1) Buffon, História Geral dos Animais, cap. III: Da nutrição e do desenvolvimento

Documentos relacionados
- A estética de Plotino é influenciada pela estética de Platão. Assim, Plotino acredita também em uma hierarquia do belo com 3 planos sucessivos:

A LUZ DE MAIOR BRILHO É O AMOR!

DESENHO TÉCNICO ( AULA 01)

Desenhando perspectiva isométrica

Capítulo 13 Em busca da beleza. (p.99) 1ª série Ensino Médio Filosofia Prof.º Tiago Fontanella.

Desenhando perspectiva isométrica

Título: CONSIDERAI A JESUS CRISTO Autor: W. POTTER. Literaturas em formato digital:

Resumo sobre a concepção de ensino em Agostinho de Hipona (do livro De Magistro )*

ESTÉTICA e ARTE 10/02/2017 1

INTRODUÇÃO AO O QUE É A FILOSOFIA? PENSAMENTO FILOSÓFICO: Professor Cesar Alberto Ranquetat Júnior

EGC - Engenharia e gestão do conhecimento Disciplina: Complexidade, conhecimento e sociedades em rede Professor: Aires Rover Aluna: Desirée Sant Anna

Universidade Cidade de São Paulo UNICID. Curso Superior de Tecnologia em Produção Publicitária. Core Curriculum: Arte e suas Linguagens

Dicas para fazer esboços da natureza. adriaans.com/on- painting/

Corpo: a fronteira com o mundo VOLUME 1 - CAPÍTULO 2

Filosofia da Arte Aula 01. Introdução à compreensão da arte e sua história. Prof. Arlindo F. Gonçalves Jr.

Lentes e Telescópios

ESTUDO DO ADVÉRBIO. Profª. Fernanda Machado

Aula 10 1 Colegial - Filosofia

Maria Luiza Costa

B Características sensoriais e mentais que constituem o raciocínio nos processos de expressão gráfica.

CONHECE DEUS NA SUA ESSÊNCIA O AMOR

FORMAÇÃO CONTINUADA EM LÍNGUA PORTUGUESA

Introdução à Estética

SÉCULO XIX NO BRASIL: A MODERNIZAÇÃO DA ARTE

Como decorar com branco

QUESTÕES OBJETIVAS. Nesta bela e curiosa estrofe, os astros aparecem em versos sucessivos. Essa passagem revela que:

A Perspectiva Quadridimensional (1997) Prof. Dr. Denis Mandarino. São Paulo. Por

O ARRÍTMICO DELÍRIO DO SILÊNCIO ou A ACIDÊNCIA DO AGORA

00:09:05,081 --> 00:09:10,571 O Brasil é uma parte do nosso coração.

DEUS A Análise de Kardec.

Fernando Leite de Castro AS CORES ATRAVÉS DOS INSECTOS

QUANDO A VIDA NOS ENSINA A AMAR!

És Real Pra Mim. Tom: C#

BRILHO DO PASSADO, QUE RELUZ NO PRESENTE!

Arte Greco-Romana e Expressionismo : a destruição dos modelos e dos valores ocidentais. Profa. Consuelo Holanda

Agartha: Amor e Sexo. Agartha. Fausto Ramos

A CENTRALIDADE DAS ESCRITURAS. Salmo 19 Luiz Sayão

ESBOÇOS DO ESTUDO-CRISTALIZAÇÃO

Fís. Leonardo Gomes (Guilherme Brigagão)

Em Todos os Sentidos 1 Robert Seiji Peres Ijiro 2 Simone Denise Gardinali Navacinski 3 Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, SP

Presidência da República Casa Civil Secretaria de Administração Diretoria de Gestão de Pessoas Coordenação Geral de Documentação e Informação

Unhas Decoradas Passo A Passo

Descartes filósofo e matemático francês Representante do racionalismo moderno. Profs: Ana Vigário e Ângela Leite

Eu te gosto, você me gosta

O corte, o contínuo e o simultâneo Carlos Vogt... 9

VIDA DOS ANIMAIS NA DIMENSÃO ESPIRITUAL

Linguagem fotográfica

Cap. 2 - O BEM E A FELICIDADE. Ramiro Marques

7 GERAL DA RELAÇÃO Duas cartas que representam a essência da relação, a energia envolvida no relacionamento de ambas as partes.

Arte na antiguidade: Egito e Grécia. Prof. Arlindo F. Gonçalves Jr.

LISTA DE RECUPERAÇÃO FINAL DE ARTE 1ª SÉRIE. Questão 01: Escreva o período ao qual pertence cada uma das afirmações abaixo.

UFRGS 2009/1 Disciplina: Oficina de criação Tridimensional Prof. Carusto - Carlos Augusto Nunes Camargo Aluna: Jéssica Camejo Pereira.

Escola: Nome: Turma: N.º: Data: / / FICHA DE TRABALHO 1. concebido ciclo de vida semelhantes. adulto descendentes desenvolvimento

Era para ser um dia como outro qualquer, não fosse o furacão, com sua força avassaladora...

Desenho Técnico. Corte. Prof. João Paulo Barbosa

Ciências Naturais, 5º Ano. Ciências Naturais, 5º Ano FICHA DE TRABALHO 1. Escola: Nome: Turma: N.º: Conteúdo: Ciclo de Vida. Escola: Nome: Turma: N.

Elementos Básicos da Linguagem Visual

CENÁRIO FILOSÓFICO DA GRÉCIA CLÁSSICA I

PET FILOSOFIA UFPR. Fichamento parcial do capítulo VIII, A divinização do Espaço, da obra de Alexandre Koyré Do Mundo Fechado ao Universo Infinito.

L I VRO DOS ESPÍ RI TOS. Conhecer o início. N ova Ger ação 133

Prof.: Natalia Naoumova. Tarefas: treinar hachuras e desenhar formas simples, copiar técnicas de croquis

MORDOMIA DAS BENÇÃOS. MORDOMIA DOS BENS Fábio Noronha

Eu acredito que você está aqui, nessa vida, por uma razão

Na Terra, a sinfonia e a melodia não são mais que ecos débeis e deformados dos concertos celestes. Nossos instrumentos, mesmo os mais perfeitos,

CAESP - Artes Aula 12-27/07/2017 RENASCIMENTO: PRIMADO DA ARTE COMO SABER, FAZER E CONHECER

Medidas Gerais do Corpo Humano Arranjadas em Diálogo e Método Fácil para uso da Real Aula de Desenho, e Pintura da Ilha da Madeira, em 1810


O Lar de New Zeca 1. Centro Universitário Leonardo da Vinci, UNIASSELVI Indaial, SC RESUMO

IDEALISMO ESPECULATIVO E A FENOMENOLOGIA DO ESPÍRITO CURSO DE EXTENSÃO 22/10/ Prof. Ricardo Pereira Tassinari

NÚMERO DE OURO E SECÇÃO ÁUREA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE FÍSICA DO INSTITUTO DE FÍSICA DA UFRGS

RAPPORT INSTANTÂNEO COM LEITURA FRIA

Texto da questão. Escolha uma: a. Classe social. b. Universo social. c. Atividade humana. d. Comunicação. e. Natureza humana.

VISUALIZAÇÃO. Representação (bidimensional) de Objetos (tridimensionais)

Desenho e Projeto de tubulação Industrial. Módulo I. Aula 07

Título: O CÂNTICO DOS CÂNTICOS DO NOIVO Autor: C. E. LUNDEN. Literaturas em formato digital:

Praticar os princípios da ordenação, cópia de formatos, hifenização, trabalho com múltiplos documentos, modos de visualização e impressão.

Pró-letramento Matemática Estado de Minas Gerais

42ª Assembleia. Diocesana de Pastoral

Unidade II. Unidade II. Técnica do Nado Crawl

Desenhar a figura humana

1 Dobre o tecido de algodão cru ao meio, risque e recorte com margem todas as peças do corpo da boneca. Posicione o molde das pernas na dobra.

BOM ESTARMOS AQUI ADORAMOS

ADVÉRBIO E LOCUÇÃO ADVERBIAL. Profª. Fernanda Machado

A FONTE

O mar na gota de água

Plano de Ensino. EMENTA (parte permanente) PROGRAMA (parte variável)

O GRANDE RACIONALISMO: RENÉ DESCARTES ( )

Construção de uma Lente Divergente de Água

ATIVIDADES DE LÍNGUA PORTUGUESA 4ª S SÉRIES A-B-C-D-E

Filosofia da Arte. Unidade II O Universo das artes

NOSSA AGENDA

Sobre este trecho do livro VII de A República, de Platão, é correto afirmar.

Cassirer. An Essay on Man. An Introduction to a Philosophy of Human Culture. New Haven/London: Yale University Press.1944:32

S. Tomás de Aquino SE A VIDA CONTEMPLATIVA CONSISTE SOMENTE EM UM ATO DO ENTENDIMENTO

Salmo. Celebração do Matrimónio - Ritual Romano Salmo. Salmo 32 (33), 12 e (R. 5b)

UMA AVENTURA NO MUNDO DE

com omissão de corte.

Transcrição:

Textos 1) Buffon, História Geral dos Animais, cap. III: Da nutrição e do desenvolvimento Eis aqui uma segunda questão: qual pode ser a potência ativa que faz essa matéria orgânica penetrar no molde interior e se juntar, ou melhor, se incorporar intimamente com ele! Parece, pelo que dissemos no capítulo precedente, que existe na natureza forças, como a da gravidade, que são relativas ao interior da matéria, e que não têm relação alguma com as qualidades exteriores dos corpos, mas se agitam em suas partes mais íntimas e os penetram de todos os lados; essas forças, como provamos, não poderão jamais se mostrar a nossos sentidos, porque, como sua ação se faz no interior dos corpos, e como nossos sentidos só podem representar aquilo que se faz no exterior, elas não são do gênero de coisas de que possamos nos aperceber; para isso seria preciso que nossos olhos, em vez de nos representar as superfícies, fossem organizados de modo a nos representar as massas dos corpos, e que nossa vista pudesse penetrar na estrutura deles e na composição íntima da matéria; é, portanto, evidente que jamais teremos ideia nítida dessas forças penetrantes, nem da matéria em que agem; mas, ao mesmo tempo, não é menos certo que elas existem, que é por meio delas que se produz a maior parte dos efeitos da natureza, e que devemos em particular lhes atribuir o efeito da nutrição e do desenvolvimento, pois que estamos seguros de que ele não pode se realizar senão penetrando intimamente na matéria; pois, assim como a força de gravidade penetra o interior de toda matéria, assim também a força que impele ou atrai as partes orgânicas da nutrição penetra no interior dos corpos organizados, e os faz entrar ali por sua ação; e como esses corpos têm uma certa forma que chamamos de molde interior, as partes orgânicas impelidas pela ação da força penetrante não pode nela entrar senão numa certa ordem relativa a essa forma, o que, por conseguinte, não pode modificá-la, mas somente aumentar todas as dimensões, tanto exteriores quanto interiores, e seu desenvolvimento; e se nesse corpo organizado que se desenvolve por esse meio ocorre uma ou mais partes semelhantes ao todo, essa parte ou essas partes, de que a forma interior e exterior é semelhante à do corpo inteiro, serão as que realizarão a reprodução. Eis-nos diante da terceira questão: não é por uma potência semelhante que o próprio molde interior se reproduz! Não somente é uma potência semelhante, mas parece que é a mesma potência que causa o desenvolvimento e a reprodução; pois basta que no corpo organizado em desenvolvimento haja alguma parte semelhante ao todo para que essa parte possa um dia se tornar ela mesma um corpo organizado semelhante àquele de que faz atualmente parte; no ponto em que consideramos o desenvolvimento do corpo inteiro, essa parte, de que a forma interior e exterior é semelhante à do corpo inteiro, não apresentará a nossos olhos uma figura sensível que possamos comparar atualmente com o corpo inteiro, mas se a separamos desse corpo e se ela encontrar alimento, ela começará a se desenvolver como corpo inteiro, e nos oferecerá logo uma forma semelhante, tanto no exterior como no interior, e se tornará, por esse segundo

desenvolvimento, um ser da mesma espécie que o corpo do qual ela terá sido separada; assim, nos salgueiros e nos pólipos, como há mais partes orgânicas semelhantes ao todo do que às outras partes, cada pedaço de salgueiro ou de pólipo que se retira do corpo inteiro, se torna um salgueiro ou um pólipo mediante esse segundo desenvolvimento. (HN, II, pp. 46-47) 2. Kant, Observações sobre o sentimento do belo e do sublime, trad. de Vinícius de Figueiredo, Campinas: Papirus, 2000, pp. 58-59. 3. Escala dos animais Talvez, a partir desses conceitos, sejamos capazes de compreender algo acerca dos efeitos tão diferentes que o aspecto de uma mesma mulher produz sobre o gosto dos homens. Uma vez que está fora da circunscrição do gosto refinado, não me ocupo aqui daquilo que, nessa impressão, se refere muito de perto ao impulso sexual, e que concorda com a particular ilusão voluptuosa de que se reveste o sentimento de cada um. Talvez o senhor Buffon esteja certo ao supor que aquela figura que deixa a primeira impressão quando esse impulso é ainda recente e começa a se desenvolver, permanece o arquétipo, ao qual devem conformar-se no futuro todas as imagens femininas [...] No que diz respeito a um gosto algo mais refinado, afirmo que aquela espécie de beleza que denominamos bela figura é apreciada de maneira assaz uniforme por todos os homens, e que sobre ela as opiniões não são tão diferentes como em geral se sustenta. As moças circassianas e georgianas sempre foram tidas, por todos os europeus que percorreram os seus países, como as mais bonitas. Os turcos, os árabes e os persas devem estar bem de acordo com esse gosto, pois se mostram ansiosos em embelezar seus próprios povos por meio de sangue tão refinado; observa-se, também, que isso já foi atingido pela raça persa. Os animais que mais se assemelham ao homem por sua figura e por sua organização serão portanto, a despeito dos apologistas dos insetos, mantidos nas posição em que estavam, de serem superiores a todos os outros pelas qualidades interiores; e, ainda que sejam infinitamente diferentes das dos homens, que sejam apenas, como provamos, resultados do exercício e da experiência do sentimento, esses animais são, por essas mesmas faculdades, muito superiores aos insetos; e como tudo se faz e que tudo existe por nuances na Natureza, podemos estabelecer uma escala para julgar os graus das qualidades intrínsecas de cada animal, tomando por primeiro termo a parte material do homem e colocando sucessivamente os animais a diferentes distâncias, conforme efetivamente se aproximem ou se distanciem mais ou menos dele, tanto pela forma exterior como pela organização interna; de modo que o macaco, o cão, o elefante e os outros quadrúpedes estarão na primeira posição [rang]; os cetáceos, que, como

os quadrúpedes e os homens, têm carne e sangue, que são vivíparos como eles, estarão na segunda posição; os pássaros, na terceira, porque, no fim das contas, eles diferem dos homens mais que os cetáceos e que os quadrúpedes; e, se não houvesse seres que, como as ostras e os pólipos, parecem dele diferir tanto quanto possível, os insetos seriam, com razão, os animais da última posição. ( Discurso sobre a natureza dos animais. História natural dos animais, IV, 1753. Oeuvres, p. 489) 4. A beleza clássica e a superioridade do homem: Mas como o homem não é um simples animal, como sua natureza é superior à dos animais, devemos nos dedicar a demonstrar a causa dessa superioridade, e estabelecer, por meio de provas claras e sólidas, o grau preciso dessa inferioridade da natureza dos animais, a fim de distinguir o que pertence apenas ao homem daquilo que lhe pertence em comum com o animal. ( Discurso sobre a natureza dos animais. História natural dos animais, IV, 1753. Oeuvres, p. 432) 4.1. Superioridade do homem, proximidade com o divino Tudo anuncia, nesses dois senhores da natureza [homem e mulher], tudo marca no homem, mesmo pelo exterior, a sua superioridade sobre todos os seres vivos; ele se mantém ereto e elevado, sua atitude é de comando, sua cabeça olha o céu e apresenta uma face augusta sobre a qual está impresso o caráter de sua dignidade; nela, a imagem da alma está pintada pela fisionomia, a excelência da sua natureza atravessa seus órgãos materiais e anima com um fogo divino os traços de seu rosto; seu porte majestoso, seu andar firme e audaz anunciam sua nobreza e sua posição [rang]; ele toca a terra apenas com suas extremidades mais distantes, ele não a vê senão de longe, e parece desdenhá-la; os braços não lhe são dados para servir de pilares de apoio para a massa de seu corpo, sua mão não deve calcar a terra e perder, por fricções reiteradas, a fineza do tato, da qual ela é o órgão principal; o braço e a mão são feitos para servir a usos mais nobres, para executar as ordens da vontade, para apanhar as coisas distantes, para afastar

os obstáculos, para prevenir os encontros e choque do que é prejudicial, para abraçar e reter o que pode dar prazer e colocá-lo ao alcance dos outros sentidos. Quando a alma está tranquila, todas as partes do rosto estão num estado de repouso, a proporção, a união, o conjunto delas ainda marcam bastante a doce harmonia dos pensamentos e respondem à calma do interior; mas quando a alma está agitada, a face humana se torna uma pintura viva, onde as paixões são representadas com tanta delicadeza quanto energia, onde cada movimento da alma é expresso por um traço, cada ação por um caractere, cuja impressão viva e rápida se adianta à vontade, nos revela e traz para fora, pelos sinais patéticos, as imagens de nossas agitações secretas. (História natural do homem, Da Idade Madura, Descrição do Homem. II, 1749. Oeuvres, p. 237) 4.2. A bela natureza Nada se observou de perfeitamente exato no detalhe das proporções do corpo humano; não somente as mesmas partes do corpo não têm as mesmas dimensões proporcionais em duas pessoas diferentes, mas frequentemente, na mesma pessoa, uma parte não é exatamente semelhante à parte correspondente; por exemplo, frequentemente o braço ou a perna do lado direito não tem exatamente as mesmas dimensões que o braço ou a perna do lado esquerdo, etc. Foram necessárias, portanto, observações repetidas durante muito tempo para encontrar a mediania [milieu] entre essas diferenças, a fim de estabelecer, ao certo, as dimensões das partes do corpo humano, e dar uma ideia dessas proporções que constituem aquilo que se chama de bela natureza: não foi pela comparação do corpo de um homem com o de outro homem, ou pelas medidas tomadas atualmente de um grande número de sujeitos, que se pôde adquirir esse conhecimento, foi pelos esforços que se fizeram para imitar e copiar exatamente a Natureza, é à arte do desenho [dessein] que se sabe tudo o que se saber nesse gênero, o sentimento e o gosto fizeram aquilo que a arte mecânica não podia fazer; deixou-se de lado a régua e o compasso para se ater ao golpe de vista, realizaram-se no mármore todas as formas, todos os contornos de todas as partes do corpo humano, e se conheceu melhor a Natureza pela representação do que pela própria Natureza; desde que houve estátuas, julgou-se melhor a perfeição delas ao vê-las do que ao medi-las. Foi graças a um grande exercício

da arte do desenho e a um gosto delicado que os grandes escultores chegaram a fazer sentir aos outros homens as justas proporções das obras da Natureza; os antigos fizeram estátuas tão belas, que, de comum acordo, foram vistas como a representação exata do corpo humano mais perfeito. Essas estátuas, que não passavam de cópias do homem, se tornaram originais, porque não feitas a partir de um só indivíduo, mas da espécie humana inteira bem observada, e tão bem vista, que não se pôde encontrar nenhum homem cujo corpo fosse tão bem proporcionado quanto essas estátuas; foi, portanto, desses modelos que se tiraram as medidas do corpo humano, e nós os referiremos aqui tais como dadas pelos desenhistas. (História natural do homem. II, 1749. Oeuvres, p. 255)