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Transcrição:

a batalha do livro Lincoln Secco

Lincoln Secco A Batalha dos Livros Formação da Esquerda no Brasil

Comecei minha vida como hei de acabá-la, sem dúvida: no meio de livros. Sartre, As Palavras.

Dedico a Ozória, minha mãe, pasárgada na minha infância.

Sumário Luz para um outro Mundo Wilson do Nascimento Barbosa 13 prefácio Takao Amano 17 Introdução 23 Ciclos Políticos do Livro 25; Depois de 1964 26 Capítulo 1. primeiras impressões (1830-1919) 29 Evolução Política 30; Notícias 33; Espaços de Leitura 35; O Socia lismo Científico 37; Núcleos Socialistas 38; A Questão do Programa 41; Socialismo de Cátedra 42; O Anarquismo 45; Escola 47; Evolução Política 47 Capítulo 2. Sob o komintern 51 Movimento de Leituras 52; Os Leitores 64; Tradutores 66; Escola 67; Como os Comunistas Liam 70; Conversão pela Leitura 73; Espaços de Leitura 75; A Economia do Livro 79; A Revolução de 1930 do Livro 81; O Negro 84; Queima de Livros 85; Anticomunismo 87; O Novo Vocabulário 89; As Mulheres 90; Evolução Política 92; Balanço 98 Capítulo 3. A Hegemonia Comunista 103 Novas Leituras 107; Leitores 108; Economia do Livro 108; As Mulheres 109; Escola 112; Editoras 115; Rosa Luxemburgo 118; Outras Leituras 120; Literatura Proletária 120; Revistas Teóricas 121; Distribuição 123 Capítulo 4. A Hegemonia compartilhada 125 Evolução Política 125; Leitores 128; Nova Oferta 131; Crítica das Armas 132; Leituras Perigosas 134; Espaços de Leitura 137; Queima de Livros 139; Mulheres 140; Leituras da Diversidade Sexual 142; Nova Oferta 143; Rosa Luxemburgo 146; Trotskismo 147; Tempos Novos para o Anarquismo 148; Balanço Comunista 150 11

12 lincoln secco Capítulo 5. Autonomia 153 Revistas Marxistas 155 Economia do Livro 157; Rumo à Autonomia 158; Leitores e Recursos 160; Anticomunismo 162 Conclusão 165 caderno de imagens 167 Apêndice Temas e Dados para a História da Formação Política 191 Fontes 197 Fontes Primárias 199 Bibliografia 203 Índice remissivo 219

Luz Para Um Outro Mundo Wilson do Nascimento Barbosa Como disse famoso escritor ucraniano menos melhormente humorado, não há fome onde sobram ossos. E, certamente, ainda sobram muitos ossos por aí espalhados do que foi o movimento revolucionário brasileiro do recém- -finado século XX. Ainda é possível, catando-se um fêmur aqui e um estribo acolá, recompor-se algo do que foi aquele magnífico movimento de luta, assassinado pela ditadura militar de 1964. Recordo-me dos meus anos no exército, da frase constantemente expressa pelos oficiais superiores reacionários: só existem três instituições no Brasil: a Igreja Católica, o Exército e o Partido Comunista. E o partido não é cristão. É preciso destruí-lo, não deixar cinza sobre cinza. Talvez o único ponto do programa de repressão que se haja cumprido foi este, com extermínio físico de milhares de comunistas. Quanto ao Brasil Grande, a repressão o deixou como tarefa para a CIA e a rede Globo De qualquer modo, um bom arqueólogo forense ou historiador haverá de recolher todos, ou quase todos, fragmentos daquilo que foi o movimento revolucionário brasileiro e remontar-lhe a caveira, porque afinal, como diz a canção infantil, aqui todo mundo bate osso... E temos, senhores e senhoras, diante de nós um jovem historiador que se dispõe participar desta tarefa, espalhada pela imensidade do Brasil. Quem ousou sonhar com um Brasil melhor? Quem camonianamente lançou-se ao mar das ideias para chegar a esta distância, dispor de um cabo da Boa Esperança e alcançar uma promessa de vitória que tudo mudaria? 13

14 lincoln secco O historiador Lincoln Secco se dispôs iniciar a longa travessia. Depois de levar sua mente gramsciana a refletir sobre a formação e as lutas iniciais do Partido dos Trabalhadores, Lincoln voltou-se para um passado menos recente e procurou as primeiras pistas gerais, as marcas no solo e nas folhagens, de que de todo não pode se desfazer o persistente Tiranossauro Rex que atormenta a existência dos brasileiros, que de outro modo poderia ser livre. Sim, a caixa de ossos está espalhada por oito milhões e meio de quilômetros quadrados. Por toda parte os melhores brasileiros lutaram, sofreram, pagaram com a vida, nessa desagradável provação. Seja em Santana de Livramento, no 7 o ou no 5 o RC, seja nas encostas do Araguaia, ou nas ladeiras de Salvador, a gente de esquerda sofreu, reuniu, debateu, difundiu suas ideias e pagou um preço extraordinário; Lincoln busca seguir as pistas, recolher os ossículos, para resgatar a história cultural de uma militância que se foi, na luta por um Brasil melhor. Experiência que hoje se vê temporariamente eliminada. Grassa agora, por toda parte, o jardim do Tiranossauro, com os corruptos frutos que mais lhe apetecem. Mas a Batalha dos Livros não se debruça apenas sobre o desfecho desta história cultural, este momento de chegada da Esquerda na luta contra as trevas. Não. Lincoln acende o archote da razão lá atrás, e intenta uma primeira aproximação da formação da Esquerda no Brasil. Nos quatro capítulos que o livro possui, como diz José Mao Jr., começa com os profissionais da palavra impressa e vem até a luta pela formação política em escala de massas. As delegacias de ordem política e social tinham, na democracia brasileira, a tarefa de, em todos os estados da federação, combater os inimigos do Brasil. Sua prioridade de fato sempre foi e não é estranho! - impedir a educação política da classe trabalhadora e reprimir o negro e o indígena em suas práticas religiosas e culturais. Quanto aos terreiros de santo, a polícia os invadia, prendia, espancava e queimava os símbolos de culto, em associação prática com a Igreja Católica. Dessa maneira, destruiu o enorme patrimônio cultural afro-brasileiro, contribuindo para colocar em seu lugar variações do programa da Xuxa e da igreja pentecostal. Quanto à educação política do trabalhador, queimou centenas de milhares de exemplares de livros, cadernos de aula, apostilas etc., com que os educadores iluministas e marxistas tentaram implantar a razão em nosso meio. Deve-se reconhecer que o êxito foi quase absoluto. Obtivemos como resultado do precioso labor o país que hoje temos, tornado apenas em lugar exótico, que dá lucros para o exterior e contém a Amazônia.

a batalha dos livros 15 Imaginem um professor ou professora na sala de aula que, toda vez que enchesse o quadro-negro (ou verde ) com seus esquemas, tivesse por detrás de si um ou mais funcionários a rapidamente ir tudo dali apagando Esta certamente se parecia com a luta pela educação que a Esquerda tem feito no Brasil. Uma autoridade ruim estabelece funcionários alertas, cuja tarefa é apagar a última letra da razão. E, obviamente, amigo, em seguida extinguir qualquer luz na sala. Temos agora Lincoln na tarefa de ao menos acender a luz. Este livro é um ponto de partida.