73 ESTUDO FITOQUÍMICO ANTIMICROBIANO DE Ceiba Glaziovii Kuntze K. Schum André Júnior de Brito Leal 1, Ivan Coelho Dantas 2 ; Thiago Pereira Chaves 1 ; Delcio de Castro Felismino 2 ; Karlete Vania Mendes Vieira 3 RESUMO - O problema da crescente resistência de cepas microbianas aos antibióticos tradicionais tem chamado a atenção de pesquisadores em busca de novas alternativas terapêuticas. Várias plantas são referidas como tendo algum efeito antimicrobiano, o que pode ser muito importante no desenvolvimento de terapias alternativas no combate a microrganismos resistentes. O presente trabalho de caráter descritivo e experimental teve por objetivo a determinação dos compostos secundários e o estudo acerca da atividade antimicrobiana do extrato fluído hidroalcóolico da casca e das folhas de Ceiba Glaziovii (Kuntze) K. Schum sobre as cepas de Candida albicans, Staphylococcus aureus e Escherichia coli. Para o teste do screening foi utilizado o processo de difusão em meio sólido cavidade-placa, onde as referidas cepas foram submetidas a diferentes concentrações (100%, 50%, 25%, 12,5%, 6,25%) dos extratos. A identificação dos grupos de metabólitos secundários presentes nos extratos foi realizada através de reações químicas com obtenção de precipitação, coloração e floculação. O estudo fitoquímico revelou a presença de taninos, fenóis, albumina, flavonóides, antocianina, antocianidina, sendo que saponina e xantona foram identificados no extrato da folha e da casca respectivamente. Apenas Staphylococcus aureus apresentou sensibilidade aos extratos testados, sendo os maiores halos de inibição observados para o extrato da casca. A partir deste trabalho concluiu-se que a barriguda (C. Glaziovii) apresentou uma considerável variedade de compostos secundários e atividade antimicrobiana para cepas de S. aureus a qual pode estar relacionada à presença de compostos químicos tais como taninos e fenóis. Unitermos: Plantas medicinais, Etnobotânica, resistência microbiana, barriguda. PHYTOCHEMICAL ANTIBACTERIAL STUDY ON CEIBA GLAZIOVII KUNTZE K. SCHUM ABSTRACT - The problem of the increasing resistance of microbial sprouts to traditional antibiotics has called researchers attention searching for new therapeutic alternatives. Several vegetable species are referred as presenting some antimicrobial effect, what can help in the development of alternative therapies against resistant microorganisms. The present descriptive paper aimed to determine the secondary compounds and to make a study on the antimicrobial activity of the hydroalcoholic fluid extract of the Ceiba Glaziovii (Kuntze) K. Schum s shell and leaves on the Candida albicans, Staphylococcus aureus and Escherichia coli s sprouts. For making possible the screening test, it was used the process of diffusion through solid cavity-shape means, where the studied sprouts were submitted to different concentrations (100%, 50%, 25%, 12.5%, 6.25%) of the extracts. The identification of the groups of secondary metabolites in the extracts was carried on through chemical reactions with precipitation, coloration and flocculation occurrences. The phytochemical study has shown that tannins, phenols, albumin, flavonoids, antocyanine, antocyanidine, where the saponine and xantona were identified in the extracts of leaves and shell respectively. Only Staphylococcus aureus presented sensibility to the studied extracts, having the largest inhibition halo present on the extract of the shell. In light of these studies, it can be 1 Biólogo, Mestrando em Ciência e Tecnologia Ambiental (UEPB) pereira_thiago@msn.com 2 Departamento de Biologia, CCBS/UEPB. ivancd@gmail.com; delciofelismino@gmail.com 3 Departamento de Farmácia, CCBS/UEPB.
74 concluded that barriguda (C. Glaziovii) presented a substantial variety of secondary compounds and antimicrobial activity to sprouts of S. aureus, what can be related to the presence of chemical compounds such as tannins and phenols. Uniterms: microbial sprouts; secondary compounds; barriguda; antimicrobial activity. INTRODUÇÃO A utilização de plantas silvestres com fins medicinais data dos primórdios da civilização humana, provavelmente ainda da pré-história (Gomes et al., 2007). Ao se falar de plantas medicinais é inevitável não mencionar o conhecimento empírico, o qual foi adquirido, acumulado e transmitido pelas populações tradicionais geralmente de forma oral. O homem adquiriu esse conhecimento através da observação do comportamento dos animais domésticos e silvestres como, por exemplo, observando animais como cães consumindo ervas com efeitos nauseantes procurando esvaziar seus estômagos (Dantas, 2007a). Atualmente o conhecimento sobre plantas medicinais está sendo revisto e expandido a fim de encontrar vegetais com propriedades antimicrobianas, devido a problemática da resistência a antibióticos convencionais adquirida por diversos micro-organismos. Um dos fatores que mais contribui para a resistência é o uso inadequado desses medicamentos por parte da população, sendo que no futuro torna-se duvidosa a viabilidade do uso dos mesmos (Reis, 2006). Mims et al (1999) afirmam que a resistência bacteriana a antibióticos convencionais pode tornar-se crítica, tornando incerto o futuro quanto à utilização de antibióticos o que, sem sombra de dúvida, constitui um problema de saúde pública. A Caatinga é um domínio morfoclimático exclusivamente brasileiro caracterizado por clima semi-árido, solos rasos e pedregosos e vegetação adaptada às condições de déficit hídrico. Devido a essas características locais a Caatinga apresenta um número expressivo de táxons raros e endêmicos, muitos com forte potencial farmacológico que podem ser fonte de moléculas bioativas com atividade antimicrobiana. Ceiba Glaziovii (Kuntze) K. Schum é uma árvore pertencente à família Bombacaceae, endêmica e restrita a região semiárida nordestina (Duarte, 2006) onde é popularmente conhecida como barriguda devido à forma peculiar do caule na planta adulta. Também ocorre em brejos de altitude os quais são disjunções de mata atlântica circundadas por vegetação xerófila. Agra et al (2007) e Dantas (2007b) citam o emprego medicinal da barriguda no tratamento de edemas, reumatismo e inflamações. Considerando o problema da resistência microbiana e a escassez de estudos de plantas da Caatinga quanto a sua composição química e ao seu potencial farmacológico, este trabalho objetiva determinar a composição dos metabólitos secundários e avaliar atividade antimicrobiana dos extratos hidroalcóolicos da casca e folha da barriguda (Ceiba Glaziovii Kuntze K. Schum). MATERIAL E MÉTODOS Coleta do material vegetal e obtenção do extrato hidroalcoólico O material vegetal foi coletado na zona rural do município de Campina Grande PB, através da raspagem da casca do caule e retirada manual de folhas de plantas adultas devidamente selecionadas, onde foram evitados os espécimes doentes ou jovens. A planta foi identificada e depositada no Herbário Arruda Câmara da Universidade Estadual da Paraíba. Após o material ser seco em estufa de ventilação forçada a temperatura constante de 40ºC, moído em moinho tipo Willey e peneirado em tamis de numeração 10 mesh, o extrato foi obtido a partir da maceração do pó da casca e das folhas por sete dias em álcool 70%. Posteriormente os
75 extratos foram concentrados em banho-maria a uma temperatura constante de 45ºC até obter-se uma concentração ao nível de extrato fluído de 1:1 (p/v). Identificação dos metabólitos secundários A presença dos compostos bioativos foram evidenciada por meio de reações químicas através da obtenção de precipitação, floculação ou coloração, segundo protocolos específicos propostos por Morita e Assumpção (1972), Costa (2000) e Simões (2004). Para taninos e fenóis utilizou-se a solução de cloreto férrico (FeCl 3 ) a 4,5%; para flavonóides, antocianina e antocianidina, os extratos foram acidificados e alcalinizados e posteriormente observada a coloração; para alcalóides os reagentes utilizados foram os de Mayer, Bouchardat e Erdmann; para saponinas solução foi agitada por aproximadamente 1 minuto; para albuminas utilizou-se o reagente de Claudius. Screening microbiológico Para o ensaio da atividade microbiológica dos extratos de Ceiba Glaziovii Kuntze K. Schum foram utilizadas as cepas padrão Amenican Type Culture Collection (ATCC) das seguintes espécies: Candida albicans (ATCC 18804), Escherichia coli (ATCC 25922) Staphylococcus aureus (ATCC 25923) cedidas pela FIOCRUZ-RJ. Foi empregado o método de difusão em meio sólido cavidade-placa (Bauer et al., 1966). Para o preparo do inóculo, as culturas jovens de cada micro-organismo foram padronizadas em solução salina estéril 0,85% segundo a escala 0,5 de MacFarland. Em placas de estéreis contendo 20 ml dos meios de cultura (Agar Sabouraud dextrose para C. albicans, Agar Muller-Hinton para E. coli e Agar manitol salgado para S. aureus), as cepas foram inoculadas com auxílio de swabs estéreis mergulhados na suspensão contendo o inóculo. Posteriormente foram realizadas perfurações no meio de cultura de aproximadamente 6 mm de diâmetro utilizando perfuradores descartáveis estéreis e a inoculação 50 µl dos respectivos extratos nas suas formas concentradas (100 %) e nas diluições 50 %, 25%, 12,5 % e 6,25 %. Como controle foi utilizado o solvente etanólico puro. As placas foram incubadas a 37 C em estufa bacteriológica, por um período de 24-48 horas. Os ensaios foram realizados em triplicata, e o resultado final foi determinado pela média aritmética dos halos de inibição obtidos nos três ensaios. Foi considerada Concentração Inibitória Mínima, a menor concentração do extrato que inibiu o crescimento, formando halo de inibição igual ou superior a 10 mm de diâmetro. RESULTADOS E DISCUSSÃO A análise fitoquímica indicou na casca da barriguda a presença de taninos catéquicos, flavonóis, fenóis, flavonas, xantonas, alcalóides, albumina e quantidades menores de antocianina e antocianidina. Na folha, por sua vez, constatou-se a presença de taninos catéquicos, flavonois, alcalóides, albumina, antocianina, antocianidina e traços de saponina. Os testes microbiológicos revelaram que tanto os extratos hidroalcóolicos da casca quanto da folha da barriguda (Ceiba Glaziovii Kuntze K. Schum) apresentaram atividade antimicrobiana apenas frente às cepas de Staphylococcus aureus. O extrato da casca formou halos de inibição variando de 14,83 mm na forma concentrada a 10,42 mm na concentração de 12,5%, sendo observada uma diminuição proporcional do diâmetro dos halos à medida que a concentração do extrato foi diminuída. O extrato das folhas mostrou eficácia apenas na forma concentrada, com halo de 11,18 mm (Tabela 1). Com relação às cepas de Escherichia coli e Candida albicans, ambas mostraram resistência aos extratos testados. A resistência de E. coli pode estar associada a sua morfologia a qual apresenta uma membrana externa (cápsula) que pode auxiliar na sua proteção, os fungos como C. albicans comumente formam esporos de resistência quando submetidos a situações ambientais estressantes.
76 Tabela 1. Médias aritméticas dos halos de inibição (mm) do extrato fluido hidroalcóolico da casca e folha de Ceiba Glaziovii Kuntze K. Schum. EXTRATO DA CASCA EXTRATO DA FOLHA Micro-organismos Concentração (%) / Diâmetro dos Halos (mm) 100 50 25 12,5 6,25 C 100 50 25 12,5 6,25 C S. aureus 14,83 12,96 11,58 10,42 8,82-11,18 9,08 8,41 7,50 7,15 - E. coli - - - - - - - - - - - - C. albicans - - - - - - - - - - - - De acordo com a literatura, a atividade antimicrobiana de diversos extratos vegetais incluindo Cereus jamacaru DC, Richardia brasiliensis Gomez, Petiveria alliacea L., Azadiracta indica e Mimosa tenuiflora frente a S. aureus foi observada (Davet et al, 2009; Figueiredo et al, 2009; Guedes et al, 2009, Pereira et al, 2009). A resistência de Escherichia coli e Candida albicans a extratos vegetais como os de Talauma ovata também foi observada (Stefanello et al, 2009). A atividade antimicrobiana que Ceiba Glaziovii Kuntze K. Schum apresentou provavelmente pode estar associada a taninos e pigmentos flavonóides tanto devido a sua abundância nos extratos hidroalcoólicos da casca e da folha como pela comparação de outros trabalhos realizados com plantas ricas nesses compostos tais como a jurema (Mimosa tenuiflora Will Poir) e o barbatimão (Stryphnodendron adstringens Martius) que obtiveram resultados consideráveis para cepas de S. aureus (Orlando, 2005; Pereira et al, 2009). CONCLUSÃO De acordo com o estudo realizado concluiu-se que: A barriguda (C. Glaziovii Kuntze K. Schum) apresentou uma considerável variedade de compostos provenientes do metabolismo secundário incluindo taninos catéquicos (abundantes), flavonóides, fenóis, albumina e pigmentos antocianina, antocianidina e xantona. Tanto o extrato da casca quanto o da folha apresentou atividade inibitória apenas sobre as cepas de Staphylococcus aureus. Para o extrato hidroalcoólico da casca a concentração inibitória mínima foi de 12,5%. Para a folha foram obtidos halos com diâmetro considerável apenas para o extrato concentrado. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Agra, M. F.; Baracho, G. S.; Basílio, I. J. D.; Nurit, K.; Coelho, V. P.; Barbosa, D. A. Sinopse da flora medicinal do cariri paraibano. Oecol. Bras. N. 11. vol. 3. 2007. p. 323-330. Bauer, A. W. et al. Antibiotic susceptibility testing by a standardized single disc method. American Journal of Clinical Pathology, v. 45,1966.p. 493-96. Costa, A. F. Farmacognosia Experimental. v. III, 3 ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2000. Dantas, I.C. Plantas medicinais: histórico e evolução. In: Dantas, I. C. O Raizeiro Campina Grande: EDUEPB, 2007a. Dantas, I. C; Dantas, G. D. S; Felismino, D. C. Plantas medicinais. In: Dantas, I. C. O Raizeiro. 1. Ed, Campina Grande, 2007b. Davet, A. et al. Atividade antibacteriana de Cereus jamacaru DC, Cactaceae. Revista Brasileira de Farmacognosia. 19(2B): 561-564, 2009.
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