Padrão de mobilidade como indicador de dependência em idosos restritos ao domicílio

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Transcrição:

ARTIGO ORIGINAL Padrão de mobilidade como indicador de dependência em idosos restritos ao domicílio Mobility as indicator of dependency in housebound elderly people Celita Salmaso Trelha 1, Marcos Aparecido Sarria Cabrera 2, Mara Solange Gomes Dellaroza 3, Carolina Kruleske da Silva 4, Flavia Cristina da Silva 5 RESUMO 1 Fisioterapeuta, Doutora em Ciências da Saúde pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), PR, Brasil. Professora Adjunta da UEL. 2 Médico, Doutor em Ciências da Saúde pela Universidade de São Paulo, Professor Adjunto da UEL. 3 Enfermeira, Mestre em Enfermagem Fundamental pela Universidade de São Paulo (USP), Professora Assistente da UEL. 4 Fisioterapeuta, Mestre em Ciências da Reabilitação UEL- Unopar, Londrina, PR, Brasil. 5 Graduanda em Fisioterapia pela UEL, bolsista de Iniciação Científica do CNPq. Objetivo: O objetivo deste trabalho foi avaliar a associação do padrão de mobilidade com as atividades de vida diária e declínio cognitivo em idosos restritos ao domicílio. Métodos: Foram avaliados 131 idosos, com idade média de 77,5 ± 9,15 anos, por meio do índice Katz, escala de Lawton, miniexame do estado mental, caracterização sociodemográfica e classificação do grau de independência para deambular. Resultados: O padrão de mobilidade apresentou associação significativa com a capacidade de desempenho em atividades básicas e instrumentais de vida diária, com declínio cognitivo e com a dependência de cuidador. Conclusão: A utilização de uma medida de fácil avaliação e aplicabilidade como o padrão de mobilidade pode ser útil no direcionamento de ações preventivas focadas na redução do grau de incapacidade funcional em idosos. Palavras-chave: Saúde do idoso, idoso fragilizado, limitação de mobilidade. ABSTRACT Objective: The aim of this article is to investigate the association between the mobility standard in the daily activities and the cognitive decline. 131 elderly individuals participated in the study (77.5 ± 9.15 years). Methods: Several aspects were assessed such as functional decrease (Katz and Lawton-Brody Indexes), Mini Mental State Examination, sociodemographical variables and mobility conditions. Results: There was significant association between cognitive impairment of activities in daily living and instrumental activities of daily living, cognitive decline and caregivers needs. Conclusion: Mobility is an easy instrument and may be useful for preventive actions to reduce functional disability in elderlies. Keywords: Health of the elderly, frail elderly, mobility limitation. Endereço para correspondência: Profa. Dra. Celita Salmaso Trelha - Av. Robert Kock, 60 - Londrina - PR - CEP: 86038-440 Tel: (43) 9102 7085 - E-mail: celita@uel.br.

126 Geriatria & Gerontologia INTRODUÇÃO O envelhecimento populacional no Brasil, evidenciado pelas transformações demográ icas ocorridas nos últimos anos, tem sido considerado um dos principais problemas de saúde pública. 1,2 Uma série de alterações e desgastes em vários sistemas funcionais acompanha o envelhecimento, podendo resultar em diminuição da mobilidade, limitações no desempenho de atividades cotidianas, dependência na realização de atividades simples e diminuição da condição de saúde do idoso com o surgimento de doenças crônicas e aumento no consumo dos serviços de saúde. 1,3 A avaliação da capacidade funcional vem sendo considerada uma ferramenta particularmente útil para mensurar o estado de saúde do idoso, sendo este, num sentido amplo, entendido como o equilíbrio entre as várias dimensões de sua capacidade funcional, sem necessariamente expressar a ausência de problemas. 4 Seu conhecimento é importante para que possa ser ampliado o foco de atenção ao idoso permitindo a estruturação de melhores estratégias, visando à qualidade de vida desta população. 5 Atualmente, a avaliação funcional envolve a avaliação da di iculdade ou necessidade de auxílio em tarefas básicas de cuidados pessoais e em tarefas necessárias para viver de forma independente na comunidade, respectivamente denominadas atividades básicas de vida diária (ABVDs) e atividades instrumentais de vida diária (AIVDs) 4,6. No entanto, observa-se na prática uma di iculdade na aplicação efetiva desses instrumentos. As medidas de mobilidade têm se mostrado importantes na avaliação do declínio funcional do idoso e no estudo das relações entre o grau de dependência funcional e características demográ icas, condições crônicas de saúde e comportamentos relacionados à saúde. 4 A mobilidade pode ser de inida como a capacidade de deslocamento pelo ambiente, importante componente da função ísica que constitui elemento essencial para a execução das ABVDs e AIVDs, sendo um representante indireto da independência na realização de atividades da vida diária 7,8. O comprometimento da mobilidade pode repercutir em índices de morbidade, mortalidade, condições psíquicas e sociais, além de signi- icativo custo aos serviços de saúde 9,10. Apesar de esforços do governo para identi- icar a capacidade funcional dos idosos, essa variável ainda é pouco aplicada. O padrão de mobilidade pode ser um indicador das condições de saúde e funcionalidade do idoso, útil para a estruturação de estratégias preventivas e intervenções especí icas a esta população. 4,11 O objetivo deste trabalho foi avaliar a associação do padrão de mobilidade com atividades de vida diária e declínio cognitivo em idosos residentes na comunidade. MATERIAIS E MÉTODOS Foi realizado estudo transversal com a inclusão de idosos, com sessenta anos ou mais, moradores da área de abrangência de duas Unidades Básicas de Saúde (UBS) da região norte da cidade de Londrina, PR. Participaram idosos cadastrados no Programa Saúde da Família e o critério de inclusão utilizado foi que o idoso não possuísse capacidade de se deslocar fora da área de sua residência. O objetivo desse critério era a seleção de idosos com certo grau de dependência. Foram identi icados 181 idosos classi icados como restritos ao domicílio pelas equipes de saúde da família. Considerou-se restrito ao leito ou à cadeira de rodas o indivíduo que não tinha condições de sair do leito ou da cadeira de rodas sem ajuda de outros. Destes, vinte foram excluídos por apresentarem idade menor do que sessenta anos (n = 13) ou óbito antes da realização da amostragem (n=7). A coleta dos dados foi realizada por meio de entrevistas domiciliares realizadas com os idosos ou com seu cuidador principal.

Mobilidade em idosos dependentes 127 As variáveis estudadas foram: informações sócio-demográ icas (gênero, idade e escolaridade) e condições de saúde (diagnostico auto-referido de depressão, diabetes mellitus, hipertensão arterial, quedas nos últimos três meses, presença de dores nos últimos 15 dias, internação nos últimos 12 meses e presença de cuidador). A capacidade de mobilidade dos participantes foi de inida como o grau de independência para deambular, sendo classi icada em uma das três categorias: restrito ao leito ou a cadeira de rodas; deambula com ajuda ou utiliza dispositivo de auxílio para a marcha como andador ou bengala; ou deambula de forma independente e sem auxílio. Os participantes foram avaliados por meio do índice Katz, ou índice de independência nas atividades de vida diária (ABVD), que consiste em um índice classi icatório da independência em subgrupos, de A a G, por meio da avaliação individual do desempenho funcional 12. Neste estudo, foram considerados dependentes nas atividades de vida diária os idosos classi icados como Katz F ou G o que corresponde à dependência em cinco ou seis atividades analisadas 13. A Escala de Lawton foi utilizada para avaliação das atividades instrumentais de vida diária (AIVD). Seu escore varia de 7 a 21, de forma que maiores pontuações indicam melhor desempenho. Os idosos com pontuação menor do que 11 na foram classi icados como dependentes em AIVD neste estudo. 14. Para avaliar a capacidade cognitiva foi utilizado o miniexame do estado mental (Meem), composto por questões que avaliam diversos domínios, com um escore de 0 a 30 pontos 15-17. Como a maioria dos participantes deste estudo apresentava baixa ou nenhuma escolaridade, o ponto de corte, utilizado como indicativo de comprometimento cognitivo, foi menor ou igual a 20 pontos 18. Tabela 1. Distribuição do padrão de mobilidade dos idosos segundo variáveis socioeconômicas, condição de saúde e dependência Variável Deambula sozinho N 76 (58,1%) Deambula com ajuda ou com utilização de dispositivo 38 (29%) Padrão de mobilidade Restrito ao leito ou à cadeira de rodas 17 (12,9%) Idade média 76,4 80,0 76,3 0,120 Idosos com > 75 anos 44 (57,9) 26 (68,4) 9 (52,9) 0,440 Gênero feminino 65 (85,5) 13 (34,2) 13 (76,5) 0,000 Analfabetismo 39 (51,3) 22 (57,9) 9 (52,9) 0,800 Queda 3 meses 19 (25,0) 10 (26,3) 2 (11,8) 0,400 Dor 15 dias 52 (68,4) 28 (73,7) 9 (52,9) 0,310 Internação 12 meses 19 (25,0) 10 (26,3) 6 (35,3) 0,600 Diabetes 25 (32,9) 10 (26,3) 6 (35,3) 0,700 Hipertensão 64 (84,2) 36 (94,7) 12 (70,6) 0,050 Depressão 39 (52,7) 20 (54,1) 8 (57,1) 0,900 Ter cuidador 36 (48,6) 29 (76,3) 17 (100,0) 0,000 MEEM < 20 20 (26,3) 16 (42,1) 11 (64,7) 0,007 ABVD (Katz) dependente 6 (7,9) 8 (21,1) 17 (100,0) 0,000 AIVD (Lawton) dependente 13 (17,1) 12 (31,6) 12 (70,6) 0,000 p

128 Geriatria & Gerontologia Os dados foram armazenados e analisados pelo Programa Epi Info 3.5 (2008). Na estatística descritiva as proporções foram comparadas por meio do teste qui-quadrado. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Londrina (parecer n. 108/08) e todos os participantes voluntários foram informados sobre os objetivos da pesquisa, assinando o Termo e Consentimento Livre e Esclarecido e concordando em participar. RESULTADOS Dos 161 idosos identi icados, 30 não foram avaliados (perda de 18,6%) devido à internação (n = 2), mudança de endereço (n = 6), recusa (n = 9) ou por não terem sido encontrados no momento da visita (n = 13). Foram estudados 131 indivíduos com idade entre 60 e 99 anos (média = 77,5 ± 9,2, sendo observado predomínio do gênero feminino (69,5%). Não houve diferença signi icativa entre a média de idade dos idosos entre os três grupos com diferentes graus de dependência (p = 0,12). A maioria dos idosos foi classi icada como independentes para deambular (n = 76; 58%). A distribuição do padrão de mobilidade dos idosos avaliados e sua associação com as demais variáveis do estudo podem ser observadas na Tabela 1. Quando os grupos foram analisados em relação ao padrão de mobilidade, foram observadas diferenças estatisticamente signi icantes entre os grupos em relação à presença de cuidador (p < 0,001), pontuação no Meem (p = 0,007), classi icação como dependentes para realização de ABVD e AIVD (p < 0,001). Todos os idosos restritos ao leito ou a cadeira de rodas foram classi icados como dependentes para realização de ABVD e tinham o apoio de um cuidador responsável. Cerca de 70% (n = 12) dos idosos nesta condição foram classi icados como dependentes para realização de AIVD e 64,7% (n = 11) apresentavam dé icit cognitivo quando avaliados pelo Meem. O gênero também se mostrou signi icativo, com maior concentração de mulheres entre os menos e mais dependentes. DISCUSSÃO Resultados deste estudo apontaram que cerca de 42% dos idosos avaliados apresentavam incapacidade ou necessidade de auxílio para deambular. Araújo e Bachion 19 avaliaram idosos atendidos por uma equipe do Programa Saúde da Família de Goiânia, GO, e veri icaram que 44% dos idosos apresentavam capacidade diminuída para andar, de inida como limitação do movimento a pé pelo ambiente. Outras dimensões relacionadas à mobilidade foram avaliadas no estudo citado, e os autores concluíram ressaltando a necessidade de intervenções de natureza interdisciplinar, no âmbito do Programa Saúde da Família, a im de minimizar a progressão do comprometimento da mobilidade na população estudada. O estudo de Parahyba e Veras 4 analisou diferenciais sociodemográ icos nas taxas de prevalência de incapacidade em mobilidade ísica entre os idosos no Brasil. Os dados utilizados foram os da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), de 1998 e 2003, realizada pelo IBGE. Os resultados apontaram redução estatisticamente signi icante da prevalência de incapacidade funcional em mobilidade ísica entre as pessoas idosas no período. Em 2003, os índices apresentaram maior prevalência de di iculdade para caminhar no gênero feminino, progredindo com o aumento da idade e apresentando diferenças regionais associadas às desigualdades sociodemográ icas existentes no Brasil.

Mobilidade em idosos dependentes 129 O grau de incapacidade avaliado por meio do desempenho em atividades de vida diária, história de hospitalização prévia no último ano, estado cognitivo, assim como gênero e idade tem se mostrado indicador de mortalidade entre os idosos. 11 No presente estudo, as variáveis relacionadas ao desempenho de atividades básicas e instrumentais de vida diária e ao declínio cognitivo mostraram-se associadas ao prejuízo da mobilidade, que por sua vez, apresenta grande in luência no estado de saúde dos idosos, como descrevem Araújo e Bachion 19. A di iculdade de locomoção é reconhecida como o principal fator de risco para mortalidade em idosos. Maia et al. 20 veri icaram que a di iculdade de caminhar no quarto apresentou um OR de 3,51 ao compararem os idosos com e sem di iculdades. Os achados referentes ao gênero com predomínio de mulheres entre os idosos mais e menos dependentes podem ser explicados parcialmente pelo fenômeno da feminização da população idosa 21 e a maior incapacidade de mulheres idosas quando comparadas a homens da mesma faixa etária. Estes dados corroboram os encontrados em pesquisa, realizado com a população idosa brasileira 22 e podem ser melhores explicados não pela maior ocorrência, mas pelas diferenças na sobrevivência e nas morbidades associadas. Análise realizada com idosos brasileiros, comparando a curva de sobrevida e a curva de sobrevida com incapacidade, comprovou que as mulheres sobrevivem mais que os homens inclusive em situações de incapacidade. Enquanto os homens sobrevivem em média 1,6 anos, as mulheres sobrevivem 2,5 anos a partir do aparecimento de incapacidades. 23 Entendendo capacidade funcional como a capacidade de executar tarefas cotidianas básicas ou mais complexas necessárias para uma vida independente na comunidade, como, por exemplo, tarefas relacionadas à mobilidade, 24 é fácil imaginar as repercussões que a diminuição da mobilidade podem trazer à autonomia e independência do individuo. 25 A grande preocupação na área da geriatria e gerontologia é a manutenção da capacidade funcional da pessoa idosa como condição para facilitar a manutenção da autonomia e da qualidade de vida. Quanto maior a dependência maior o desa io em respeitar a autonomia e individualidade da pessoa. É disso tudo que deriva a preocupação das pessoas idosos de terem como objetivo a manutenção de autonomia e do máximo de independência possível. 26 Reconhecendo a mobilidade com aspecto essencial no cuidado ao idoso, encontra-se a imobilidade como uma das Grandes Síndromes da Geriatria e, devido a isto, deve ser foco também da avaliação geriátrica ampla por meio de testes validados de força de membros e mobilidade. Mas a aplicação destes testes na realidade diária da clínica e na atenção domiciliar é um desa io a ser alcançado. Assim, a mobilidade, avaliada de maneira simples, conforme proposto, pode ser um indicador, de fácil avaliação, usado por pro- issionais de todos os níveis de assistência, e que permitirá o reconhecimento de situações de risco para o declínio da capacidade funcional de maneira simples e efetiva. CONCLUSÃO O padrão de mobilidade avaliado em idosos restritos ao domicílio apresentou associação signi icativa com a capacidade de desempenho em atividades básicas e instrumentais de vida diária, com declínio cognitivo e com a dependência de cuidador. A utilização de uma medida de fácil avaliação e aplicabilidade como o padrão de mobilidade em idosos restritos ao domicílio pode ser útil para o di-

130 Geriatria & Gerontologia recionamento de ações preventivas focadas na redução do grau de incapacidade funcional nesta população. AGRADECIMENTOS Ao CNPq/PIBIC pela concessão de bolsa de Iniciação Cientí ica ao último autor para execução deste trabalho. CONFLITO DE INTERESSE Os autores declaram não haver con lito de interesses na realização deste trabalho. REFERÊNCIAS 1. Lima-Costa MF, Veras R. Envelhecimento e saúde pública [editorial]. Cad. Saúde Pública. 2003;19(3):700-1 2. Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE. Projeções da população. 2009. Disponível em: www.ibge.gov.br. Acesso em: 12 nov 2011. 3. Fiedler MM, Peres KG. Functional status and associated factors among the elderly in a southern Brazilian city: a population-based study. Cad Saúde Pública. 2008;24(2):409-15. 4. Parahyba MI, Veras R. Socio-demographic differentials in the functional decline among the elderly in Brazil. Cien Saude Colet. 2008;13(4):1257-64. 5. Santos KA, Koszuoski R, Dias-da-Costa JS, Pattussi MP. Factors associated with functional incapacity among the elderly in Guatambu, Santa Catarina State,Brazil. Cad Saúde Pública. 2007;23(11):2781-8. 6. Machado FN. Capacidade e desempenho para a realização das atividades básicas de vida diária: um estudo com idosos dependentes [dissertação]. Belo Horizonte: Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais; 2010. 7. Cesari M, Kritchevsky SB, Penninx BW, Nicklas BJ, Simonsick EM, Newman AB et al. Prognostic value of usual gait speed in well-functioning older people - results from the Health, Aging and Body Composition Study. J Am Geriatr Soc. 2005;53(10):1675-80. 8. Shumway-Cook A, Guralnik JM, Phillips CL, Coppin AK, Ciol MA, Bandinelli S et al. Age-associated declines in complex walking task performance: the Walking InCHIANTI toolkit. J Am Geriatr Soc. 2007;55(1):58-65. 9. Inzitari D, Basile AM. Activities of daily living and global functioning. Int Psychogeriatr. 2003;15(Suppl 1):225-9. 10. Fried TR, Bradley EH, Williams CS, Tinetti ME. Functional disability and health care expenditures for older persons. Arch Intern Med. 2001;161(21):2602-7. 11. Ramos LR. Determinant factors for healthy aging among senior citizens in a large city: the Epidoso Project in São Paulo. Cad Saude Publica. 2003;19(3):793-8. 12. Duarte YA, de Andrade CL, Lebrão ML. Katz Index on elderly functionality evaluation. Rev Esc Enferm USP. 2007;41(2):317-25. 13. Katz S, Ford AB, Moskowitz RW, Jackson BA, Jaffe MW. Studies of illness in the aged. the index of adl: a standardized measure of biological and psychosocial function. JAMA. 1963;185:914-9. 14. Lawton MP, Brody EM. Assessment of older people: self-maintaining and instrumental activities of daily living. Gerontologist. 1969;9(3):179-86. 15. Folstein MF, Folstein SE, McHugh PR. Mini-mental state. A practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. J Psychiatr Res. 1975;12(3):189-98. 16. Brucki SM, Nitrini R, Caramelli P, Bertolucci PH, Okamoto IH. Suggestions for utilization of the mini-mental state examination in Brazil. Arq Neuropsiquiatr. 2003;61(3B):777-81. 17. Lourenço RA, Veras RP. Mini-Mental State Examination: psychometric characteristics in elderly outpatients. Rev Saude Publica. 2006;40(4):712-9. 18. Almeida OP. Mini mental state examination and the diagnosis of dementia in Brazil. Arq Neuropsiquiatr. 1998;56(3B):605-12. 19. Araújo LA, Bachion MM. Nursing diagnoses of the pattern of mobility in the elderly attended by the Family Health Program. Rev Esc Enferm USP. 2005;39(1):53-61. 20. Maia FO, Duarte YA, Lebrão ML, Santos JL. Risk factors for mortality among elderly people. Rev Saude Publica. 2006;40(6):1049-56. 21. Veras RP. País jovem com cabelos brancos: a saúde do idoso no Brasil. Rio de Janeiro: Relume-Dumará;1994. 22. Tavares DMS, Pereira GA, Iwamoto HH, Miranzzi SSC, Rodrigues LR, Machado ARM. Incapacidade funcional entre idosos residentes em um município do interior de Minas Gerais. Texto Contexto Enferm. 2007;16(1):32-9. 23. Camargos MC, Perpétuo IH, Machado CJ. Life expectancy with functional disability in elderly persons in São Paulo, Brazil. Rev Panam Salud Publica. 2005;17(5-6):379-86. 24. Alves LC, Leite Ida C, Machado CJ. The concept and measurement of functional disability in the elderly population: a literature review. Ciên Saúde Colet. 2008;13(4):1199-207. 25. Papaléo Netto M, Yuaso DR, Kitadai FT. Longevidade: um desafio no terceiro milênio. In: Pessini L, Barchifontaine CP, organizadores. Bioética e longevidade humana. São Paulo: Loyola; 2006. p. 259-83. 26. Paschoal SMP, Desafios da longevidade: qualidade de vida. In: Pessini L, Barchifontaine CP, organizadores. Bioética e longevidade humana. São Paulo: Loyola; 2006. p. 329-37.