UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE JUSSARA LICENCIATURA EM HISTÓRIA IVANA PATRICIA F. NOGUEIRA DE JESUS



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Transcrição:

0 UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE JUSSARA LICENCIATURA EM HISTÓRIA IVANA PATRICIA F. NOGUEIRA DE JESUS A EDUCAÇÃO E O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA NAS NOSSAS ESCOLAS: UM DESAFIO. JUSSARA-GO 2011

1 Ivana Patricia F. Nogueira de Jesus A EDUCAÇÃO E O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA NAS NOSSAS ESCOLAS: UM DESAFIO. Trabalho apresentado para fins de avaliação final do Curso de Licenciatura em História, da Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária de Jussara, com requisito parcial para a obtenção do título de Licenciado em História, sob a orientação do Prof. Esp. Wilson de Sousa Gomes. JUSSARA-GO 2011

2 IVANA PATRICIA F. NOGUEIRA DE JESUS A EDUCAÇÃO E O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO-BRASILEIRA NAS NOSSAS ESCOLAS: UM DESAFIO. Monografia aprovada como requisito parcial para a obtenção do grau de Licenciatura em História na Universidade Estadual de Goiás UEG, pela banca examinadora: Orientador: Wilson Sousa Gomes Examinador: Examinador: JUSSARA NOVEMBRO/2011

3 Eu dedico este trabalho a minha família que tanto me apoiou nos momentos de dificuldade que não me deixou desistir quando nisso pensei e que acreditou e acredita na minha capacidade, em especial a minha Mãe, Vandeleia de Jesus Ferreira, ao meu padrasto Ivo Celestino do Santos e aos meus avós, Francisco Ferreira e Odeti Maria de Jesus. Muito obrigada pelo apoio e dedicação.

4 AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus por eu ter tido força para conseguir concluir este trabalho diante das minhas dificuldades, agradeço ao meu professor e orientador Wilson de Sousa Gomes, que, sem dúvida alguma, sem sua paciência e dedicação não teria conseguido. Agradeço aos colegas e aos professores que direta ou indiretamente contribuíram, apoiaram e me incentivaram a não desistir. Em fim a todos que de alguma forma estiveram comigo nestes momentos o meu muitíssimo obrigado!

Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, ou por sua origem, ou sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se elas aprendem a odiar, podem ser ensinadas a amar, pois o amor chega mais naturalmente ao coração humano do que o seu oposto. A bondade humana é uma chama que pode ser oculta, jamais extinta. A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo. Nelson Mandel 5

6 RESUMO O presente trabalho tem como objetivo promover uma discussão sobre o ensino de História tomando como foco de problematização a temática da cultura afro-brasileira. Discutindo a lei 10.639/03 lança-se uma análise bibliográfica e documental para perceber-se a aplicabilidade do ensino de história e cultura afro-brasileira nas instituições de ensino do país. Assim, tendo por princípio o entendimento da aplicabilidade da lei e a valorização da cultura afro-brasileira partese para uma análise que compreenda a identidade afro-brasileira no contexto educacional. Com tal perspectiva, essa discussão será pautada na contradição entre a lei e a problemática das relações da nossa herança cultural acerca da exclusão do negro e da sua cultura frente a sua aceitação no contexto educacional e social. PALAVRAS-CHAVE: Educação. Ensino de História. Cultura afro-brasileira. Exclusão. ABSTRACT The present work aims to promote a discussion about the teaching of history taking as a focus of problematize the issues of African-Brazilian s culture. Discussing the Law 10.639/03 launches an bibliographic and documentary analysis to see the applicability of the teaching of history and of the African-Brazilian s culture in educational institutions in the country. So, the goal is understand the applicability of the Law and the appreciation of African-Brazilian s culture, the work do an analysis to understand the African-Brazilian identity in educational context. With this perspective, this discussion will be guided in the contradiction between the law and the problem of relationships of our cultural heritage about the exclusion of black culture and front acceptance in the educational and social context. Key-words: Education. Teaching of history. African-Brazilian s culture. Exclusion.

7 SUMÁRIO INTRODUÇÃO 08 CAPÍTULO 01 A LEI, O LIVRO DIDÁTICO E O PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: O DESAFIO DO ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO- BRASILIERA 11 1.1 A Lei e sua aplicação à realidade educacional 11 1.2 O livro didático e a sua problemática 17 1.3. O Projeto Político Pedagógico: a cultura afro-brasileira na escola. 20 1.4 A condição do negro e os problemas históricos 24 CAPÍTULO 02 A EDUCAÇÃO: O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO- BRASILIERA 28 2.1 A Escola Nova: pensar o ensino de história e cultura afro-brasileira. 28 2.2 O conceito de educação e a realidade social 32 2.3 A cultura: a nossa herança cultural e os dilemas sociais. 36 2.4 Ensino de história e cultura afro-brasileira: a educação, a escola e os desafios. 40 CONSIDERAÇÕES FINAIS 43 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 45

8 INTRODUÇÃO Esta monografia foi pensada a partir da observação e do conhecimento da lei 10.639 1, que fora sancionada em 09 de janeiro de 2003, esta altera a lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996 da LDB (Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional). A partir de então, do ponto de vista legal, fica estabelecido que as instituições de ensino do país, tornam-se obrigadas a trabalharem o ensino sobre História da África e a cultura afro-brasileira. Diante do documento legal, desenvolve-se uma análise crítica e reflexiva em termos da aplicabilidade da temática nas instituições de ensino brasileiras. Partindo do princípio que a história enquanto disciplina, produz um conhecimento perspectivista, buscar-se-á uma discussão que problematize a lei, a tradição cultural. Desse modo, tomando-a como elemento de discussão, será problematizada a herança cultural do país com a intenção de entender as bases da construção das diferenças e do preconceito racial. O primeiro capítulo dedica-se às medidas legais tomadas para as melhorias da educação e, sobretudo na disciplina de história; será tratado acerca da criação e dos objetivos da lei 10.639/03, bem como os obstáculos para sua aplicabilidade no cotidiano das escolas, que impede a validade da lei, isto é, o não comprimento da mesma. Assim o segundo capítulo apresenta os documentos legais que validam a lei, ressaltando sua necessidade e importância. Em contrapartida, busca-se uma análise baseada em fonte que possibilitará um confronto entre o que expressa a lei com a realidade do dia-a-dia das escolas, a relação do professor e aceitação das novas medida educacionais, além da relação professor e aluno e o material didático, a qual pode contribuir para o desenvolvimento da temática. Por último, busca-se destacar o papel transformador social do ensino de história. Portanto este trabalho tem como objetivo discutir a aplicabilidade da lei 10.639/03 que torna obrigatório à temática da história da África e da cultura afro-brasileira com o intuito de que através desta pesquisa possa-se trazer para a sociedade a valorização desta cultura e o respeito pela história desse povo que faz parte da nossa formação. Para isso levantam-se alguns elementos que 1 Lei que altera a lei 9.394, de 20 de dezembro de 1996 e estabelece as diretrizes e bases da educação, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática história e cultura Afro-brasileira, esta foi decretada pelo congresso nacional e sancionada pelo então presidente da república Luiz Inácio Lula da Silva em 9 de janeiro de 2003, a lei e um documento de uma única pagina com cinco artigos que estabeleci sua obrigatoriedade.

9 nortearam o desenvolvimento do trabalho, tais como: a cultura, a educação, a identidade nacional e o papel social da História. Assim sendo, no segundo capítulo discute-se superficialmente estes elementos, uma vez que deve-se levar em consideração que este é um trabalho desenvolvido para a história, e com isto precisa-se seguir uma linha de pensamento histórico, uma corrente historiográfica que possa conduzi-lo. Dessa maneira, a pesquisa tem como fundamentação o pensamento da Escola dos Annales, A História Nova de Jacques Le Goff, pois esta estabelece para história, novos caminhos e conduz a mesma para ser pensada na mentalidade da sociedade, as representações coletivas e das estruturas, os acontecimentos de longa duração e, sobretudo, a organização social e econômica, elementos que podem explicar os eventos históricos, o porquê dos acontecimentos, levantar questões de mudanças e de permanência de determinados fatos históricos. Pensar este trabalho por esta corrente é importante e necessário para estabelecer um diálogo entre a pesquisa e a historiografia. Após apresentação do referencial teórico, faz-se uma abordagem em termos conceituais de educação como uma das principais abordagens para definir a perspectiva analítica, pois a educação passou a ser vista com o caminho para as transformações sociais, e o objeto de estudo aqui trabalhado necessita desenvolver-se no meio educacional Tem-se nele um elemento de extrema importância, pois ajuda a pensar e entender não apenas a própria educação, como também os princípios estabelecidos pela sociedade na formação do indivíduo pensante e crítico. Dando seqüência às discussões chega-se ao conceito de cultura. Pois para se pensar na problemática aqui tratada, tem-se que pensar primeiro nessa definição, porque faz-se de extrema importância para o processo de análise, afinal na educação e na escola é onde se pensa o desenvolvimento do objeto estudado. Por outro lado note-se também que não é apenas uma questão do ensino de história, mas estão envolvidos elementos da nossa tradição contidos na nossa cultura. A abordagem acima citada abre o caminho para outra discussão que também contribui para a compreensão e desenvolvimento da problemática em questão, que é a condição do negro em nossa sociedade: de onde vêm tais inferiorizações e por que foi necessária a criação da lei. Desse ponto desenvolve-se uma análise dos fatores discriminatórios contra a população negra que influenciam na marginalização do mesmo nos aspectos políticos, sociais e culturais. Através desta ótica será possível levantar os fatores que contribuíram com para inferiorização e exclusão

10 do negro que vem desde o período da escravidão no Brasil o qual, conseqüentemente, deixou marcas para as gerações futuras. Diante do exposto, o que se pretende destacar durante a pesquisa são os elementos que nortearão o desenvolvimento da problemática do nosso objeto, ou seja, aplicabilidade da lei 10.639/03. Além disso, o objetivo é tentar promover uma análise em torno do preconceito racial, que contribui para a discriminação e a inferiorização do negro e a partir deste fato ressaltar a necessidade de mudança.

11 CAPÍTULO 01 A LEI, O LIVRO DIDÁTICO E O PROJETO POLÍTICO PEDAGÓGICO: O DESAFIO DO ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRO- BRASILIERA Neste primeiro capítulo propôs-se uma discussão que debata sobre as proposta da lei 10.639/03 e os objetivos a serem alcançados. A problemática situa-se dentro de uma análise que percebe o ensino de história e cultura afro-brasileira bem como a condição do negro na sociedade mediante a valorização da cultura nacional, especificamente a de matriz afro nos conteúdos do ensino de história, quer-se entender a aplicabilidade desses elementos nas escolas. Assim sendo a discussão pauta-se na contradição entre a lei e a problemática da sua aplicabilidade em relação com a nossa herança cultural e exclusão dos indivíduos da construção histórica do nosso passado 1.1 A Lei e sua aplicação à realidade educacional Este trabalho tem como objetivo promover uma discussão crítica e reflexiva em torno do ensino de história e a cultura afro-brasileira, uma vez que a Lei 10.639/03 estabeleceu que a partir de então se torna obrigatório às instituições de ensino do país a promoção do conhecimento acerca da temática da História e Cultura Afro - brasileira em seus currículos. Com isso, haveria a garantia e o direito legal da valorização da identidade cultural afro-brasileira. Diante do que foi dito acima pode-se estabelecer uma análise do que diz a lei em seus documentos oficiais e problemáticas da sua aplicabilidade quando são estabelecidas a relações da nossa herança cultural e a exclusão do negro e da sua cultura frente a sua aceitação no contexto educacional e social. Partindo desses princípios, observa-se que a lei 10.639/03, que fora sancionada em 09 de janeiro de 2003, altera a lei 9.394 de 20 de dezembro de 1996 da LDB (Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional), onde a mesma fica acrescida dos seguintes artigos 79-a, 79-b e o artigo 26- a.

12 A partir disso, do ponto de vista legal, fica estabelecido que as instituições de ensino do país, tornam-se obrigadas a trabalharem o ensino sobre a história e cultura afro-brasileira. Aqui se pode conhecer a implementação e a obrigatoriedade da lei, o que pede uma análise de como se foi pensada e o objetivo de sua criação e se esta sendo cumprida no sistema educacional. Partindo por este viés tenta-se aqui estabelecer o que diz os documentos legais e a prática no cotidiano das escolas. Com este propósito procurou-se a professora 2 Gleycy Mara Borges Mesquita, graduada em História e pós-graduada em Docência Universitária, atual coordenadora Pedagógica nos anos finais do Ensino Fundamental da Secretaria Municipal de Educação. Na oportunidade, a coordenadora foi questionada se a lei 10.639/03 esta sendo desempenhada nas escolas do município, a sua resposta foi bem clara e objetiva, dizendo que a lei não está funcionando e seus objetivos não estão sendo alcançados. Os motivos pelo não cumprimento da lei são variados, vão desde a carga horária do professor, que muitas vez estão sobre carregados, à falta de interesse do próprio professor que não se encontra disposto a aceitar a nova forma de ensinar. Segundo a professora, há professores que não se abrem a nova proposta de ensino de conteúdo e metodologia, algo necessário a aplicabilidade da lei; outro motivo citado pela foi a falta de material didático, uma alternativa seria a distribuição de material didático para a elaboração das aulas, porém desde 2003 (ano que foi implementada a lei) ainda se tornam quase desconhecida tais matérias. O livro didático que é o principal apoio do professor não contribui para o desenvolvimento da temática, atualmente o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), articulado por meio do Governo Federal, inovou os livros didáticos de história com conteúdos da História da África e dos Africanos, porém com viés, tornando-se superficial por se tratar de culturas tão distintas. A professora finaliza sua fala dizendo que é indubitável a magnitude da Lei 10.639/03 para a formação de novos cidadãos livres do preconceito epidêmico. Todavia, a ineficiência de ações concretas torna esta proposta um sonho ainda distante, mas não inalcançável. Na apresentação do MEC (2004, p. 05) justifica-se que o Ministério da Educação, está comprometido com as ações afirmativas, e pautado nessas ações que se é pensada a criação da lei 10.639/03. Com o objetivo de que se estabeleça uma relação de igualdade social e cultural, uma 2 Relatos da professora responsável pela coordenação dos anos finais do Ensino Fundamental do município de Jussara, concedeu-nos uma entrevista informal no dia 30 de outubro de 2011 às 6 horas da tarde, as perguntas foram feitas oralmente, e as resposta foram anotadas em um caderno.

13 forma também de corrigir os séculos de exploração e opressão ao povo africano no país, além de promover a inclusão social e a cidadania para todos no sistema educacional brasileiro. Acima se pode conhecer a objetividade do Ministério da educação, em criar a lei 10.639/03, que é trazer através da educação uma conscientização do povo brasileiro da sua formação cultural e com isso o conhecimento da sua identidade, e consequentemente o respeito às diferenças e a aceitação da cultura africana que está presente em nosso cotidiano. Como já foi exposto anteriormente, o ensino escolar passou por um longo processo de transformação até chegar ao que se conhece hoje por educação, na nossa historiografia educacional também foi pensada de forma variada ao longo da nossa história, porém o que se percebe é que ela sempre foi conduzida como uma forma de controle da sociedade, com afirma Bittencourt (2004): Para a maioria dos educadores que concordavam com a escolarização das classes populares, a história a ser ensinada, desde o primeiro ano escolar, aos trabalhadores livres que emergiam em substituição aos escravos deveria inculcar da obediência à hierarquia, de modo que a nação pudesse chegar ao progresso, modernizando-se segundo o modelo dos países europeus (BITTENCOURT, 2004, p. 64). Nessas palavras nota-se que o ensino tinha com objetivo auxiliar e situar cada indivíduo em seu lugar na sociedade, por outro lado hoje o sistema educação volta-se para a criação de medidas que possam conduzir nossa sociedade rumo à igualdade, a democracia racial, cultural, a cidadania educacional e a afirmação da identidade. Pois nos dias atuais pode-se ver cenas de preconceito contra afro descendentes e uma forte rejeição a cultura africana, daí a necessidade da criação de lei para que possa mudar esta realidade. Como se vê na citação da apresentação do objetivo do MEC com a implementação da lei 10.639, que esta foi baseada nas medidas das ações afirmativas e um conjunto de medidas que surgiram para combater a discriminação e o pensamento estereotipado da inferiorizarão coletiva do negro, que até hoje sofre as conseqüências de seu passado histórico. Entende-se, pois que a lei veio para suprir as injustiças cometidas ao povo africano e conseqüentemente a seus descendentes, assim também para garantir o direito da valorização da sua cultura e ver na educação o melhor caminho para que se estabeleça uma relação de igualdade social. Esta estrutura permite a articulação de programas de combate à discriminação racial com projetos de valorização da diversidade étnica. Um dos seus objetivos é tornar a multiplicidade de experiências pedagógicas dessas áreas em modos de

14 renovação nas práticas educacionais. Mais do que uma reunião de programas, a tarefa da nova secretaria é articular as competências e experiências desenvolvidas, tanto pelos sistemas formais de ensino como pelas práticas de organizações sociais, em instrumentos de promoção da cidadania, da valorização da diversidade e de apoio às populações que vivem em situações de vulnerabilidade social (BRASÍLIA, 2004, p. 05). O documento do MEC ainda afirma que, por intermédio da Secad 3, tem a missão de promover a união de esforços com os governos estaduais e municipais, ONGs, sindicatos, associações profissionais e de moradores, contando com a cooperação de organismos internacionais para ampliar o acesso, garantir a permanência e contribuir para o aprimoramento de práticas e valores dos sistemas de ensino. Diante do que foi exposto acima entende-se que a lei foi criada para que através do conhecimento, garantisse o direito da valorização da cultura afro-brasileira e assim, estabelecesse-se a igualdade social. Contudo, para que isso ocorra e necessário que tais ações sejam exercidas no cotidiano escolar, porém o que se verifica é que dificilmente se consegue seguir tais propostas; os motivos são diversos, que vão desde a falta de compromisso das instituições até a falta de matérias didáticos que possam dar suporte ao professor uma vez que ensinar história e a temática da cultura afro-brasileira. José Carlos Libâneo defende que: Minha tese inicial é bastante pessimista: há uma distância considerável entre as políticas educacionais, a legislação educacional, a pesquisa acadêmica, e o que acontece na realidade das escolas, isto é, no ensino, no trabalho cotidiano dos professores, na aprendizagem dos alunos. Esse distanciamento das questões mais concretas da sala de aula e do trabalho direto dos professores com os alunos é um forte indício da desatenção, do desapreço, com os aspectos pedagógicodidáticos que, em última instância, são os que efetivamente atuam na aprendizagem dos alunos e no trabalho dos professores. Paradoxalmente, é na ponta do sistema de ensino, nas escolas e nas salas de aula, que as coisas efetivamente acontecem, é lá que sabemos o que os alunos aprendem como aprendem e o que fazem com o que aprendem (LIBÂNEO, 2008, p.01). Em seu texto Libâneo questiona o sistema educacional e suas medidas para melhorar o ensino, onde ele coloca o distanciamento entre a proposta para qualidade do ensino e a prática do cotidiano escolar, o funcionamento das políticas educacionais nas rotinas em sala de aula, o diaa-dia da relação entre professor e aluno, em que o professor lida com a realidade que muita vezes não conta com uma estrutura e material que possam levar tal qualidade ao ensino. Como se sabe 3 Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão

15 quem cria tais normas e medidas geralmente não conhece a realidade de quem precisa das mesmas. Mais palavras de Libânio (2008, p. 03) há uma deficiência da estrutura física das escolas, de equipamentos e material escolar. Tomando as idéias apontadas acima, tem-se que a lei 10.639/03 instituiu a obrigatoriedade do ensino de História e cultura afro-brasileira e África no currículo educacional das instituições de ensino. Essa decisão resgata historicamente a contribuição dos negros na construção e formação da sociedade brasileira. No entanto, como já fora colocado acima, o ensino nas escolas brasileiras encontra dificuldades em transpor para a realidade as medidas educacionais, o que leva a pensar que a lei 10.639 e só mais uma das medidas que as escolas conhecem, mas quando se deparam com a realidade do cotidiano e com a sociedade em si, aparecem os problemas para a aplicabilidade da lei. Assim, a lei confrontada com os motivos da sua criação, tem que lidar com a pluralidade cultural, social e econômica, com os valores familiares já enraizados, o preconceito, sem esquecer do próprio aluno negro na sala; todas essas questões envolvem a temática da cultura afrodescendente e africana na sala de aula, por este motivo Fonseca (2003, p. 37) diz que não basta criar novo conteúdo perspectivo multicultural, tem que se reconstruir no cotidiano escolar linguagens e atitudes que atendam as variáveis diferenças culturais e níveis sociais. Nesse contexto sociocultural e educacional processa-se de forma intensa o debate acerca dos paradigmas, das relações entre os padrões e níveis de conhecimento, das concepções de educação e da escola, o que evidencia a necessidade de repensar as práticas pedagógicas dos professores no interior dos diferentes espaços educativo. (...) a abordagem das formas e relações entre conhecimentos e metodologia (FONSECA, 2003, p. 101). Isso porque hoje o meio educacional é visto como um lugar capaz de transformar, ou seja, a escola ganha um papel de trazer as possíveis transformações sociais, econômicas e culturais, e para que estas transformações realmente ocorram, devem ocorrer primeiro no sistema educacional, no processo de ensino e aprendizagem. Segundo Fonseca (2003, p. 29) nesse novo mapa cultura e político situam-se a educação, de valores, vivenciado de forma aguda e complexa pela sociedade brasileira contemporânea, onde a educação tem com função explorá-la, contestá-la e transformá-la que por sua vez implica enfrentar uma temática óbvia ao historiador, que é a relação orgânica entre educação, cultura memória e ensino de história. Diante dessa perspectiva entende-se que a escola se tornou fundamental ao mundo contemporâneo.

16 Considera-se que a lei 10.639 foi criada para transformar uma realidade da nossa sociedade: a exclusão e o preconceito racial e cultural, que o negro sofre pela sua condição histórica. Assim sendo, a lei veio para promover uma sociedade democrática, justa e igualitária. Porém, uma coisa é a existência da lei, outra é o dia-a-dia como se afirmou acima. Nos documentos analisados nas primeiras falas, comprova-se o desejo por uma sociedade democrática nas suas relações sociais e culturais, onde a pluralidade brasileira seja motivo de orgulho e não um motivo para haver tanta desigualdade social. Como se observa na citação: A diversidade aparece aqui, sobre tudo com um problema a ser enfrentado. Trata-se de uma constatação da diferença e da necessidade de lidar com a mesma (ABREU e SOILHEL, 2003, p. 56). Segundo as autoras, a justificativa do tema parte da antiga constatação de que o Brasil desconhece-se a si mesmo. Daí a necessidade de romper com estereótipos tanto regionais quanto étnicos, sociais e culturais e conhecer o país. Pois acredita-se que só assim é que se poderá mudar a realidade do Brasil que é marcado por sua desigualdade social e cultural, segundo Romanelli (2010). Por isso se faz necessário que seja inserido nos currículos escolares a temática da cultura afro-brasileira, por outro lado não basta só sancionar, tem que acompanhar seu desenvolvimento e resultado, estabelecer metas, inserir novos métodos e formas de apreender o conhecimento, pois o que se percebe é que a lei vai além do que há no cotidiano educacional das escolas. Na constituição da República Federativa do Brasil (2010, p. 57) estabelece-se na seção II da cultura, no artigo 215 que o estado garantirá a todos pleno exercício dos direito culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização cultural, protegerá as manifestações das culturas populares indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional. Assim como garantirá a formação de pessoal qualificado para a gestão da cultura em suas múltiplas dimensões. A partir disso, do ponto de vista legal, fica estabelecido que as instituições de ensino do país tornam-se obrigadas a trabalharem o ensino sobre história e cultura afro-brasileira. Com a ação legal, tem-se que a temática relativa ao Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e História da África está sendo aplicada, desenvolvida, explicada e ensinada nas instituições de ensino do país, o que se consegue perceber na pesquisa é que a temática, em geral, é trabalhada em forma de projeto nas escolas, como um dia especial, um dia especial para trabalhar uma temática tão ampla que possui tamanha expectativa de transformação social, sem falar da sua

17 complexidade; que carrega como objetivo trazer ao povo brasileiro conscientização da sua pluralidade cultural e assim através das novas gerações levar o Brasil rumo a uma sociedade democrática na suas relações raciais e educacionais, bem como promover o respeito à diferença. Portanto, essa atitude faz-se pequena para tamanha expectativa. Ensinar História da África e Cultura afro-brasileira é uma questão de obrigatoriedade que não deve só envolver o sistema educacional, mas também toda a sociedade. O objetivo principal para inserção da Lei é o de divulgar e produzir conhecimentos que garantam o respeito pela pluralidade étnico-racial do Brasil e assim garantir a valorização da identidade cultural brasileira e africana. Este é o principal objetivo da lei, mas se não houver uma participação de todos ficará difícil mudar a realidade excludente. A escola tem um importante papel nesse contexto e é por isso que se foca nesta análise, como demonstra os subtítulos abaixo. 1.2 O livro didático e a sua problemática Já é de conhecimento que a implementação da Lei nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira e africana nos currículos escolares de todo o Brasil. Assim haverá a valorização da cultura negra e de suas contribuições para nossa formação, buscando assim uma educação multicultural, afinal tem-se aqui na formação do país uma incontestável mistura racial e cultura. Porém parece que as escolas ainda não aprenderam a lidar com esta realidade de nossa sociedade, por isso esta análise se faz importante neste trabalho, uma análise do livro didático, o principal instrumento do professor em sala de aula, uma oportunidade de questionar se o livro didático está contribuindo com tais propostas. Os levantamentos que serão feitos aqui foram resultados da análise dos livros didáticos da coleção Projeto Araribá de 7ª á 8ª série (8ª e 9ª ano) 4, pois são nestas séries que são abordados os 4 Livro didático do ensino fundamental uma obra coletiva, lançado em 2006, ou seja, três anos após a lei, e foi usado durante quatro anos e de longe atende às necessidades da lei.

18 conteúdos referentes à temática, com intuito de perceber como é abordado o ensino da história do negro após a criação da lei, saber se este corresponde com as propostas e objetivos da mesma. Com este propósito inicia-se a análise do livro didático destinado a 7ª na Unidade 8 Brasil: da Regência ao Segundo Reinado, onde se discute característica do período de revolta entre eles formada por negro, como é o caso da revolta dos malês, e logo após na página 200 se localiza um tópico denominado A abolição do tráfico negreiro, encontra-se logo na sua seqüência Os imigrantes no Brasil. Tal passagem de uma situação de ensino para outra, leva-nos a questionar sobre a aprendizagem relativa à temática, isto é, se não houver uma socialização uma problematização por parte do professor só a aplicação do livro didático não contribuirá para a compreensão dos alunos. Já no manual da 8ª série, encontra-se na Unidade 2 A República chega ao Brasil, em que é discutido de forma bem superficial sobre a importância do trabalho escravo para a formação econômica, política e social do Brasil, logo em seguida na página 45 a 47 aborda-se sobre o processo lento da abolição da escravatura e apenas em 16 linhas, na página 47, fala sobre o pós-abolição. As cidades de São Paulo e Rio de Janeiro receberam grande número de escravos libertos que para lá se dirigiram em busca de trabalho. Em São Paulo os escravos, os ex-escravos, a maior parte sem qualificação profissional e tendo que concorrer com os trabalhadores imigrantes, foram obrigados a aceitar os trabalhos mais pesados e mal remunerados (MELANE, 2006, p. 74). Assim constata-se na análise que o processo histórico do negro no Brasil abordado no livro didático não contribui para os objetivos da lei, imagens que estão expostas no mesmo abordam o período escravocrata onde o negro aparece no trabalho forçado, os castigos e poucas ou nenhuma expressões culturais que possam vir a valorizar a cultura desse povo que faz parte de nossa formação cultural. Como já foi dito anteriormente, livros didáticos abordam superficialmente sobre a vida escrava do negro no período colonial do Brasil, como a implantação da lei visa mudar esta realidade e trazer o conhecimento da cultura Afro-brasileira para sala de aula, há limitações do livro didático para com a escola, sendo um assunto bastante visado pelos profissionais da educação, pois como afirma o livro Jörn Rüsen e o Ensino de História: No campo dos textos dedicado a temas históricos os livros didáticos constituem uma categoria bem delimitada, cujas características são definidas pelo seu uso nas aulas de história na escola, que permaneceu em grande parte excluída da maioria das análises (SCHMIDT, BARCA, MARTINS, 2010, p. 111).

19 Assim, realça-se nesta análise que há um elemento muito presente nos livros didáticos de história e uma concepção eurocêntrica do passado, a qual valoriza os grandes fatos e feitos dos colonizadores. O que se vê nos livros didáticos de história é que iniciam a historiografia do passado pelo processo de conquista e colonização do território brasileiro sem dar o valor necessário à presença do índio. Nas palavras de Bittencourt (2004, p. 310) o que se pode considera com uns dos problemas do livro didático e em sua produção está ainda a preterir os estudos sobre a história brasileira, prioriza temáticas da história geral segundo uma visão eurocêntrica e fornecendo explicações dos problemas brasileiros sob a influência exclusivamente externa. A partir da problemática proposta, que se constitui da aplicabilidade da lei 10.639/03, questiona-se os livros didáticos, os quais são o principal apoio do professor de história, carregam uma visão eurocêntrica em seus conteúdos e com isso, como fica a questão da cultura afrobrasileira e africana? Como estão sendo expostas? Nota-se que nos livros didáticos o povo africano aparece na condição de escravos, como mercadoria objeto de venda e compra, em imagens que demonstram suas condições desfavoráveis sendo castigados, oprimidos e explorados, negando assim um maior destaque a sua influência cultural, valorização da sua contribuição para formação econômica, suas lutas e conquistas, porém o que se observa no cotidiano da escola são meras manifestações culturais folclóricas de legado aos indígenas e aos negros. As renovações de temas abordagens da história da população de origem africana ocorridas nos livros didáticos a partir da mobilização dos movimentos negros e de sua atuação política, concluindo que a produção historiográfica continua insistindo sobre o período da escravidão e pouco se dedicando à época posterior, pós-abolição e à atuação e lutas dessa população na história do Brasil (BITTENCOUR, 2004, p. 306). Nesta palavra pode-se ver que o peso da obrigatoriedade da lei, os livro didático ainda possuem uma visão linear de suas produções historiográficas o que não possibilita uma contestação, segundo Circe (2004, p. 3130) um dos problemas considerados como dos mais graves em relação ao livro didático é a forma pela qual apresenta os conteúdos históricos. O conhecimento produzido por ele é categórico, característico perceptível pelo discurso unitário e simplificado que reproduz, sem possibilidade de ser contestado. Para a autora para a análise dos livros didáticos é importante para que se percebam os valores ideológicos expostos nos conteúdos.

20 Com isso se acredita que é preciso refletir sobre o que o livro didático realmente propõe ao ensino, especificamente de história, quais as contribuições para o processo de ensino e aprendizado do aluno e o que este esta a acrescentar ao professor. Até agora não se investigou, de maneira mais sistemática e contínua, os conhecimentos que os professores e professoras vêm acumulando em suas aulas sobre as possibilidade e limitações da aplicação dos livros didáticos, pelo menos no que se refere à análise das disciplinas envolvidas nos livros didáticos de história (SCHMIDT, BARCA, MARTINS, 2010, p.111). Como foi notar, os autores vêm destacando os problemas dos livros didáticos, entre eles as questões dos conteúdos expostos nestes em relação à história do Brasil, assim com é explicada a questão da história do povo africano e a sua influência cultural; é muito enfatizado o sistema escravocrata e muito limitadamente as leis abolicionistas. Sabendo do papel fundamental que as instituições escolares têm para com a sociedade, neste contexto se insere a questão relativa à valorização da diversidade étnico-cultural do Brasil, daí a importância da temática sobre a história da África e afro-brasileira, além de trazer para a sala de aula um assunto marginalizado, o fim de um ensino eurocêntrico e a valorização da pluralidade étnico-cultural. Assim, haverá a valorização e um possível combate ao preconceito e à discriminação quando houver uma preocupação com a cultura e passado sem que haja a desconsideração dos sujeitos que contribuíram para a estruturação da sociedade. O desenvolvimento dessa temática afim de tais objetivos é um desafio ao sistema educacional, uma vez que são cobradas medidas e planejamento para que se consiga alcançar os objetivos propostos. Daí a importância da elaboração do projeto político pedagógico da escola, pois neste fica estabelecido as intenções e os objetivos a serem alcançados, deve-se busca a organização do ensino da cultura afro-brasileira e africana no ensino. 1.3. O Projeto Político Pedagógico: a cultura afro-brasileira na escola. Acima destacam-se e analisam-se os problemas que encontrados nos livros didáticos de história para educação básica do Brasil, o que leva a necessidade de conhecer com esta sendo planejado o ensino de história e para que esta análise seja possível busca-se os projetos políticos pedagógicos (PPP), uma vez que as Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional com a

21 validação da Constituição Federal de 1988 determina que o ensino de História terá em sua grade o ensino das contribuições do povo africano para nossa formação econômica, política, social e, sobretudo cultural esta determinação surgiu a partir do momento em que Ministério da Educação (MEC) percebeu que esta medida relevante para a compreensão da sociedade contemporânea. Assim sendo elabora-se para os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN); a temática da Pluralidade Cultural com a finalidade de através do conhecimento haja a valorização de diferentes grupos sociais e tornar a sociedade mais igualitária, menos excludente e baseando-se na lei 10.639/03, propor para as novas gerações aceitar o Brasil como ele realmente é, ou seja, um país plural. Diante do conhecimento do documento legal, remete-se alguns questionamentos a respeito, a legitimação da lei na transposição para realidade cotidiana das escolas brasileiras: estaria a lei em plena funcionalidade, estariam as escolas e seus professores preparados para algo tão desafiador, e os seus objetivos estariam sendo alcançados ou não estariam como muitas outras leis brasileiras, não passando de um documento legal? Com pretensão de respostas, busca-se através desta pesquisa, embasada em fonte bibliográfica que conduziu a uma análise reflexiva e crítica da situação atual do ensino, saber se houve grandes ou pequenas mudanças no ensino com a lei 10.639/03 e, sobretudo, qual o papel social e cultural das instituições escolares e o ensino da memória histórica. Sabe-se que não, mas, pelas palavras da professora Greycy, o projeto político pedagógico em relação a inserção da temática da cultura afro-brasileira e africana, não invalidada no cotidiano escolar é muito limitada para falar sobre um povo africano, para ela, para que se consiga falar de África primeiro tem que se pensar nas Áfricas, pois é um continente de cultura variada, para se pensar em ensinar nas contribuições do povo africano tem que se pensar primeiro na definição dos povos africanos que passaram pelo nosso país; fatos que estão sendo expostos de forma muito limitada nas escolas. Os Parâmetros Curriculares demonstram a necessidade de mudança e o grande peso social que tem a disciplinar de História. Em alguns projetos políticos pedagógicos propõem-se para a disciplina de História que seus conteúdos sejam ministrados com a finalidade de que seus alunos possam entender a realidade na sua diversidade e nas múltiplas dimensões temporais e destacar os compromissos e as atitudes de indivíduos de grupos e de povos na construção das sociedades, propondo estudos nas questões locais, regionais e mundiais, além de identificar as diferenças e

22 semelhanças entre culturas, mudança e permanência no modo de viver, de pensar, de fazer e das heranças legadas por gerações, ou seja, um incentivo a formação de diálogo entre passado e presente. A sociedade atual solicita que se enfrente a heterogeneidade e que se distingam as particularidades dos grupos e das culturas, seus valores, interesses e identidades. Ao mesmo tempo, ela demanda que reconhecimento das diferenças não fundamente relações de dominação, submissão, preconceito ou desigualdade (BRASIL, PCN, p. 302). Quando se analisa este trecho tanto das propostas pedagógicas como dos Parâmetros Curriculares Nacionais pode-se observar que estão coerentes com o objetivo da lei 10.639 5. Por outro lado, caso se pensa em tudo que envolve e representa esta caminhada até alcançar o objetivo final, que não e só trazer o conhecimento mas também o respeito às diferenças e às diversidades culturais e o fim do preconceito racial e cultural, da inferioridade social, econômica além da interiorização da cultura afro-brasileira, conseguiria o professor, que também faz parte dessa sociedade, trabalhar sem deixa que se influencie pela sua própria forma cultural, pode-se dizer que este bem preparado sim, porém ele esta sendo preparado para tal responsabilidade social, sabe-se que a disciplina de História tem este poder transformador, reflexivo e crítico basta ser conduzido para tal propósito. Veja esta afirmação: Como instituição social, a escola interage com diferentes grupos sujeito é assim ocupa um lugar estratégico por que faz a media das relações entre a sociedade, a educação, o Estado, a cultura e a cidadania,..., a escola articula as necessidades individuais á demanda da sociedade contemporânea ao mesmo tempo, fornece escolaridade prepara para o trabalho e a vida social e política transmitindo preservando e recriando a cultura (FONSECA, 2003, p.101). Observa-se, portanto, que as instituições escolares podem desempenhar um papel importante na configuração da identidade, pois elas constituem-se como um lugar plural, ou seja, a escola é um lugar onde se é possível lidar com uma variedade de diferentes grupos pertencentes a uma mesma sociedade, por isso que visa à escola com o caminho para as transformações sociais, pois ela estabelece e reflete sobre a atuação do indivíduo nas suas relações pessoais e o convívio com o coletivo e suas atitudes de compromisso com classes, grupos sociais, culturas e valores. Todas estas intenções deixam claro o papel social importante que tem o sistema educacional, por isso se faz importante a elaboração de propostas pedagógicas capazes de 5 Para esta confirmação buscamos no projeto político pedagógico do colégio onde na pagina 10 do seu PPP em um único parágrafo de oito linhas vem a especifica o objetivo da lei 10.639/03

23 despertarem no professor a capacidade de lidar com aluno e sua variações culturais, sociais e econômicas, pois a história em si pode dar este suporte ao professor de história, porém este tem que ser conduzido com tais propósitos. Como afirma Michel de Certeau (1982, p. 66) toda pesquisa historiográfica se articula com um lugar de produção sócio-econômica, política e cultural, e por isto o trabalho do historiador está condicionado ao tempo, espaço e ao lugar de memória. Segundo Selva Guimarães Fonseca (2003) a formação do ser humano não é tarefa exclusiva da escola, mas diante das mudanças sociais, política e econômicas ocorridas ao longo dos tempos fez-se com que exigisse da escola uma participação maior neste processo. Por outro lado, estas transformações trouxeram consigo novos problemas que se tornaram um desafio para o processo educacional que tem de ir em busca de meios para se adequar a seu tempo e assumir o compromisso de agente formador de cidadão, uma vez que a escola não deve ser considerada só como uma formadora de cidadão, mas também como uma instituição que interfere e transforma uma estrutura social. Pois por ser a escola uma instituição social que se relaciona com diferentes grupos, possibilita-se à ela não só transformar, mas de se transformar junto a esta sociedade. Diante dessas afirmações, a proposta pedagógica para o ensino de história deve se baseada nesta concepção, a escola como uma instituição social de transmissão e produção de saberes e valores culturais e acima de tudo que forme cidadãos capazes de respeitarem as diferenças, pois a intencionalidade da lei 10.639/03, além de trazer o conhecimento da cultura Afro-brasileira, é também tornar esta aceita e respeitada e propiciar a igualdade social. Sabe-se que ainda há muito por fazer, a começar pelos materiais didáticos que são fornecidos para trabalhar esta temática, que de longe atendem esta finalidade, sem falar na carga horária das escolas que dificilmente conseguem trabalhar de forma a dar uma atenção maior a todos os assuntos que envolvem a história e a cultura africana e a sua herança deixada Brasil. Como isso, na perspectiva de Selva (2003) tem-se que entender que é preciso que o professor traga o conteúdo para realidade do cotidiano do aluno é assim será possível desenvolver no aluno a capacidade de ler e interpretar a sua própria realidade, e ver-se como participante do processo Histórico e com isso o aluno ganhará cada vez mais autonomia no seu processo de ensino e aprendizagem, ou seja, o professor não ensina o conteúdo e sim ensina ao aluno como aprender, desenvolvendo a capacidade do aluno de investigar, interpretar, e analisar e ter um olhar crítico sobre sua própria realidade algo importante para se pensar quando se pensa em

24 trabalhar em sala de aula uma temática que envolve toda a formação de um povo. Esta proposta a ser trabalhada tem com finalidade não uma crítica ao estabelecimento escolar, mais sim às medida que são criadas com objetivo de qualidade educacional e social. Contudo, sem dar suporte ao profissional da história e sem o acompanhamento do desempenho dos objetivos alcançados, a realidade social e educacional não vai mudar facilmente. Então, a partir disso, constata-se que falar sobre a cultura afro-brasileira, em si, já renderia uma discussão com uma série de obstáculos, e transpor isso didaticamente para a sala de aula seria ainda mais desafiador. Porém, esse desafio a instituições escolares que realmente abraçaram a causa tem muito a fazer e a alcançar. 1.4 A condição do negro e os problemas históricos Seguindo o pensamento acima desenvolvido, encontra-se na historiografia, que após o fim da escravidão o negro passou a ser considerado como a mão-de-obra não mais necessária ao novo sistema econômico. Inicia-se assim a marginalização da população negra e afro-descendente que habitavam o nosso território. Com isso, passam a ser considerados incapazes para a nova forma de trabalho que exige capacitação e/ou qualificação. Há nesse contexto, a ideologia de que o emperramento do Brasil frente ao desenvolvimento e progresso causado pela escravidão e, consequentemente, pela população afro-descendente. Segundo Cláudio Lembo (2008) nesse momento o negro passa a ser estereotipado, marcado pela sua condição de ex-escravo, analfabeto e sem lugar na sociedade já que ele não é mais escravo. Sem direito a nenhum benefício pelos seus anos de trabalho, a ascensão social não era nem pensada e para que haja mais problemas de ordem econômica, elege-se o trabalhador branco como o indivíduo portador das qualidades e formações necessárias ou adequadas para o novo modelo econômico no qual o Brasil queria entrar, ou seja, o capitalismo. A ideologia das elites dominantes, herança da escravidão, cria valores discriminatórios, que, por sua vez, impossibilita uma ascensão nos níveis econômico, social, cultural dos grupos excluídos. Como afirma Foucault: Em certo sentido, a peça representada nesse teatro sem lugar é sempre a mesma:

25 é aquela que repetem indefinidamente os dominadores e os dominados. Homens dominam outros homens e é assim que nasce a diferença dos valores; classes dominam classes e é assim que nascem à idéia de liberdade homens se apoderam de coisas das quais eles têm necessidade para viver, eles lhes impõem uma duração que elas não têm, ou eles as assimilam pela força é o nascimento da lógica (FOUCAULT, 1979, p. 24). Dessa forma entende-se que em qualquer que seja o momento da história de uma determinada sociedade, sempre houve e haverá tipos de dominação construída pelos que detém a força. Ainda Foucault, afirma que nem a relação de dominação é mais uma relação, nem o lugar onde ela se exerce é um lugar. E é por isto, precisamente, que em cada momento da história a dominação se fixa em um ritual: ela impõe obrigações e direitos, ela constitui cuidadosamente procedimentos que justificam a dominação e exclusão dos indivíduos que não pertencem ao seu universo. A humanidade é constituída em um sistema de regras que contribui para a dominação de um sobre o outro se olharmos a dominação construída historicamente. Trazendo essa análise para o contexto brasileiro, percebe-se que ao findar da escravidão a mão-de-obra escrava não sendo mais necessária, inicia uma divisão social e racial. Tomando as definições de Foucault (1979) pode-se assim dizer que a sociedade brasileira não é democrática nas suas relações sociais e raciais e isto faz com que fique imobilizada pelos mecanismos seletivos que as elites estabeleceram. Segundo Leonildo Correa (2008) a trajetória histórica do negro Brasil fora marcada pela violência, a dominação, a exclusão e a exploração. Hoje diz-se que a omissão e a indiferença fazem parte do cotidiano do afro-descendente. A elite, em sua maioria branca, rica e poderosa, controla e domina enquanto em sua maioria. A nossa sociedade está dividida de modo a perpetuar a lógica da exclusão e dominação segundo Foucault (1979). Assim, os negros se reconhecem enquanto pobres historicamente pela condição escrava que lhes foi imposta e junto a eles ainda há os indivíduos brancos que pela condição econômica atual nascem pobres e não tem uma exclusão racial e sim econômica. Isto faz com que a mudança não ocorra devido à lógica da naturalização dos problemas sociais, culturais e educacionais como nosso objeto focaliza. Assim observa-se que as mudanças sociais encontram dificuldade em ocorrerem. Quem cria as situações, ou seja, a elite, geralmente não conhece a realidade a qual necessita ser mudada. Não se pretende colocar toda a responsabilidade dos problemas sociais sobre a escola e a educação, entretanto, a educação tem uma grande parcela nessa conjuntura. De acordo com Romanelli:

26 Dessa forma, ainda que os objetivos verbalizados do sistema de ensino visem atender aos interesses da sociedade como um todo é sempre inevitável que as diretrizes realmente assumidas pela educação escolar favoreçam mais as camadas sociais detentoras de maior representação política nessa estrutura. Afinal quem legisla, sempre o faz segundo uma escala de valores próprios da camada a que pertence (ROMANELLI, 2010, p. 30). Aqui se encaixa a problemática da aplicabilidade da lei 10.639/03. Na realidade escolar as questões da dominação social, da idéia de superioridade racial e econômica, acontecem de modo sutil. Isso porque há duas realidades, uma em mudar a concepção da sociedade sobre os aspectos de valores culturais e isso tem influência direta no condicionamento do educando que é motivado a crer que no ideal de beleza, de religião entre outros fatores: o ideal cristão, europeu, jovem e masculino. Na outra realidade tem-se um contexto de indivíduos que não se reconhecem como agentes históricos que fazem parte da construção histórica e temporal da realidade social. O indivíduo negro ou afro-descendente não se reconhece como cidadão e ser histórico. Discutindo a primeira realidade, pode-se estendê-la para um contexto ainda maior de contato com o mundo da exclusão e do preconceito. Segundo Garcia (2011) é preciso lembrar que em muitos casos a pessoa, enquanto criança, introjetando valores que irão orientar as atitudes e comportamentos preconceituosos e discriminatórios já no seio da família, antes mesmo de ir para a escola, então como se afirma acima, o problema não é apenas da escola, mas ela participa de uma parcela. Diante de tais afirmações ressalta-se o quanto é desafiadora a transposição da lei para o cotidiano das escolas, isso porque uma coisa é o que a lei dita, outra é o dia-a-dia e a aplicação efetiva da lei. Com isso, vê-se que foi necessária e importante a criação de uma Lei para fazer valer a presença da temática, da valorização e aceitação da história da cultura afro-brasileira e, consequentemente, do grupo étnico que está envolvido nesse contexto. Mais isso não impede a discriminação e o preconceito social, cultural e educacional do afro-brasileiro. Histórias sobre as contribuições das sociedades e culturas africanas na formação social brasileira estão intimamente relacionadas ao controle social e à dominação ideológica e também de construir uma sociedade sem conteúdo racial (branqueamento). Quando pensamos: O que é ser brasileiro? Imediatamente associamos as muitas práticas comuns entre nós feijoada, futebol, samba, carnaval, malandragem e jeitinho brasileiro etc. Quando procuramos entender as peculiaridades do ser brasileiro questionamos a constituição do povo brasileiro baseado na mistura racial (OLIVEIRA, 2004, S/p).