E rythroplakia and speckled leukoplakia are oral

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Transcrição:

Braz J Otorhinolaryngol. 2009;75(2):295-9. Eritroplasia e leucoeritroplasia oral: análise retrospectiva de 13 casos Elaini Sickert Hosni 1, Fernanda Gonçalves Salum 2, Karen Cherubini 3, Liliane Soares Yurgel 4, Maria Antonia Zancanaro Figueiredo 5 ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE Oral Erythroplakia and Speckled Leukoplakia: retrospective analysis of 13 cases Palavras-chave: câncer oral, eritroplasia, fatores de risco, leucoplasia bucal, mucosa bucal. Keywords: oral cancer, erythroplasia, risk factors, oral leukoplakia, oral mucosa. Resumo / Summary Eritroplasia e leucoeritroplasia são lesões orais cancerizáveis com elevado potencial de transformação maligna. Objetivos: Neste estudo retrospectivo foram analisadas as características clínico-patológicas de 13 casos de eritroplasias e leucoeritroplasias orais de pacientes atendidos em um Serviço especializado em Estomatologia e diagnóstico histopatológico. Material e Método: Foram revisados os registros de biópsia de pacientes atendidos entre os anos de 1978 e 2006. Foram registradas e características clínicas e histopatológicas das lesões, bem como sexo, idade dos pacientes e associação com fatores de risco. Resultados: As lesões exibiram predileção por pacientes do sexo masculino na proporção de 1:3.3. A média etária dos indivíduos foi de 57 anos e o palato mole foi o sítio envolvido em 77% dos casos. Sintomatologia dolorosa foi relatada por 61,5% dos pacientes e associação com tabagismo e etilismo foi observada em 100% e em 46% dos casos, respectivamente. As lesões analisadas exibiam displasia epitelial e mais de 50% foram diagnosticadas como carcinoma in situ ou carcinoma invasivo. Conclusões: Apesar de apresentarem baixa prevalência, as eritroplasias homogêneas e as leucoplasias salpicadas exibem alterações epiteliais que vão de displasia epitelial a carcinoma invasivo, o que justifica sua inclusão entre as lesões bucais com maior potencial de malignização. E rythroplakia and speckled leukoplakia are oral precancerous lesions that have a high potential for malignant transformation. Aim: A retrospective analysis was conducted to investigate the clinicopathologic features of 13 cases of oral erythroplakia and speckled leukoplakia in patients who were seen at a center specialized in stomatology and Histopathological diagnosis of oral diseases. Materials and Methods: All cases diagnosed with erythroplakia and speckled leukoplakia between 1978 and 2006 were retrieved from the service archives. Results: The lesions exhibited a predilection for males with a female-to-male ratio of 1:3.3. Mean age was 57 years old and soft palate was the site affected in 77% of the cases. Pain symptoms were reported by 61.5% of the patients and association with risk factors such as smoking and excessive alcohol intake was seen in 100% and in 46% of the cases, respectively. The lesions showed epithelial dysplasia, where more than 50% were diagnosed as in situ or invasive carcinoma. Conclusions: Despite low prevalence, oral homogeneous erythroplakia and speckled leukoplakia show Histopathological alterations vary from epithelial dysplasia to invasive carcinoma. These lesions must be included among those oral lesions with the highest potential for malignant tranformation. 1 Mestre em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (UFPEL), Doutoranda em Estomatologia Clínica (PUCRS), Professora Assistente da Universidade Federal de Pelotas. 2 3 4 5 Pontifícia Universidade Católica Do Rio Grande Do Sul; Universidade Federal de Pelotas. Endereço para correspondência: Fernanda Gonçalves Salum - Hospital São Lucas PUCRS - Av. Ipiranga 6690 Sala 231 2º andar 90610-000 Porto Alegre RS Brasil. Tel/Fax: 55 (0xx51) 3320-3254 - E-mail: fesalum@terra.com.br Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gestão de Publicações) da RBORL em 13 de dezembro de 2007. cod. 5625 Artigo aceito em 11 de março de 2008. 295

INTRODUÇÃO O termo eritroplasia oral é empregado para descrever lesão bucal macular ou em placa, de coloração vermelha, para a qual não pode ser estabelecido um diagnóstico clínico específico 1,2. Quando há associação de áreas vermelhas e brancas ou pontos granulares esbranquiçados sobrepostos à região vermelha, as lesões são designadas por eritroleucoplasia, leucoeritroplasia ou leucoplasia salpicada 2,3. O termo empregado atualmente pela WHO 4 para descrever as lesões orais que exibem ambos os componentes, leucoplásico e eritroplásico, é leucoplasia salpicada, designação que será utilizada neste estudo. A eritroplasia oral (EO) é uma lesão rara, entretanto, suas taxas de transformação maligna são consideradas as mais elevadas entre todas as lesões cancerizáveis da mucosa bucal 5,6, pois em mais de 90% dos casos já existe displasia, carcinoma in situ ou carcinoma invasivo 7-9. Embora maior potencial de transformação maligna seja atribuído a eritroplasia, as leucoplasias salpicadas não podem ser negligenciadas, uma vez que as áreas vermelhas dessa lesão exibem o mesmo padrão histopatológico das eritroplasias homogêneas 10-13. O presente estudo tem como objetivos analisar retrospectivamente as características clínico-patológicas de 13 casos de eritroplasias e leucoplasias salpicadas orais de pacientes atendidos em um Serviço especializado em Estomatologia e diagnóstico histopatológico de doenças bucais. Figura 1. Eritroplasia homogênea localizada no palato mole. A área ulcerada (seta) corresponde ao sítio em que foi realizada biópsia incisional. MATERIAL E MÉTODO No presente estudo de coorte histórica com corte transversal, foram revisados 17831 prontuários de pacientes com lesões estomatológicas, biopsiados no período de 1978 a 2006. Aqueles com diagnóstico clínico de eritroplasia ou de leucoplasia salpicada foram analisados e os dados referentes à idade e sexo dos pacientes, consumo de tabaco e álcool, sintomatologia dolorosa, localização, dimensões, tempo de evolução e características histopatológicas das lesões foram estudados. Os dados foram analisados por meio de estatística descritiva. RESULTADOS De 17831 casos revisados nos registros de biópsia, treze apresentaram os requisitos para serem incluídos neste estudo. Destes, dois casos correspondiam a eritroplasias homogêneas (Figura 1) e onze a leucoplasias salpicadas (Figura 2). Essas lesões representaram 0,072% das lesões orais dos pacientes atendidos no referido Serviço de Estomatologia. Os dados obtidos são demonstrados na Tabela 1. Houve predileção por indivíduos do sexo masculino na proporção de 1:3.3. A idade dos pacientes acometidos Figura 2. Leucoplasia salpicada localizada no palato mole e duro. Ao exame histopatológico, a área leucoplásica exibia acantose e hiperceratose e a área eritroplásica (seta), carcinoma invasivo. variou de 33 a 71 anos, com média de 57 (DP:13,08) anos. Aproximadamente 77% (10 casos) das eritroplasias e leucoplasias salpicadas envolveram o palato mole e destas, 70% (7 casos) estendiam-se também ao palato duro ou pilar amigdaliano. O diâmetro das mesmas variou de 1,5cm a 4cm, com média de 2,58cm (DP:0,87). Sintomatologia dolorosa, associada ou não à disfagia, foi relatada por 61,5% dos pacientes, enquanto os demais apresentavamse assintomáticos. Dos treze pacientes, 69,2% eram fumantes e todos os demais tinham histórico de tabagismo, isto é, haviam utilizado tabaco por pelo menos cinco anos, mas estavam livres deste hábito no período em que a lesão desenvolveu-se. O consumo excessivo de bebidas alco- 296

Tabela 1. Características clínico-patológicas de 13 casos de eritroplasias homogêneas e leucoplasias salpicadas de pacientes atendidos entre 1978 e 2006. Porto Alegre, 2007. Sexo Idade Diag. Clínico Diag. Histopatol. Localização Sintomas Tabaco Álcool M 55 Eritroplasia homogênea displasia epitelial palato mole e duro Dor sim sim F 71 Eritroplasia homogênea displasia epitelial palato mole disfagia sim não M 33 Leucoplasia salpicada ca espinocelular ventre da língua dor sim sim M 39 Leucoplasia Salpicada ca espinocelular palato mole e pilar assintomático sim sim F 42 Leucoplasia salpicada ca espinocelular assoalho assintomático sim sim M 48 Leucoplasia salpicada displasia epitelial palato mole e pilar disfagia sim não M 54 Leucoplasia salpicada ca espinocelular palato mole disfagia sim sim M 62 Leucoplasia salpicada ca espinocelular palato mole e duro assintomático sim não M 62 Leucoplasia salpicada ca in situ palato mole e pilar disfagia sim não M 66 Leucoplasia Salpicada ca espinocelular palato mole disfagia sim sim M 69 Leucoplasia salpicada ca in situ palato mole e pilar assintomático sim não F 70 Leucoplasia salpicada displasia epitelial assoalho assintomático sim não M 71 Leucoplasia salpicada displasia epitelial palato mole e pilar dor sim sim ólicas foi relatado por 46% dos pacientes. Em 61,5% dos casos analisados houve suspeita de infecção por cândida sobreposta às lesões e bochechos com suspensão oral de nistatina foram prescritos previamente à realização de biópsia incisional. Quando as lesões exibiam concomitância de áreas vermelhas e brancas, durante a biópsia incisional foi coletado material de ambas as regiões. Em todas as áreas vermelhas algum grau de displasia epitelial foi observado. O diagnóstico histopatológico das leucoplasias salpicadas foi de displasia epitelial em 27% (n=3) dos casos (Figura 3), de carcinoma in situ em 18% (n=2) e de carcinoma invasivo em 55% (n=6). Nos dois casos de eritroplasia homogênea o diagnóstico foi de displasia epitelial. Em um caso de leucoplasia salpicada o diagnóstico histopatológico da área Figura 3. Aspecto histopatológico de uma leucoplasia salpicada exibindo displasia epitelial moderada (H&E, 200X). eritroplásica foi de carcinoma espinocelular grau II e o da área leucoplásica, de acantose e hiperceratose. Dos oito pacientes com diagnóstico de carcinoma in situ ou invasivo, quatro foram submetidos à ressecção cirúrgica da lesão e quatro à radioterapia. Dois pacientes com diagnóstico de displasia epitelial foram submetidos a procedimento cirúrgico ressectivo e dois permanecem em acompanhamento clínico, tendo mostrado remissão parcial da lesão após abandono do tabagismo. Um paciente não retornou para tratamento. DISCUSSÃO As eritroplasias e as leucoplasias salpicadas são lesões incomuns da mucosa bucal. No período de 1978 a 2006, entre 17831 pacientes com lesões estomatológicas, treze casos biopsiados representavam eritroplasias homogêneas ou leucoplasias salpicadas. A prevalência das lesões deste estudo foi inferior à de 0,4% relatada por Mallo-Pérez et al. 14, que investigaram pacientes idosos institucionalizados. No presente estudo, entretanto, foram revisados registros de pacientes de todas as faixas etárias. Lapthanasupkul et al. 15 investigaram lesões orais precursoras em um grupo de pacientes tailandeses e encontraram prevalência para a eritroplasia de 0,17%, também inferior à do presente estudo, o que pode estar associado a diferenças regionais, principalmente em relação ao tabagismo. Os resultados da análise das características clínicas dessas lesões estão de acordo com a literatura no que se refere ao sexo dos pacientes, sintomatologia e predileção por palato mole, sítio onde foram encontradas dez das treze lesões analisadas 5,14,15. Oito dos 13 pacientes estudados encontravam-se entre as 6ª e 8ª décadas de vida e dois, na 5ª década, faixas etárias que corroboram a literatura 297

em relação às eritroplasias e leucoplasias salpicadas orais. Em dois casos, entretanto, as lesões desenvolveram-se em pacientes mais jovens, com 33 e 39 anos, ambos etilistas e tabagistas que apresentaram, ao exame histopatológico, diagnóstico de carcinoma espinocelular. Apesar da presença dos principais fatores de risco, o desenvolvimento dessas lesões em indivíduos mais jovens pode estar associado também a fatores inerentes aos mesmos, como mutações gênicas. Fatores de risco associados ao desenvolvimento do carcinoma oral, tais como consumo de álcool ou tabaco, dietas pobres em antioxidantes como as vitaminas C, E e betacarotenos, exposição ocupacional a carcinógenos, infecções virais, além de fatores genéticos e hereditários podem influenciar no estabelecimento e comportamento das lesões cancerizáveis 16-19. No presente estudo, entretanto, não foi possível analisar-se outros fatores de risco além do tabagismo e etilismo, uma vez que a investigação foi retrospectiva, realizada em prontuários, muitos dos quais não continham essas informações. Dos fatores analisados, o tabagismo foi o mais prevalente, uma vez que em todos os casos havia histórico de fumo, e o etilismo foi associado a 46% dos casos. Nenhum paciente possuía histórico de exposição ocupacional a carcinógenos. Nas leucoplasias salpicadas a biópsia foi realizada em ambas as regiões, na eritroplásica e na leucoplásica. Em todas as áreas vermelhas algum grau de displasia epitelial estava presente e o diagnóstico histopatológico variou de displasia a carcinoma espinocelular invasivo. Em um caso, aspectos histopatológicos distintos foram encontrados na mesma lesão, enquanto nenhum grau de displasia foi observado na região leucoplásica, na eritroplásica o diagnóstico foi de malignidade. Este achado enfatiza a necessidade de coletar-se material de diferentes regiões das leucoplasias salpicadas, não deixando de incluir o componente eritroplásico. Ao analisarem carcinomas bucais, Pindborg et al. 9 demonstraram que 64% dos casos surgiram de leucoplasias salpicadas. Banoczy & Csiba 10 e Banoczy 12 relataram que 26% dos carcinomas desenvolveram-se em leucoplasias salpicadas, enquanto apenas 2% dos mesmos desenvolveram de outro tipo de leucoplasia. Considerando-se o diagnóstico histopatológico, o acompanhamento clínico e a realização de biópsias incisionais periódicas nos pacientes com eritroplasia ou leucoplasia salpicada oral é uma conduta possível 20,21. Dois dos pacientes analisados foram submetidos a este manejo terapêutico, pois exibiram leucoplasias salpicadas extensas, com diagnóstico histopatológico de displasia epitelial leve. Tais pacientes mostraram-se engajados no esquema terapêutico proposto que incluía reconsultas periódicas, biópsias sequenciais e a suspensão do consumo do tabaco e do álcool. A excisão cirúrgica é o tratamento de escolha da maioria dos profissionais, tendo sido adotada em seis dos casos analisados. Outras opções terapêuticas têm sido relatadas, tais como o uso tópico de ácido retinóico associado ao uso sistêmico de betacarotenos 22 ; a terapia fotodinâmica com metil aminolevulinato 23 ; a criocirurgia ou a vaporização com laser de dióxido de carbono 24, todas essas medidas também incluem a eliminação dos fatores de risco. Nos casos de evolução para carcinoma, a cirurgia (seguida ou não de radioterapia), a radioterapia e a quimioterapia são os métodos terapêuticos mais adotados 21. Reichart & Philipsen 6 consideram que somente as eritroplasias de cor vermelha homogênea foram claramente definidas, enquanto a terminologia para lesões mistas é confusa, pois permanece o dilema de como quantificar as áreas vermelhas e brancas. Além disso, os autores sugerem que a história natural da eritroplasia homogênea é desconhecida e não está claro se a lesão desenvolve-se de novo ou através de uma leucoplasia preexistente 6. Para descrever as lesões que exibem concomitância de áreas vermelhas e brancas, diferentes designações têm sido empregadas conforme descrito anteriormente. Para padronizar a nomenclatura, foi empregado neste estudo o termo leucoplasia salpicada, uma vez que este é atualmente utilizado pela WHO 4. CONCLUSÕES As características clínico-patológicas das lesões analisadas corroboram os dados da literatura. Apesar da baixa prevalência, as eritroplasias homogêneas e as leucoplasias salpicadas exibem alterações histopatológicas que vão de displasia epitelial a carcinoma invasivo, o que justifica sua inclusão entre as lesões bucais com maior potencial de malignização. Além disso, independente do diagnóstico histopatológico e do tratamento estabelecido, o acompanhamento periódico dos pacientes e a suspensão dos fatores de risco são medidas indispensáveis nesses casos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Reibel J. Prognosis of oral pre-malignant lesions: significance of clinical, histopathological, and molecular biological characteristics. Crit Rev Oral Biol Med. 2003;14(1):47-62. 2. World Health Organizations. Collaborative Reference Centre for Oral Precancerous Lesions. Application of the international classification of diseases to Dentistry and stomatology. Geneva: WHO; 1978. 3. Craig RM. Speckled leukoplakia of the floor of the mouth. J Am Dent Assoc. 1981;102(5):690-2. 4. 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