PROCESSO-CONSULTA CFM nº 27/2016 PARECER CFM nº 32/2017 INTERESSADO: Dra. E. T. M. M. ASSUNTO: Divulgação em sítio eletrônico oficial de listagem de pacientes que aguardam por consulta, exames e intervenções cirúrgicas nos estabelecimentos da rede pública de saúde. RELATOR: Cons. José Albertino Souza EMENTA: A divulgação de listagens de pacientes em sítio eletrônico oficial, por determinação de Lei Municipal, utilizando-se o número de inscrição de usuário do Sistema Único de Saúde (número do Cartão Nacional de Saúde CNS), atende à finalidade da Lei (princípio da transparência da Administração Pública), com a preservação do sigilo. DA CONSULTA A Dra. E. T. M. M, subsecretária de saúde do município de Teresópolis (RJ), por meio de correspondência eletrônica, solicita parecer acerca de publicação de listagens de pacientes em sítio eletrônico da prefeitura. Cita que a Lei Municipal nº 3.433, de 8 de março de 2016, trata da divulgação pelos gestores da saúde, no sítio eletrônico da prefeitura, dos nomes dos pacientes, além de seus exames e consultas com especialistas e de cirurgias às quais serão submetidos. Argumenta que, como médica, poderá ser acusada de liberar diagnósticos de pacientes e questiona se a Câmara de vereadores pode legislar sobre o tema. DO PARECER A Lei Municipal nº 3.433/2016 torna obrigatória a divulgação das listagens dos pacientes que aguardam por consultas com especialistas, exames e cirurgias na rede pública de saúde do município de Teresópolis e o cumprimento da ordem de inscrição. 1
Estabelece que: Art. 1 2 As informações a serem divulgadas devem conter: II Dados do sistema e a forma de registro de inscrição dos pacientes, com a discriminação do tipo de consulta, exame ou intervenção cirúrgica necessária. IV Relação dos inscritos habilitados para o respectivo exame, consulta ou procedimento cirúrgico; V Relação dos pacientes já atendidos. (Grifos nossos) Instada a se manifestar sobre a matéria, a Coordenação Jurídica (Cojur) do CFM, por meio do Despacho nº 222/2016, assim opina: Não ser da competência do CFM analisar, para o público geral, a competência dos entes federados para editarem medidas legislativas. para se atender aos princípios da transparência e publicidade, e não se descurar do sobredourado sigilo do paciente, soluções intermediárias poderiam ser pensadas, tais como: i) listagens apenas com as iniciais dos pacientes; ii) listagem por meio dos CPF's; iii) listagens por meio da inscrição dos pacientes no SUS. Como exemplo, a Cojur cita os Projetos de Lei a seguir elencados. O PL nº 1.208/2015, da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, estabelece o número de inscrição no Cadastro de Pessoas Física (CPF), como forma exclusiva de identificação do paciente. Adota como JUSTIFICATIVA: 2
De acordo com o artigo 23 da Constituição Federal de 1988 (CF/88), in verbis: Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: II cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência; O dispositivo constitucional em referência explicitamente estabelece que a tutela da saúde é um tema de competência material comum, isto é, um assunto que não cabe com exclusividade à União, e sim de forma compartilhada com os demais entes da Federação, incluindo os Estados. Neste sentido, a competência legislativa sobre a defesa da saúde é concorrente. Segundo o teor do artigo 24 da CF/88: O projeto de lei que ora apresentamos objetiva aprimorar as ações e serviços de saúde pública executados no território do Estado de São Paulo, por meio de um sistema de regulação do acesso à saúde que obedeça tanto ao princípio de transparência da Administração Pública (Artigo 37, caput, da CF/88), quanto ao princípio de respeito à dignidade humana do paciente (Artigo 1, III, CF/88), da intimidade e da vida privada (Art. 52, X, CF/88), com a preservação absoluta do sigilo da identidade dos usuários do SUS. O presente projeto de lei assegurará aos cidadãos do Estado de São Paulo uma transparência no atendimento à saúde promovida pelo Poder Público Estadual, com a clareza e precisão de informações que essas listas de espera exigem. 3
O Projeto de Lei nº 148/2014, do município de Bebedouro (SP), dispõe, no seu artigo 1º, parágrafo 1º, que: Para garantir o direito de privacidade dos pacientes, estes serão identificados nas listagens previstas no caput deste artigo tão somente pelo número do Cartão Nacional de Saúde CNS. Na justificativa anexa, o relator do PL argumenta que: A Justiça de São Paulo determinou que a Prefeitura de Ribeirão Preto coloque em seu site a lista completa de pessoas que aguardam consultas com especialistas, exames e cirurgias na rede municipal da saúde. A fila seria formada pelo número do cartão SUS (Sistema Único de Saúde) para não expor os pacientes. Cita que o colegiado do TJ-SP entendeu que a lei tem por finalidade tão somente informar à população sobre a lista de pacientes no aguardo de consultas, procedimentos médicos e cirurgias da rede pública em atenção ao princípio de publicidade, iniciativa que deveria ser seguida e não repelida. A Lei Municipal n 3.433/2016, do município de Teresópolis (RJ), citada pela consulente, induz à interpretação de que a listagem será feita de modo nominal. Destarte, identificando-se nominalmente a pessoa do paciente e correlacionando-a com o procedimento almejado/realizado, ocorrerá a quebra do sigilo profissional. Em análise mais atenta do dispositivo em questão, vê-se que torna obrigatória a divulgação da relação dos inscritos habilitados e a relação dos pacientes atendidos (artigo 1, parágrafo 2º, alíneas IV e V), não ficando explícito se estas relações tenham que ser nominais. O artigo 73 do Código de Ética Médica estabelece que é vedado ao médico: Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente. O aspecto principal deste parecer diz respeito à possibilidade de correlação entre a pessoa do paciente e a sua doença. Listagens nominais, sejam elas somente com as iniciais ou por CPF, favorecem a quebra do sigilo. 4
Sendo assim, considero mais apropriadas e seguras, para a preservação do sigilo do paciente, listagens por meio da inscrição de usuário do SUS (número do CNS), pois atendem à finalidade da Lei (princípio da transparência da Administração Pública artigo 37, caput, da CF/88) e aos princípios de respeito à dignidade humana do paciente (artigo 1º, inciso II, da CF/88), da intimidade e da vida privada (artigo 52, inciso X, da CF/88). Este é o parecer, S.M.J. Brasília, DF, 28 de julho de 2017. JOSÉ ALBERTINO SOUZA Conselheiro relator 5