Palavras-chave: Política Externa Brasileira; Governo Lula; Autonomia pela Assertividade



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Transcrição:

POR UMA AUTONOMIA ASSERTIVA: CONTINUIDADES E MUDANÇAS NA POLÍTICA EXTERNA DO GOVERNO LULA (2003-2010) EIRAS,André Luis Silva. Mestrando em Relações Internacionais e Desenvolvimento no Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da UNESP/Marília. Resumo A política externa brasileira teve vários períodos marcantes em sua história contemporânea. No imperial observamos as aspirações nacionais para a construção da soberania e do imaginário nacional e uma tentativa de consolidar suas fronteiras nacionais. Encontramos, logo depois, uma transição do modelo agroexportador para um desenvolvimentista, o qual destaca a política externa gerenciada pelo Barão do Rio Branco, no início do século XX, a de Getúlio Vargas durante a Segunda Guerra Mundial e o período da chamada Política Externa Independente, nos governos de Jânio Quadros e de João Goulart. Em seguida um longo período de governo militar, durante 1965 a 1985, e logo após o retorno à democracia. No período de consolidação do sistema democrático, houve forte reversão de paradigmas tradicionais, principalmente durante a década de 1990, por onde o país necessitava adaptar-se a uma nova ordem global. Durante o governo Lula da Silva tivemos um novo período, marcado por uma política externa de afirmação e desafio às grandes potências com ênfase na chamada Diplomacia Sul-Sul e a criação de um paradigma distinto para a política externa brasileira. Este trabalho pretende analisar as principais mudanças adotadas pelo Governo de acordo com o conceito de Autonomia pela Assertividade, com a premissa básica de uma política externa mais afirmativa para a defesa dos interesses brasileiros, principalmente via alianças Sul-Sul, perante os demais países no sistema internacional. Palavras-chave: Política Externa Brasileira; Governo Lula; Autonomia pela Assertividade Introdução Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 1

A política externa brasileira, traçada historicamente pelo seu corpo diplomático, junto com os dirigentes políticos, teve vários períodos marcantes em sua história contemporânea. No imperial observamos as aspirações nacionais para a construção da soberania e do imaginário nacional e uma tentativa, ainda que preliminar, mas já com intenções definitivas, de consolidar suas fronteiras nacionais em um único país, ao contrário do que ocorreu nas antigas colônias espanholas na América. Encontramos, logo depois, uma transição do modelo agroexportador para um desenvolvimentista, o qual destaca a política externa gerenciada pelo Barão do Rio Branco, no início do século XX, a política externa de Getúlio Vargas durante a Segunda Guerra Mundial e o período da chamada Política Externa Independente (PEI), nos governos de Jânio Quadros e de João Goulart. Em seguida verificamos um longo período de governo militar no país, durante meados de 1960 a meados de 1980, com o retorno à democracia e a consolidação do governo democrático na década de 1990. Durante o período militar é destacada uma política desenvolvimentista, com uma intensa busca de inserção do Brasil no competitivo contexto internacional do período, cuja diplomacia brasileira desenvolve fortes contatos internacionais, colocando-se em posição significativa de força e respeito no cenário mundial. Já no período de consolidação do sistema democrático, houve forte reversão de paradigmas tradicionais, principalmente durante a década de 1990, por onde o país necessitava adaptar-se a uma nova ordem global, com novas prioridades e formas de ação, como abertura incondicional e algumas reversões de prioridades por uma adequação mundial. Quando Luis Inácio Lula da Silva foi eleito, em 2002, a sociedade brasileira vivenciava o fato de que o país consolidara seu processo democrático, com a ascensão da esquerda ao poder, tendo como líder um ex-metalúrgico. Sua diplomacia passou a ser conduzida por diplomatas que começaram suas carreiras em plena PEI, e tiveram suas primeiras aspirações ainda no modelo diplomático do Pragmatismo Responsável e Ecumênico 1 do governo Geisel, durante o regime militar. Lula assume o poder em 2003 debaixo de grande tensão econômica, devido à desconfiança do mercado, principalmente do FMI, em relação a um governo de esquerda, 1 Rótulo que definia a nova estratégia de execução da política externa brasileira, conduzida pelo Chanceler Azeredo da Silveira, entre 1974-1979. Caracterizou-se por uma atuação mais autônoma, buscando maximizar o poder nacional no plano mundial. Ficou marcada por sua posição independente em relação aos EUA, devido as aproximações com os países árabes e o Japão, por exemplo, e relações comerciais mais próximas com a China e com a Alemanha. Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 2

tendo em vista que o partido de Lula, o Partido dos Trabalhadores (PT), desde sua origem teve um discurso contrário às instituições financeiras internacionais. A equipe econômica manteve, entretanto, a mesma linha do governo anterior, com política monetária de juros altos e controle da inflação, acalmando, assim, o mercado. Na academia ocorreram intensos debates na área de Relações Internacionais sobre a nova formulação de política externa, tendo de um lado intelectuais sustentando o jeito presidencialista de se fazer politica de Fernando Henrique Cardoso, e de outro pensadores de esquerda, demonstrando que as mudanças são essenciais para reivindicar espaços de poder no cenário internacional. Para responder e dar suporte a essas indagações, nossa hipótese é a de que há viabilidade de classificar e enquadrar o período histórico da política externa brasileira dentro da lógica do conceito de autonomia pela assertividade 2. Sustentamos que o conceitos anteriores distância, integração e diversificação não expressa adequadamente a política externa brasileira durante o governo Lula, fazendo necessário, portanto, cunhar este novo conceito. Nesse sentido, assertivamente, a diplomacia brasileira sob a gestão Lula passou a defender a adesão do país aos princípios e às normas internacionais por meio de alianças Sul- Sul, revivendo discursos e mecanismos políticos ligados ao universalismo da PEI, com ampla e irrestrita defesa do multilateralismo, e identificados com o movimentos dos países não alinhados durante os anos 1960 a 1980. Segundo a perspectiva da diplomacia lulo-petista, esses realinhamentos serviriam para reduzir as assimetrias nas relações externas com países mais poderosos, permitindo assim aos países em desenvolvimento, incluindo o Brasil, a falar mais alto, bater na mesa, criando assim condições abstratas e práticas sem consequências maiores para um exercício mais assertivo dos interesses nacionais. A dimensão prática desse exercício intelectual, ideológico e político pode ser encontrada no protagonismo brasileiro na formação do G-4 visando a reforma da ONU; na criação do G-20 agrícola; na criação do G-20 financeiro; na aproximação com países africanos e árabes, na discussão sobre a questão da segurança internacional envolvendo material atômico; no enfrentamento com os Estados Unidos, principalmente na discussão sobre a ALCA; na criação do Fórum IBAS; a atuação conjunta no BRICS com apoio a entrada da Rússia e da China na OMC; etc. 2 O conceito autonomia pela assertividade está sendo construído na atual pesquisa de mestrado em conjunto com o orientador, Prof. Dr. Marcelo Fernandes de Oliveira. Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 3

Outra mudança prática significativa trata-se da disposição do governo Lula em arcar com os custos do exercício da sua liderança na América do Sul por meio da proposta da ALCSA, onde desempenhou papel proeminente para a solução pacífica de crises regionais, agindo como liderança sul-americana orientada a busca de um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Os custos reais dessa empreitada ainda não foram adequadamente medidos, entretanto, ela contribuiu para ampliar as tensões de vários vizinhos contra o Brasil em torno de questões específicas. Em nossa hipótese, portanto, a política externa do governo Lula buscou muito mais abrir espaços políticos entre países de menor poder relativo e países em desenvolvimento para neles efetuar um uso irrestrito da assertividade como norma da afirmação dos interesses externos brasileiros. Ela pode ser resumida em três pontos principais: primeiramente, seu reforço permitiria uma gestão democrática do sistema internacional e, em segundo lugar, o multilateralismo político tenderia a reforçar o econômico, pois ambas as esferas estão interligadas. Por último, uma antiga aspiração de o Brasil obter um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU, como representante da América do Sul, baseado no vínculo entre a paz, o desenvolvimento e a justiça social. O Conceito da Autonomia pela assertividade A política externa é um importante componente da estratégia de desenvolvimento dos Estados, uma vez que consiste em um instrumento efetivo na defesa dos interesses nacionais diante outros países. É também objeto de muitos estudos e análises por pesquisadores da área que se concentram em identificar as linhas gerais das políticas praticadas pelos Estados e das suas alterações conforme cada governo que, na maioria das vezes, insere traços de inovação com consequentes mudanças. A ascensão de Lula ao poder despertou atenção da comunidade científica. Pois, sob o discurso da mudança, parcela considerável da população foi mobilizada em torno de expectativas criadas por um discurso que exaltou a necessidade de imprimir transformações à atuação política brasileira. Nessa direção, a política externa também passou por uma revisão em seus principais pontos de atuação. Demandando dos analistas a elaboração de novos conceitos capazes de expressar o momento. Uma perspectiva interpretativa das linhas da política externa adotada pelo Brasil passa pela avaliação do grau de autonomia apresentado pelo país em suas ações políticas internacionais. Isso porque a ideia de autonomia tornou-se um componente central no Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 4

pensamento da diplomacia brasileira. Historicamente, é possível detectar momentos de maior ou menor autonomia do país no cenário internacional, intrinsecamente relacionado a este contexto mais geral de interação entre os Estados. Em uma definição simplificada e mais superficial, pode-se resumir que o grau da autonomia tende a variar nos períodos em que o Brasil esteve mais próximo ou mais afastado da zona de influência de uma potência hegemônica, que dominou o sistema internacional durante blocos históricos. O conceito de autonomia se relaciona então diretamente com a conjuntura do sistema internacional no período analisado. Logo, seja em um contexto unipolar, multipolar ou apolar, o grau de autonomia usufruído pelos países, sobretudo periféricos, tende a variar ao longo da história. Os três principais conceitos que se encaixam na classificação da política externa brasileira dos últimos trinta anos na perspectiva conceitual da autonomia. São eles: autonomia pela distância ; autonomia pela integração ; e autonomia pela diversificação. Para caracterizarmos este novo conceito é preciso identificar algumas características da política externa brasileira no período de 2003 a 2010. Posteriormente, retomaremos a relação entre o Partido dos Trabalhadores e a política externa do governo Lula, apresentada no primeiro capítulo do presente estudo, utilizando como base as informações ali destacadas e relacionando-as com os novos questionamentos que surgirão a partir de agora. Como visto anteriormente, a autonomia pela distância sugere que a opção da diplomacia brasileira pelo não-alinhamento automático aos regimes internacionais dominantes da Guerra Fria, serviu para preservar a soberania nacional definida como interesses da coalizão nacional desenvolvimentista, caracterizada pelo processo de industrialização. O momento histórico no qual ela prevaleceu foi o regime militar (FONSECA JR., 1998). Já a autonomia pela integração sugere que a postura brasileira sofreu alterações e passou a adotar uma nova estratégia que teve como base o alinhamento aos regimes internacionais vigentes, requerendo a participação do Brasil para buscar influenciá-los e, portanto, participar na formulação das regras e dos princípios reguladores do sistema internacional (VIGEVANI; OLIVEIRA, 2007). A prática da autonomia pela integração teria ocorrido durante o governo Collor e os dois governos de Fernando Henrique Cardoso. No tocante à autonomia pela diversificação, os autores defendem a perspectiva de que o Brasil buscou aderir aos princípios e às normas internacionais por meio de alianças Sul- Sul, inclusive regionais, e de acordos com parceiros não tradicionais (China, Ásia-Pacífico, África, Europa Ocidental, Oriente Médio etc.) (VIGEVANI; CEPALUNI, 2008: p. 283), Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 5

diversificando assim seu relacionamento internacional. Esse padrão comportamental caracterizaria a política externa do governo Lula. Porém, ao analisarmos tais informações, ficou claro haver nessa construção conceitual alguns equívocos significativos, conduzindo-nos a refletir sobre a sua pertinência conceitual para a classificação da política externa brasileira no período citado. Como resultados dessa reflexão, algumas indagações surgiram, as quais serviram de base para clarificar nosso problema, estabelecer nossas hipóteses e, por conseguinte, definir nossos objetivos. De acordo com Ricupero (2010), a política externa do governo Lula concentrou-se em quatro principais eixos de atuação: a) a busca pelo reconhecimento do Brasil como ator político global de primeira ordem; b) a consolidação de condições econômicas internacionais que favorecessem o desenvolvimento das vantagens comparativas no setor da agricultura; c) o reforço das relações Sul-Sul; d) a consolidação de um espaço político-estratégico e econômico-comercial sul-americano. Estes objetivos, como se pode observar pelo próprio conteúdo, são pontos tradicionais da diplomacia brasileira. O que difere substancialmente é a ênfase conferida a certos pontos e o enfoque diferenciado em outros, que a administração petista imprimiu a tais eixos de atuação. Dessa maneira, cabe avaliar a origem dessas alterações, ou seja, os motivos que fundamentaram a nova estratégia de inserção internacional brasileira durante o governo Lula. Em determinados casos, deve-se à percepção aguçada das oportunidades. Em outros momentos, fruto de alterações na dinâmica do sistema e do jogo de forças, bem como de circunstâncias políticas e econômicas configuradas no período. Por outro lado, pode também relacionar-se às inovações doutrinárias impostas pelo partido ao qual o governo esteve atrelado. Em todo caso, um estudo mais detalhado de acontecimentos polêmicos e das ações mais expressivas da política externa durante a gestão Lula, nos permitirá identificar a base concreta da diplomacia destes últimos anos. A busca por projeção internacional do Estado brasileiro é um objetivo concreto de nossa diplomacia. É de fato com este intuito que se tentou ao longo dos anos consolidar uma linha de ação externa. Isso foi, em grande parte, alcançado pela valorização de princípios que se consagraram como inerentes à atuação diplomática brasileira, como, por exemplo, o respeito à autodeterminação dos povos e a não intervenção. Logo, ao criar esta imagem de Estado coerente, buscava-se também obter o reconhecimento das demais nações do papel desempenhado pelo Brasil, de cooperativo nos grandes temas da agenda internacional, e despertar a atenção para o que poderia ainda vir a ser feito. Em outras palavras, ser cotado a Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 6

ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU no processo de reforma institucional. No governo Lula, entretanto, esta busca por reconhecimento tomou proporções maiores. A proposta de democratização das relações de poder do sistema internacional foi uma das principais bases sobre as quais se desenvolveu a política externa do governo Lula, na esperança de que quando concretizada, legasse ao Brasil um assento permanente no Conselho. Passando a guiar as principais ações da diplomacia brasileira, visando a reorientar o foco das atenções para o país de maior destaque da América Latina. Não bastando suas proporções territoriais e econômicas acima dos demais vizinhos, o Brasil sob a gestão Lula tornou-se destaque nos principais foros multilaterais, através de uma atuação bastante ativa. Com este mesmo intuito, o reforço das relações Sul-Sul se concretizou como uma estratégia de criar alternativas ao eixo Norte-Sul, limitado ao interesse das grandes potências. Essa busca por coordenação, ensaiando uma governança global mais justa, traduziu-se nas alianças que o Brasil criou com países emergentes, tais como o BRICs, o IBAS e a Unasul, e a relevante atuação no G-20 agrícola e financeiro. Neste sentido, Ricupero (2010, p. 30) ressalta que o Brasil tornou-se efetivamente o representante da América Latina nesses grupos. Não por acaso eles reúnem os membros permanentes do Conselho de Segurança (China e Rússia) e os aspirantes a essa posição que têm em comum a circunstância de não serem aliados dos Estados Unidos na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Seria uma espécie de clube dos candidatos naturais ao reconhecimento de um status internacional mais elevado em cada um dos três continentes: Índia (Ásia), África do Sul (África) e Brasil (América Latina). Estas alianças, ainda que altamente questionáveis do ponto de vista da sua efetividade, despertaram o pragmatismo do Estado brasileiro, adormecido desde o período desenvolvimentista. Ainda que não tenham produzido tantos ganhos reais, além de documentos e resoluções genéricas, aproximou o Brasil das principais nações emergentes e o colocou em destaque nas grandes discussões do século XXI. Soma-se a isso o exercício desenfreado de uma diplomacia presidencial, calcada na personalidade carismática e popular de Lula. Porém, a linha entre pragmatismo e comportamento arriscado é bastante tênue. A busca exagerada por reconhecimento condicionada pela crença no declínio hegemônico dos EUA e a conseqüente criação de um vácuo de poder, fizeram com que a política externa no Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 7

período analisado se afastasse em determinados momentos de seu comportamento e suas bases tradicionais. Atitudes consideradas polêmicas permearam a gestão petista também no que tange à política externa. Ao assumir a missão de paz da ONU no Haiti (MINUSTAH) em 2004, o envolvimento brasileiro foi questionado com relação ao ônus 3 desta nova empreitada, além de relatos de abusos sexuais e desrespeito aos direitos humanos, contribuindo negativamente para a imagem do país. Outros casos que se destacam: o apoio constante a Cuba; a simpatia por Hugo Chavez; a passividade diante da nacionalização da Petrobras pelo governo boliviano, resultando na perda de um investimento de mais de US$1,5 bilhão; a intervenção em Honduras no golpe de 2009, ao abrigar o presidente deposto na embaixada brasileira. Mais ao fim do governo, a aproximação com o Irã na questão nuclear e a abstenção em resoluções da ONU que condenavam violações de direitos humanos neste país; a tentativa de mediar a questão delicada entre israelenses e palestinos, são exemplos que nos fazem refletir. A partir desta análise, algumas perguntas naturalmente surgem: de onde viria então a orientação para tais ações, se não expressam fielmente a postura que o Brasil tradicionalmente adotou ao longo de seu passado diplomático? Qual a característica definidora desse novo período da política externa brasileira? Desde o início o PT declarou sua vinculação política internacional com as causas dos povos e dos países oprimidos. Atualmente, são aqueles atores do eixo sul-sul, chamados de países em desenvolvimento e, também, de países de menor desenvolvimento relativo. Mais recentemente, diante da complexidade do cenário internacional nos últimos anos, o PT reafirmou suas teses tradicionais no campo da política internacional sobre a necessidade de criar uma linha de ação autônoma da política externa brasileira amalgamada com os interesses dos países menos desenvolvidos para: a) defendê-los dos ataques da oposição de direita, b) garantindo a predominância dos interesses públicos e pró-integração, c) estimulando um viés latino-americano e caribenho, d) realizando a crítica ao comportamento imperialista das metrópoles, e) construindo a dimensão popular e cultural do internacionalismo e da integração, f) articulando assim esta política externa com o objetivo socialista da esquerda (PT, 2010). 3 Até 2009, de R$574.914.065,51 para o Brasil. Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 8

A partir de 2003, após Lula assumir a Presidência da República, teve início a concretização programática da política internacional do PT na política externa do governo brasileiro. Já no seu discurso de posse, Lula deixou claro que aprofundaria as relações com grandes nações em desenvolvimento: a China, a Índia, a Rússia, a África do Sul, entre outros. Novamente, em documento mais recente, o PT sinalizou que o governo Lula e sua diplomacia tem como diretriz privilegiar e fortalecer as relações sul-sul, por intermédio do estreitamento de relações com as potências médias como a Índia, África do Sul, Argentina, entre outras; com os países da América do Sul; com os países africanos e com os países árabes. Entre os instrumentos utilizados, podemos citar: o Acordo IBSA (Índia Brasil África do Sul); as reuniões do grupo BRIC (Brasil Rússia Índia China); o G20 comercial; os encontros entre países árabes e sul-americanos e entre países africanos e sul-americanos; as cúpulas ibero-americanas; as relações bilaterais específicas e, por fim, os acordos de integração regional Mercosul e Unasul (PT, 2010). Neste sentido, o protagonismo da ação brasileira em diversas questões internacionais, tais como a oposição à invasão americana do Iraque, as contribuições para solucionar o conflito entre israelenses e palestinos, a campanha fome-zero internacional, a atuação em Honduras, a missão de paz no Haiti, o apoio à reintegração de Cuba no sistema interamericano, as posições defendidas pelo Brasil no Conselho de Direitos Humanos da ONU, a defesa do direito de desenvolvimento de tecnologia para o uso pacífico da energia nucelar, etc, são posturas que dão significado à atuação diplomática brasileira durante o governo Lula na lógica da assertividade. Uma análise superficial dos resultados dessas iniciativas permite-nos afirmar que ao direcionar o foco para relações com países de proporções iguais ou mais modestas que a do Brasil, a diplomacia brasileira sob o governo Lula busca exercer um poder político internacional que, de fato, o país não possui. Busca, dessa maneira, impor um exercício de afirmação dos interesses nacionais brasileiros de modo mais assertivo exclusivamente pelo fato de que só o faz em espaços políticos internacionais, nos quais as grandes potências internacionais não atuam. Satisfaz, assim, a interesses particulares e partidários com ações internacionais assertivas para continuar desenvolvendo o mesmo projeto de país iniciado nos anos 1990 e aprofundado durante o governo FHC no âmbito doméstico. Logo, o exercício da autonomia Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 9

pela assertividade parece mais ser uma estratégia política do que efetivamente caracterizar profundas alterações na condução da política externa brasileira. Além disso, esse novo modelo de comportamento, na prática, tem trazido prejuízos significativos para uma inserção internacional de qualidade do país. Devido a essa motivação, podemos considerar que os últimos anos da política externa brasileira estão impregnados de motivações ideológicas e partidárias com origem no PT. É, por este motivo, inviável trabalhar a política externa do período Lula sem levar em consideração o peso que o Partido dos Trabalhadores exerceu nas decisões e ações do governo. É também importante demonstrarmos que a propalada autonomia pela diversificação não passa de uma ilusão de ótica, visto que o processo de diversificação dos relacionamentos externos brasileiros já vem sendo implementado, pelo menos, desde os anos 1950. Portanto, a atual política externa brasileira sob o comando da diplomacia lulo-petista caracteriza-se, de maneira mais adequada, como um exercício de autonomia pela assertividade. Em outras palavras, constitui em um padrão de inserção internacional que privilegia relacionamentos com países do eixo sul-sul, entre os quais o Brasil, sob o comando de Lula, pode efetivamente exercer alguma liderança, se auto-iludindo com um protagonismo internacional irreal que poderá legar para a sociedade brasileira prejuízos futuros consideráveis. De fato, a política externa brasileira viveu momentos de glória ao participar de iniciativas bastante positivas, como por exemplo a busca pela redemocratização do sistema internacional. No entanto, caminhando para o término da gestão e fruto, talvez, de excessiva autoconfiança, fomentada pelo êxito em diversos setores do governo e do alto grau de popularidade desfrutado pelo ex-presidente Lula, graves equívocos foram cometidos. O conhecimento dos avanços e do sucesso contribuiu para uma atuação cada vez mais afirmativa e assertiva na tomada de decisões e na escolha das estratégias da diplomacia brasileira. foi Segundo Amorim (2010), o maior acerto da política externa assertiva do governo Lula (...) apostar que o Brasil não poderia ter uma postura meramente reativa no mundo. Precisávamos trabalhar para ajudar a transformar a realidade internacional. Escolhemos colocar em marcha uma política externa não somente "ativa e altiva", mas também "criativa". Foi o que fizemos capitaneando ou apoiando uma série de iniciativas transformadoras, como o G20 da OMC, o Fórum Índia-Brasil-África do Sul (IBAS), o BRIC ou a Unasul. Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 10

Como podemos perceber nas palavras de Amorim, durante o governo Lula, a diplomacia brasileira alterou seu padrão de inserção internacional. De uma perspectiva de perfil moderado, conciliador, como foi no período FHC, a diplomacia no governo Lula chamou para si a responsabilidade de conduzir uma política externa de alto relevo. Assumindo a função de promover a defesa dos interesses nacionais brasileiros com mais efetividade, com maior capacidade, com maior assertividade, sobretudo à frente de coalizões internacionais basicamente compostas por países em desenvolvimento e/ou menor desenvolvimento relativo. Significa afirmar que a política externa do governo Lula com altivez, muita atividade, criatividade e assertividade decidiu demonstrar ao mundo a capacidade do Brasil de ser líder dos países menos favorecidos no sistema internacional vis-à-vis aos países desenvolvidos do mundo. A pesquisa realizada até aqui indica que essa nova postura na condução da diplomacia brasileira é resultado da combinação do pensamento tradicional do Partido dos Trabalhadores sobre a política internacional que, operacionalizado no governo Lula, consolidou um modelo de inserção internacional que caracterizaremos como autonomia pela assertividade. Portanto, como já afirmamos acima, na nossa avaliação, a política externa do governo Lula busca muito mais abrir espaços políticos entre países de menor poder relativo e países em desenvolvimento para neles efetuar um uso irrestrito da assertividade como norma da afirmação dos interesses externos brasileiros. Desta forma, visaria fomentar a existência de um grande país que, de fato, não existe na cena internacional nesse início de século XXI. A partir desta análise, o que fica evidente é que a política externa durante o governo Lula foi utilizada enquanto instrumento de projeção particular do ex-presidente, de seu partido e dos companheiros que apoiaram as iniciativas, principalmente o ex-chanceler Celso Amorim. O Itamaraty, afamadamente conhecido por sua tradição e visões objetivas na atuação diplomática, foi instrumentalizado equivocadamente, ao se levar em consideração os fracassos políticos que destoam de sua linha de atuação e a constante discordância de seus diplomatas e embaixadores. Isso tudo indica que a administração petista, ao criar uma agenda política própria, esforçou-se nestes objetivos com o intuito de que fossem concretizados nos anos compreendidos por sua gestão, para assim poderem triunfar e contar vantagens de uma suposta competência acima da média. Isso explica o engajamento na conquista do assento Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 11

permanente no Conselho das Nações Unidas e o protagonismo brasileiro na Rodada Doha, o qual não contribuiu efetivamente na solução dos problemas do comércio internacionais, entre outros exemplos. Fato é que limites foram ultrapassados e o Brasil teve sua imagem prejudicada diante de equívocos significativos. Mesmo a tão divulgada priorização da América do Sul pelo governo é passível de críticas, uma vez que nada de concreto foi feito para retomar o Mercosul ou para mediar conflitos de interesses entre os vizinhos Uruguai e Argentina e, portanto, exercer a liderança tão desejada. Diante disso, os fatos levam a crer que o discurso eleitoral foi positivo, porém distorcido ao longo dos anos seguintes. O exercício da autonomia pela assertividade baseado na ideologia lulo-petista poderá deixar passivos consideráveis para uma inserção internacional de maior qualidade do Brasil nesse início de século XXI, permitindo, a partir dessa definição conceitual, análises mais distantes e menos engajadas. Papel internacional do Brasil O Brasil, ao contrário da maioria dos países, tem sua política internacional voltada para o pacifismo e o não uso da força externa. Em sua história, o país não tem grandes guerras travadas com exceção, obviamente, da Guerra do Paraguai (1864-1870), o maior conflito armado ocorrido na América do Sul, travada entre o Paraguai e uma Tríplice Aliança composta por Brasil, Argentina e Uruguai nem invasões internas, e não corre riscos eminentes de conflitos armados. Por esta razão, a economia teve maior influência na construção da política brasileira do que questões de segurança. Desde a década de 1980, principalmente a partir da redemocratização brasileira e do fim da chamada Guerra Fria, as atenções brasileiras tornaram-se mais diversificadas, a ponto de os Estados Unidos deixarem de ser a principal referência de alinhamento político. É neste contexto que se tem a construção de um espaço sul-americano e de uma alteração do eixo diplomático, e de suas estratégias, para um processo de integração regional realizado no Governo Lula, mas que tinha sido ensaiado durante o Governo Cardoso. É, portanto, visualizado uma institucionalização de um diálogo multilateral regional bastante claro no período. A Integração sul-americana enquadra-se na proposta estratégica da política externa brasileira, de se aprofundar nas relações políticas e econômicas entre os países sul-americanos e, assim, contribuir para o desenvolvimento da região. Ela baseia-se mais especificamente em Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 12

dois grandes pilares: o da União de Nações Sul-americanas (UNASUL) e o MERCOSUL. O Brasil apostou nas parcerias Sul-Sul de maneira a conseguir maior participação internacional, projetando sua figura em um mundo de características multilaterais. A gestão do Governo Lula foi marcada, também, por um direcionamento para as áreas comerciais, realizando parcerias estratégicas no âmbito da OMC e fortalecendo coalizões com países terceiro-mundistas, como no caso do G-20, principalmente nos interesses da proteção agrícola dos países em desenvolvimento. Aproximações em termos de cooperação técnica, política e comercial foram realizadas com o chamado G-3 (Brasil, Índia e África do Sul) e estreitamentos de laços com outras também chamadas potências regionais como Rússia China, e também com o continente africano, marcam o direcionamento das relações internacionais brasileiras (Cepaluni, Vigevani, 2007). No ponto de vista da segurança internacional, o Governo Lula passa a adotar uma postura mais assertiva para uma reformulação e pela ampliação das cadeiras no Conselho de Segurança da ONU, desejando, assim, obter uma vaga permanente. Embora durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso a diplomacia brasileira buscasse esse objetivo, ele nunca teve prioridade em sua política externa, principalmente para não constranger a Argentina, principal parceiro comercial no hemisfério sul e importante vizinho (Cervo, 2003). Encontramos, nos discursos do Presidente Lula desde seu início de governo, uma tentativa de desenhar as diretrizes e estratégias de inserção internacional. São elas: a Integração Regional, o Meio Ambiente, o Desenvolvimento e Justiça Social e o Comércio Internacional. Para seu desenvolvimento e aplicação a atuação do Chefe de Estado teve expressivo aumento, se comparado com as gestões anteriores, com diversas viagens internacionais para todos os continentes, em especial os do hemisfério sul, fazendo uma maior atuação da presença de atores estatais que não o tradicional Ministério das Relações Exteriores na tomada de decisões de política externa. Em conjunto com o multilateralismo, a Política Externa de Lula definiu-se como eixo estratégico para o seu fortalecimento a Cooperação Sul-Sul, resumida em: (i) priorização dos laços com o Sul, baseados na integração política, econômica e cultural; (ii) integração Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 13

energética da América do Sul, especialmente em fontes renováveis; e (iii) integração da infraestrutura da América do Sul 4, como fator econômico estratégico. Aliado ao eixo estratégico político, observa-se um eixo social na política externa brasileira. Essa temática interna 5 é indissociável da justiça social externa. As políticas de desenvolvimento devem ser reorientadas para acabar com a fome e a pobreza que são, afinal, uma das maiores causas de conflitos internacionais. Para isso o governo esperava fortalecer as instituições democráticas nacionais que se sobreporiam às soluções de forças para os conflitos internacionais. Essa questão está diretamente ligada à PEI, isto é, condensando políticas públicas internas e externas para realizar uma reforma social em ambos os cenários, próximo talvez de um socialismo democrático, tal como na época do presidente João Goulart. Há também uma busca em [...] superar um complexo de inferioridade, proveniente de um passado colonial, institucionalmente já distante, mas que se fazia sentir nos planos econômico, cultural e político. 6 Em resumo, a política externa orientou-se, fundamentalmente, pela concepção de que o Brasil deve assumir um papel crescente no cenário internacional, projetando uma imagem externa altiva e soberana 7. Ela prioriza, para tanto, uma relação equilibrada entre a busca de adequação ao sistema global por meio de uma estabilização monetária e com a atração de capitais externos e crescimento interno, garantindo, assim, um controle nacional das áreas estratégicas sensíveis. O governo fez também uso de uma diplomacia presidencial que segundo Guilhon (2005) tem o nome de Terceira Agenda, ou seja, a construção de uma agenda pessoal, com 4 Embora a IIRSA (Iniciativa de Integração da Infraestrutura Regional Sul-americana) tenha sido criada no ano 2000, portanto na gestão FHC, sua ampliação e desenvolvimento deu-se com mais intensidade durante os dois governos de Lula da Silva. 5 A temática de justiça social encontra-se no documento Orientação Estratégica do Ministério das Relações Exteriores, Plano Plurianual 2008-2011. IN Repertório de Política Externa: a posição do Brasil. FUNAG, 2008. 6 Discurso do Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Celso Amorim, durante a cerimônia em homenagem ao Dia do Diplomata, 2009. 7 Ver documento Balanço de Política Externa 2003-2010, desenvolvido pelo MRE. Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/temas/balanco-de-politica-externa-2003-2010> Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 14

uma imagem de Lula como líder internacional que lhe garanta realizações positivas 8. Ainda de acordo com Guilhon, esta característica de Lula limita um pouco a tradição multilateral com um excesso de protagonismo unilateral. A política externa de Lula fundamentou-se por quatro eixos fundamentais 9 : 1. A América do Sul é o eixo prioritário de nossa política externa, tendo o Mercado Comum do Sul (MERCOSUL) como núcleo central. Para este continente foram dedicados esforços necessários no sentido de avançar no processo de integração; 2. A África Ocidental, incluindo os arquipélagos de Cabo Verde e São Tomé e Príncipe, representa uma antiga fronteira, que havia sido esquecida, mas cujos laços precisam ser reatados; 3. A Ásia, novo centro dinâmico da economia mundial, é espaço essencial para a participação do Brasil no mercado global; 4. Europa e América do Norte, áreas tradicionais de vinculação política, econômica e cultural, permanecem como parceiros relevantes do Brasil, em particular no esforço de reforma da governança política e econômica global. Esses eixos têm sido analisados e interpretados por acadêmicos, jornalistas e diplomatas. Almeida (2006) 10 fez uma divisão para fins didáticos dessas diferentes visões em três categorias sintéticas: 1. vozes autorizadas, isto é, os produtores originais de posições e discursos para a diplomacia em questão; 2. apoiadores externos, isto é, membros da academia e profissionais dos meios de comunicação que concordam, no essencial, com as grandes linhas do discurso e da prática diplomática; 3. independentes ou críticos, ou seja, aqueles que se dedicam ao registro de posições e à análise de suas implicações políticas e econômicas para as relações internacionais 8 Ver entrevista Objetivos conflitantes, de José Guilhon de Albuquerque, pp. 10-15, IN Indústria Brasileira, Maio 2005. CNI, Brasília 2005. 9 Balanço de Política Externa 2003-2010. Op. Cit. p. 18 10 ALMEIDA, Paulo Roberto de. Uma nova arquitetura diplomática? Interpretações divergentes sobre a política externa do Governo Lula (2003-2006). Revista Brasileira de Política Internacional (vol. 49, nº 1, 2006) Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 15

do Brasil, mantendo um olhar crítico sobre os fundamentos e as tomadas de posição da atual diplomacia. Com as vozes autorizadas, podemos extrair a percepção de política externa do Partido dos Trabalhados. Ela desenvolveu-se em um grupo de caráter mais ideológico desvinculado da diplomacia burocrática histórica exercida pelo Itamaraty. Seu maior expoente é o acadêmico Marco Aurélio Garcia, ex-secretário de Relações Internacionais do PT e assessor diplomático do Presidente Lula. Suas orientações podem ser resumidas basicamente para a integração com os países da América do Sul (por meio do MERCOSUL, em especial) em virtude da crença na existência de uma identidade própria na região. Esta visão encontra semelhança na postura terceiromundista da PEI, tanto ideologicamente quando socialmente, ressaltando a ideia de autonomia da política exterior brasileira. Outra região do globo que recebeu grande atenção do Governo Lula foi às nações em desenvolvimento, em especial China, Índia, Rússia e África do Sul. No ano de 2003 foi criado o IBAS, grupo formado por Índia, Brasil e África do Sul, que são as maiores democracias de suas respectivas regiões e de grande poderio econômico regional. Em 2004, o governo reconheceu a China como uma economia de mercado, representando uma medida de alinhamento com seu maior parceiro econômico. Podemos indicar também uma maior participação com os países lusófonos com fortalecimento da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP). A Cúpula América do Sul - Países Árabes (ASPA), mecanismo de cooperação bi regional e um fórum de coordenação política que reúne 22 países árabes e 12 sul-americanos, é criada em 2005. A África recebeu grande atenção da política exterior de Lula. O Presidente realizou oito viagens ao continente, abriu inúmeras embaixadas e consulados, a fim de fortalecer as relações bilaterais e avançar nos investimentos comerciais. Um exemplo nítido é a presença da Petrobrás em sete países africanos, com obras de prospecção em águas profundas. Lula costumava definir sua relação com o continente como um alinhamento assertivo cooperativo. Essa visão é muito semelhante à posição de Jânio Quadros para o continente. Esse caráter universalista, também presente na PEI, pode ser observado nas palavras do Chanceler Celso Amorim (grifo nosso): Nossa política externa não pode estar confinada a uma única região, nem pode ficar restrita a uma única dimensão. O Brasil pode e deve contribuir para a construção de uma ordem mundial pacífica e solidária, fundada no Direito e Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 16

nos princípios do multilateralismo, consciente do seu peso demográfico, territorial, econômico e cultural, e de ser uma grande democracia em processo de transformação social. O Brasil atuará, sem inibições, nos vários foros internacionais, regionais e globais. 11 Podemos sintetizar as ações e objetivos da política exterior de Lula durante seus oito anos de governo da seguinte forma: em primeiro lugar um processo, de amadurecimento da democracia e do multilateralismo; em segundo lugar uma luta para modificar as regras do comércio internacional por meio da conclusão da Rodada Doha na Organização Mundial do Comércio (OMC) e uma intensa diversificação da pauta comercial; um aprofundamento na Cooperação Sul-Sul, com a inserção do BRIC 12 no molde brasileiro, sem, entretanto, levar prejuízo no processo de integração na América do Sul; por fim a Justiça Social, com o objetivo de concretizar e institucionalizar medidas de reforma social tanto interna (Bolsa- Família) quanto externamente (Missão de Paz MINUSTAH 13, dentro da chamada diplomacia solidária 14 ). Há 15 anos o Brasil era visto como uma nação mediana, sujeita a crises econômicas especialmente quando se observa a década de 1980 e com um sistema político pouco confiável. Atualmente é um dos países com voz no cenário internacional, membro do G-20, do G-8, e convidado a participar de outros encontros importantes. O Brasil, em conjunto com outros países emergentes, alcançou um papel proeminente nas discussões internacionais, embora não em todas as áreas, refletindo suas limitações econômicas e militares (Hakim, 2010). Destaca-se, entre outras, as questões de energia e mudanças climáticas, as de commodities agrícolas, e a não proliferação nuclear (estamos, talvez junto com Japão e 11 Ver Discurso de Posse, Embaixador Celso Amorim, 01/01/2003. Disponível em: <http://www.itamaraty.gov.br/sala-de-imprensa/discursos-artigos-entrevistas-e-outrascomunicacoes/embaixador-celso-luiz-nunes-amorim/discurso-proferido-pelo-embaixador-celso-amorim>. Acesso em 25 jan. 2011. 12 Acrônimo cunhado por Jim O Neill, economista chefe do grupo financeiro Goldman Sachs, que se refere as economias em desenvolvimento do Brasil, Rússia, Índia e China (BRIC). 13 A Missão das Nações Unidas para a estabilização no Haiti ou Minustah (sigla derivada do francês: Mission des Nations Unies pour lastabilisation en Haïti), é uma missão de paz criada pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas em 30 de abril de 2004, por meio da resolução 1542, para restaurar a ordem no Haiti, após um período de insurgência e a deposição do presidente Jean-Bertrand Aristide. 14 Para conhecer o conceito, ver Ricardo Seintenfus, Um exemplo da diplomacia solidária: o Brasil no Haiti. Disponível em: < http://www.seitenfus.com.br/arquivos/o_brasil_no_haiti.pdf>. Acesso em 25 jan. 2011 Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 17

Alemanha, entre os países mais importantes sem armas nucleares, atuando como uma espécie de garoto-propaganda internacional). Continuidade e mudança Nos tempos recentes da história da política externa brasileira figuram alguns conceitos de autonomia política. Durante o período da Política Externa Independente (1961-1964) e em alguns governos militares, depois de 1967, e principalmente durante o governo do Presidente Geisel (1974-1979), houve um distanciamento em relação aos principais centros de poder internacionais na busca por uma autonomia (Cervo, 2002). Já nos anos 1980 o modelo nacional-desenvolvimentista utilizado pelo Brasil, tendo um Estado forte, empreendedor e protecionista, entrou em decadência. Devido às mudanças internas ideias de cunho liberal e externas com o fim da Guerra Fria, o país procurou novas iniciativas para interagir com o mundo, principalmente por meio dos Ministérios das Relações Exteriores e o da Fazenda, com forte destaque para a política externa. É nesse cenário que o Brasil passa a defender uma autonomia de política externa que substitui o termo distância pela expressão participação (Fonseca Jr., 2004). Os principais pilares dessa autonomia pela distância eram a diversificação das relações diplomáticas e de comércio, a estabilização da identidade nacional como um país em desenvolvimento no chamado Terceiro-Mundo, mas com boas participação no regime internacional vigente, uma censura das assimetrias internacionais no comércio, nas finanças e nos regimes nucleares e, finalmente, um maior diálogo entre as nações do eixo Norte-Sul, e não somente no eixo Leste- Oeste (Cervo, Bueno, 2002). Foi durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) que se buscou substituir uma agenda reativa da política externa brasileira por uma nova agenda internacional pró-ativa, determinada pela lógica da integração (Cepaluni, Vigevani 2007). Essa estratégia vinha a basear-se na adesão e na estreita colaboração com organismos e órgãos internacionais, bem como com as normas multilaterais, aliado a uma retomada do diálogo com os EUA e outros países desenvolvidos e com a América do Sul (Lima, 2003). O país produziu, em suma, uma grande mudança paradigmática, modificando seu modelo de inserção internacional em contrário a uma autonomia isolacionista, em que contribuiu, de alguma maneira, para a construção de um ambiente favorável pra seu desenvolvimento econômico. Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 18

Busca-se, assim, construir uma ordem internacional mais harmônica e justa, e inserindo-se em uma participação mais ativa no Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), e posteriormente na Organização Mundial do Comércio (OMC), reivindicando assento no Conselho de Segurança da ONU e buscando um melhor entendimento com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Os EUA tem grande destaque como parceiro estratégico do Brasil, em busca por uma maior autonomia na política hemisférica e em questões de comércio e de propriedade intelectual, considerada necessária para a ampliação do papel brasileiro no cenário internacional (Almeida, 2004). O maior êxito encontra-se no âmbito regional, com o fortalecimento do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), visto como o instrumento mais importante para a legitimação da atuação do país no contexto regional (Cepaluni, Vigevani, 2007). A estratégia de desenvolvimento era buscada pelo governo de Fernando Henrique, articulada com a ordem mundial vigente, como objetivo essencial de sua política externa dentro do conceito de autonomia pela participação. Durante o governo do Presidente Lula (2003-2010) encontramos mudanças e transformações da postura externa do Brasil, sobretudo com a inserção de novas ênfases e de alianças preferenciais. Embora o país mantivesse uma forte ênfase no multilateralismo político, mantendo assim uma continuidade com a política externa do governo anterior, o presidente procurou diferenciar suas ações, preferências e perspectivas (Cepaluni, Vigevani, 2007). Uma preferência pela diplomacia Sul-Sul, um grande esforço para reforçar e ampliar o MERCOSUL, uma intensa busca por um assento no Conselho de Segurança da ONU e uma retomada da agenda terceiro-mundista, desenvolve a base dos eixos da diplomacia de Lula (Almeida, 2007; Lima, 2003). A estratégia do governo Lula de busca pela autonomia pela diversificação desenvolveu uma maior assertividade no plano internacional, por meio de alianças Sul-Sul e de acordo com parceiros estratégicos, aumentando assim a capacidade de negociação brasileira (Cepaluin, Vigevani, 2007). Uma intensa participação do presidente em algo que podemos convencionar de diplomacia presidencial é muito intensa neste período. Embora o Presidente Fernando Henrique tenha utilizado com frequência dessa diplomacia, o Presidente Lula foi além. Em seus oito anos de governo foram 259 visitas a 83 países estrangeiros, incluindo encontros internacionais, e o Brasil recebeu 904 visitas estrangeiras de representantes de 137 nações, Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 19

incluindo Presidentes, Reis, Primeiros-Ministros e outros representantes oficiais (Amorim, 2010). Podemos traçar, de acordo com levantamento feito por Cepaluni e Vigevani (2007), outras diferenças e semelhanças que caracterizam as mudanças e as continuidades. Encontramos na ALCA, que apesar de não ser prioritário para o Brasil, uma postura favorável a ela durante a era de FHC, enquanto que no governo Lula as negociações foram duras, levando a sua extinção. Quanto ao combate à Fome Internacional, o tema ganhou destaque somente na administração de Lula, principalmente em seu primeiro mandato. Na questão da liderança brasileira o governo FHC acreditava que ela não se autoproclama, mas sim é exercida, não tendo, portanto, muito destaque durante sua gestão. Para o governo Lula, entretanto, o tema foi colocado ostensivamente no debate político brasileiro. De acordo com Cepaluni e Vigevani (2007), [...]O desejo de obter um papel de destaque na região e entre os países em desenvolvimento foi introduzido e, em parte, tems e constatado uma maior cobrança por parte dos países sul-americanos em relação ao Brasil. Considerações finais A proposta deste estudo foi a de proporcionar uma análise da política externa durante o governo Lula, compreendida entre os anos de 2003 e 2010. Trabalhar a política externa é considerar os diferentes fatores que influenciam na sua elaboração e execução, uma vez que consiste em um reflexo ponderado do conjunto das demandas internas de um Estado. O governo Lula possui algumas continuidades e outras mudanças em seu programa de Política Externa, mas o mais marcante é sua busca em aumentar o protagonismo do país no cenário internacional, de acordo com a autonomia pela assertividade e com momentos de maior assertividade comparados a períodos anteriores. Por meio dessa estratégia, de uma política externa mais assertiva, ou ativa, a administração Lula buscou garantir uma maior presença em seu papel de ator internacional. As grandes linhas históricas da política externa brasileira sempre foram a do desenvolvimento nacional, pela defesa da soberania aliado a um profundo respeito ao direito internacional e a Carta da ONU, além de um cuidado com a diplomacia econômica. Inserido nesses aspectos, encontramos uma diplomacia presidencial extremamente ativa de Lula da Silva. Sua retórica nacionalista, defendendo a soberania e os interesses de um projeto Disponível em: http://www.unesp.br/santiagodantassp 20