Diagnóstico e tratamento do cisto nasolabial: relato de caso clínico



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Relato de caso clínico CTBMF Diagnóstico e tratamento do cisto nasolabial: relato de caso clínico Recebido em: mar/2012 Aprovado em: ago/2012 Diagnosis and treatment of nasolabial cyst: case report Flavia Heloisa Monteiro Aluna do curso de especialização em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial (CTBMF) Fundecto/Fousp Cirurgiã-Dentista Renata Matalon Negreiros Mestre em Ciências Odontológicas do Departamento de Odontologia Social da Faculdade de Odontologia da Universidade de São Paulo (Fousp) - Professora assistente Curso de Especialização em CTBMF Fundecto/Fousp Basilio de Almeida Milani Mestre em Ciências Odontológicas do Departamento de Clínica Integrada da Fousp - Professor assistente do Curso de Especialização em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial-FUNDECTO-FOUSP Resumo O cisto nasolabial é um cisto de desenvolvimento não odontogênico raro, que acomete os tecidos moles entre a asa e base do nariz e o lábio superior podendo levar a assimetria facial. Sua patogênese é ainda muito discutida, no entanto, seu diagnóstico é clínico confirmado pelo exame anatomo-patológico. O tratamento clássico é a enucleação da lesão. O objetivo deste artigo é descrever as características, o diagnóstico e o tratamento do cisto nasolabial e relatar um caso clínico. Descritores: cistos; lábio; nariz; cistos não-odontogênicos Abstract Nasolabial cyst is a rare non-odontogenic development cyst, which affects soft-tissues between the ala and the base of the nose and the upper lip and may lead to facial asymmetry. Its pathogenesis is still controverse, although clinical diagnosis is confirmed by the anatomo- -pathological examination. The treatment is enucleation of the lesion. The aim of this article is to describe the characteristics, diagnosis and the treatment of nasolabial cysts and report a clinical case. Descriptors: cysts; lip; nose; nonodontogenic cysts Michelle Palmieri Especialista em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial - Professora assistente Curso de Especialização em em CTBMF Fundecto/Fousp Waldyr Antonio Jorge Professor livre docente e titular do departamento de Clinica Integrada da Fousp - Coordenador do Curso de Especialização em CTBMF Fundecto/Fousp Termo de consentimento livre e esclarecido assinado pelo paciente e enviado à Revista Autor para correspondência: Flavia Heloisa Monteiro Rua Heitor Peixoto, 318 - Apto. 183 Aclimação São Paulo SP 01543-000 Brasil flavia.monteiro@hotmail.com 45 Artigo 01 - Diagnóstico e tratamento do cisto - fluxo 619.indd 45 14/03/13 16:17

MONTEIRO FH; NEGREIROS RM; MILANI BA; PALMIERI M; JORGE WA Relevância Clinica Permitir ao Cirurgião-Dentista conhecer as características da lesão para que possa incluí-la na hipótese diagnóstica e planejar um tratamento adequado. Introdução Os primeiros cistos nasolabiais foram descritos em 1882 por Zuckerlandl 1,2,3,4,5,6,7,8,9,10 e acreditava-se que eram cistos de retenção 1. O primeiro relato de caso clínico foi feito em 1892 por Mc- Bride 1,10 e foram mais detalhados por Brown-Kelly em 1898 1,4,10 que considerou a lesão originada da inflamação de glândulas mucosas da região 1. Desde então possui uma ampla sinonímia: cisto mucoide, cisto maxilar, cisto de vento, cisto nasovestibular, cisto subalar, cisto nasogloberular, cisto nasoalveolar 4, cisto mucoso do nariz, cisto do vestíbulo nasal, cisto do assoalho nasal 9. A lesão foi muito estudada por Kledstadt e em 1953 recebeu o nome de Cisto de Kledstadt 4,5. Em 1955 Rao o definiu como uma lesão de tecidos moles entre o lábio superior e o vestíbulo nasal e usou o termo nasolabial, diferenciando-o do cisto nasoalveolar, uma lesão que levaria a erosão da superfície da maxila 4,6. O cisto nasolabial é uma lesão rara, com a incidência chegando a 0,7% dos cistos maxilares e 2,5% dos cistos não odontogênicos 2,11. Maior prevalência entre a quarta e quinta décadas de vida, em indivíduos do gênero feminino, da raça negra e 90% dos casos são unilaterais 3,4,7,10,11,12,13. Clinicamente apresenta-se como uma massa ou nódulo flutuante na região de sulco nasolabial envolvendo a asa do nariz, podendo levar a obstrução nasal, elevação do lábio superior 1,3,4,5,9,13 e aumento de volume no assoalho nasal do lado acometido14. A vitalidade dos elementos dentais é preservada 3,9. Por ser uma lesão de crescimento lento e indolor os pacientes procuram tratamento ao perceberem algum sintoma, como deformidade, obstrução nasal ou infecção, que em cerca de 50% dos casos 11,15 pode levar a dor 2,3,4,9, e drenar para a cavidade oral ou o vestíbulo nasal 11,13,15 ou ainda a interferência na utilização de prótese 2,12,13. Eventualmente é um achado radiográfico em radiografias extraorais de rotina 11, ou observado durante um exame otorrinolaringológico 3. O diagnóstico é clínico, as radiografias intra e extraoral pouco elucidam 5. Já a tomografia computadorizada e a ressonância magnética auxiliam no diagnóstico, delimitando a cápsula cística, seu tamanho e sua relação com estruturas adjacentes 4,5,6,16. O exame anatomo-patológico confirma a hipótese diagnóstica 13. A deformidade facial progressiva pode atingir enormes dimensões 17, o risco de infecção e suas sequelas, como dor e outros sinais flogísticos tornam mandatória a exérese da lesão 9,11. O tratamento clássico é a remoção cirúrgica da lesão com acesso intraoral, com bom prognóstico, e recidiva muito rara 5. Pelo fato de acometer somente tecidos moles alguns autores 2,14 afirmam que ela não responde bem a marsupialização. O objetivo deste trabalho é descrever as características, o diagnóstico e o tratamento do cisto nasolabial, ilustrado através do relato um caso clínico, possibilitando ao Cirurgião-Dentista reconhecer a lesão, de diagnóstico basicamente clínico, a fim de instituir a terapia adequada. Relato de caso clínico A paciente do gênero feminino, 51 anos, melanoderma, ASA II (hipertensão arterial), compareceu a clínica do curso de especialização de Cirurgia Bucomaxilofacial da Fundecto, coordenado pelo Prof. Dr. Waldyr Antonio Jorge, encaminhada por uma Cirurgiã-Dentista pedindo avaliação e remoção da lesão em maxila lado direito que causava desadaptação da prótese total superior (paciente edêntula). A paciente apresentava assimetria no terço médio da face devido a um aumento de volume, flácido, na lateral direita do nariz levando a apagamento do sulco nasolabial, elevação da asa do nariz e assoalho nasal do mesmo lado. A coloração e integridade tecidual estavam mantidas, e a paciente referia sensibilidade à palpação em toda a região da tumefação (Figura 1). Ao exame intraoral observava-se uma massa, de cerca de 2,5 cm, na região de fundo de sulco, com a mucosa de coloração normal, íntegra e também com sensibilidade a palpação (Figura 2). A tomografia computadorizada (Figura 3) da região mostrava uma imagem com densidade semelhante a tecido mole sugerindo uma lesão arredondada circunscrita, bem delimitada de cerca de 2,5 cm de diâmetro, anterior a abertura piriforme do lado direito, limitada aos tecidos moles da região, levando a um desvio do septo nasal e erosão da maxila do mesmo lado. Com base nas características clínicas e nos exames complementares levantou-se a hipótese diagnóstica de cisto nasolabial e foi indicada a remoção cirúrgica da lesão. O procedimento foi feito com anestesia local, acesso intraoral e difusão romba da lesão, com enucleação do cisto (acesso de Denker3) (Figura 4). A incisão foi feita sobre a lesão, em fundo de sulco, da região da fossa canina até a linha média. Após difusão da mucosa visualizamos a cápsula da lesão e realizamos descolamento por planos em toda sua extensão até total remoção (Figura 5). O conteúdo do cisto era um líquido seroso amarelado e a mucosa nasal foi preservada (Figura 6). Realizada sutura simples. Administrado amoxicilina 1g uma hora antes do ato operatório e prescrito amoxicilina 500mg 8/8 horas por sete dias, diclofenaco sódico 50mg 8/8h por três dias e dipirona sódica 500mg para dor. A peça cirúrgica (Figura 7) foi enviada para exame anatomo-patológico para confirmar o diagnóstico. Os cortes histológicos evidenciaram cápsula cística apresentando epitélio cístico do tipo simples cúbico, com variação para pseudoestratificado, contendo várias células mucosas por toda a extensão. O epitélio dispunha-se planamente, porém com áreas de invaginação para a cápsula e outras focais de estratificação. A cápsula cística era composta por tecido conjuntivo denso não modelado, permeado por hemorragia em quase toda a extensão, somada a áreas de vasos hiperêmicos e alguns contendo neutrófilos polimorfonucleares no interior, completando o quadro a presença de feixes de fibras musculares esqueléticas (Figura 8). O diagnóstico foi de cisto nasolabial. 46 Artigo 01 - Diagnóstico e tratamento do cisto - fluxo 619.indd 46 14/03/13 16:17

CTBMF figura 1 Assimetria do terço médio da face: apagamento do sulco nasolabial, elevação da asa e assoalho do nariz do lado direito figura 4 Exposição da cápsula cística figura 2 Massa flutuante - um fundo de sulco vestibular figura 5 Enucleação da lesão figura 3 Tomografia computadorizada: imagem sugerindo lesão arredondada circunscrita anterior a abertura piriforme, levando a desvio do septo nasal e erosão da maxila do lado direito figura 6 Após a exerese da lesão, note a preservação da mucosa nasal Artigo 01 - Diagnóstico e tratamento do cisto - fluxo 619.indd 47 47 14/03/13 16:18

MONTEIRO FH; NEGREIROS RM; MILANI BA; PALMIERI M; JORGE WA figura 7 Peça cirúrgica figura 9 Aspecto extraoral após um ano da remoção da lesão. Note a definição do sulco nasolabial e simetria da região A paciente evoluiu bem sem complicações, foi feito acompanhamento pós-operatório de sete dias, um mês, três, seis e dez meses e um ano e até o momento sem recidiva (Figuras 9 e 10). Discussão Acredita-se que o cisto desenvolva-se após um evento gatilho, como trauma ou infecção, estimulando os restos epiteliais a proliferar e formar uma lesão cística1,9,18. A paciente no nosso caso relata trauma antigo na região. Os artigos mais recentes sugerem falta de evidências do aprisionamento de epitélio embrionário na região8,13,14,18 e enfatizam a semelhança do epitélio do ducto nasolacrimal (psdeudoestratificado colunar) com o do cisto3,4,11,13,14,18. Alguns casos interessantes como o cisto em um paciente portador de fissura labiopalatina18 e outro em um paciente com inflamação do saco nasolacrimal bila48 figura 8 Corte histológico corado em HE mostrando a cápsula cística com epitélio pseudoestratificado com células mucosas. Gentilmente cedida pela Profa. Dra. Marina Helena Cury Gallotini de Magalhães, professora titular da Disciplina Patologia Bucal - Fousp figura 10 Visão intraoral um ano após o procedimento teral (dacriocistite), associado ao cisto nasolabial bilateral8 devem ser levados em conta, fortalecendo a Teoria de Bruggemann3,8,13,14. A lesão tem crescimento lento e indolor3,8,10,15 e leva a um abaulamento da asa do nariz, elevação do lábio superior, apagamento do sulco nasolabial, elevação do assoalho nasal do lado acometido3,5,6,14, sinais presentes no nosso caso relatado, porém esta paciente não conseguiu relatar o tempo de evolução da lesão. Pode ser confundido com uma lesão inflamatória periapical, devido à imagem radiográfica escassa1, mas mantém íntegra a vitalidade dos dentes8,16. Apesar de edêntula, nossa paciente também relatou sensibilidade na região. Radiograficamente, em alguns casos, podemos observar um abaulamento e afinamento da parede do assoalho da fossa nasal e às vezes até erosão da cortical da maxila2,3,4,13. Alguns autores referem uma mudança na convexidade da margem lateral e anterior Artigo 01 - Diagnóstico e tratamento do cisto - fluxo 619.indd 48 14/03/13 16:18

CTBMF do assoalho nasal 1,4. Em poucos casos pode ocorrer um aumento da radiolucidez no periápice dos incisivos 1,11,14. Lesões pequenas ou recentes não apresentam modificações na radiografia oclusal 1. Pudemos verificar todas essas alterações na radiografia do caso descrito. A tomografia computadorizada e ressonância magnética podem mostrar com maior nitidez a natureza cística da lesão e sua relação com a asa nasal e a maxila 4,14. A preservação do seio maxilar e a erosão óssea são sugestivas de um cisto de tecido mole em detrimento de lesões de origem óssea 17. No caso em questão, a tomografia computadorizada mostrou estes detalhes e contribuiu para a elaboração da hipótese diagnóstica. Pode-se também fazer uso da radiografia com contraste, lembrando-se do risco de infecção 13,14. Chinellato & Damante 1, em 1984, relatam que o contraste tem valor didático, mas não no diagnóstico clínico de rotina. Já a ecografia e a punção são de pouca valia, devido aos achados uniformes 4. Temos ainda como exame auxiliar a nasofibroscopia flexível 6. Com a tomografia computadorizada em mãos pudemos delimitar os limites da lesão, mostrando a natureza da lesão e sua relação com as estruturas adjacentes, não vimos necessidade destes outros exames. Outras lesões que devemos levar em conta no diagnóstico diferencial são: furúnculo 11 e pólipo nasal 2, cistos odontogênicos 4, cistos mucosos e adenomas 16, cistos dermóide e epidermóide 13 e ainda neoplasias sólidas de menor incidência (carcinoma espinocelular e tumores de glândulas salivares menores) 11. Quanto ao tratamento a abordagem clássica é a enucleação da lesão com acesso intraoral, sob anestesia local ou geral 1,8,14,19, realizando a biópsia excisional, mas atualmente alguns autores utilizam a marsupialização 7,9,15,19, na qual acredita-se transformar o cisto em uma espécie de seio paranasal, coberto por epitélio similar ao da cavidade nasal 19. Concordando com outros autores 19, Chen et al. (2009) descreveram o uso de marsupialização através da microdebridação endoscópica, preservando a mucosa, diminuindo o trauma, o tempo operatório e as complicações pós-operatórias mas ressaltam a necessidade de maiores estudos da técnica inclusive quanto a recidiva 7. Por isso, a cirurgia tradicional é mais indicada e segura, com a hipótese diagnóstica levantada clinicamente, optou-se pela enucleação com acesso intraoral sob anestesia local, buscando a resolução do caso em um ato operatório. Durante a enucleação da lesão há o risco de formação de fístula oronasal, devido a proximidade da lesão com a mucosa do assoalho nasal 1,11, pequenas comunicações podem ser deixadas sem nenhuma manobra de síntese, mas as maiores devem ser suturadas no mesmo ato operatório 2, no nosso caso clínico a mucosa nasal foi totalmente preservada. O prognóstico é favorável sem relato de recorrência 14. Quanto à malignização, na literatura há um caso de degeneração carcinomatosa, descrito por Arnold em 1929 3,8 e outro caso de transformação maligna em 1967 8. Apesar de ser uma lesão de diagnóstico clínico, devemos analisar os exames de imagem criteriosamente, evitando o sub-diagnóstico de uma lesão bilateral, e múltiplos procedimentos cirúrgicos 11. Conclusão O cisto nasolabial é raro e possui características clínicas e iconológicas singulares, que o Cirurgião-Dentista deve conhecer para incluir a lesão na hipótese diagnóstica e planejar um tratamento adequado. A lesão tem a resolução simples e segura com a enucleação com acesso intraoral e biópsia excisional, poupando o paciente de passar por dois ou mais procedimentos cirúrgicos. Aplicação clínica O cisto nasolabial na maioria das vezes possui diagnóstico puramente clínico. O artigo traz informações essenciais para não submeter o paciente a intervenções desnecessárias, como endodontia de elementos próximos e múltiplos procedimentos cirúrgicos. REFERÊNCIAS 1. Chinellato LEM, Damante JH. Contribution of radiographs in the diagnosis of nasoalveolar cyst. Oral Surg Oral Med Oral Pathol Oral Radiol Endod 1984;58:729-35. 2. Pereira Filho VA, Silva AC, Moraes M, Villalba H. Nasolabial cyst: case report. Braz Dent J. 2002;13(3):212-4. 3. Felix JAP, Ferreira PLF, Correa R, Cantini R, Neto RM, Feliz F. Cisto nasolabial bilateral: relato de dois caos e revisão de literatura. Rev Bras Otorrinolaringol. 2003 Mar/Abr;69(2);279-82. 4. Aquilino RN, Bazzo VJ, Faria RJA, Leid NLM, Bóscolo FN. Cisto nasolabial: apresentação de um caso e descrição em imagens por TC e RM. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74(3):467-71. 5. Silva AG, Cardoso CC. Cisto de Klestadt (cisto Nasolabial). Rev Port Estomatol Cir Maxilofac. 2008;49(4):233-6. 6. 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