PROSPECÇÃO TECNOLÓGICA DO USO DO BAGAÇO DE CANA-DE-AÇÚCAR VISANDO A PRODUÇÃO DE ETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO

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Transcrição:

PROSPECÇÃO TECNOLÓGICA DO USO DO BAGAÇO DE CANA-DE-AÇÚCAR VISANDO A PRODUÇÃO DE ETANOL DE SEGUNDA GERAÇÃO Jéssica Guimarães Lopes* 1 ; Kamila Cavalcante dos Santos 2 ; Andréia Alves Costa 3 1, 2, 3 Faculdade do Gama, Universidade de Brasília, DF, Brasil. Rec.: 19.07.2017. Ace.: 05.09.2017. RESUMO A pesquisa sobre produção de etanol de segunda geração é um estudo de grande interesse por parte dos setores envolvidos. Um dos principais motivos é a possibilidade de aumentar a produção de etanol sem a necessidade de aumentar a área plantada, produzindo um combustível com baixa emissão de gases de efeito estufa, contribuindo ainda mais pra diversificação da matriz energética. Dessa forma há a necessidade de se produzir de forma competitiva este etanol de segunda geração, já que suas tecnologias ainda são muito caras e pouco desenvolvidas. Visando compreender a dinâmica deste mercado, a prospecção tecnológica será utilizada nesse trabalho para realizar um monitoramento tecnológico do processo de obtenção de etanol de segunda geração, baseando-se em documentos de patentes e publicações científicas. A metodologia escolhida permitirá a avaliação da distribuição de patentes ao longo do tempo, a identificação dos principais atores no setor e a real situação brasileira no cenário mundial. Palavras-chave: Bagaço de cana-de-açúcar, etanol de segunda geração, prospecção tecnológica. TECHNOLOGICAL PROSPECTION OF THE USE OF SUGAR CANE BAGGAGE AIMING THE PRODUCTION OF SECOND GENERATION ETHANOL ABSTRACT The research on second generation ethanol production is a study of great interest for the sectors involved. One of the main reasons is the possibility of increasing ethanol production without the need to increase the planted area, producing a fuel with low emission of greenhouse gases, contributing even more to the diversification of the energy matrix. Therefore there is a need to produce this second generation ethanol in a competitive way, since its technologies are still very expensive and underdeveloped. In order to understand the dynamics of this market, technological forecasting will be used in this work to carry out a technological monitoring of the process of obtaining second generation ethanol, based on patent documents and scientific publications. The chosen methodology will allow the evaluation of the distribution of patents over time, the identification of the main actors in the sector and the real brazilian situation on world scenario. Keywords: Sugar cane bagasse, second generation ethanol, technology prospecting. Área Tecnológica: Energia Renovável. Biocombustíveis. Prospecção Tecnológica. * Autor para correspondência: jessicaguiimaraes@gmail.com 590

INTRODUÇÃO O mercado energético atual e as condições ambientais presentes no mundo estão mudando a percepção da utilização de combustíveis fósseis em diversas áreas e setores energéticos. Embora o petróleo permaneça como fonte predominante de energia por alguns anos, o incremento de fontes de energia limpa tem seu espaço garantido para desenvolvimento, não só no Brasil, como no mundo. Essa realidade orienta a diversificação da matriz energética através do uso de fontes renováveis de energia e a inclusão da eficiência energética em diversos processos. Através desse pensamento o Brasil vem investindo em novos meios de produzir energia limpa, e o foco principal tem sido nos biocombustíveis líquidos utilizados em veículos, com destaque para o biodiesel e para o etanol. O uso intensivo de etanol no país teve seu início em 1927, passando pelo seu ápice em 1975, quando o Programa Nacional do Álcool Proálcool desenvolveu estudos para a expansão da produção e do uso de etanol combustível a partir da cana-de-açúcar. Desde então, a legislação brasileira estabeleceu que uma porcentagem de etanol seria adicionada à gasolina, e à partir desse momento esse combustível tem contribuído de maneira significativa para a matriz energética do país. À partir da cana-de-açúcar pode-se produzir o etanol de primeira geração, chamado etanol 1G, que tem como matéria-prima o caldo da cana-de-açúcar; e o etanol de segunda geração, chamado etanol 2G, que tem como matéria-prima o bagaço da canade-açúcar. O produto final será o mesmo, com as mesmas especificações. O que os distingue é o processo de obtenção deste combustível. O combustível etanol é obtido pela fermentação de açúcares contidos no caldo de cana-de-açúcar com uso de leveduras. Este é o conhecido processo de primeira geração. Esta matéria-prima agrícola (o extrato da cana, ou o caldo ) apresenta moléculas relativamente curtas, que podem facilmente ser metabolizadas por leveduras (Beta Renewables, 2017). Já os açúcares contidos no bagaço são compostos por moléculas longas e complexas, formadas por polissacarídeos não metabolizáveis por leveduras. A celulose e a hemicelulose, que formam a estrutura do bagaço, são envolvidas por uma matriz de lignina, a qual impede o acesso das leveduras a esses açucares fermentáveis. Dessa forma, estes são os dois problemas a serem resolvidos, que não são encontrados no processo de obtenção de etanol de primeira geração (1G): primeiro, separar a lignina da celulose e hemicelulose; segundo, reduzir estes polissacarídeos em açúcares simples (Beta Renewables, 2017). Com o crescente aumento na demanda por combustíveis alternativos, o etanol tem um campo de expansão bem grande a ser percorrido. Para tal é necessária a expansão de sua produção através das tecnologias existentes para a obtenção de etanol 1G, e novas tecnologias para a obtenção do etanol 2G. Essa necessidade representa uma nova alternativa para uso energético do bagaço, levando a vantagens tanto ambientais, quanto sociais e econômicas. Nesse contexto, a biomassa de cana é a mais promissora, pelo seu elevado volume e pelo menor custo de transporte do bagaço em relação às demais fontes de biomassa, principalmente por sua presença próxima às usinas. É estimado que o etanol 2G aumente a produção de etanol a partir da mesma tonelada de cana-de-açúcar em até 42% (MME, 2017). A combinação das rotas na produção de etanol 1G e 2G permite obter uma maior quantidade de combustível sem aumentar o volume de matéria-prima cultivada. O Brasil é um país privilegiado, por ter em sua matriz energética a maior contribuição de fontes 591

renováveis na oferta interna de energia, e essa vantagem faz com que o país possa crescer economicamente através de uma economia com baixa emissão de gases de efeito estufa. Para que isso ocorra é necessária a elaboração de estratégias que explorem o potencial existente desse mercado. Através da prospecção tecnológica é possível analisar informações passadas e atuais para a elaboração de cenários futuros, os quais possam determinam prioridades para investimentos em pesquisa e desenvolvimento, que favoreçam a compreensão e gerenciamento do risco associado à inovação tecnológica. Além disso, promove a conscientização sobre o uso dos direitos de propriedade intelectual e a melhoria da competitividade de produtos, processos e serviços, entre outras vantagens. Em termos gerais, os estudos de prospecção podem ser definidos como qualquer exploração do que deve acontecer e do que nós devemos querer que venha a acontecer ou como o estudo do futuro para o desenvolvimento de uma atitude estratégica para a criação de um futuro desejável (Mayerhoff et al., 2008). Especificamente, a prospecção tecnológica pode ser definida como um meio sistemático de mapear desenvolvimentos científicos e tecnológicos futuros capazes de influenciar de forma significativa uma indústria, a economia ou a sociedade como um todo (Mayerhoff et al., 2008). Os estudos prospectivos ajudam a diminuir as incertezas e os riscos do futuro, sendo uma ferramenta analítica que lida com o cenário de constantes transformações nos âmbitos social, econômico e ambiental, além da rápida evolução do conhecimento (Teixeira, 2013). Colabora então para um entendimento do que é necessário ser feito no presente para orientar a escolha das melhores oportunidades futuras. Este estudo de prospecção pretende subsidiar decisões futuras para os atores do setor, buscando mapear o caminho do desenvolvimento tecnológico do uso do bagaço de cana-de-açúcar para produção etanol 2G no Brasil. Este mapeamento será feito a partir da análise tendências do patenteamento da produção de etanol a partir do bagaço da cana-de-açúcar, encontradas nos escritórios de proteção industrial. O objetivo é realizar um diagnóstico do estado da arte de determinadas tecnologias, para visualização dos principais detentores das técnicas e inovações vanguardistas, que configuram um importante meio para subsidiar a determinação de políticas de ciência e tecnologia. METODOLOGIA O sistema de busca e análise de patentes Orbit Intelligence foi utilizado neste artigo para a pesquisa de patentes relacionadas ao bagaço de cana-de-açúcar para produção de etanol 2G. A base de dados deste sistema de busca é da FAMPAT, que cobre publicações de patentes que são diariamente atualizadas, com mais de 54 milhões de famílias de patentes e mais de 100 milhões de documentos, com cobertura mundial incluindo o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) onde estão os documentos de patentes registrados no Brasil. A pesquisa avançada foi realizada por meio das seguintes palavras chave: hidrólise, enzima, etanol, bagaço e produção, com o termo hydrolysis and enzym and ethanol and bagasse and production. Em seguida foi realizada a análise dos dados dos documentos de patentes, os quais foram avaliados dentro de cinco perspectivas: (1) ano de publicação, (2) países de primeiro deposito; (3) principais depositantes e (4) domínio tecnológico. 592

O tratamento estatístico foi realizado utilizando a ferramenta analyze, permitindo o cruzamento de dados como depositantes, inventores, agentes, citações, classificações, distribuição geográfica, cobertura temporal, dados de análise semântica, dentre outros. Posteriormente ocorreu a análise para a construção deste artigo que consolida e apresenta as informações recuperadas e analisadas sobre tendências do patenteamento da produção de etanol a partir do bagaço da cana-de-açúcar. RESULTADOS E DISCUSSÃO De acordo com a metodologia estabelecida, foram recuperadas 200 famílias de patentes, distribuídas em escritórios de patentes em mais de 5 países entre 1997 a 2016. A produção de etanol 2G pode ser considerada recente, por ter sua primeira publicação em 1997. O Gráfico 1 traz a distribuição dos resultados encontrados com os termos de busca por ano. Gráfico 1 - Distribuição dos resultados obtidos com os termos de busca selecionados por ano (anos prioritários). Os anos com maior concentração de depósitos para o termo de busca em questão estão entre 2006 e 2012, que corresponde ao período de expansão recente da produção sucroenergética canavieira no Brasil. Nota-se que para o período em questão foram depositados um total de 110 documentos de patentes, o equivalente a mais de 50% de todos os documentos analisados. Dentre as 36 famílias de patentes, observadas no Gráfico 2, duas chamam a atenção, com nacionalidade principal de firmas ou pesquisadores brasileiros. Os documentos de patente foram disponibilizados ao público tornando-se, consequentemente, parte do estado da técnica. A Petrobras foi uma depositante, apresentando o documento BRP0605017-A, com data de depósito de 30/11/2006 e de publicação 15/07/2008, cujo título é: Processo para a produção fermentativa de etanol a partir de material lignocelulósico sólido compreendendo um passo de tratamento de um material lignocelulósico sólido com solução alcalina para remover a lignina. Refere-se a um processo para a obtenção de etanol combustível, utilizando resíduos agrícolas e agroindustriais, compostos de 593

lenhocelulose, e especialmente bagaço de cana-de-açúcar. Estes resíduos têm um conteúdo significativo de carboidratos sob a forma de polissacarídeos (celulose e hemicelulose), que podem ser hidrolisados por processos químicos e enzimáticos. A fração de hemicelulose é submetida à hidrólise suave com ácido sulfúrico e o material sólido desta hidrólise é submetido a um processo de sacarifação (hidrólise enzimática) com fermentação alcoólica rápida simultânea em condições que permitem um aumento significativo na conversão para o álcool, em grande quantidade e em tempo reduzido. Gráfico 2 Distribuição dos resultados obtidos com os termos de busca selecionados por país de origem (país de publicação). O outro documento BRPI0801763, com data de depósito 25/04/2008 e de publicação 28/01/2009, é propriedade da Evonik Industries, uma empresa multinacional com sede na Alemanha. O título do documento é Processo para a hidrólise enzimática de lignocelulose quimicamente pré-tratada, e refere-se à preparação do hidrolisado contendo açúcar a partir de materiais lignocelulósicos que compreende um prétratamento do bagaço, com um composto químico específico na presença de água, o qual disponibiliza os açúcares para fermentação, e facilita assim a obtenção do etanol 2G. Esses documentos representam marcos do processo de produção desse combustível utilizando o bagaço de cana-de-açúcar, e se destacam entre as demais patentes. 594

As outras nacionalidades das famílias de patentes podem ser visualizadas no Gráfico 3. Esse apresenta apenas os autores principais, excluindo as co-titularidades. É importante frisar que, com a distribuição das nacionalidades dos depositantes, não é possível identificar em quais países há maior desenvolvimento de pesquisas com etanol 2G, pois os participantes que atuam neste mercado têm centros de pesquisa em países distintos. Gráfico 3 Distribuição dos resultados obtidos com os termos de busca selecionados por país de origem (país prioritário). A informação tecnológica presente em um documento de patente permite observar, com maior exatidão, os países com desenvolvimento tecnológico mais expressivo em um determinado setor. Este é identificado como o país de prioridade desse documento, o qual representa o local onde foi efetuado o primeiro depósito de patente para a referida tecnologia no mundo (Biaggi et al., 2015). Nesse contexto, a Petrobras apresentou uma família significante de patentes depositadas, tendo como país de prioridade o Brasil. Essa informação coloca o Brasil como um mercado de destaque na produção de etanol 2G no mundo. Gráfico 3 - Relação dos principais depositantes de pedidos de patente. 595

O Gráfico 4 descreve a situação atual dos documentos pesquisados. Cada publicação recebe um código de despacho, que corresponde à decisão dada a um determinado pedido de patente em uma determinada data. Com esse código é possível identificar o status do documento como sendo: pedido pendente ; pedido vencido ; pedido prescrito ; pedido arquivado e patente concedida. Com relação ao documento de titularidade brasileira constatado na pesquisa, cuja principal depositante é a Petrobras, o status encontra-se com classificação patente concedida. Gráfico 4 - Estágio atual dos documentos de patentes pesquisados a partir dos termos de busca selecionados. 596

O Gráfico 5, refere-se às principais classes de pedidos de patentes selecionadas na etapa de busca, segundo a Classificação Internacional de Patentes (CIPs). A CIP, ou IPC (International Patent Classification), estabelece um sistema hierárquico de símbolos para a classificação de Patentes de Invenção e de Modelo de Utilidade de acordo com as diferentes áreas tecnológicas. Ela é adotada por mais de 100 países e coordenada pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual (Emerick et al., 2007). Gráfico 5 - Distribuição das principais CIPs dos documentos de patente pesquisados a partir dos termos de busca selecionados. Os documentos de titularidade brasileira, levantados na pesquisa, estão classificados como C12P e C12R. A classificação C12P é referente à fermentação ou procedimentos de utilização de enzimas para composto químico desejado ou composição, ou para separar isômeros ópticos de uma mistura racêmica (ESPACENET, 2017). Já a classificação C12R é referente à levedura a Saccharomydes Cerevisiae. Ambos documentos estão relacionados às etapas de identificação e separação dos açúcares, hidrólise e fermentação dos açúcares para a produção do etanol 2G, as quais são fundamentais no processo de obtenção desse combustível. Uma análise da Figura 1 ratifica o conteúdo principal das famílias de patentes relacionadas neste artigo, que segue a lógica da classificação internacional de patentes. A maior participação está nos temas de sequência de aminoácidos, microrganismo, hidrólise enzimática e álcool etílico. 597

Figura 1. Conteúdo principal das famílias de patentes. Este trabalho mostra que o Brasil se destaca no cenário mundial de produção de etanol 2G, apresentando tendências do patenteamento ligadas principalmente aos aspectos da produção do combustível. CONCLUSÃO A pesquisa desenvolvida neste artigo permitiu verificar, a partir da busca de famílias de patentes com os termos selecionados com o software Questel-Orbit, a relevância da pesquisa envolvendo etanol 2G, à partir do bagaço de cana-de-açúcar, nas principais bases de proteção industrial do mundo. Estas pesquisas são uma importante ferramenta para o diagnóstico do estado da arte de determinadas tecnologias, para visualização dos principais detentores das técnicas e inovações vanguardistas e configuram um importante meio para ajudar na determinação de políticas de ciência e tecnologia em várias esferas de governo. O levantamento preliminar dos documentos de famílias de patentes estudadas permitiu apontar aspectos importantes sobre as iniciativas de pesquisa e desenvolvimento na área em questão. A tecnologia de produção de etanol a partir do bagaço de cana-de-açúcar é recente em todo o mundo, tendo seu desenvolvimento se tornado mais expressivo somente nos últimos 20 anos. Esta tecnologia permeia diversos campos científicos e tecnológicos, principalmente nas áreas de química e bioquímica, em função da alta complexidade tecnológica envolvida no processo. REFERÊNCIAS Biaggi, D.E, Piacente, F.J, Silva, V.C. Produção de etanol de segunda geração a partir da cana-deaçúcar: estudo de prospecção de patentes. X WORKSHOP DE PÓS- GRADUAÇÃO E PESQUISA DO CENTRO PAULA SOUZA. São Paulo, 2015. BETA RENEWABLES, (http://www.betarenewables.com/pt/proesa/o-que-e-proesa), 2017. Emerick, M.C., Montenegro, K.B.M. e Degrave, W.Novas tecnologias na genética humana: avanços e impactos para a saúde. Rio de Janeiro: GESTEC-Nit, 2007. 598

ESPACENET, (https://worldwide.espacenet.com/classification?locale=en_ep#!/cpc=c12p13/08), de 2017. Mayerhoff, D.V.L, Z. Uma Análise Sobre os Estudos de Prospecção Tecnológica. Cadernos de Prospecção. Vol. 1, nº 1. Pág. 7-9. 2008. Instituto Nacional da Propriedade Industrial. MME, Ministério de Minas e Energia. RenovaBio: Diretrizes. Proposta Submetida à Consulta Pública. 2016. Teixeira, L. P. Prospecção Tecnológica: importância, métodos e experiências da Embrapa Cerrados. 2013. Embrapa Cerrados, Planaltina-DF. 599