ANÁLISE DE SISTEMAS CONVECTIVOS DE MESOESCALA NO ESTADO DE SÃO PAULO UTILIZANDO DADOS DO RADAR DOPPLER DE BAURU Marcelo Moreira Medeiros¹; Ana Maria Gomes²; Gerhard Held²; Jonas Teixeira Nery¹ ¹Departamento de Geografia, Unidade Experimental de Ourinhos, UNESP, Ourinhos SP ²Instituto de Pesquisas Meteorológicas, UNESP, Bauru SP ana@ipmet.unesp.br RESUMO: No presente estudo propõe-se a uma análise de ocorrência de sistemas convectivos de mesoescala no estado de São Paulo utilizando a base de dados coletados pelo radar Doppler de Bauru. O período selecionado para análise compreende os meses chuvosos no estado, isto é, meses de outubro de 23 a março de 24. Os dados do radar de Bauru, tratados no sistema TITAN, serão usados para identificar os sistemas convectivos de mesoescala e determinar suas características morfológicas. Para análise serão considerados sistemas precipitantes que possuem áreas de pelo menos 125 km 2, com duração mínima de 4 horas. A partir daí será feita uma classificação preliminar dos sistemas convectivos de mesoescala, quanto a sua intensidade, a partir de definições de limiares para tal. A saber, sistemas com refletividade entre 35 dbz e 45dBZ persistente por mais de 2 horas de duração são considerados médios e causam pequenos estragos em superfície. Os sistemas que ultrapassam 45 dbz e persistentes por mais de 2 horas de duração são considerados intensos e causam grandes estragos em superfície e com grande probabilidade de produzir granizo. ABSTRACT: The present study proposes an analysis of the occurrence of mesoscale convective systems in the state of São Paulo, using the database collected by the Doppler radar of Bauru. The period selected for analysis includes the rainy months in the state, from October 23 to March 24. The radar data processed with the TITAN system will be used to identify mesoscale convective systems and to determine their morphological characteristics. 2 Precipitation systems that have areas of a minimum size of at least 125 km and precipitation lasting at least 4 hours, will be considered for the analysis. Thereafter, there will be a preliminary classification of mesoscale convective systems, comprising reflectivity between 35 dbz and 45 dbz and lasting more than 2 hours, which are considered of medium intensity, causing little damage on the surface. Systems that exceed 45dBZ and have a lifespan of more than two hours are considered intense and highly likely to produce hail, causing substantial damage.
1- INTRODUÇÃO O Estado de São Paulo está localizado na região sudeste do Brasil caracterizada, em geral, por uma região de transição entre os climas tropicais, típicos das baixas latitudes e o clima mesotermal, típico das latitudes temperadas (Nimer, 1979). A região está sob influencia de sistemas de grande escala, tanto das latitudes tropicais quanto das latitudes temperadas, tanto os sistemas sinóticos quanto a atividade convectiva estão em sua maioria concentrados durante o período de verão, sendo que a maior parte do tempo significativo ocorre entre os meses de outubro a março, quando o suprimento de energia solar e de umidade é maior. Uma breve revisão da literatura mostra que a maioria dos estudos, focando eventos extremos ou severos, está associada com a Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS), definida como a formação de uma frente estacionaria, sendo responsável por chuvas intensas e mais ativas durante os meses do verão (Satyamurty et al., 28). Assim, a maior parte dos sistemas convectivos de mesoescala ocorre no período de verão, e muitos casos estão associados ao encontro de massas de ar frio de entrada mais continental com jatos de baixo nível advindos da Amazônia, que geram uma linha de instabilidade provocando altos níveis de convecção. Boa parte das pesquisas realizadas sobre os SCM está baseada em dados e análises de imagens de satélite. Em relação à extensão desses sistemas Maddox (1983) mostrou que na fase madura os SCM atingem sua máxima extensão definindo uma extensa área de precipitação com convecção intensa provocando chuvas fortes, granizo acompanhado de rajadas de vento em áreas bastante localizadas. Os resultados de Machado et al. (1993) para SCM na América do Sul usando imagens de satélite a cada 3 horas mostraram que o tempo de vida desses sistemas estava entre 6 a 36 horas, sendo que 9% dos SCM analisados tiveram duração menor que 18 horas. Figura 1: Áreas de alcance qualitativo (45 km) e quantitativo (24 km) a partir de cada radar do IPMet, Bauru (BRU) e Presidente Prudente (PPR), respectivamente. Starostin e Anabor (2) num estudo sobre SCM de longa duração, considerando um tempo de vida maior que 12 horas, identificaram dois horários preferenciais para intensificação dos SCM,
sendo um no período da madrugada (entre zero e 6 horas) e outro no final da tarde (entre 12 e 18 horas). O presente estudo propõe similar análise usando informações coletadas por um dos radares do IPMet (Instituto de Pesquisas Meteorológicas), e o sistema TITAN (Thunderstorm Identification, Tracking, Analysis and Nowcasting; Dixon and Wiener, 1993), para identificação dos SCM que ocorrem no Estado de São Paulo, na área de alcance do radar de Bauru, mostrado na Figura 1. O sistema TITAN tem grande potencial para rastrear e identificar áreas de precipitação, possibilitando informações sobre parâmetros característicos como o tempo de vida, forma, dimensão bem como percentual de contribuição dos núcleos convectivos nesses sistemas. 2 MATERIAL E METODOS Para identificação de uma tempestade pode-se utilizar tanto o volume quanto sua área, que é definida pelo limiar da Célula do TITAN, ou simplesmente Célula. Uma tempestade completa constitui, portanto, um grande volume composto de regiões incluindo refletividades menores que o valor de limiar (Gomes, 27). O presente estudo apresenta uma análise de sistemas convectivos de mesoescala (SCM) que adentram o Estado de São Paulo, na área de alcance dos radares Doppler do IPMet, durante os meses de outubro de 23 a março de 24. Os parâmetros utilizados para identificar esses SCM são: área de no mínimo 125 km², limiar de refletividade >2 dbz e duração mínima de 4 horas, observadas em CAPPIs (Indicador de Posição no Plano a Altura Constante) de 3,5 km. A partir da identificação das áreas de precipitação foram obtidos os parâmetros necessários para caracterizar os SCM, gerando informações como data, hora de inicio de entrada na área de alcance do radar, duração, área média e máxima de precipitação (km²), refletividade média e máxima (dbz), etc, relativos ao período selecionado para o estudo. 3 - RESULTADOS E DISCUSSÕES Para a apresentação dos resultados são considerados todos os SCM que adentraram a área do radar de Bauru e identificados no período, com destaque para os sistemas de precipitação com duração maior que 4 horas e atividade convectiva, identificada pelos níveis de refletividades >35 dbz, e portanto com potencial para causar danos em superfície e conseqüentemente maiores transtornos à sociedade. No período analisado foram detectados 47 SCM baseados nos parâmetros definidos para a identificação desses sistemas, sendo que apenas 67 deles ultrapassaram um tempo de vida maior que 4 horas de duração, dentro da área de alcance dos 24 km do radar de Bauru. A distribuição de ocorrência sazonal é mostrada na Figura 3, onde se observa dois máximos relativos a ocorrência desses sistemas, um no mês de dezembro e o outro no mês de fevereiro. A maior parte dos SCM identificados dentro da área de alcance do radar de Bauru foram observados entre as 17h e 2h, totalizando aproximadamente 33% dos casos, como
indica a Figura 4, em acordo com os resultados de análises realizadas por Starostin e Anabor (2) para SCM observados no Rio Grande do Sul. Dentre o total de sistemas convectivos de mesoescala identificados no período selecionado para o estudo observou-se que os mesmos tiveram uma duração média de 2 horas, sendo que aproximadamente 86% deles duraram menos que 4 horas, como pode ser visto pela Figura 5. 14 Sistemas Convectivos de Mesoescala 25 12 SCM Observados SCM>4 hs 2 Número de Ocorrencias 1 8 6 4 Frequencia de Ocorrencia (%) 15 1 5 2.25-2. 2. - 4. 4. - 6. 6. - 8. 8. - 1. 1. - 12. - 14. - 16. - 18. - 2. - 22. - Outubro Novembro Dezembro Janeiro Fevereiro Março 12. 14. 16. Horario Inicio (hs) 18. 2. 22. 24. Figura 3: Distribuição de ocorrência de SCM nos meses de verão de Outubro de 23 a março de 24. 25 Figura 4: Horário de inicio dos SCM, em porcentagem. 2 Número de Ocorrencia 2 15 1 5 Número de Ocorrencia 18 16 14 12 1 8 6 4 2 1 2 3 4 5 6 7 8 9 1 11 12 13 14 15 4 5 6 7 8 9 1 11 12 13 14 15 Tempo de Duração (horas) Tempo de Vida (Horas) Figura 5: Distribuição da frequencia de duração, em horas, dos SCM identificados pelo radar de Bauru. Figura 6: Distribuição de ocorrências de SCM com tempo de vida >4 horas. Quando se considerou os SCM de longa duração os resultados mostraram que do total de sistemas identificados, 67 destes SCM, tiveram duração >4 horas, como ilustra a Figura 6. A distribuição de ocorrencia das áreas médias e máximas que podem atingir esses sistemas convectivos, observados com o radar de Bauru é mostrado na Figura 7. Os SCM atingem área media entre 3 x1 3 e 25x1 3 km 2 sendo que as áreas máximas ficam entre 5 x1 3 e 75x1 3 km 2, para o periodo analisado. Um exemplo de um SCM observado em 7 de outubro de 23, é apresentado na Figura 8, mostrando sua evolução temporal desde sua detecção às 11:52 HL, passando pelo periodo do estágio maduro, quando atinge sua máxima área de precipitação, até o periodo de desintensificação e consequente decaimento, em torno de 21: HL. Esses resultados ainda são preliminares pois o estudo deverá ser expandido para um periodo mais extenso, considerando uma base de dados de 15 anos existentes no banco de dados do IPMet.
Frequencia do Número de Ocorrencia 5 45 4 35 3 25 2 15 1 5 4 6 Area Media SCM 8 1 Área Máxima SCM 15 2 25 3 35 Área do SCM (km 2 ) 4 45 5 1 Figura 7: Distribuição de ocorrências de áreas média (azul) e máxima (verde) dos SCM. Área do SCM (km 2 ) 6 5 4 3 2 1 11:52 12:37 13:22 14:7 14:52 15:37 16:22 17:7 17:52 18:37 19:22 2:7 2:51 Horario (hora local) Figura 8: Evolução temporal da área de precipitação baseada no limiar de refletividade >2 dbz mostrando o ciclo de vida do SCM de 7 de outubro de 23 sobre a área de alcance dos 24 km do radar de Bauru. 4- REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS COTTON, W. R. and ANTHES, R.A., 1989. Storm and Cloud Dynamics. Academic Press, 1989, 883p. DIXON, M.J. and WIENER, G., 1993. TITAN Thunderstorm identification, tracking, analysis, and nowcasting A radar-based methodology. Journal of Atmospheric Oceanic Technology, v.1, p. 785-797. GOMES, A. M., 27. Utilização da técnica VxIAT para determinação de volumes de precipitação na área central do Estado de São Paulo. Tese (doutorado) em Ciências Agronômicas, Botucatu, 91 p., 27. HOUZE Jr., R.A., 1993. Cloud Dynamics, Academic Press, 1993, 57p. MADDOX, R. A., 1983. Large-scale meteorological conditions associated with midlatitude, mesoscale convective complexes. Mon. Wea. Rev., 121(5): 1398 1416. MACHADO, L.A.T., R. L. GUEDES, J.M.B. SILVEIRA, R.C.WALTZ e ALVES, M.A.S., 1994. Ciclo de vida de sistemas convectivos. VIII Congresso Brasileiro de Meteorologia, SBMET, Anais, 2, 323-326. NIMER, E., 1979. Climatologia do Brasil. Fundação Instituto Brasileiro de Geografia, Estatística, Diretoria Técnica, Superintendência de Recursos Naturais e Meio Ambiente. STAROSTIN, A. e ANABOR, V., 2. Análise de um sistema convectivo de mesoescala através de imagens de satélite no referencial móvel. In: XI Congresso Brasileiro de Meteorologia, Rio de Janeiro, SBMet, CD-ROM, 2, p. 1836-1841. SATYAMURTY, P.; S. B. SOUSA J. R.; M. DA S. TEIXEIRA e L. E. M. G. DA SILVA, 28. Regional circulation differences between a rainy episode and a nonrainy episode in eastern São Paulo State in March 26. Revista Brasileira de Meteorologia, 23 (4), 44-416. ZIPSER, E. J., 1982. Use of a conceptual modelo of the life cycle of mesoscale convective systems to very-short-range forecasts. Nowcasting, K. Browning (Ed.), Academic Press, New York, p.191-24.