DETERMINAÇÃO DAS CURVAS DE SECAGEM DO RESÍDUO DO LEITE DE SOJA EM LEITO DE JORRO COM INERTES E DA CURVA FLUIDODINÂMICA PARA O MATERIAL INERTE. V. Fraile 1, C. A. A. Lescano 2, S. C. S. Rocha 3 1: Aluno de IC; 2: Doutorando; 3: Professora Orientadora Laboratório de Fluidodinâmica e Secagem Universidade Estadual de Campinas LFS/FEQ R Albert Einstein, 500 Caixa Postal 6066 Barão Geraldo Campinas SP CEP: 13083-970 v027040@dac.unicamp.br 1, agules@feq.unicamp.br 2 e rocha@feq.unicamp.br 3 RESUMO - A secagem é uma tecnologia amplamente utilizada pelas indústrias para aprimorar a qualidade e prolongar a vida de prateleira dos produtos. No entanto, ainda hoje persistem muitos problemas a respeito, principalmente dos métodos específicos adequados para a secagem de materiais biológicos, especialmente aqueles utilizados para alimentação humana. No presente trabalho é analisada a secagem do resíduo do leite de soja, utilizando secador de leito de jorro com inertes. Seguindo a nomenclatura das publicações, este resíduo rico em proteínas, fibras e vitaminas, será denominado Okara. Foi determinada a curva fluidodinâmica do leito de jorro com material inerte (polipropileno). Foram também determinadas as curvas de secagem para os diferentes experimentos à velocidade de jorro mínimo e mesma temperatura (60 C), mantendo-se fixa a quantidade do material inerte (1000g) e variando-se a quantidade de material úmido (300g, 400g e 500g) no leito. Foram ainda analisadas as curvas fixando-se a quantidade de material úmido (300g) e variando-se a quantidade de material inerte (1000g, 1250g e 1500g). O modelo matemático de PAGE foi utilizado para ajustar os dados experimentais da cinética de secagem. INTRODUÇÃO O Okara é um material rico em proteína, fibra e vitaminas, entretanto termo-sensível e altamente deteriorável. É caracterizado como uma massa de alta coesão, de composição química complexa e com alto teor de umidade (75%-80%) (LESCANO, 2004). Segundo WACHIRAPHAN-SAKUL (2005), o Okara seco, é composto por 60% de fibras, 29% de proteínas e 11% de gordura. O Okara tem proteína de qualidade superior aos outros derivados da soja. Por exemplo, a razão de eficiência de proteína do Okara é 2.71, sendo para o leite de soja 2.11 (O TOOLE, 1999). O material seco pode ser incorporado a uma grande variedade de alimentos, reduzindo a quantidade total de calorias e aumentando a quantidade de fibras (TARUNA & JINDAL, 2002).
Devido à sua alta atividade de água, possui elevada capacidade de deterioração (O TOOLE, 1999), gerando odores desagradáveis e contaminação na indústria. Na literatura são encontrados trabalhos analisando a secagem de Okara em diversos tipos de secadores, dentre eles: secador de tambor rotativo (LESCANO, 2004); secador de leito de jorro (WACHIRAPHANSAKUL, 2005); secador de leito móvel com as partículas sujeitas a movimento de vortex (TARUNA & JINDAL, 2002). O objetivo deste trabalho consistiu na análise da cinética de secagem de Okara em leito de jorro com material inerte, para diferentes razões de massa de Okara úmido/massa de i- nerte. Secador de leito de jorro A tecnologia do leito de jorro foi desenvolvida inicialmente por GIS- HLER e MATHUR, em 1954, como um método para secagem de trigo. O regime de jorro é estabelecido em um leito de partículas sólidas pela injeção de um fluido (geralmente ar) na sua parte inferior vertical, através de um o- rifício, cujo diâmetro é reduzido em relação ao diâmetro do leito. A secagem em leito de jorro com inertes tem sido indicada para materiais pastosos termo-sensíveis. Sua indicação para a secagem desses materiais é conseqüência do curto tempo de permanência do material no interior do equipamento e também, às menores temperaturas das partículas no interior do leito quando comparadas com a temperatura de entrada do gás. A esse equipamento é atribuído um baixo custo de instalação e de operação (PANTEL et al. 1986) e, maior taxa de secagem por unidade de volume do equipamento, o que reduz os custos de produção. No caso da secagem, a utilização do leito de jorro tem sido difundida devido às suas características de alta taxa de circulação de partículas inertes e da uniformidade na temperatura no leito. A principal desvantagem do leito de jorro é a dificuldade de estabelecimento de regime fluidodinâmico estável em grande escala. Do ponto de vista fluidodinâmico, os principais parâmetros relacionados ao projeto de leitos de jorro são: a velocidade de jorro mínimo, a queda de pressão máxima e a queda de pressão de jorro estável. A partir deles, são determinadas a menor vazão de gás que propicia o fenômeno do jorro, a potência máxima a ser fornecida pelo soprador e a potência consumida durante a operação. Esses parâmetros são obtidos através da curva característica do equipamento. A figura 1 mostra uma curva típica característica de queda de pressão em função da vazão de gás para diferentes alturas de alimentação do leito. Duas diferentes e- tapas são mostradas nesta figura: o desenvolvimento do jorro com o incremento da vazão de gás, indicado pela linha contínua, e o colapso do jorro para vazão decrescente, representado pela curva pontilhada. Figura 1 Curva típica de queda de pressão versus vazão de gás (MATHUR e EPSTEIN, 1974) No período AB o gás apenas percola entre as partículas e o sistema comporta-se como um leito fixo. Aumentando a vazão, há o surgimento
de uma cavidade na base, que se a- longa, havendo formação de um jorro interno. A queda de pressão continua a aumentar até atingir o valor máximo (ponto B). A partir deste ponto, a queda de pressão diminui até se atingir o denominado jorro incipiente (ponto C) em que qualquer incremento na vazão de gás faz o jorro aflorar através da superfície do leito (ponto D) e aumentos sucessivos na vazão de ar não causam mais variações significativas na queda de pressão (MATHUR e EPSTEIN, 1974). Operando o processo inverso (reduções sucessivas da vazão de gás), determina-se a vazão de jorro mínimo, que é a menor vazão em que se tem jorro estável. sucessivas vezes, determinando-se a cada aumento a correspondente diferença de pressão entre a entrada e a saída do leito através de um manômetro diferencial tipo tubo em U. O fluido manométrico foi água destilada. A vazão foi aumentada até que a queda de pressão no leito atingisse valores aproximadamente constantes. Iniciou-se então o processo inverso, reduzindo-se a vazão de ar e determinando-se a queda de pressão no leito. MATERIAIS E MÉTODOS Equipamento experimental A secagem foi realizada no secador de leito de jorro localizado no Laboratório de Fluidodinâmica e Secagem da Faculdade de Engenharia Química UNICAMP, mostrado na figura 2. O leito de jorro foi construído em acrílico, com as dimensões: diâmetro da coluna de 20cm, altura da coluna de 30cm, diâmetro do orifício de entrada de ar de 5cm e base angular de 60º. Outras partes do equipamento envolvem: soprador, válvula de controle de vazão, placa de orifício, manômetro diferencial, aquecedor deresistências, termo-higrômetro, termopares e ciclone. Obtenção da curva fluidodinâmica O polipropileno foi escolhido como inerte com base em resultados de testes fluidodinâmicos preliminares no equipamento. Inicialmente, o leito foi alimentado com determinada carga de material inerte (polipropileno). Em seguida, o soprador foi acionado e a vazão de ar de entrada foi aumentada Figura 2: Leito de jorro Produto inicial: O Okara Para se obter o Okara, foi preparado leite de soja no Laboratório de Medidas Físicas da Faculdade de Engenharia de Alimentos UNICAMP, segundo método proposto por LES- CANO (2004). O primeiro passo consistiu em saturar 1 kg de soja, deixando em á- gua potável durante 8 horas; então a soja foi selecionada e posteriormente cozida a 100ºC durante 5 minutos, mantendo uma relação próxima de 2kg de soja / 1L de água. A mistura, após ser limpa e peneirada, foi triturada em um multiprocessador de alimentos marca WALITA, modelo RI3173/72, mantendo a relação de 1kg de soja úmida / 2L de água. Após a trituração, o material obtido foi cozido por mais 5 minutos, então resfriado e filtrado. Após esta operação, o materi-
al retido no filtro foi prensado, visandose diminuir o teor de umidade a aproximadamente 65% base úmida. Para a prensagem do material foi utilizada uma prensa hidráulica do Laboratório de Tecnologia de Alimentos da Faculdade de Engenharia de Alimentos/UNICAMP. Após a prensagem, o material sólido que apresenta aparência de partículas úmidas, foi embalado em sacos de PVC e refrigerado a uma temperatura inferior a 5ºC para evitar deterioração. O processo de secagem As variáveis analisadas nos experimentos de secagem foram: massa de material inerte e massa de Okara. A temperatura do ar de secagem foi mantida constante (60ºC) em todos os experimentos e a vazão do ar de entrada foi regulada de forma a se ter sempre o equipamento trabalhando na condição de jorro mínimo. A secagem foi realizada em batelada. O Okara foi inserido no leito quando este já se encontrava estável com as partículas inertes, a 60ºC. As amostras foram retiradas da região do jorro a cada 6 minutos através de um amostrador localizado na parte cilíndrica do leito, e foram utilizadas para elaborar as curvas de cinética de secagem. Os valores de umidade foram determinados pelo método gravimétrico estático, em estufa a 105ºC por 24h. Após a secagem, o material retido no leito foi retirado, e por peneiramento, foi feita a separação entre o Okara seco e o material inerte. As quantidades de material inerte (polipropileno) e de Okara utilizadas nos experimentos são mostradas na Tabela 1. Modelo Matemático O modelo utilizado para análise das curvas das cinéticas de secagem foi o modelo de Page, dado na equação (1). X A exp K. t X 0 (1) Tabela 1: Relações M o /M i utilizadas. Experimento Massa de Inertes (g) Massa de Okara (g) M o /M i 1 1000 300 0.30 2 1000 400 0.40 3 1000 500 0.50 4 1250 300 0.24 5 1500 300 0.20 RESULTADOS E DISCUSSÃO Na Figura 3 apresenta-se a curva fluidodinâmica obtida para o polipropileno no leito de jorro para uma massa de 1500g. Verifica-se que o material inerte atinge regime de jorro estável sem exigir uma vazão de ar alta, resultado este que auxilia na secagem do Okara, impedindo perdas excessivas por elutriação. Figura 3: Curva fluidodinâmica do polipropileno. Na Tabela 2 encontram-se os resultados da cinética de secagem para o primeiro experimento (300g de Okara e 1000g de material inerte). Os conteúdos de umidade foram calculados tanto em base úmida como em base seca. Valores para os adimensionais Y (X/X o ) (em base seca) são também mostrados. n
Tabela 2: Cinética de secagem para o experimento 1. Tempo (min) X bu (%) X bs Y (X/X 0 ) (kg/kg) 0 64.449 181.286 1.000 6 47.099 89.033 0.491 12 33.501 50.378 0.278 18 19.667 24.482 0.135 24 6.627 7.098 0.039 30 4.548 4.765 0.026 36 3.820 3.972 0.022 42 3.487 3.613 0.020 48 3.561 3.692 0.020 54 3.402 3.522 0.019 60 3.052 3.148 0.017 A taxa de secagem se mostrou constante nos primeiros três pontos, e decrescente para os pontos seguintes, como se pode ver na Figura 4. Comportamento similar foi observado nos outros experimentos. Na Figura 4 observa-se que, mantendo-se constante a quantidade de material inerte e variando a quantidade de material úmido, o tempo de secagem é menor para uma menor quantidade de material úmido. Figura 4: Curva de cinética de Secagem Entretanto, para uma mesma quantidade de material úmido, ao variar-se a quantidade de material inerte, o tempo de secagem é menor para uma maior quantidade de inertes. Esse comportamento pode ser explicado pela maior área de contato entre o Okara e os inertes, além da maior vazão de ar exigida para promoção do jorro. Entretanto, a diferença entre os tempos é pequena, podendo-se considerá-la sem significância. Na tabela 3 são mostrados os valores preditos pelo modelo de Page para o experimento 1, juntamente com os valores observados. Para as regressões, foi utilizado o método de regressão não linear do programa Statistica ajustado para o modelo de Page. Na Figura 5 são mostradas as curvas obtidas pelo modelo de Page para os experimentos 3 e 5 e os pontos experimentais. Na tabela 4 são mostrados os parâmetros A, K, e n obtidos a partir do modelo de Page. Observa-se que os valores do parâmetro A se encontram muito próximo de 1 em todos os experimentos. Para uma mesma quantidade de material inerte, o valor de K decresce com o aumento da massa de Okara. Tabela 3: Valores observados e preditos pelo modelo de Page. Tempo Valor Valor Amostra (min) Predito Observado 1 0 0.9990 1.0000 2 6 0.5009 0.4911 3 12 0.2563 0.2779 4 18 0.1321 0.1350 5 24 0.0684 0.0392 6 30 0.0355 0.0263 7 36 0.0185 0.0219 8 42 0.0097 0.0199 9 48 0.0051 0.0204 10 54 0.0027 0.0194 11 60 0.0014 0.0174 Desvio Padrão 0.015769
neste trabalho). Portanto, é possível afirmar que o material inerte, nas quantidades uti-lizadas, não tem influência sobre o tempo de secagem do Okara em leito de jorro. Figura 5: Curvas preditas pelo modelo de Page O modelo de Page demonstrou um excelente ajuste para todos os experimentos com R~0,999 para todos os casos analisados. Tabela 4: Parâmetros do modelo de Page CONCLUSÕES O secador de leito de jorro com inertes demonstrou performance adequada para a secagem de Okara na condição de material particulado. As curvas de secagem apresentaram dois períodos: de taxa constante e de taxa decrescente. O maior tempo de secagem foi obtido para o experimento de menor relação massa de inertes / massa de material úmido. Sendo considerável a variação do tempo de acordo com a variação da massa de material úmido. O menor tempo de secagem foi obtido para o experimento de maior relação massa de inertes / massa de material úmido. Entretanto, os tempos de secagem foram muito próximos ao se variar somente a massa de material inerte (na faixa de quantidades utilizadas NOMENCLATURA A : Parâmetro do modelo de Page; DP: Queda de pressão (cm de água); K : Parâmetro do modelo de Page; n : Parâmetro do modelo de Page; M i : Massa de material inerte; M o : Massa de Okara; Q ar : Vazão do ar (kg/min); X : Teor de umidade, kg/kg; X o :Teor de umidade inicial, kg/kg; X bs :Teor de umidade (base seca,kg/kg); X bu :Teor de umidade (base úmida, kg/kg) Y : Adimensional (X/X o ). REFERÊNCIAS Lescano C. A. (2004). Estudo da secagem e caracterização das partículas de Okara produzidas em um secador de tambor rotativo. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Engenharia de Alimentos. UNICAMP. Campinas. SP. Brasil. 128p. 2004. Mathur, K.B. & Epstein, N., Spouted Beds, Academic Press, N.Y., (1974). O'Toole, D. K; (1999), "The characteristics and use of Okara, the soy bean residue from soy milk production - a review", Agricultural and Food Chemistry, 47, 363. Pantel, K. et al, Spouting behavior of solids, Drying 86, New York, Hemisphe- Publ. Co., V.1, P.415-420, 1986. Taruma, I.; Jindal, V. K.; Drying of soy pulp (Okara) in a Bed of Inert Particles. (2002) Drying Technology 20(3&4), 1035-1051 (2002). Wachiraphansakul, S.; Devahastin, S.; Drying Kinetics and quality of Soy Residue (Okara) Dried in a Jet Spouted-Bed Dryer. Drying Technology, 23: 1229-1242 (2005). AGRADECIMENTOS