Disfunção temporomandibular em indivíduos atendidos no setor de otorrinolaringologia

Documentos relacionados
The interaction between Temporomandibular disorders

ODONTOLOGIA PREVENTIVA. Saúde Bucal. Dores na mandíbula e na face.

Desordem temporomandibular: prevalência e necessidade de tratamento em pacientes portadores de próteses totais duplas

GABRIEL DA ROSA RÔMULO DE SOUZA SALABERGA AVALIAÇÃO DO PADRÃO OCLUSAL DE PACIENTES COM DISFUNÇÃO CRANIOMANDIBULAR ATENDIDOS NA CLÍNICA DE

Romildo da Silva Amorim 1, Giulliano Gardenghi 2

TRABALHO DE PESQUISA. PALAVRAS-CHAVE: Articulação temporomandibular; Hábitos; Prevalência.

Análise dos sintomas e das alterações otológicas em pacientes com sintomatologia dolorosa na articulação temporomandibular

Introduction: The Temporomandibular Joint Disorders

Universidade Federal de Pelotas Faculdade de Odontologia. Extensão Universitária - ADITEME -

WALABONSO BENJAMIN GONÇALVES FERREIRA NETO FRATURA DA CABEÇA DA MANDÍBULA. CARACTERÍSTICAS, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO.

- ADITEME - Atendimento Especial de Pacientes com Disfunção da Articulação Temporomandibular

UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Temporomandibular disorder and severity in university professors*

- ADITEME - Atendimento Especial de Pacientes com Disfunção da Articulação Temporomandibular

ARTICULAÇÃO TÊMPORO-MANDIBULAR

DANIELLY GUEDES LUCENA

Mechanisms of association between temporomandibular disorder and Vertigo. Los mecanismos de asociación entre el trastorno temporomandibular y vértigo

AUTOPERCEPÇÃO EM SAÚDE BUCAL DE IDOSOS EM USF DO DISTRITO SANITÁRIO III

Título do Trabalho: Ansiedade e Depressão em Pacientes com Esclerose Múltipla em Brasília Autores: Tauil CB; Dias RM; Sousa ACJ; Valencia CEU; Campos

REVISÃO DA ANATOMIA DA ATM E CLASSIFICAÇÃO DAS DISFUNÇÕES DESTA ARTICULAÇÃO. Mariáh Luz Lisboa

ANALISE DO ÍNDICE DE DISFUNÇÕES TEMPOROMADIBULARES NOS ALUNOS DO CURSO DE FISIOTERAPIA DA FAP

OCORRÊNCIA DE ANTECEDENTES FAMILIARES EM PACIENTES COM DISTÚRBIOS DO MOVIMENTO DO HOSPITAL DAS CLÍNICAS NO ESTADO DE GOIÁS

Avaliação da sintomatologia ocular em pacientes com disfunção temporo-mandibular

Influência do tratamento ortodôntico-cirúrgico nos sinais e sintomas de disfunção temporomandibular em indivíduos com deformidades dentofaciais

Marcos Sekine Enoch Meira João Pimenta

HIPERMOBILIDADE X DISFUNÇÃO TEMPOROMANDIBULAR: CASO CLÍNICO

Avaliação do paciente com DTM: quais as etapas para se chegar a um correto diagnóstico

DISTÚRBIOS ARTICULARES NOS DESDENTADOS TOTAIS 1. RESUMO

Proposta de Criação do Curso Pós-Graduado em Disfunção da ATM e Dor Orofacial

Dor Orofacial Neurovascular Neurovascular Orofacial Pain

Prevalência de Dor Miofascial em Pacientes com Desordem Temporomandibular. Resumo. 1 Introdução

Frequency of Temporomandibular Disorders (TMD) and their relationship with anxiety and depression among dental patients of a Health Care Unit

Disfunção têmporo-mandibular. Aspectos clínicos de interesse do cefaliatra

Ficha de Recolha de Dados

CONGRESSO BRASILEIRO DE FISIOTERAPIA DERMATO FUNCIONAL 08 a 10 DE NOVEMBRO 2012 RECIFE PE MODALIDADE PÔSTER

Association between temporomandibular dysfunction and depression

XXV Reunião Clínico - Radiológica. Dr. Rosalino Dalasen.

Anamaria Siriani de Oliveira 1, Débora Bevilaqua-Grossi 2, Elton Matias Dias 3 ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA. APRESENTAÇÃO set.

Easy PDF Creator is professional software to create PDF. If you wish to remove this line, buy it now.

OCLUSÃO, ESTRESSE E CARACTERÍSTICAS PSICOLÓGICAS COMO FATORES ETIOLÓGICOS DE DISFUNÇÃO CRANIOMANDIBULAR

Avaliação da presença de disfunção temporomandibular em crianças 1

CURSO DE ODONTOLOGIA Autorizado pela Portaria no 131, de 13/01/11, publicada no DOU no 11, de17/01/11, seção 1, pág.

Estimativa da excursão condilar em pacientes com disfunção craniomandibular: um enfoque multidisciplinar

UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR

Fatores predisponentes de desordem temporomandibular em crianças com 6 a 11 anos de idade ao início do tratamento ortodôntico

Simone Maria Ragoni GUIMARÃES Professora Disciplina de Radiologia Faculdade de Odontologia UFJF Juiz de Fora MG Brasil

Toxina Botulínica. O anestesista e o doente submetido a prévias técnicas analgésicas não convencionais:

RENATO DE AGUIAR RIBEIRO INFLUÊNCIA DA QUALIDADE DAS PRÓTESES TOTAIS NA PREVALÊNCIA DE SINAIS E SINTOMAS DE DISFUNÇÃO TEMPOROMANDIBULAR

AVALIAÇAO DA MOBILIDADE ARTROCINEMÁTICA DA COLUNA CERVICAL EM PORTADORES DE DESORDEM TEMPOROMANDIBULAR

Filipa Alexandra de Oliveira Lacerda. Estudo da prevalência de desordens temporomandibulares em músicos de sopro. Universidade Fernando Pessoa

Relação da classe econômica e qualidade do sono na ocorrência da disfunção temporomandibular

Relação entre classe socioeconômica e fatores demográficos na ocorrência da disfunção temporomandibular

ConScientiae Saúde ISSN: Universidade Nove de Julho Brasil

Stomatos ISSN: Universidade Luterana do Brasil Brasil

ESTUDO COMPARATIVO DA OCLUSÃO E DA SUA RELAÇÃO COM AS DISFUNÇÕES TEMPOROMANDIBULARES (DTM) EM JOVENS COM E SEM TRATAMENTO ORTODÔNTICO

DIMAS RENÓ DE LIMA. Orientador: Prof. Dr. Ruy Fonseca Brw1etti. São José dos Campos 1995

NERVO TRIGÊMEO. Anatomia Aplicada à Odontologia. Prof. Peter Reher, CD, CD, MSc, MSc, PhD. PhD

Acadêmica do curso de Odontologia da Universidade Federal de Uberlândia 4

UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS E DA SAÚDE DEPARTAMENTO DE FISIOTERAPIA KÊNIA ROSÂNGELA SOUSA FARIAS

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Departamento de Odontologia

CURSOS ICMDS OCLUSÃO e DTM

UNIVERSIDADE DE PERNAMBUCO - UPE FABIANA GODOY BENÉ BEZERRA DISFUNÇÃO TEMPOROMANDIBULAR E FATORES ASSOCIADOS EM ADOLESCENTES NA CIDADE DO RECIFE

Sinais e sintomas da disfunção temporomandibular: Revisão de literatura * Sings and symptoms of temporomandibular dysfunction: Literature review

Neurociência e Saúde Mental

IMPACTO DA ARTROPLASTIA TOTAL DE QUADRIL SOBRE A QUALIDADE DE VIDA EM IDOSOS PORTADORES DE ARTROSE INCAPACITANTE.

DOI: /aodontol/ ISSNe

Tipos de Estudos Epidemiológicos

CURSO TEÓRICO-PRÁTICO. Diagnóstico de disfunções. Diagnostic Criteria

TÍTULO: PREVALÊNCIA DE LESÕES EM CORREDORES DOS 10 KM TRIBUNA FM-UNILUS

Palavras-chave: qualidade de vida, saúde bucal, síndrome da disfunção temporomandibular.

Aprovado pelo Comitê de Ética da Faculdade de Odontologia de Bauru/USP, em reunião realizada em 15 de agosto de 2003.

FREQÜÊNCIA DE RAÍZES FUSIONADAS, SEPARADAS DIVERGENTES, SEPARADAS CONVERGENTES, SEPARADAS RETILÍNEAS E DILACERADAS DOS TERCEIROS MOLARES

MODELO FORMATIVO. DATA DE INíCIO / FIM / Manhã - 08h30-13h00 Tarde - 14h00-19h30

Correlações entre idade, auto-avaliação, protocolos de qualidade de vida e diagnóstico otorrinolaringológico, em população com queixa vocal

Aspectos posturais e morfológicos do sistema estomatognático de crianças respiradoras nasais e orais: abordagem antroposcópica

Fisioterapeuta Priscila Souza

A PERDA DA QUALIDADE DO SONO EM PACIENTES PORTADORES DE DTM

MODELO FORMATIVO. DATA DE INíCIO / FIM / Manhã - 08h30-13h00 Tarde - 14h00-19h30

The otologic symptoms are frequents in temporomandibular

UNIVERSIDADE DE TAUBATÉ Marden Batista Gomes

Músculos da Cabeça e Pescoço

Banca: Prof. Dr. Wilson Galhego Garcia- Orientador - (FOA/Unesp) Profa. Dra. Nemre Adas Saliba - Orientadora - FOA/Unesp)

REDUÇÃO PARCIAL DE ZUMBIDO POR REABILITAÇÃO PROTÉTICA: RELATO DE CASO CLÍNICO.

Thaís Cristina Chaves 1, Anamaria Siriani de Oliveira 2, Débora Bevilaqua Grossi 2

TÍTULO: EFEITO DA TERAPIA PERIODONTAL NÃO CIRÚRGICA SOBRE O CONTROLE GLICÊMICO EM INDIVÍDUOS COM DIABETES TIPO2 E PERIODONTITE CRÔNICA: ENSAIO CLÍNICO

AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO FUNCIONAL DE IDOSOS INSTITUCIONALIZADOS

IMPLANTE COCLEAR EM CRIANÇAS DE 1 A 2 ANOS DE IDADE

SERVIÇO DE ATENDIMENTO A PACIENTES COM DISFUNÇÃO TEMPOROMANDIBULAR

Acidentes de trabalho e problemas de saúde relacionados com o trabalho (ATPS 2013)

Relação dos Sintomas Otológicos nas Disfunções Temporomandibulares

Inalde Marília Fernandes Barp PISTAS DIRETAS PLANAS: INDICAÇÕES NA CORREÇÃO DA MORDIDA CRUZADA POSTERIOR E OUTRAS ALTERAÇÕES FUNCIONAIS NA 1ª DENTIÇÃO

UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE ODONTOLOGIA MESTRADO EM ODONTOLOGIA

Limitações funcionais em universitários com sinais e sintomas da disfunção temporomandibular

Síndrome de Eagle Relato de Caso

Molares Decíduos Decíduos

ESTUDO DA PREVALÊNCIA DE SINTOMATOLOGIA TEMPOROMANDIBULAR EM UNIVERSITÁRIOS BRASILEIROS DE ODONTOLOGIA

VIBRAÇÕES ARTICULARES ANTES E APÓS O TRATAMENTO DAS DESORDENS TEMPOROMANDIBULARES

TÍTULO: PERFIL DE UTILIZAÇÃO DE ANTI INFLAMATORIOS NÃO ESTEROIDAIS DE UMA DROGARIA DE AGUAÍ-SP

UNITERMOS: Articulação temporomandibular, distúrbios da articulação temporomandibular; fisiopatologia da disfunção da articulação temporomandibular.

Transcrição:

ORIGINAL ORIGINAL Disfunção temporomandibular em indivíduos atendidos no setor de otorrinolaringologia Temporomandibular disorders in otolaryngology patients Paulo de Tarso de Carvalho BAYMA 1 Pedro Paulo FELTRIN 1 Carlos Alberto Silva DIAS 2 José Ferreira COSTA 3 Dalva Cruz LAGANÁ 4 Ricardo Tatsuo INOUE 1 RESUMO Objetivo: Avaliar a prevalência de disfunção temporomandibular em indivíduos que procuraram o serviço de otorrinolaringologia do Hospital da Universidade Federal do Maranhão. Métodos: Foram avaliados 303 indivíduos do serviço de otorrinolaringologia do Hospital Universitário da Universidade Federal do Maranhão em São Luís durante um período de três meses. Para captação e interpretação dos dados, bem como verificação da disfunção temporomandibular, foi utilizado um questionário auto-aplicado previamente validado. Resultados: Após coleta e interpretação dos dados de 303 indivíduos, os resultados obtidos foram: 61,7% (187 indivíduos) foram considerados como necessitando de tratamento ou avaliação odontológica, dos quais 67,7% eram do sexo feminino. Já 9,9% dos indivíduos não apresentaram sintomas de disfunção temporomandibular. Outros resultados mostraram que 48,51% dos indivíduos apresentaram dor de cabeça; 52,14% dor no pescoço e ombro; 50,49% dor na região do ouvido e 46,20% ruídos articulares. Conclusão: A prevalência de disfunção temporomandibular foi de 61,72%, sendo significativamente maior no gênero feminino (p=0,006); e as prevalências em relação aos índices, foram: disfunção temporomandibular ausente de 9,9%; disfunção temporomandibular leve de 28,4%; disfunção temporomandibular moderada de 36,6% e disfunção temporomandibular severa de 25,1%. Termos de indexação: articulação temporomandibular; dor facial; epidemiologia; prevalência. ABSTRACT Objective: The objective of this study was to assess the prevalence of temporomandibular disorders in individuals who visit the otolaryngology service of the Federal University of Maranhão hospital. Methods: A total of 303 patients of the otolaryngology service of the abovementioned university hospital located in São Luiz were assessed over three months. A previously validated self-administered questionnaire was used to collect and interpret data and to verify temporomandibular disorders. Results: The results of the data collected from 303 individuals and the respective interpretation were: 61.7% (187 individuals) were in need of an otolaryngological assessment or treatment. Of these, 67.7% were females. Only 9.9% of the individuals did not present symptoms of temporomandibular disorders. Other results show that 48.51% of the individuals had headaches, 52.14% had neck and shoulder pain, 50.49% had pain in the ear area and 46.20% had joint noise. Conclusion: The prevalence of temporomandibular disorders was 61.72% and significantly higher among females (p=0.006). Temporomandibular disorders were absent in 9.9%; mild in 28.4%; moderate in 36.6% and severe in 25.1% of the sample. Indexing terms: temporomandibular joint; facial pain; epidemiology; prevalence. INTRODUÇÃO As disfunções temporomandibulares são, ainda hoje, motivo de debates e controvérsias. Como abrangem várias áreas do corpo humano e possuem sinais e sintomas muito semelhantes aos de outras doenças, o diagnóstico, a classificação e o tratamento são bastante complexos. A Academia Americana de Desordem Temporomadinbular define que desordens ou Disfunções Temporomandibulares (DTM) abrange vários problemas clínicos envolvendo a musculatura da mastigação, a Articulação Temporomandibular 1 Faculdade São Leopoldo Mandic, Curso de Odontologia, Programa de Pós-Graduação Mestrado em Prótese Dentária. Rua José Rocha Junqueira, 13, Swift, 13045-755, Campinas, SP, Brasil. Correspondência para / Correspondence to: PTC BAYMA. E-mail: <paulodetarsobayma@gmail.com>. 2 Universidade Federal do Maranhão, Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Medicina II. São Luís, MA, Brasil. 3 Universidade Federal do Maranhão, Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Odontologia I. São Luís, MA, Brasil. 4 Universidade de São Paulo, Faculdade de Odontologia, Departamento de Prótese. São Paulo, SP, Brasil.

PTC BAYMA et al. (ATM) e estruturas associadas ou ambas 1. A Sociedade Internacional de Cefaleia classifica a DTM em um subgrupo distinto das desordens musculoesqueléticas e reumatológicas da região orofacial 2. O sintoma mais frequente da DTM é a dor. A dor ou sensibilidade pode ocorrer quando se palpam os músculos mastigatórios, a ATM ou a região pré-auricular e normalmente é agravada pela mastigação ou por outra função dos maxilares. As queixas mais comuns entre os indivíduos portadores de DTM são: cefaleias, otalgias e dores maxilares 3. Sinais e sintomas de DTM são comuns na população. Pesquisas epidemiológicas demonstraram que mais de 50% dos seus componentes apresentam pelo menos um ou mais sinais destes distúrbios 1, porém esses números não se traduzem em necessidade de tratamento. Estima-se que somente 3,6% a 7,0% desses indivíduos necessitam de algum tipo de intervenção 4. Considerando somente os sintomas otorrinolaringológicos dos indivíduos portadores de DTM, tem-se o seguinte panorama: otalgia, presente em 75,0% dos indivíduos, hipoacusia, em 15,0%; náuseas, em 10,0%: vômitos, em 10%; plenitude auricular, em 17,5%; zumbido, em 17,5% e autofonia, em 15,0% 5. A interação entre DTM e otalgia é motivo para especulações e hipóteses. Vários pesquisadores sugerem causas, consequências e supostos tratamentos. Com certeza, o mais famoso dos pesquisadores é Costen 6, que em 1934 publicou um tratado que, além de evidenciar essa interação entre o sistema estomatognático e a otalgia, formulava uma teoria sobre como os dentes, ou a ausência deles, por um efeito cascata, desencadeava alterações otológicas. Antes de Costen 6, houve outras teorias, como a de Prentiss 7, que, em 1918, elaborou a teoria do deslocamento mecânico, ou a de Monson 8, que acrescentou que a retrusão do côndilo poderia causar reabsorção da placa timpânica, desencadeando vários efeitos que resultariam em perda auditiva e ruído nos ouvidos. Diante das inúmeras teorias relacionando DTM como causa de otalgia ou dos múltiplos sinais e sintomas otológicos nela presente, é pertinente investigar a prevalência desta disfunção em indivíduos atendidos nos serviços de otorrinolaringologia. desta pesquisa está registrado no Comitê de Ética e Pesquisa do Hospital sob o número 193/06, processo 33104-647/2006. Os critérios de exclusão foram: indivíduos com menos de 18 anos ou mais de 80 anos de idade; indivíduos que sofreram acidentes e/ou intervenção cirúrgica na face durante os últimos seis meses; portadores de deficiência física ou mental que pudessem afetar o discernimento e/ ou preenchimento do questionário; portadores de doenças crônicas ou autoimunes que pudessem mascarar os dados da pesquisa; também indivíduos que tivessem apresentado história de otite crônica ou cirurgias otológicas. Como critério de inclusão, seriam todos os indivíduos que procurassem o serviço de otorrinolaringologia no determinado período e que aceitassem participar do estudo. Os critérios utilizados foram os adotados por Fonseca 9 e Conti et al. 10, os quais sugeriam a confiabilidade somente do uso de questionários anamnésicos para diagnóstico e determinação do grau de DTM. O questionário para avaliação de DTM era constituído de dez questões. Não houve nenhuma interferência por parte do pesquisador. Classificação de DTM A interpretação do questionário: -para cada resposta indicando sim foi atribuído o valor 2, às vezes valor 1 e ao não valor 0 ; nas questões 6 e 7, a presença de sintomas bilaterais recebeu valor 3, a ser somado no índice de DTM; também na questão 4, um escore 3 foi atribuído quando relatado que a dor era freqüente e intensa. A somatória dos valores obtidos permitiu a classificação da amostra em relação à DTM, sendo considerada, de agora em diante, com índice. a) valores de 0 a 3: não portador de DTM; b) valores de 4 a 8: portador leve; c) valores de 9 a 14: portador moderada; d) valores de 15 a 23: portador severa. RESULTADOS Tabela 1. Interpretação dos resultados população total x índice de DTM. MÉTODOS A amostragem desta investigação foi do tipo acidental e se consistiu de 303 indivíduos, de ambos os gêneros, que procuraram o atendimento no serviço de Otorrinolaringologia do Hospital da Universidade Federal do Maranhão, Unidade Presidente Dutra em São Luís, durante três meses (período compreendido entre os dias 28/8/2006 a 16/11/2006. O protocolo de aprovação Quanto aos indivíduos que foram considerados como necessitando de tratamento, isto é, com índice de DTM moderado e severo, o índice encontrado foi de 187 indivíduos (61,7%), dos quais 111 (36,6%) tinham índice moderado e 76 (25,1%) índice severo. 314

DTM em indivíduos com otalgia DISCUSSÃO Esta pesquisa enfocou um grupo de indivíduos que procurou o serviço de otorrinolaringologia, ou seja, uma população específica, e a coleta dos dados foi obtida por meio de questionário auto-aplicativo. Apenas os sintomas dos indivíduos foram levados em consideração. O parâmetro, tanto para a interpretação dos dados, quanto para a necessidade de tratamento, foi o mesmo utilizado pelo idealizador do questionário, os indivíduos que obtiveram um índice anamnésico moderado e severo foram considerados passíveis de avaliação/tratamento de DTM 9. Há quatro sintomas ditos clássicos em indivíduos com DTM 10 : a) dor; b) click ou sons articulares; c) limitação de movimentos mandibulares e; d) sensibilidade à palpação nos músculos mastigatórios e/ou cervicais. O sintoma mais relatado nesta investigação foi a dor no pescoço e nos ombros; sendo 52,14% sentiam frequentemente e 15,84%, às vezes. Agerberg & Carlsson 11, ao avaliar uma população geral, obtiveram um índice de prevalência de sintomas de 24% para dores faciais e dores de cabeça, 39% para ruídos articulares e 7% para limitação de movimento na mandíbula. Quando se refere aos sintomas otológicos em indivíduos com DTM, de 105 entrevistados por Bush 12, em 82% dos casos havia presença de otalgia e 33% dos indivíduos apresentavam zumbido. Brito 13 relatou como sintomas otorrinolaringológicos mais frequentes: otalgia direita (72,5%), otalgia esquerda (77,5%), otalgia bilateral (52,5%), hipoacusia (15%), náusea (10%), vômito (10%), plenitude auricular (17,5%), zumbido (17,5%), autofonia (15%). Nesta pesquisa não foram avaliados estes dados, pois não foi realizado exame clínico nos indivíduos. Os resultados mostraram diferença significativa entre o número de indivíduos do gênero feminino (62,37%) que procuraram o otorrinolaringologista, em relação aos do gênero masculino (37,62%). Estes dados estão dentro dos parâmetros da literatura. Quando se analisam populações assintomáticas, autores como Agerberg & Carlsson 14, Helkimo 15 e Lipton et al. 16 consideram estatisticamente insignificante a diferença nos valores de sinais e sintomas entre os gêneros, com ressalva, contudo, em relação à frequência de cefaleias, considerada muito mais presente no gênero feminino. Entretanto, ao se levar em consideração uma população específica, ou seja, indivíduos em tratamento, as diferenças entre os gêneros se alteram mais significativamente. Os resultados obtidos nesta investigação foram: dos indivíduos que não apresentaram sinais de DTM, 5,8% eram do gênero feminino e 16,7% do gênero masculino; dos indivíduos com índice de DTM leve, 26,5% eram do gênero feminino e 31,6% do gênero masculino; dos indivíduos com índice moderado, 39,2% eram do gênero feminino e 32,5% do gênero masculino; dos indivíduos com índice de DTM severo, 28,6%,eram do gênero feminino e 19,3% eram do gênero masculino. É ainda pertinente assinalar que, dos indivíduos que necessitaram de tratamento, ou seja, índice de DTM moderado mais severo 67,7% pertenciam ao gênero feminino e 51,8% ao masculino, numa proporção de 2,17:1. Algumas teorias têm tentado explicar por que o gênero feminino parece ser mais afetado do que o gênero masculino. Agerberg & Sandstrom 17 acreditam que o gênero feminino não é tão apto a lidar com suas pressões. Na pesquisa de Abubaker et al. 18 mostra que os receptores de estrogênio na ATM estão em muito maior quantidade. A verdadeira razão, ou o conjunto delas, de que o gênero feminino apresenta-se mais freqüentemente em tratamento de DTM é ainda desconhecida e demanda a necessidade de estudos adicionais. Esta pesquisa obteve um total de 61,7% de indivíduos com índice anamnésico, dos quais 36,6% eram moderados e 25,1% de severos. A percentagem de indivíduos com DTM e a encontrada na literatura envolvendo população similar, 17,2% 18, não são semelhantes, havendo diferença estatisticamente significante entre elas (p=0,108). Conti et al. 10, observaram que aproximadamente 6,5% dos indivíduos necessitavam de tratamento. Agerberg & Inkapööl 4 concluíram que 9% dos indivíduos do gênero masculino julgavam necessário algum tipo de tratamento para seus sintomas e que este número subia para 16% quando se tratava de indivíduos do gênero feminino. A suposta relação entre alterações otológicas e disfunções temporomandibulares tem despertado o interesse dos profissionais da área da saúde há várias décadas. Apesar de não haver nenhuma conclusão sobre a inter-relação de alterações otológicas e DTM, algumas teorias, tem tentado explicar com os seguintes enfoques: o da compressão, o da anatomia, o da embriologia, o enfoque da obstrução tubária e da dor miofascial e, o mais recente, o enfoque nervoso. Como esta investigação não teve por objetivo diagnosticar a causa da DTM, mas somente o seu grau, estes enfoques foram discutidos para nortear o leitor deste trabalho. A teoria da compressão baseia-se no conceito de que a diminuição da Dimensão vertical de Oclusão (DVO), causada pela perda de pré-molares e molares, deslocaria o côndilo para distal, pressionando a tuba de Eustáquio, estruturas do ouvido e nervo auriculotemporal. Costen 6 publicou um artigo descrevendo uma série de sintomas otológicos e os associando à mandíbula e à ATM. Sicher 19 questionou a teoria apresentada por Costen 6, afirmando que a única maneira de pressionar o nervo timpânico seria com a ocorrência de fratura óssea. Zimmerman 20 questionando a teoria de Costen 6 escreveu que todos os sintomas da síndrome, exceto as neuralgias trigeminais e occipitais, seriam questionáveis. Pinto 21 estabeleceu uma ligação anatômica direta entre ATM e ouvido. Araújo 22 defendeu a teoria da obstrução tubária e que, em casos de alterações unilateral da ATM, a obstrução correspondia ao lado da alteração. Greene et al. 23 defendeu a 315

PTC BAYMA et al. teoria com enfoque da dor miofascial e leva em consideração, pontos de desencadeamento localizados na porção profunda do masseter referem dores na ATM e na orelha; ainda, alguns indivíduos descrevem um zumbido discreto. Levando, agora, em consideração o músculo pterigóideo medial, poderia desencadear também por meio de ponto gatilho, dor na região infra-auricular da ATM e alterações na tuba auditiva. O músculo esternocleidomastoideo, na divisão clavicular profunda, causaria dor referida na região pósauricular e região frontal. Vass et al. 24 encontrou evidências que o gânglio trigeminal é responsável pela inervação dos vasos sanguíneos da cóclea, causando o fenômeno da convergência, a hiperatividade dos músculos mastigatórios, podendo com isto desencadear hiperatividade nos órgãos relacionados à cóclea. D Antonio et al. 25 descreveram que cerca de 85% dos pacientes com DTM apresentam sintomas otorrinolaringológicos. Manfredi et al. 26 discutiram que a oclusão dental ainda é considerada um dos fatores predisponentes ao aparecimento das DTM já que um encaixe dental instável pode levar a um desequilíbrio da musculatura mastigatória. Trauma, estresse emocional e má oclusão têm sido a causa mais citada, direta ou indiretamente. Seraidarian et al. 27 descreveram que a otalgia teria uma prevalência de aproximadamente 5% na população com a referida disfunção. Tosato & Caria 28 descreveram que além do hábito parafuncional, a tensão emocional e o estresse também são conhecidos como fatores etiológicos das alterações da região da cabeça e pescoço. Dellon & Maloney 29, ressaltou que a secção do nervo auriculotemporal não pode ser aplicada a todos os indivíduos. Silveira et al. 30 relatou que em sua pesquisa utilizando a mesma populaçãoalvo e a mesma metodologia o sintoma mais relatado pelos indivíduos foi a dor de cabeça, pois 34,39% responderam que sentiam dor de cabeça freqüente e 33,48% às vezes. A respeito das teorias, o fato é que, quer por uma razão única, quer pela união de todas elas, os indivíduos portadores de DTM possuem freqüentemente sinais e sintomas relacionados com a otorrinolaringologia, e que foram descritas com o objetivo de esclarecer a diretriz da pesquisa. CONCLUSÃO Diante dos resultados obtidos e analisados estatisticamente, conclui-se que: a prevalência de DTM severa e moderada foi de 61,72%; a prevalência de DTM foi significativamente maior no gênero feminino (p=0,006); a prevalência encontrada em relação aos índices foi DTM leve - 28,4%; DTM moderada - 36,6%; DTM severa - 25,1% a prevalência da ausência de sintomas de DTM - 9,9%. Colaboradores PTC BAYMA foi o executor do trabalho de pesquisa. PP FELTRIN, DC LAGANÁ e RT INOUE orientaram a pesquisa. CAS DIAS examinou os pacientes que participaram do trabalho. JF COSTA foi o co-orientador da pesquisa. REFERÊNCIAS 1. Okeson JP. Fundamentos de oclusão e desordens temporomandibulares. 2. ed. São Paulo: Artes Médicas; 1992. 2. McNeill CH. Temporomandibular disorders, guidelines for classification, assessment and management. Chicago: Quintessence Publishing; 1993. 3. Okenson JP. Dor orofacial: guia de avaliação, diagnóstico e tratamento. São Paulo: Quintessence; 1998. 4. Agerberg G, Inkapool I. Craniomandibular disorders in an urban Swedish population. J Prosthet Dent. 1990;4(3):154-64. 5. Magnusson T, Egermark I, Carlsson GE. A longitudinal epidemiologic study of signs and symptoms of temporomandibular disorders from 15 to 35 years of age. J Orofac Pain. 2000;14(4):310-9. 6. Costen JB. A syndrome of ear and sinus symptoms dependent upon disturbed function of the temporomandibular join. 1934. Ann Otol rhinol Laryngol. 1997;106(10 pt 1):805-19. 7. Prentiss H. A preliminary report upon the temporomandibular articulation in the human type. Dent Cosm. 1918;60(6):505-12. 8. Monson GS. Occlusion as applied to crown bridge work. J Nat Dent Ass. 1920;7:399. 9. Fonseca DM. Disfunção craniomandibular (DCM): diagnóstico pela anamnese [dissertação]. Bauru: Universidade de São Paulo; 1992. 10. Conti PC, Ferreira PM, Pegoraro LF, Conti JV, Salvador MCI. A cross-sectional study of prevalence and etiology of signs and symptoms of temporomandibular disorders in high school and university students. J Orofac Pain. 1996;10(3):254-6 11. Agerberg G, Carlsson GE. Funcional disorders of the masticatory system. I. Distribuition of symptoms according to age and sex judged from investigation by questionnaire. Acta Odontol Scand. 1972;30(6):597-613. 12. Bush FM. Tinnitus and otalgia in temporomandibular disorders. J Prosthet Dent. 1987;58(4):495-8. 316

DTM em indivíduos com otalgia 13. Brito LH. Alterações otológicas nas desordens temporomandibulares. Rev Bras Otorrinolaringol. 1998;64(4):1-75. 14. Agerberg G, Carlsson GE. Funcional disorders of the masticatory system. II. Symptoms in relacion to impaired mobility of the mandible as judged from investigation by questionnaire. Acta Odontol Scand. 1973;31(6):337-47. 15. Helkimo M. Studies on function and dysfunction of the masticatory system. II. Index for anamnesic and clinical dysfunction and occlusal state. Sven Tandlak Tidskr. 1974;67(2):101-21. 16. Lipton JA, Ship JA, Larach-Robinson D. Estimated prevalence and distribution of reported orofacial pain in the United States. J Am Dent Assoc. 1993;124(10):115-21. 17. Agerberg G, Sandstrom R. Frequency of occlusal interferences: a clinical study in teenagers and young adults. J Prosthet Dent. 1998;59(2):212-7. 18. Abubaker AO, Raslan WF, Sotereanos GC. Estrogen and progesterone receptors in temporomandibular joint discs of symptomatic and asymptomatic persons: a preliminary study. J Oral Maxillofac Surg. 1993;5(10):1096-100. 19. Sicher H. Temporomandibular articulation in mandibular overclosure. J Am Dent Assoc. 1948;36(2):131-9. 20. Zimmermer A. An evaluation of Costen s syndrome from an anatomical point of view. In: Darant BG. The temporomandibular joint. Springfield: Charles C. Thomas; 1951. 21. Pinto OF. A new structure related to the temporomandibular joint and middle ear. J Prosthet Dent. 1962;12(1):95-103. 22. Araújo A. Influência das disfunções da articulação temporomandibular sobre a tuba auditiva. Rev Fac Odontol São José dos Campos. 1973;2(2):85-8. 23. Greene CS, Lerman MD, Sutcher HD, Kaskin DM. The TMJ pain-dysfunction syndrome: heterogeneity of the patient population. J Am Dent Assoc. 1969;79(5):1168-72. 24. Vass Z, Shore SE, Nuttal AL Jancson G, Brecthtelsbauer PB, Miller M. Direct evidence of trigeminal innervation of the cochlear blood vessels. Neuroscience. 1998;84(2):559-67. 25. D Antonio W, Ikino C, Castro S Balbani AP, Jurado JR, Bento RF. Distúrbio temporo-mandibular como causa de otalgia: um estudo clínico. Rev Bras Otorrinol. 2000;66(1):46-50. 26. Manfredi APS, Silva AAS, Vendite LL. Avaliação da sensibilidade do questionário de triagem para dor orofacial e desordens temporomandibulares recomendado pela Academia Americana de dor orofacial. Rev Bras Otorrinol. 2001;6(67):763-8. 27. Seraidarian PI, Dutra SR, Melgaço CA. Otalgia e desordens temporomandibular. JBA J Bras Oclu ATM & Dor Orofacial. 2005;5(20):102-12. 28. Tosato JP, Caria PHF. Prevalência de DTM em diferentes faixas etárias. RGO - Rev Gaúcha Odontol. 2006;54(3):211-24. 29. Dellon L, Maloney CT Jr. Denervation of the painful temporomandibular joint. J Craniofac Surg. 2006;5(17):828-32. 30. Silveira AM, Feltrin PP, Zanetti RV, Mautoni MC. Prevalência de portadores de DTM em pacientes avaliados no setor de otorrinolaringologia. Rev Bras Otorrinol. 2007;73(4):528-32. Recebido em: 27/5/2008 Versão final reapresentada em: 14/7/2008 Aprovado em: 3/11/2008 317