TRATAMENTO DAS FUNDAÇÕES DA PONTE RODO-PEDONAL DE MACHICO GROUND IMPROVEMENT OF THE MACHICO VEHICLE AND PEDESTRIAN BRIDGE

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TRATAMENTO DAS FUNDAÇÕES DA PONTE RODO-PEDONAL DE MACHICO GROUND IMPROVEMENT OF THE MACHICO VEHICLE AND PEDESTRIAN BRIDGE Pinto, Alexandre, JetS Geotecnia, Lda., Lisboa, Portugal, apinto@jsj.pt Cruz, Sérgio, JSJ Estruturas, Lda., Lisboa, Portugal, sergio@jsj.pt Santos, Jorge, Tecnasol FGE-Fundações e Geotecnia, S.A., Portugal, jmsantos@tecnasol-fge.pt Carrilho, Nuno, Tecnasol FGE-Fundações Geotecnia,S.A.,Portugal, ncarrilhol@tecnasol-fge.pt RESUMO No presente artigo são descritos os principais critérios de concepção e de execução adoptados na solução de fundação e de tratamento dos terrenos de fundação da ponte rodo-pedonal de Machico, inserida no plano de requalificação da baia de Machico, assegurando a ligação, na foz, das duas margens da ribeira com o mesmo nome. Dados os condicionamentos verificados, designadamente a ocupação urbana, o seu desenvolvimento na foz da ribeira, a escassos metros do mar, e o cenário geológico-geotécnico desfavorável, caracterizado pela presença de depósitos coluvio-aluvionares de cascalheiras com uma espessura máxima de quase 40m, verificou-se a necessidade de recorrer ao tratamento dos solos de fundação dos encontros e dos dois pilares centrais da ponte. Para tal foi adoptada uma solução de colunas de jet-grouting com 1000mm de diâmetro mínimo, armadas com tubos metálicos. Com o objectivo de validar os principais critério de concepção e execução foi ainda realizado um ensaio de carga à escala real, cujos principais resultados são igualmente destacados no presente artigo. ABSTRACT The aim of this paper is to present the main design and execution criteria adopted for the foundations and ground improvement of the Machico vehicle and pedestrian bridge, taking part of the Machico Bay qualification programme, allowing the connection between the two banks at the mouth of the Machico stream. Due to the existent restraints, mainly the urban area, the location affected by the seaside nearness, as well as the geological and geotechnical scenario, characterized by a layer of aluvionar and coluvionar gravel materials with a maximum thickness of almost 40m, it was considered as necessary the treatment of both the abutments and the two central piers foundations. For that purpose a solution of jet grouting columns, with 1000mm of diameter, reinforced with steel tubes, was adopted. In order to confirm the main design and execution criteria a full scale load test was performed, of which the main results are also pointed out in this paper. 1. INTRODUÇÃO A ponte rodo-pedonal de Machico, com estrutura em betão armada atirantada, localiza-se na foz da ribeira de Machico, sendo constituída por quatro vãos, apoiados em dois pilares torre, um de cada lado da ribeira, e nos encontros (figura 1). Atendendo aos condicionamentos existentes, em particular as características geológicas dos terrenos de fundação e o valor e o tipo de cargas que a ponte transmite às fundações, foi adoptada uma solução de fundação indirecta e de tratamento dos terrenos de fundação constituída por colunas de jet grouting, armadas com tubos metálicos de coroa circular. Esta solução foi previamente testada através da realização de um ensaio de carga à escala real. O controlo de execução das colunas definitivas foi garantido através do registo permanente dos principais parâmetros adoptados (figura 5).

Figura 1 Perspectiva e vista da ponte após a sua construção 2. PRINCIPAIS CONDICIONAMENTOS 2.1 Condicionamentos de natureza geológica e geotécnica De acordo com os resultados da campanha de prospecção geológica e geotécnica efectuada, a qual consistiu na realização de 3 furos de sondagem à rotação, foi, estabelecido dentro do possível e atendendo à heterogeneidade dos terrenos, o seguinte zonamento geotécnico, o qual se veio genericamente a confirmar no decorrer dos trabalhos de furacão (figura 2): - Zona ZG2: corresponde ao depósito coluvio - aluvionar superficial, de constituição muito heterogénea, com calhaus e blocos de basalto de dimensões variadas, com diâmetro máximo estimado em 80cm. Esta zona foi identificada em todas as sondagens até profundidades máximas de cerca de 38,6m (sondagem S2); - Zona ZG1B: identifica os tufos desagregados, caracterizados pela sua natureza argilo - arenosa e areno - argilosa, com valores de N SPT variáveis entre as 40 e as 60 pancadas. Esta zona foi definida em todas as sondagens, até uma profundidade máxima de cerca de 49,6m (sondagem S2) e com uma espessura máxima de cerca de 12,4m (sondagem S3), encontrando-se sempre em contacto com a zona ZG2 (sobrejacente) e com a zona ZG1A (subjacente); - Zona ZG1A: refere-se aos tufos, brechoides, compactos a medianamente compactos. Na sondagem S1 foram detectados basaltos muito alterados (W 3/2 ) e fracturados (F 3/4 e F 5/4 ). Esta zona foi definida em todas as sondagens, sempre subjacente à zona ZG1B, a profundidades variáveis entre os 33,00m (sondagem S1) e os 49,60m (sondagem S2). No que se refere ao nível da água, o mesmo foi detectado a profundidades variáveis entre os 0,40 e os 2,00m, correspondente aproximadamente à cota das marés. A proximidade do oceano atlântico e do efeito da rebentação das ondas constituiu igualmente um factor importante na selecção da solução adoptada, assim como a existência de muros adjacentes em alvenaria de pedra, cuja estabilidade e condições de fundação importava necessariamente preservar.

Perfil geológico Solução - Alçado ZG2 Depósitos coluvio - aluvionares ZG1A S1 S2 S3 +0 ZG1B -10-20 -30-40 Figura 2 Perfil geológico e geotécnico e alçado Nascente da solução adoptada 2.2 Condicionamentos relativos ao prazo de execução As soluções a propor deveriam permitir a execução da obra dentro dos prazos inicialmente previstos, se possível, abreviando-os. Assim e comparando com experiência existente na realização de soluções de jet grouting neste tipo de cenário [1 e 2], as soluções convencionais, recorrendo a estacas de betão armado moldadas no terreno, seriam, à partida, menos previsíveis. 3. SOLUÇÃO ADOPTADA Tendo por base os principais condicionamentos conhecidos, foi adoptada uma solução de fundação e de tratamento do terreno constituída por colunas de jet grouting, armadas com tubos metálicos de coroa circular. Esta solução apresentava a dupla função de elemento de tratamento do terreno e de fundação da ponte, consistindo na execução de colunas de jet-grouting com diâmetro exterior mínimo de 1000mm. Na realização das colunas foi adoptada uma dosagem de cimento, tipo Portland CEM I 42,5R, de cerca 600kg/m 3 e uma pressão de injecção de 400bar (40MPa). Durante a execução foi efectuado o registo contínuo de todos os parâmetros. Atendendo à heterogeneidade do terreno e de forma a garantir a eficácia da ligação à estrutura e a transmissão da carga ao longo de todo o comprimento das colunas, as mesmas foram antecedidas de pré-furos e armadas interiormente, em todo o comprimento, com tubo metálico do tipo TM-80 127x9mm (figuras 2, 3, 4 e 5). ZG1A E1 P1 P2 ZG1B E2-10 -20-30 -40 Tirantes Tirantes Figura 3 Fundação do encontro E2: planta e alçado lateral Nascente

As colunas foram dimensionadas para acomodar uma carga axial de serviço com um valor máximo de cerca de 1000kN (tensão de serviço de 1,3MPa) e para a transmitir ao terreno por atrito lateral e por ponta. De acordo com a modelação adoptada, admitiu-se que as colunas de jet-grouting acomodavam predominantemente cargas axiais, incluindo as reacções dos tirantes, pelo que, quando existentes, as excentricidades seriam acomodadas pelos maciços de encabeçamento das colunas. Figura 4 Vista das colunas teste e da execução de colunas junto ao muro existente Atendendo à heterogeneidade e às fracas características resistentes dos terrenos onde as colunas foram executadas, as mesmas deveriam dispor de um comprimento mínimo total que determinasse a mobilização de deformações verticais compatíveis com o bom desempenho da estrutura suportada em termos de estados limites de utilização. Em fase de projecto estimou-se um comprimento mínimo de 20,0m, o qual veio a ser previamente confirmado através da realização de um ensaio de carga à escala real. Figura 5 Controlo de execução das colunas e vista da estrutura na sua fase de conclusão A opção pela solução adoptada, em detrimento de uma solução tradicional de fundações indirectas por estacas, com diâmetro mínimo de 800mm, baseou-se na dificuldade e na menor previsibilidade, traduzida em rendimentos de execução muito baixos, que os equipamentos de estacas normalmente revelam na furação de materiais muito heterogéneos e pedregosos, dispondo de blocos com diâmetro que pode chegar facilmente a cerca de 0,80m.

Como alternativa mais consistente, do ponto de vista construtivo, à solução de colunas de jet grouting poderia ser equacionada uma solução de fundações indirectas por microestacas, embora com a desvantagem, num cenário caracterizado pela ocorrência de depósitos coluvioaluvionares, com quase 40m de espessura, de constituir uma solução bastante mais esbelta, mais flexível e igualmente mais onerosa e que determinava ainda uma maior exposição dos tubos metálicos à agressividade do meio envolvente. A solução adoptada tirava assim partido do tratamento do terreno de fundação com colunas de solo cimento, de forma a permitir o encurtamento do comprimento dos tubos das microestacas, desta forma devidamente confinados e protegidos no interior das colunas. Face ao exposto, e de forma a viabilizar a realização de uma solução de fundação e de tratamento do terreno através de colunas de jet grouting, forma adoptadas previamente ao início dos trabalhos as seguintes medidas: - Confirmação de que a constituição química dos depósitos coluvio-aluvionares superficiais não inibia a presa do cimento. Para tal, foram realizadas análises químicas à constituição da água e dos terrenos superficiais; - Confirmação de que os depósitos coluvio-aluvionares superficiais, constituídos por calhaus e por blocos de basalto, se encontravam envolvidos em matriz e que a eventual velocidade do escoamento, associada à variação das marés e à arrebentação das ondas, não inibia a presa do cimento. Para despistar esta situação foram realizados poços de pequena dimensão até à cota do nível da água, assim como várias colunas teste (figura 4); - Realização de um ensaio de carga à escala real, de forma a comprovar que as características geométricas e resistentes estimadas para as colunas eram compatíveis com o bom desempenho da estrutura suportada. Este ensaio é descrito no capítulo seguinte. 4. ENSAIO DE CARGA 4.1 Introdução O ensaio de carga vertical de compressão e à escala real, foi realizado sobre uma coluna de jetgrouting com características idênticas às da fundação da ponte: diâmetro 1000mm com 20,0m de comprimento total, armada com tubo metálico TM-80 127x9mm. O ensaio teve lugar no dia 14/07/2004, mais de 28 dias após a realização da coluna de ensaio, e teve como principal objectivo a confirmação das características resistentes e geométricas das colunas de jet-grouting como solução de tratamento de fundação e de fundação indirecta da ponte. Pormenor A -10-20 -30-40 Figura 6 Sistema de aplicação da carga

4.2 Características da coluna de ensaio e do terreno envolvente A coluna ensaiada foi executada com parâmetros idênticos aos das colunas definitivas. Durante a execução da coluna de jet-grouting de ensaio, identificaram-se blocos de basalto de grande diâmetro, a profundidades variáveis entre a superfície e os 20,0m, encontrando-se o os mesmos envoltos em matriz argilo-arenosa, correspondente ao depósito coluvio-aluvionar. 4.3 Sistema de aplicação da carga O ensaio efectuado consistiu na aplicação ao maciço de encabeçamento da coluna de ensaio de uma carga axial de compressão com um valor máximo de 3500kN. O valor atingido pelo ensaio correspondeu a cerca de 3,5 vezes o valor de serviço considerado, ou seja 1000kN. A carga foi aplicada com o auxílio de 4 macacos hidráulicos, uniformemente distribuídos na área da superfície de aplicação da mesma, constituída por um maciço de encabeçamento em betão armado. A carga foi transmitida à coluna de ensaio através de uma estrutura de reacção ancorada ao terreno e composta por uma cabeça metálica onde reagiam 8 ancoragens (figura 6). 4.4 Sistema de instrumentação A monitorização da coluna de ensaio foi realizada recorrendo aos seguintes aparelhos (figura 7): - 4 extensómetros de vara e 12 extensómetros incrementais ( Strain Gauges VW Spot Weldable ) para registo da variação das extensões actuantes na secção da coluna, instalados a diferentes profundidades; - 4 deflectómetros de haste eléctricos, para controlo de deslocamentos verticais do maciço de encabeçamento; - 2 deflectómetros digitais, tipo EU2000A, para controlo dos movimentos laterais da cabeça da estrutura de reacção; - 4 células de carga eléctricas de 2500kN, para controlo da carga aplicada à estrutura de reacção através de cada um dos macacos hidráulicos, instalados sobre o maciço de encabeçamento. Os extensómetros, células de carga eléctricas e os deflectómetros de haste eléctricos encontravam-se ligados a uma caixa terminal, sendo a tomada de leituras efectuada através de uma unidade de aquisição de dados automática. Macacos planos e células de carga Deflectómetros Deflectómetros Extensómetros Figura 7 Principais dispositivos de leitura

4.5 Programa do ensaio O ensaio de carga foi dividido em cinco ciclos de carga/descarga. Após um primeiro ciclo com carga máxima de 500kN, a coluna ensaiada foi carregada, em dois ciclos distintos, até ao seu valor de serviço, ou seja 1000kN. No quarto ciclo, a carga aplicada de 2000kN, correspondeu a duas vezes o valor de serviço e no quinto e último ciclo, a carga aplicada de 3500kN traduziu-se em três vezes e meia do referido valor. Pretendeu-se com este último ciclo tentar atingir a rotura entre a coluna e o solo, o que aparentemente não se veio a verificar (figura 8). Durante as fases de carga, considerava-se por concluída cada leitura quando as mesmas revelavam valores iguais ou inferiores a 0,05mm ou quando se atingiam 30 minutos de ensaio no respectivo patamar. 4.6 Principais resultados considerações gerais A análise dos resultados obtidos permitiu obter as seguintes considerações gerais (figuras 8 e 9): - O valor do deslocamento vertical da coluna para a carga de serviço (1060kN 2º e 3º ciclo) não ultrapassou os 1,1mm. Para o valor máximo da carga de ensaio (3500kN 5º ciclo) o deslocamento associado foi de 5,5mm. Foi assim possível constatar que os deslocamentos observados apresentavam pouca expressão, sendo sempre inferiores ao deslocamento elástico estimado, cerca de 12,7mm. Tal poderá ser explicado pela transmissão ao terreno de uma grande percentagem de carga por atrito lateral; - Relativamente ao comportamento elástico da coluna foi possível constatar que após a diminuição da força, em cada patamar de descarga de cada ciclo, a coluna respondia praticamente com comportamento elástico, dado que os deslocamentos observados no final de cada ciclo foram inferiores a 1,0mm. A excepção verificou-se no último ciclo onde os valores obtidos rondaram os 1,2mm; - Em função dos deslocamentos plásticos obtidos para os vários ciclos e para os vários dispositivos de leitura foi estimado um valor mínimo de 3000kN para a força de rotura da coluna sem fluência. 3250 Carga aplicada (kn) 3500 3000 2500 2000 1500 1000 500 8:30 10:00 12:30 15:00 18:30 20:30 1º ciclo 2º ciclo 3º ciclo 4º ciclo 5º ciclo Tempo (horário do ensaio dia 14/07/04) 3000 2750 2500 2250 2000 1750 1500 1250 1000 750 500 250 0 F topo [kn] 1º ciclo 2º e 3º ciclo 4º ciclo 5º ciclo 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 6,0 7,0 Defectómetro D3 d 3 [mm] Figura 8 Diagramas de aplicação de carga e carga deslocamento no coroamento

4.7 Principais resultados transmissão de carga ao terreno Conforme prática corrente neste tipo de ensaio, a interpretação de todos os valores obtidos através dos extensómetros foi efectuada de forma essencialmente comparativa, uma vez que os valores absolutos se encontravam dependentes da rigidez efectiva da coluna, a qual poderia variar ao longo do comprimento da coluna e do próprio ensaio, assim como da assunção para todos os patamares de carga do comportamento elástico da mesma coluna. A análise de transmissão da carga ao terreno permitiu que fossem registadas as seguintes constatações (figura 9): - A coluna demonstrou capacidade para transmissão de cargas ao terreno por atrito lateral, ao longo de todo o seu fuste, nas formações atravessadas e para os vários patamares de carga. Consequentemente, foi possível concluir que a coluna apresentava adequadas condições de integridade; - Os resultados obtidos através dos extensómetros de vara apresentaram, em geral, concordância com os valores obtidos através dos extensómetros tipo "strain gauges"; - No primeiro ciclo constatou-se que a carga sofreu uma degradação para cerca de metade do seu valor a cerca de 8,0m de profundidade; - No 2º e 3º ciclo, para a carga de serviço, pôde constatar-se que a cerca de 8,0m de profundidade a força já se tinha dissipado em mais de 40%, relativamente à carga aplicada no topo da coluna; - No 4º e 5º ciclo a transmissão para o terreno de grande parte da carga aplicada no topo da coluna já se havia efectuado a profundidades variáveis entre os 10,0 e 12,0 metros; - A cerca de 17,0m de profundidade, para os vários ciclos, já havia sido transmitida ao terreno a quase totalidade da carga aplicada no topo da coluna. Como a coluna apresentava cerca de 20,0m de comprimento, muito provavelmente, a carga transmitida por ponta seria assim praticamente desprezável. 0,0 500 1000 1500 2000 2500 3000 F Topo [kn] q s [KPa] 2,5 5,0 7,5 10,0 12,5 15,0 17,5 20,0 Prof. [m] 1º ciclo 2º e 3º ciclo 4º ciclo 5º ciclo 70,0 60,0 50,0 40,0 30,0 20,0 10,0 0,0 1,0 2,0 3,0 4,0 5,0 Profundidade 2,8m 6,8m 8,8m 10,8m 12,8m 14,8m 16,8m d axial Topo [mm] Figura 9 Diagramas de transmissão de carga em profundidade e de tensões tangenciais (qs) 4.8 Principais resultados tensão tangencial coluna solo Tendo por base os resultados obtidos relativos à transmissão da carga ao terreno foi possível estabelecer as considerações, referentes à mobilização da tensão tangencial na interface colunasolo, apresentadas nos pontos seguintes (figura 9): - Para todos os ciclos verificou-se que a tensão tangencial apresentava uma tendência de aumento, função do incremento da carga aplicada. Tal facto traduziu uma resposta

adequada por parte do terreno, não se tendo constatado a plastificação do solo nas várias profundidades instrumentadas; - A tensão tangencial máxima mobilizada foi registada aos 6,8m de profundidade, com valores da ordem dos 72kPa, para uma força aplicada no topo da coluna de 3500kN; - Os valores da tensão mobilizada aos 8,8m de profundidade foram ligeiramente inferiores aos constatados aos 10,8m de profundidade. Tal poderá ser justificável pela existência de formações, a essa profundidade, com pontualmente menores características de resistência e de deformabilidade, assim como a um eventual estrangulamento do diâmetro da coluna; 4.9 Principais resultados fluência A análise do comportamento da coluna em termos de fluência foi efectuada utilizando os resultados obtidos através da média dos quatro deflectómetros instalados no maciço de encabeçamento da coluna. Tendo presente a perda de carga verificada por parte dos macacos/bomba foram efectuadas as correcções aos valores dos deslocamentos de forma a assegurar o seu ajuste à força inicial do patamar de carga constante. Os valores obtidos para o coeficiente de fluência, k s, foram relativamente baixos, incrementando à medida que a força aplicada era superior. (si-s1) [mm] 1.1 1.0 0.9 0.8 0.7 0.6 0.5 0.4 0.3 0.2 0.1 Fluência 1º Ciclo 2º Ciclo 3º Ciclo 4º Ciclo 5º Ciclo 0.0 0.0 0.2 0.4 0.6 0.8 1.0 1.2 1.4 1.6 log[ti/t1] ks [ mm ] 2.5 2.0 1.5 1.0 0.5 Fluência 0.0 0 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 4000 4500 5000 5500 Força [ kn ] Figura 10 Parâmetros de fluência No que respeita à força de rotura por fluência da coluna de jet-grouting constatou-se que a mesma seria de aproximadamente 5420kN. Este valor confirma o adequado comportamento da coluna no que respeita às suas condições de fluência, sendo o mesmo bastante superior ao valor estimado da força de rotura sem fluência, cerca de 3000kN (figura 10). 4.10 Principais constatações A análise dos resultados do ensaio de carga, admitindo-se como extrapoláveis para toda a área da obra em que foi aplicada a solução de fundação indirecta por colunas de jet-grouting, permitiram estabelecer as considerações resumidas nos tópicos seguintes: - Adequação das características resistentes e geométricas das colunas de jet-grouting executadas como elemento de fundação indirecta e de tratamento do terreno para a carga de serviço de 1000kN, como atesta o respectivo comportamento elástico; - Para a carga de serviço de 1000kN, a tensão tangencial mobilizada na interface colunacalda permitiu a transmissão de praticamente toda a carga ao terreno por atrito lateral

através do fuste da coluna, o que, no limite, teria permitido uma eventual optimização do seu comportamento total; - O valor da carga de rotura por fluência obtido foi de 5420kN, tendo o valor de rotura sem fluência sido estimado em 3000kN (tensão de serviço de 3,8MPa). Aplicando um factor de segurança com o valor de 2 seria possível estimar, em condições de serviço, uma força máxima admissível pela coluna de cerca de 1500kN (tensão de serviço de 1,9MPa). 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A solução projectada e executada para as fundações e para o tratamento das fundações da ponte rodo pedonal de Machico (figura 11) revelou-se como especialmente adequada aos condicionamentos existentes, confirmando-se como uma boa alternativa às soluções convencionais, como as estacas de betão armado, em cenários estruturais e geotécnicos como o presente. A solução adoptada além de assegurar as indispensáveis condições de segurança da estrutura, permitiu ainda a realização da obra dentro dos prazos e dos orçamentos previstos. Figura 11 Vistas da ponte após a sua conclusão 6. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao Dono de Obra, DROT, a autorização para a redacção e publicação do presente artigo. A empreitada geral foi realizada pelo consórcio Somague Madeira Etermar. 7. REFERÊNCIAS [1] Pinto, A.; Falcão, J.; Barata, C.; Ferreira, S.; Cebola, D.; Pacheco, J. - Case Histories of Ground Treatment with Vertical Jet Grouting Solutions Grouting and Ground Treatment, February 2003, New Orleans - Louisiana, pp. 401-412, Proceedings of the Third International Conference Volume 1. [2] Pinto, A.; Falcão, J.; Pinto, F.; Barata, C.; Ferreira, S.; Pacheco, J.; Durão, J. Soluções de Tratamento de Terrenos através de Colunas de Jet Grouting XII Congresso Brasileiro de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica, Outubro 2002, São Paulo Brasil, pp. 1825-1834 Vol. 3, Tema Fundações: Perspectivas de Evolução.