DADOS PRELIMINARES SOBRE PARTÍCULAS SEMELHANTES A VIRUS EM CÉLULAS DE TRIATOMÍNEOS *

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Transcrição:

NOTAS E INFORMAÇÕES/NOTES AND INFORMATION DADOS PRELIMINARES SOBRE PARTÍCULAS SEMELHANTES A VIRUS EM CÉLULAS DE TRIATOMÍNEOS * H. Dolder ** Maria Luiza S. Mello ** RSPUB9/399 DOLDER, H. & MELLO, M. L. S. Dados preliminares sobre partículas semelhantes a virus em células de triatomíneos. Rev. Saúde públ., S. Paulo, 12: 104-9, 1978. RESUMO: Nos tubos de Malpighi de Triatoma infestans Klug e de Panstrongylus megistus Burmeister foram encontradas estruturas víricas distribuídas no citoplasma, no interior de citolissomos ou outros tipos de glóbulos, formando às vezes arranjos para cristalinos envolvidos por membrana, e entre plasmalemas de células contíguas. Outros tecidos dos mesmos insetos apresentam arranjos paracristalinos desses virus. A análise citoquímica ao nível da microscopia eletrônica indica serem estes virus compostos de RNP. Não são encontradas alterações morfológicas drásticas nos tecidos infectados. Admite-se que tais virus tenham sido ingeridos durante uma alimentação de sangue infectado de ave. UNITERMOS: Triatomíneos. RNA, Virus. Histocitoquímica. INTRODUÇÃO Nas células epiteliais dos tubos de Malpighi do Triatoma infestans Klug, à semelhança do que já foi reportado em Rhodnius prolixus Stahl (Wigglesworth e Salpeter 6, 1962) e mesmo em outros grupos de insetos (Sohal 5, 1974), são encontrados glóbulos citoplasmáticos contendo estruturas lamelares e/ou granulações semelhantes a ribossomos (Mello e Dolder 2, 1977). A maioria desses glóbulos, dadas suas propriedades morfológicas, parecem se tratar de citolissomos (Mello e Dolder 2, 1977). Em alguns dos exemplares de Triatoma infestans estudados foram observados glóbulos contendo elevado nmero de grânulos com arranjos especialmente orientados, o que levantou a suspeita de que essas partículas pudessem representar estruturas víricas. Tal motivou a presente investigação, a qual trata de um levantamento mais detalhado de características ultra-estruturais e citoquímicas dessas partículas e de sua distribuição nas células de triatomíneos. * Trabalho subvencionado pela FAPESP (Proc. Biol. 75/907). **Do Departamento de Biologia Celular do Instituto de Biologia da UNICAMP 13100 Campinas, SP Brasil.

MATERIAL E MÉTODOS Foram utilizados tubos de Malpighi, bem como musculatura a eles adjacente, de ninfas e adultos de Triatoma infestans Klug e Panstrongylus megistus Burmeister (Hemiptera, Reduviidae), sem indícios aparentes de anormalidades anatômicas e de comportamento, e criados em laboratório. O material foi fixado durante 3 h em glutaraldeído a 3% em tampão fosfato a ph 7,2 seguido por 1 h de tratamento em ósmio a 1% em tampão fosfato. A inclusão foi efetuada em Epon e os procedimentos de coloração e contraste foram rotineiros. Alguns dos órgãos foram tratados com RNAse "en bloc", anteriormente à fixação. O exame dos cortes foi realizado num ME Hitachi HU 12 de alta resolução. RESULTADOS Parte do material foi submetido ao procedimento de coloração preferencial de Bernhard 1 (1969), que evidencia componentes ribonucleoprotéicos, permanecendo os cortes 45 a 60 min. em EDTA. Tanto em populações de Triatoma infestans como de Panstrongylus megistus são encontrados indivíduos (ninfas e adultos) com tubos de Malpighi portadores de glóbulos citoplasmáticos contendo em seu interior partículas à primeira vista semelhantes a ribossomos (Figs. 1-5, 8-9). O exame mais minucioso das partículas, nos casos especiais em que os glóbulos contêm grande número delas, geralmente com distribuição orientada, porém, revela serem elas maiores do que os ribossomos (Figs. 6 e 8). Após métodos rotineiros de preparo de material para microscopia eletrônica, tais partículas se apresentam mesmo mais eletrodensas do que os ribossomos. Alguns dos glóbulos aparentam tratar-se de citolissomos, contendo em seu interior, inclusive, outras estruturas, tais como arranjos lamelares empilhados (Figs. 1 e 3) e restos membranosos de mitocôndrias (Fig. 4). Em geral essas formações globulares acham-se delimitadas por membrana (Figs. 1-4). Partículas semelhantes às encontradas no interior de glóbulos foram observadas também entre membranas plasmáticas de células vizinhas (Figs. 6 e 7) e formando arranjos paracristalinos em células de outros tecidos (ex.: musculatura) dos mesmos insetos que forneceram os resultados acima descritos (Figs. 10 e 11). Com a utilização do método de Bernhard 1 (1969), foram obtidas imagens que salientam uma zona superficial nas partículas, com caráter eletrodenso, envolvendo uma região central eletrolúcida, de aparência oca (Figs. 6-8). Foram também observadas projeções laterais eletrodensas partindo da superfície dessas estruturas (Fig. 7). O tratamento com RNAse digere a maioria das partículas. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES A observação de que as partículas objeto de estudo deste trabalho podem aparecer contidas não apenas em citolissomos, mas entre plasmalemas de células contíguas, e também sob a forma de arranjos paracristalinos revestidos por membranas, em células de diversos tecidos de um mesmo inseto, indica que elas sejam estruturas víricas e não agregados orientados de ribossomos (corpos cromatóides). Em favor dessa afirmação existe também o fato de que as formações que as contêm não se acham presentes em todas as amostras populacionais de Triatoma infestans e Panstrongylus megistus estudadas. Baseando-se nos resultados obtidos após digestão enzimática com RNAse ou tratamento do material pelo método de Bernhard 1 (1969), ficou demonstrado que os virus em questão contêm RNA, o qual se apresenta distribuído na parte superficial das partículas, pelo menos após o processamento metodológico utilizado.

A presença de virus em células de outros insetos vetores de doenças, aparentemente não afetando os hábitos de alimentação destes últimos nem a duração de suas vidas, já foi constatada por alguns autores (Peleg 4, 1969; Murphy 3, 1975; Wise 7. 1975). Foram mesmo sugeridos mecanismos especiais moduladores da infeccão no inseto (Murphy 3, 1975). No presente caso admite-se que os virus tenham sido inge-

ridos quando da alimentação dos triatomíneos, criados em laboratório, com sangue infectado de ave. Os virus parecem não afetar de modo drástico o tecido infectado. Muitas vezes apenas algumas células num mesmo tubo de Malpighi apresentam-se infectadas, o que também já foi constatado em glândulas salivares de Aedes triseriatus e Culex pipiens infectados com virus de encefalite (Murphy 3, 1975). Investigações adicionais fazem-se necessárias no sentido de classificação dos virus encontrados nos triatomíneos, bem como no sentido de se analisar o comportamento dos insetos ao longo de períodos mais prolongados de infeccão. AGRADECIMENTOS Ao Dr. E. O. Rocha-e-Silva pela doação dos hemípteros e ao Dr. S. Caticha-Ellis, por permitir o uso do ME Hitachi HU-12 do Departamento de Cristalografia do Instituto de Física da UNICAMP. RSPUB9/399 DOLDER, H. & MELLO, M. L. S. /Preliminary data on particles similar to viruses in the cells of triatomines] Rev. Saúae públ., S. Paulo, 12:104-9, 1978. ABSTRACT: Viral particles distributed within cytolysomes or other cytoplasmic globule types, giving rise to membrane enclosed paracrystalline arrays, and between membranes of contiguous cells, were found in the Malpighian tubes of Triatoma infestans Klug and Panstrongylus megistus Burmeister. Other tissues of the same insects also display paracrystalline arrays of these viruses. A RNP composition is assumed for the viruses based on their response to cytochemical methods at the EM level. Drastic morphological changes were not found in the injected tissues. This infection assumed to be promoted by ingestion of a bird infected blood meal. UNITERMS: Triatominae. RNA viruses. Histocytochemistry. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. BERNHARD. W. A new staining procedure for electron microscopical cytology. J. Ultrastruct. Res., 27:250-65, 1969. MELLO, M. L. S. & DOLDER. H. Fine structure of the Malpighian tubes in the blood-sucking insect, Triatoma infestans Klug. Protoplasma, 1977. [no prelo]. MURPHY, F A Cellular resistance to arbovirus infection. Ann. N. Y. Acad. Sci., 266:197-203, 1975. 4. PELEG, J. Inapparent persistent virus infection in continuously grown Aedes aegypti mosquito cells. J. gen. Virol., 5:463-71, 1969. 5. SOHAL, R. S. Fine structure of the Malpighian tubules in the housefly. Musca domestica Tissue & Cell, 6:719-28, 1974. 6. WIGGLESWORTH, V. B. & SALPETER, M. M. Histology of the Malpighian tubules in Rhodnius prolixus Stahl (Hemiptera). J. Insect Physiol., 8: 299-307, 1962. WISE, J. A Comparative effects of viruses on arthropod and vertebrate cells: an introduction. Ann. N. Y. Acad Sci., 266: 195-6, 1975. Recebido para publicação em 07/07/1977 Aprovado para publicação em 14/07/1977.