FORMATOS DE LINGUAGEM NO WEBJORNALISMO CONVER- GENTE: A Fotorreportagem Revisitada



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Transcrição:

FORMATOS DE LINGUAGEM NO WEBJORNALISMO CONVER- GENTE: A Fotorreportagem Revisitada Raquel Ritter Longhi 1 Resumo: Verifica os formatos fotojornalísticos na web, especialmente as histórias fotográficas da série One in Eight Million", do New York Times.com, atentando para o cenário da convergência tecnológica e midiática do webjornalismo. A hipótese que norteia o artigo é de que tais produtos tomam a forma de representação do slideshow e remodelam o gênero das histórias fotográficas e do documentário, criando um novo gênero, herdeiro da reportagem fotográfica do impresso. Como base teórica, o trabalho discorre sobre a dimensão de apresentação da convergência, essencialmente ligada à narrativa jornalística, e recorre às investigações sobre gêneros fotojornalísticos e narrativas com imagens no webjornalismo. Palavras-chave: formatos fotojornalísticos no webjornalismo; histórias fotográficas; dimensão de apresentação da convergência; narrativas com imagens; gêneros fotojornalísticos. 1. Introdução Diferentes tipos de formatos jornalísticos com imagens têm sido produzidos pelo webjornalismo, num processo de adequação à linguagem hipermidiática do meio, que leva em conta em grande parte a remodelação de linguagens anteriormente estabelecidas pelo impresso, televisão, rádio e cinema. Mais especificamente relacionadas ao gênero fotojornalístico, sites noticiosos apresentam histórias fotográficas onde se destacam o slideshow, os especiais multimídia 2 e as picture stories, ou fotorreportages 3. A partir de uma análise da série One in Eight Milion, do New York Times.com, o artigo busca identificar o surgimento de um novo gênero fotojornalístico, específico do webjornalismo, resultante da fusão dos formatos do slideshow e do documentário, e herdeiro ainda da reportagem fotográfica do impresso. 1 Doutora em Comunicação e Semiótica (PUC/SP), Mestre em Comunicação e Informação (U- FRGS). Professora do Curso de Jornalismo e do Mestrado em Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina/UFSC. 2 Denominação usada pelo site Clarín.com. 3 No Clarín.com.

O cenário do webjornalismo convergente é analisado do ponto de vista da apresentação da notícia (narrativa), apontado por Gordon (2003, apud GRANT, 2009) como um dos aspectos da convergência. 2. Dimensão de apresentação da convergência jornalística Palavra onipresente nos últimos tempos, convergência tem sido usada nos mais diversos cenários. No jornalismo, aponta para aspectos relacionados à indústria da mídia, à tecnologia, à estruturação de redações (e sua consequente integração), à economia, dentre outros. Para as organizações midiáticas, o conceito resume, segundo Wilkinson (2009), as imensas mudanças ocorridas nos últimos dez anos, nas quais os criadores de conteúdo tradicional (jornalismo e meios de massa), se adaptam a uma sociedade ondemand, onde o consumidor tem o controle, segundo Wilkinson (2009, 98). A figura do consumidor é reconceitualizada com a convergência; a partir dele, agora também um criador de conteúdo, as organizações de mídia orientam seus modos de produzir, disponibilizar e veicular a notícia, e esse é um dos impactos da convergência sobre o produto noticioso. Gordon (2003), citado por Grant (2009), aponta cinco dimensões para a convergência: propriedade, táticas, estrutura, captura da informação (information gathering) e apresentação (narrativa). Essa última característica da convergência jornalística vem como resultado da convergência tecnológica, como lembra Kolodzy (2009), que abriu novas formas de apresentar a informação, pois trouxe consigo a multimídia, onde diferentes plataformas de narrativas podem ser combinadas, na Internet, como texto, áudio, fotos, gráficos, vídeo, cinema.... a convergência tecnológica também abriu novas formas de apresentar a informação. A convergência tecnológica levou à apresentação da informação em multimídia. A internet permite que plataformas ou meios narrativos anteriormente separados texto do impresso; o áudio do rádio, figuras e gráficos do design visual; e imagens em movimentos, animação, filme e televisão sejam combinados em novas formas de proporcionar a informação. (KOLODZY, 2009, 34) 4 4 Tradução nossa. No original:... technological convergence has also opened up new ways of presenting that information. Technological convergence has led to multimedia information presentation. The internet allows formerly separate and distinct storytelling media or platforms the text of print; the audio of radio, pictures and graphics of 2

O jornalismo distribuído pela internet é jornalismo de convergência, no dizer dessa autora, porque marca a junção de diferentes elementos de narrativa. A fusão dos gigantes do entretenimento AOL (provedor de conteúdo online) e Time Warner (produtora de conteúdos), no ano 2000, teria sido um marco nesse sentido. Mais recentemente, autores como Henry Jenkins (2008) apontam a indústria do entretenimento como uma parte fundamental do processo de convergência midiática. Se mudanças sociais (fragmentação do público, surgimento e explosão de redes sociais), econômicas (fusões de grandes organizações midiáticas) e tecnológicas (convergência de mídias) marcam um momento da comunicação global, as empresas informativas têm sido desafiadas a desenvolverem formas inovadoras para atrair novos leitores e espectadores e manter os seus atuais públicos. Assim, para Kolodzy, (2009: 32), convergência no jornalismo é também uma forma de pensar a notícia, produzí-la e distribuí-la, e requer mudanças no modo como as organizações de mídia encaminham esses processos. O conteúdo produzido por múltiplas mídias é visto por Grant (2009), como mais uma dimensão a ser considerada da convergência, sendo algo revolucionário, como explica o autor (2009, 7). Para ele, uma vez que uma organização de mídia tem seu website, esse tem o potencial de estender a capacidade de organização da publicação de conteúdo proveniente tanto emissoras de rádio e tv como jornais - textos, tabelas e informação de fundo, e vídeo, galerias de fotos e versões mais longas de histórias que aparecem no impresso. E ainda, ambos podem proporcionar novos tipos de conteúdo, incluindo narrativas interativas, blogs e hiperlinks (GRANT, 2009, 7). Nesse sentido, a colaboração e o consumo de conteúdos é uma das dimensões relevantes para se analisar a convergência, juntamente com a coordenação de conteúdo de mídia, que fornecem um quadro de referência para análise das práticas midiáticas (GRANT, 2009, 4). Identificar tais aspectos operacionais da convergência, segundo esses autores, é fundamental para facilitar comparações e análises dos produtos midiáticos. visual design; and the moving pictures of animation, film, and television to be combined into a new way of providing information. 3

A forte presença de narrativas multimídia no webjornalismo, e, em especial as fotojornalísticas, que analisamos neste artigo, resulta de uma opção das organizações midiáticas por responder a um público que se fragmentou, uma audiência multimídia, segundo Kolodzy (2009). O consumidor mais jovem, segundo a autora, prefere notícias em formatos mais visuais, fato atestado por pesquisa da Pew Foundation realizada em 2004. A pesquisa ainda mostrou que a melhor compreensão da notícia, por parte desse público, se dá junto aos formatos de fotos e vídeos. A ascensão do You Tube e sua explosão, seja como comunidade de usuários, de espectadores, seja como fonte para o jornalismo, e espaço de entretenimento, mostra também o grande poder das narrativas audiovisuais. Para Kolodzy, a fragmentação da audiência, que vem acontecendo bem antes do surgimento da Internet, se fortifica com a rede, levando os meios tradicionais a se adaptarem a essas novas preferências da audiência (KOLODZY, 2009, 41). Para a autora, as audiências de notícias tornaram-se fragmentadas porque seus estilos de vida são fragmentados. Mudanças nos hábitos de leitura, multitarefas, pouco tempo disponível para absorver o excesso de informação, são algumas questões que impactaram na forma como as pessoas selecionam a notícia e no modo como elas devem ser apresentadas, no dizer da autora (KOLODZY, 2009, 39). Elas são apresentadas em diferentes formatos, em distintos momentos do dia, para responder a tais mudanças no estilo de vida da audiência, segundo a autora. Tudo isso tem um impacto no produto noticioso, que já vinha sendo explorado pelas características hipermidiáticas relativas à linguagem do meio digital. Além da audiência, fragmentada, a notícia no jornalismo convergente leva em conta ainda a mudança no perfil do consumidor, que torna-se um co-produtor, ou co-criador; e a convergência midiática na produção de conteúdos, originados por diversas plataformas dentro das empresas midiáticas. 3. Histórias fotográficas, ou apresentações fotojornalísticas convergentes A nomenclatura histórias fotográficas picture stories, atualmente bastante usada no webjornalismo, tem sua origem nas teorias sobre gêneros fotojornalísticos do im- 4

presso. Num estudo sobre o fotojornalismo, Sousa apontava para esses gêneros, nos quais uma série de imagens se integram num conjunto que procura construir um relato compreensivo e desenvolvido de um tema (SOUSA, 2004, 101). Embora o conceito fazer uma reportagem fotográfica tanto sirva para um foto-relato em várias imagens como para uma abordagem usando apenas uma fotografia (SOUSA, 2004), as picture stories correspondem à noção mais completa de fotorreportagem. No caso das narrativa com imagens de que nos ocupamos neste artigo, tratam-se de foto-ensaios temáticos sobre personagens do cotidiano de uma cidade, Nova Iorque. Histórias fotográficas são gêneros fotojornalísticos que englobam os subgêneros das fotorreportagens e dos fotos-ensaios, conforme Sousa (2004). Os gêneros fotojornalísticos, porém, segundo o autor, não são estanques: sua identificação passa, por vezes, pela intenção jornalística e pelo contexto de inserção da (s) foto (s) numa peça. O conteúdo e a forma do texto são, assim, essenciais para explicitar o gênero fotojornalístico (não se pode esquecer que o fotojornalismo integra texto e fotografia) (SOUSA, 2004, 89-90). A fotorreportagem, ou reportagem fotográfica, em muitos casos não se diferencia do foto-ensaio, assim, neste artigo, utilizaremos ambas as expressões. Lou Jacobs, citado por Abreu Sojo (1998, 51), define ambos como um grupo ou série de fotos com um tema principal, o qual é argumentado através das fotografias, e que tem um começo, um meio e um final. O ensaio fotográfico, para ele, seria mais interpretativo, tratando o tema com maior profundidade. Ao combinar o formato do slideshow às histórias com imagens, o webjornalismo está configurando um novo gênero narrativo. O tratamento mais aprofundado, assim como o núcleo temático único, são característicos dessas histórias: no caso da série do NYTimes em questão neste artigo, trata-se de temáticas dirigidas a personagens da cidade, desenvolvidas a partir de uma ideia singular: o assistente de roupas para casamentos da loja de departamentos Saks; a professora de Mambo; o veterano da Guerra do Iraque, o ciclista, são alguns dos personagens retratados na série. 5

O núcleo temático único também é utilizado nas fotorreportajes do Clarín.com, produzidas em formato de slideshow 5. As histórias fotográficas vêm se consolidando com um gênero informativo fotográfico no webjornalismo, como tem mostrado sua grande expansão em sites como o N.Y.Times.com, MSNBC, UOL e Clarin.com, dentre outros 6. O slideshow, que se encontra entre os mais populares produtos do webjornalismo, revigorou o foto-ensaio como uma forma de narrativa jornalística, no dizer de Janet Kolodzy (2006, 207). No webjornalismo, as narrativas com imagens podem ser classificadas dentro da definição de narrativas online multimídia ou apresentações convergentes, para usar as palavras da mesma autora (2009). Como gêneros fotográficos informativos, remodelam o fotoensaio do impresso, trazendo na sua constituição, e combinada com a imagem estática, o som. Tal mescla de linguagens, proporcionada pelo ambiente hipermidiático da web, faz com que as fronteiras anteriormente registradas entre esses modos de representação tornem-se difusas, e aponta para o surgimento de uma nova linguagem, que definimos como intermídia (LONGHI, 2008). Na sua definição tradicional, um gênero se apresenta como uma forma ou modo de configuração textual e constitui um conjunto de procedimentos combinados, de regras produzidas de acordo com estruturas convencionais, previamente estabelecidas, reconhecidas e desenvolvidas reiteradamente durante um tempo. (SOJO, 1998, 18) As narrativas com imagens do webjornalismo congregam características comuns (conjunto de procedimentos combinados) e estruturas convencionais previamente estabelecidas e desenvolvidas durante um certo tempo. Tais conjuntos de procedimentos e modos de apresentação são reconhecidos por autores e público receptor e respondem, ainda a necessidades de comunicação específicas do webjornalismo, como observa A- breu Sojo (1998). 5 Ver, por exemplo, a fotorreportagem La erupción del volcán islandés, sobre o vulcão Eijafjalla http://edant.clarin.com/diario/2010/04/19/conexiones/t-02184211.htm). Acesso em: abril, 2010. 6 Um estudo de Daniella Oswald Ramos (2009) destaca as picture stories do MSNBC e do Uol como representantes de formatos webjornalísticos. Ver referência na Bibliografia. 6

A investigação analítica dos gêneros é que vai trazer à tona as regras e estruturas que os definem, delimitam e diferenciam uns dos outros, segundo Cébrian Herreros, (apud Abreu Sojo, 1998, 19). Para Herreros, a teoria dos gêneros aparecerá precisamente após as análises das produções particulares. Analisar os gêneros é adentrar-se nas mensagens pela via formal para sua melhor compreensão. A indagação dos elementos afins a muitas produções permite uma sistematização das mesmas (...) (CÉBRIAN HERRE- ROS, apud Abreu Sojo, 1998, 19-20). A fusão de formatos, como o som e a fotografia nos slideshows, está a comprovar que, mais do que a presença decisiva da imagem fotográfica nos meios digitais, tais produtos fotojornalísticos abrangem com facilidade não apenas o registro estático, do instantâneo capturado por um milésimo de segundo, mas também o som, numa combinação de materialidades, onde o áudio dá movimento à narrativa de imagens. 4. Fotorreportagem revisitada: narrativas no New York Times.com A série One in Eight Million. New Yorkers in sound and images, produzida pelo New York Times.com apresenta reportagens fotográficas com personagens da vida da cidade de Nova Iorque, usando o formato do slideshow com áudio. Com fotografias em preto e branco, o conteúdo documental do produto é evidenciado, característica que ganha, ainda, com o uso de áudio dos entrevistados, ou sons ambiente. Nessa fusão de linguagens áudio e foto - e de gêneros fotorreportagem e documentário, a série se mostra como um exemplo de um gênero nascente do webjornalismo, herdeiro da grande reportagem fotográfica do impresso, do documentário televisivo e cinematográfico. A- qui, imagens fotográficas contam histórias de personagens, histórias de vida. A abertura da série mostra um índice com as várias histórias, numa interface na qual o usuário escolhe a que deseja ver, o que pode ser feito através das fotos iniciais de cada uma, que aparecem numa sucessão movimentada pelo mouse sobre a tela (Figura 1) ou ainda por uma lista (Figura 2). 7

Figura 1: Interface de abertura da série One in Eight Million, com imagens em progressão acessadas pelo mouse. Fonte: http://www.nytimes.com/packages/html/nyregion/1-in-8-million/index.html (acesso em 10 de março de 2010). Figura 2: Uma das formas de visualização do índice de histórias fotográficas da série One in Eigth Million, do NYTimes.com. Fonte: http://www.nytimes.com/packages/html/nyregion/1-in-8-million/index.html (acesso em 10 de março de 2010). 8

Escolhida uma história, a apresentação dá-se através de slideshow com áudio e pequenos textos introdutórios, como título e linha fina. Na aba about", um pequeno texto situa o leitor em relação à história e ao personagem em questão, com as informações básicas a respeito da respectiva fotorreportagem (Figura 3). Figura 3: Abertura de uma das fotorreportagens da série One in Eight Million. Fonte: http://www.nytimes.com/packages/html/nyregion/1-in-8- million/index.html#michel_kramermetraux (acesso em março de 2010). As imagens selecionadas para contar as histórias da série do NYTimes.com obedecem a padrões verificados por Jorge Pedro Sousa no seu estudo sobre os gêneros fotojornalísticos. Ele aponta cinco tipos de fotografias usadas comumente na fotorreportagem: 1) planos gerais globalizantes, em que participam os principais elementos significativos; 2) planos médios e de conjunto das ações principais; 3) grandes planos e planos de pormenor de detalhes significativos do meio, dos sujeitos e das ações; 4) retratos dos sujeitos, em close-up ou noutros planos, como o plano americano (corte acima dos joelhos) e 5) fotografia de encerramento (SOUSA, 2004, 102-103). Nas narrativas da série que analisamos, verifica-se o uso desses planos, combinados de forma a fortalecer o fio narrativo da história de cada personagem. Alguns exemplos podem ser vistos na análise 9

de um desses produtos, o foto-ensaio Michel Kramer-Metraux: The Wedding Wardrober (Figuras 4 e 5). Figura 4: Imagem em plano médio e de conjunto, mostrando o personagem e as ações principais, na história fotográfica Michel Kramer-Metraux: The Wedding Wardrober, parte da série One in Eight Million, do NYTimes.com. Fonte: http://www.nytimes.com/packages/html/nyregion/1-in-8- million/index.html#michel_kramermetraux (acesso em março de 2010). Figura 5: Imagem em plano aproximado de detalhes significativos do meio, dos sujeitos e das ações, na história fotográfica Michel Kramer-Metraux: The Wedding Wardrober, parte da série One in Eight Million, do NYTimes.com. Fonte: 10

http://www.nytimes.com/packages/html/nyregion/1-in-8- million/index.html#michel_kramermetraux (acesso em março de 2010). 5. Considerações finais Gêneros informativos fotojornalísticos no webjornalismo estão em constante e- volução, e configuram-se como gêneros intermídia, uma vez que caracterizam-se pela convergência de linguagens no ambiente hipermidiático. O webjornalismo remodela o gênero das histórias fotográficas, ou picture stories, como tem sido mais comumente denominado por vários sites informativos, conjugando o slideshow com o documentário. No caso da análise realizada neste artigo, é remodelada a fotorreportagem e o foto-ensaio, através da exploração das potencialidades da linguagem hipermídia, onde o webjornalismo busca sua própria linguagem, assim como fizeram a televisão, o cinema, etc. Como nos demais, o mesmo processo de aparecimento de novas formas expressivas se evidencia. As pictures stories, como gênero fotojornalístico da web, representam unidades discursivas que se localizam dentro dos modos de convergência de apresentação do produto jornalístico, dimensão da convergência ligada à busca pela eficácia do produto informativo noticioso para dar conta de um público cada vez mais fragmentado e multimídia. Partindo de um estudo de caso da série One in Eigtht Million, produzida pelo site NYTimes.com, este trabalho fez uma análise dos produtos fotojornalísticos formados pelas histórias fotográficas como um novo gênero, próprio do jornalismo digital, e ocasionado pela exploração da linguagem hipermídia de convergência de linguagens. 11

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