O legado e os megaeventos Erich Beting 24/10/2012
O que é legado? Pelo dicionário, a definição mais exata que se pode ter, quando aplicado a um megaevento esportivo, é a seguinte: Legado: o que é transmitido às gerações que se seguem Mas então que raios de história é essa de legado que querem colocar para a gente?
O legado e o esporte Em 1980, o COI vivia uma grande crise: EUA e URSS duelavam na Guerra Fria, com reflexos na indústria do esporte e nos Jogos Olímpicos Em 80, EUA boicotaram os Jogos de Moscou Em 84, foi a URSS quem boicotou Los Angeles Isso afetou a imagem das Olimpíadas; de festa do esporte a farra de manifestação política O COI, então, viu no marketing a virada disso
O tal do legado olímpico Em 1984 as Olimpíadas foram impostas a Los Angeles pelo governo americano Com a população contrária a sua realização, a saída foi forçar os Jogos na cidade, mas com 100% do custo bancado pela iniciativa privada Nos Jogos seguintes, o COI mudou o discurso: o maior beneficiado com o evento é a cidade em que ele se realiza, e não o contrário
O tal do legado olímpico Em 1988, colocou-se em prática pela primeira vez o discurso do legado Os Jogos em Seul representavam a entrada da Coreia do Sul no mercado econômico mundial O legado, a partir daí, passou a ser ferramenta de marketing do organizador de um evento Os Jogos se transformaram num marco zero A partir dele, tudo melhorava para o anfitrião
Mas na prática... Em 1988, Seul abraçou os Jogos para elevar a imagem da economia sul-coreana no mundo Em 1992, Barcelona deu novo significado à palavra, revitalizando a cidade pelos Jogos Em 1996, Atlanta sofreu uma barbaridade com a Olimpíada 100% em verba privada e com imensos problemas em sua realização Em 2000, Sydney assumiu uma conta altíssima
Mas na prática... Em 2004, Atenas gastou o que não tinha para receber as Olimpíadas e até hoje paga a conta Em 2008, Pequim repetiu Seul, e os Jogos mostraram uma China consumista ao mundo E em 2012, Londres imitou Barcelona-1992 para reconstruir uma área da cidade com a desculpa olímpica E o que tirar de tudo isso?
Os dois lados do legado Nem sempre legado é positivo. Afinal, como o próprio dicionário define, legado é transmitir algo para alguém. Logo... O legado é a grande falácia marqueteira de um megaevento para justificar investimentos públicos cada vez mais altos em construções que nem sempre são a prioridade de um local Mas tem como fazer o legado ser legal?
O exemplo alemão A Alemanha, a partir da Copa de 2006, mudou a forma como o torcedor assiste ao futebol Os clubes perceberam a importância de ter um estádio próprio e, sobretudo, rentável O torcedor foi colocado como prioridade no relacionamento com o clube, e o estádio é o símbolo de tudo isso Hoje o futebol alemão se beneficia da Copa
Espanha, Alemanha e Inglaterra Os três países representam o melhor exemplo de uso de um megaevento para transformar a realidade de seus países Nos três, o diferencial foi planejar e executar com maestria o legado desses eventos Ou seja: a história que foi contada para que você ganhasse a concorrência foi sendo tirada do papel e passada para a realidade local
Como será o fim de nossa história?
O legado no Brasil A história que vendemos para levar Rio-2016 é um dos melhores planejamentos já feitos no Brasil, mas até agora ficamos só nos planos No caso da Copa do Mundo, simplesmente não há plano para o país para o evento. Por conta de um ajuste político a Copa veio para cá, mas o que queremos com ela? E como fazer o legado realmente acontecer?
A nova ordem econômica A tendência é a de que megaeventos migrem para países emergentes cada vez mais Isso significa mais uso de dinheiro para a infra estrutura e mais debates sobre o legado Para a longevidade do próprio esquema que as entidades montaram, é preciso que haja um plano de execução perfeito desses eventos Do contrário, voltaremos ao período pré-1984