CAPÍTULO 3 ANÁLISE ESTRUTURAL PARA CARGAS VERTICAIS. 3.1. Principais Sistemas Estruturais. 3.1.1. Paredes Transversais



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Transcrição:

CAPÍTULO 3 ANÁLISE ESTRUTURAL PARA CARGAS VERTICAIS 3.1. Principais Sistemas Estruturais A concepção da estrutura consiste em se determinar, a partir de uma planta básica, quais as paredes que serão consideradas estruturais ou não-estruturais, no presente caso em relação às cargas verticais. Alguns fatores podem condicionar esta escolha: utilização da edificação, simetria da estrutura, etc. Esse conjunto de elementos portantes é denominado sistema estrutural. Apenas com objetivos didáticos, os sistemas estruturais podem ser classificados em alguns tipos notáveis. Segundo HENDRY (1981), que criou uma classificação que se pode considerar clássica, os sistemas estruturais podem ser nomeados de acordo com a disposição das paredes estruturais nos tipos apresentados nos itens que se seguem. 3.1.1. Paredes Transversais Utilizável em edifícios de planta retangular e alongada. As paredes externas, na direção do maior comprimento, são não estruturais de forma a permitir a colocação de grandes caixilhos. As lajes são armadas em uma direção, de forma a apoiarem-se sobre as paredes portantes. Algumas aplicações principais podem ser mencionadas: hotéis, hospitais, escolas, etc. Fig. 3.1 - Sistema estrutural em paredes transversais 23

3.1.2. Paredes Celulares Sistema adequado a edificações de plantas mais gerais. Todas as paredes são portantes. As lajes podem ser armadas em duas direções, pois há a possibilidade de apoiarem-se em todo seu contorno. Suas aplicações principais são em edifícios residenciais em geral. Por conferir uma maior rigidez ao conjunto, o sistema de paredes celulares é bastante interessante de ser utilizado, sempre que possível. Fig. 3.2 - Sistema estrutural em paredes celulares 3.1.3. Sistema Complexo Trata-se da utilização simultânea dos tipos anteriores, normalmente em regiões diferentes da planta da edificação. Interessante para edificações onde se necessita de alguns painéis externos não estruturais, sendo, entretanto, possível manter-se uma região interna mais rígida, com todas as paredes com função estrutural. Fig. 3.3 - Sistema estrutural complexo 3.2. Carregamento Vertical As cargas a serem consideradas em uma edificação dependem do tipo e da utilização desse edifício. Por exemplo, em um edifício industrial pode ser necessária a consideração de cargas provenientes de pontes rolantes. Neste trabalho, entretanto, as atenções principais estão voltadas para edificações residenciais. E para os edifícios residenciais em alvenaria estrutural as principais cargas a serem consideradas nas paredes serão: 24

a) Ações das lajes b) Peso próprio das paredes. Os valores mínimos a serem adotados para os carregamentos podem ser obtidos consultando-se a NBR 6120 - Cargas para o Cálculo de Estruturas de Edificações 1. 3.2.1. Cargas Provenientes das Lajes As principais cargas atuantes nas lajes de edifícios residenciais podem ser divididas em dois grandes grupos: cargas permanentes e cargas variáveis. As principais cargas permanentes normalmente atuantes são: a) Peso próprio b) Contrapiso c) Revestimento ou piso d) Paredes não-estruturais Já as cargas variáveis são cobertas pela sobrecarga de utilização, que para os edifícios residenciais variam de 1,5 a 2,0 kn/m 2. As lajes descarregam todas essas cargas sobre as paredes portantes que lhe servem de apoio. Para cálculo dessas ações, dois casos podem ser destacados: a) Lajes armadas em uma direção b) Lajes armadas em duas direções Fig. 3.4 - Laje apoiada sobre paredes portantes Para os casos de lajes pré-moldadas ou armadas em uma direção, deve-se considerar simplesmente a região de influência de cada apoio, ou seja, os lados perpendiculares à direção da armadura. Nesse caso pode-se imaginar a existência de uma linha, paralela aos apoios, que limita as regiões de influência. Considerando-se um vão L, essa linha pode ser tomada nas seguintes posições: a) 0,5 L entre dois apoios do mesmo tipo. b) 0,38 L do lado simplesmente apoiado e 0,62 L do lado engastado. c) 1,0 L do lado engastado quando a outra borda for livre. 1 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1980) 25

Já no caso de ações de lajes maciças, armadas em duas direções, pode-se utilizar o procedimento das linhas de ruptura, recomendado pela NBR 6118 - Projeto e Execução de Obras de Concreto Armado 1. 3.2.2. Peso Próprio das Paredes Para considerar o peso próprio das paredes, basta utilizar a expressão: onde p = γ e h p: peso da alvenaria ( por unidade de comprimento ) γ: peso específico da alvenaria e: espessura da parede ( bloco + revestimento ) h: altura da parede ( não esquecer eventuais aberturas ) Quanto ao valor de γ, o parâmetro mais importante da expressão, devem ser consideradas as condições específicas da alvenaria utilizada. Para os principais tipos presentes em edifícios residenciais pode-se montar a tabela 3.1. Tab. 3.1 Principais pesos específicos para alvenaria Tipo de alvenaria Peso específico kn/m 3 Blocos vazados de concreto 14 Blocos vazados de concreto preenchidos com graute 24 Blocos cerâmicos 12 3.3. Interação entre Paredes Numa parede de alvenaria, quando se coloca um carregamento localizado sobre apenas uma parte de seu comprimento, tende a haver um espalhamento dessa carga ao longo de sua altura. A própria NBR 10837 - Cálculo de Estruturas de Alvenaria de Blocos Vazados de Concreto 2 prescreve que esse espalhamento deve-se dar segundo um ângulo de 45. Se esse espalhamento pode ser observado em paredes planas, é de se supor que também possa ocorrer em canto e bordas, especialmente quando a amarração é realizada intercalando-se blocos numa e noutra direção, ou seja, sem a existência de juntas a prumo. Isso se dá porque um canto assim executado guarda muita semelhança com a própria parede plana, devendo ser, portanto, o seu comportamento também semelhante, figura 3.5. É claro que somente haverá espalhamento da carga através de um canto se nesse ponto puderem se desenvolver forças de interação, figura 3.6. Se essas forças não estiverem presentes por um motivo qualquer, como a existência de uma junta a prumo no local, evidentemente o 1 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1978) 2 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1989) 26

espalhamento também não se verificará. E não ocorrendo o espalhamento não ocorrerá a uniformização das cargas que atuam sobre essas paredes. Fig. 3.5 - Espalhamento do carregamento em paredes planas e em L Fig. 3.6 - Interação entre paredes em um canto Outro ponto onde se pode discutir a existência ou não de forças de interação são as aberturas. Usualmente, considera-se que a existência de uma abertura também represente um limite entre paredes, ou seja, a abertura caracteriza a interrupção do elemento. Assim sendo uma parede com aberturas normalmente é considerada como uma seqüência de paredes independentes. Entretanto, também nesse caso, costuma haver forças de interação entre esses diferentes elementos e, portanto, haverá espalhamento e uniformização de cargas, figura 3.7. Não se pode esquecer que em casos usuais de janelas ainda se tem aproximadamente 2/3 do pé-direito preenchido com material, sendo que essa altura se reduz a aproximadamente 1/3 no caso de portas. Fig. 3.7 - Interação entre paredes em região de janela Dessa forma, é importante deixar bem claro que o procedimento de distribuição de cargas verticais somente pode ser definido após uma clara avaliação desses níveis de interação entre paredes, de modo a não se violar condições reais de trabalho da estrutura. Se for possível a 27

ocorrência de forças de interação relativamente grandes isso significará um espalhamento do carregamento e, portanto, uma uniformização das cargas entre essas paredes. Em caso contrário, o espalhamento e a uniformização do carregamento podem se dar em níveis muito baixos. 3.4. Importância da Uniformização das Cargas Normalmente, as cargas verticais que atuam sobre as paredes, num determinado nível da edificação, apresentam valores que podem ser muito diferentes. Por exemplo, as paredes internas tendem a receber carregamentos bem maiores que as paredes externas. Mesmo assim, não é recomendável que, para um determinado pavimento, sejam utilizadas resistências diferentes para os blocos. Seria muito perigoso uma troca de resistências, fazendo com que uma parede que necessitasse de um bloco mais resistente acabasse sendo construída com um menos resistente e vice-versa. Isso porque os blocos normalmente não possuem nenhuma indicação explícita dessa resistência, podendo ser facilmente confundidos. Desse modo, a parede mais carregada acaba definindo a resistência dos blocos a serem utilizados para todas as paredes do pavimento. É claro que podem ser previstos pontos grauteados, o que aumenta a resistência da parede mantendo-se a resistência do bloco. Entretanto, o grauteamento não é uma solução para ser utilizada de modo extensivo, devido ao custo e às dificuldades de execução. Portanto, pode-se concluir que quanto maior a uniformização das cargas verticais ao longo da altura da edificação maiores os benefícios para a economia, pois haverá uma tendência a uma redução das resistências dos blocos a serem especificados. Por outro lado, se a suposta uniformização não ocorrer na prática, pode-se ter uma redução significativa da segurança da edificação. Logo, o projetista deve ter em mente esses parâmetros para considerar a distribuição desses carregamentos verticais, de modo a não onerar em excesso o custo da obra e não comprometer a segurança da estrutura. É bastante claro que, em maior ou menor grau, sempre ocorrerá uma uniformização dos carregamentos ao longo da altura da edificação. Entretanto, quantificar como se processa essa uniformização é o ponto relevante da questão. 3.5. Influência do Processo Construtivo Quando se fala de distribuição de cargas verticais entre as diversas paredes de uma pavimento deve-se levar em consideração que o processo executivo é uma variável de grande importância. Pode-se citar algumas das providências construtivas que mais contribuem para a existência de forças de interação elevadas e portanto uma maior uniformização das cargas verticais, em caso de canto e bordas : a) Amarração das paredes em cantos e bordas sem juntas a prumo b) Existência de cintas sob a laje do pavimento e à meia altura. c) Pavimento em laje maciça A primeira característica apresentada talvez seja a mais importante. Quando se utiliza qualquer procedimento de amarração que não seja a colocação dos blocos de forma a se evitar a 28

formação de juntas a prumo, o desenvolvimento de forças de interação, o espalhamento das cargas e logicamente a uniformização desse carregamento, torna-se um procedimento duvidoso. Resultados de pesquisas recentes realizadas no Laboratório de Estruturas do SET-EESC- USP, ainda a serem publicados, indicam que grapas, corretamente colocadas em cantos e bordas com o auxílio de furos grauteados, podem atuar de forma bastante eficiente. Os resultados são realmente muito animadores, podendo-se admitir um comportamento muito próximo daquele que se obteria com a amarração sem juntas à prumo. Entretanto, tendo sido esses resultados obtidos para paredes construídas em escala 1:3, é necessário que se confirme esses valores através de ensaios em escala real para que possam ser utilizados com segurança. Já alguns outros esquemas de armaduras que muitas vezes são colocadas nos cantos e bordas, como telas ou ferros de pequeno diâmetro envolvidos pela argamassa de juntas horizontais, realmente não tem a condição de garantir com segurança a transmissão de forças significativas nos encontros de paredes. Também podem contribuir para uma uniformização das cargas em cantos e bordas as outras providências mencionadas, se bem que num nível de menor importância. Cintas sob a laje e à meia altura e pavimentos em laje maciça trabalham a favor da uniformização pois tendem a aumentar as forças de interação. Entretanto, é difícil se quantificar essa influência benéfica, especialmente se for considerada a grande variabilidade dessas providências. Cintas podem ser executadas com diversas alturas e armadas com ferros de diversos diâmetros. Lajes também podem apresentar espessuras diferentes e diversos esquemas de armação. Quanto às aberturas, os detalhes construtivos que mais colaboram no sentido do aumento das forças de interação e portanto da uniformização são : a) Existência de vergas. b) Existência de contra-vergas. Evidentemente, essas vergas e contra-vergas devem ser previstas com uma penetração apropriada nas paredes a que se ligam. Quanto maiores forem essas penetrações melhores condições de desenvolvimento de forças de interação serão criadas 3.6. Procedimentos de Distribuição Para auxiliar a definição da distribuição de cargas verticais, pode-se apresentar alguns dos procedimentos mais indicados. Cada um tem suas vantagens, desvantagens e aplicações apropriadas, o que se tentará destacar nos itens específicos. 3.6.1. Paredes Isoladas Neste procedimento trata-se de considerar cada parede como um elemento independente, não interagindo com os demais elementos da estrutura. É um procedimento simples e rápido. Para encontrar a carga numa parede, num determinado nível, basta multiplicar a valor obtido para um pavimento pelo número de pavimentos que estão acima do nível considerado. Além de simples é também muito seguro, pois na ausência da uniformização das cargas as resistências prescritas para os blocos resultarão sempre mais elevadas que se a uniformização fosse 29

considerada. O ponto negativo é obviamente a economia, que sai penalizada pois blocos mais resistentes são também blocos mais caros. Além disso, considerar as paredes completamente isoladas não é verossímil, para a maioria das edificações, pelas razões anteriormente citadas. Isso pode causar uma estimativa errada das ações sobre estruturas complementares, como pavimentos de pilotis e fundações em concreto armado. A recomendação que se pode fazer é que este procedimento de se considerar as paredes isoladas seja utilizado para edificações de altura relativamente pequena, onde os seus efeitos negativos são menos perceptíveis. 3.6.2. Grupos de Paredes Isolados Um grupo é um conjunto de paredes que são supostas totalmente solidárias e, geralmente, os limites dos grupos são as aberturas, portas e janelas, conforme se mostra como exemplo na figura 3.8. Neste procedimento considera-se as cargas totalmente uniformizadas em cada grupo de paredes considerado. Isso significa que as forças de interação em canto e bordas são consideradas suficientes para garantir um espalhamento e uma uniformização total em uma pequena altura. Por outro lado, desconsideram-se as forças de interação nas aberturas, limites dos grupos. Dessa forma, cada grupo definido trabalhará isolado dos demais. É um procedimento bem aceito na literatura internacional. SUTHERLAND (1968) propõe que se divida a laje em triângulos e trapézios e que essas áreas de contribuição sejam levadas a grupos de paredes que estariam trabalhando solidárias. Esse é, em suma, o procedimento aqui recomendado. Os triângulos e trapézios mencionados nada mais são do que as regiões formadas por linhas de ruptura das lajes de concreto. E as evidências de uniformização do carregamento vertical dentro dos grupos foram levantadas por STOCKBRIDGE 1 apud HENDRY(1981) que mediu deformações em paredes na base de um edifício de cinco pavimentos enquanto este era construído. Essas medidas evidenciaram que as cargas acabavam se uniformizando à medida em que os pavimentos eram acrescentados à edificação. Fig. 3.8 -Exemplo de grupos de paredes definidos pelas aberturas existentes Também é um procedimento simples de ser implementado, se bem que implique em um trabalho um pouco maior do que para o procedimento de paredes isoladas. Basta que todas as cargas a serem aplicadas em qualquer parede de um determinado grupo sejam somadas e posteriormente distribuídas pelo comprimento total dessas paredes do grupo. Encontrada a carga para o grupo 1 STOCKBRIDGE, J.G. (1967). A Study of High-Rise Load Bearing Brickwork in Britain. M.Arch. Thesis, Univ. of Edinburgh. 30

correspondente a um pavimento basta multiplicar pelo número de pavimentos que se encontram acima do nível que se pretende verificar. Usualmente, também é um procedimento seguro, em especial quando as aberturas são consideradas como o limite entre os grupos. Entretanto, como essa definição pode basear-se em outros parâmetros, o procedimento pode apresentar distorções, dependendo de quais paredes serão consideradas como pertencentes a tal ou qual grupo. Considera-se ainda que produza reações adequadas para eventuais estruturas de apoio, o que é um detalhe bastante importante a ser considerado. Quanto à economia, sempre se admitindo uma escolha tecnicamente correta dos grupos a serem considerados, é um procedimento bastante racional e que normalmente resulta em especificações de blocos adequadas. A redução das resistências necessárias para os blocos costuma ser bastante significativa em relação ao procedimento das paredes isoladas. Pelas suas qualidades, pode-se considerá-lo um procedimento adequado a edificações de qualquer altura. Entretanto, é fundamental que se avalie corretamente a possibilidade de realmente ocorrerem as mencionadas forças de interação em cantos e bordas, condição fundamental para sua correta aplicação. 3.6.3. Grupos de Paredes com Interação Este procedimento é uma extensão do anterior, com uma sofisticação adicional de modo que os próprios grupos de paredes interagem entre si. Portanto, a diferença entre este procedimento e o anterior, que apenas considerava a interação em canto e bordas, é a existência de forças de interação também nas aberturas. Claro que essa interação não pode se limitar a uma uniformização total do carregamento, pois isso equivaleria a encontrar a carga vertical total de um pavimento e dividi-la pelo comprimento total das paredes, obtendo uma carga média igual para todos os elementos. Na verdade é conveniente que seja definida uma taxa de interação, que representa quanto da diferença de cargas entre grupos que interagem deve ser uniformizada em cada nível. Além disso, é também importante que se possa especificar quais grupos de paredes estão interagindo, de modo que o projetista tenha total controle sobre o processo. É bem mais trabalhoso que os dois procedimentos anteriormente mencionados. Assim, de forma a reduzir a possibilidade da ocorrência de erros, recomenda-se que seja automatizado através de computadores, até mesmo com a utilização de um programa de planilha eletrônica. Uma sugestão interessante para se considerar essa interação através de um algoritmo seguro e relativamente fácil de ser implementado é apresentada em CORRÊA & RAMALHO (1994a) ou CORRÊA & RAMALHO (1998b). Resumidamente trata-se de fazer a distribuição através das seguintes equações: q m = ( q 1 + q 2 +... + q n ) / n d i = ( q i q m ) * ( 1 t )...(3.1) onde: q i = q m + d i n = número de grupos que estão interagindo. q i = carga do grupo i. q m d i t = carga média dos grupos que estão interagindo. = diferencial de carga do grupo em relação à média. = taxa de interação. 31

Quanto à segurança do procedimento aqui exposto, é difícil adotar uma posição simplista. Como devem ser definidos os grupos, quais grupos interagem entre si e ainda a taxa de interação adotada, é um procedimento que exige bastante experiência do projetista. Quando bem utilizado é seguro, produzindo inclusive cargas adequadas para eventuais estruturas de suporte. A economia é seu grande atrativo. As especificações de resistências de blocos resultantes de sua utilização tendem a ser as menores entre os procedimentos discutidos até aqui. Especialmente quando se tem paredes de pequenas dimensões e isoladas por aberturas, as diferenças costumam ser muito significativas, mesmo em relação ao procedimento de grupos isolados. De forma semelhante ao procedimento que considera os grupos isolados, é adequado a edificações de qualquer altura. Entretanto, aqui também é fundamental que se avalie corretamente a possibilidade de realmente ocorrerem as forças de interação, tanto em cantos e bordas como nas regiões de aberturas. Serão essas, sem dúvida, as condições fundamentais para sua utilização. 3.6.4. Modelagem Tridimensional em Elementos Finitos Trata-se de modelar a estrutura com elementos de membrana ou chapa, colocando-se os carregamentos ao nível de cada pavimento. Dessa forma a uniformização dar-se-á através da compatibilização dos deslocamentos ao nível de cada nó. É um procedimento muito interessante que, entretanto, apresenta alguns inconvenientes: dificuldades na montagem dos dados e na interpretação dos resultados, além da definição de elementos que possam representar o material alvenaria. No momento, pode-se afirmar que ainda não é viável para projetos usuais. Serão necessárias algumas pesquisas, inclusive com o desenvolvimento de elementos especiais para a simulação da alvenaria, para que realmente possa ser utilizada com eficiência e segurança. 3.7. Exemplos de Distribuição de Cargas Verticais Para deixar clara a utilização dos três primeiros procedimentos discutidos apresenta-se neste item dois exemplos de aplicação. Através deles pretende-se demonstrar as principais características de cada procedimento, verificando-se assim as suas peculiaridades quando à dificuldade de implementação e resultados obtidos. 3.7.1.Exemplo 1 Trata-se de parte de uma edificação, representada pelos três grupos apresentados na figura 3.8. Será admitido que esses três grupos representem o conjunto de paredes do pavimento, o que é bastante razoável para as comparações efetuadas. O objetivo maior é demonstrar os cálculos necessários para a obtenção dos resultados, além da discussão sobre esses valores obtidos. Dados adicionais sobre comprimentos das paredes e cargas atuantes são organizados na tabela 3.2. Ressalta-se que os valores dos carregamentos são representativos de uma situação típica de projeto e para a comparação pretendida serão adotados oito pavimentos de altura e a espessura das paredes igual a 0,14 m. 32

Tab. 3.2 - Comprimentos das paredes e carregamento atuante por pavimento Parede Comp (m) Laje (kn/m) P.Prop (kn/m) Tot.Dist (kn/m) Total (kn) P1 2,55 8,50 5,50 14,00 35,70 P2 3,60 14,75 5,50 20,25 72,90 P3 0,75 7,50 5,50 13,00 9,75 P4 3,45 8,75 5,50 14,25 49,17 P5 2,25 17,25 5,50 22,75 51,19 P6 0,40 36,00 5,50 41,50 16,60 Utilizando-se o procedimento das paredes isoladas, para o primeiro pavimento, obtém-se os valores de carga e tensão especificados na tabela 3.3. Pelos resultados obtidos, pode-se concluir que a variação das tensões nas diversas paredes que compõem o citado exemplo é bastante grande. A parede P6, a mais solicitada, apresenta uma tensão 3,2 vezes maior que a parede P3, a menos solicitada. Já quanto à resistência de bloco necessária, a última coluna da referida tabela 3.3 apresenta o valor aproximado calculado considerando-se a utilização de blocos vazados de concreto. Pelos valores obtidos verifica-se que mesmo que se adotasse o grauteamento da parede P6, procedimento altamente recomendável para esse caso, ainda se obteria uma variação bastante significativa da resistência considerando-se apenas as outras paredes. Isso, obviamente, acabaria por penalizar a economia da obra. Tab. 3.3 - Paredes Isoladas, primeiro pavimento Parede Carga Dist. (kn/m) Tensão (kn/m 2 ) Tensão (MPa) Res. Bloco (MPa) P1 112,0 800,0 0,800 5 P2 162,0 1.157,1 1,157 7 P3 104,0 742,9 0,743 4,5 P4 114,0 814,3 0,814 5 P5 182,0 1.300,0 1,300 8 P6 332,0 2.371,4 2,371 15 Agora, considerando-se grupos de paredes sem interação, obtém-se, para o mesmo primeiro pavimento, os resultados apresentados na tabela 3.4. Da análise dos resultados obtidos pode-se perceber que a situação das paredes em que a distribuição das cargas dependia de forças de interação em canto e bordas, que neste caso são consideradas, fez com que a tensão se aproximasse de 1 Mpa para os dois grupos. Portanto, tensões que no caso anterior variavam de 1,30 a 0.74 MPa foram praticamente igualadas. Apenas a parede P6, que se encontra isolada no grupo G3 já que as forças de interação através das aberturas não estão sendo consideradas, ainda apresenta a mesma tensão elevada que apresentava no procedimento anterior. Quanto à resistência a ser especificada para os blocos que comporão as paredes, se considerarmos apenas os grupos 1 e 2 os valores que variavam de 4,5 a 8 MPa passam a 6 Mpa. Já a pequena parede isolada P6, que compõe o grupo G3, deve ser considerada grauteada e armada. Isso faz com que o bloco de 6 MPa possa ser utilizado em todo o pavimento, o que representa uma economia significativa. 33

Tab. 3.4 - Grupos de paredes sem interação Grupo Comp. (m) C.Tot (kn) C.Dist (kn/m) Tensão (MPa) Res. Bloco (MPa) G1 6.15 868,8 141,3 1,009 6 G2 6.45 880,9 136,6 0,976 6 G3 0,40 132,8 332,0 2,371 15 Finalmente, pode-se demonstrar a utilização do procedimento de grupos de paredes com interação. Nesse caso, adotando-se uma taxa de uniformização do diferencial de carga de 50%, obtém-se os resultados que se encontram organizados na tabela 3.5. Pav C.Media (kn/m) 8 18,10 7 36,20 6 54,30 5 72,40 4 90,50 3 108,60 2 126,70 1 144,80 Tab. 3.5 - Grupos de paredes com interação Grupo Carga Carga C. Unif. Tensão Tensão (kn/m) (kn/m) (kn/m) (kn/m 2 ) (MPa) Bloco (MPa) G1 17,66-0,219 17,88 127,7 0,128 1 G2 17,08-0,513 17,58 125,6 0,126 1 G3 41,50 11,700 29,80 212,8 0,213 1 G1 35,33-0,437 35,76 255,4 0,255 2 G2 34,15-1,025 35,17 251,2 0,251 2 G3 83,00 23,400 59,60 425,7 0,426 3 G1 52,99-0,656 53,64 383,1 0,383 2 G2 51,23-1,538 52,76 376,8 0,377 2 G3 124,50 35,100 89,40 638,5 0,639 4 G1 70,65-0,874 71,52 510,9 0,511 3 G2 68,30-2,050 70,35 502,5 0,503 3 G3 166,00 46,800 119,20 851,4 0,851 5 G1 88,32-1,093 89,40 638,6 0,639 4 G2 85,38-2,563 87,93 628,1 0,628 4 G3 207,50 58,500 149,00 1064,2 1,064 7 G1 105,98-1,311 107,28 766,3 0,766 5 G2 102,45-3,075 105,52 753,7 0,754 5 G3 249,00 70,200 178,80 1277,1 1,277 8 G1 123,64-1,530 125,17 894,0 0,894 6 G2 119,53-3,588 123,11 879,3 0,879 5 G3 290,50 81,900 208,60 1490,0 1,490 9 G1 141,30-1,748 143,05 1021,8 1,022 6 G2 136,60-4,100 140,70 1005,0 1,005 6 G3 332,00 93,600 238,40 1702,8 1,703 11 Observando-se os resultados da tabela 3.5, verifica-se que para o primeiro pavimento ocorreu um aumento muito discreto das tensões no grupos 1 e 2 para uma diminuição bastante acentuada da tensão no grupo 3. Essa é realmente a situação típica a ser encontrada. Como a parede isolada tinha pequena dimensão, e por causa disso apresentava problemas com tensões muito elevadas, a carga transmitida aos demais grupos não é significativa para acrescer as suas tensões, sendo no entanto suficientemente grande para reduzir de forma significativa a própria tensão. Quanto à resistência a ser especificada para os blocos, sempre considerando-os vazados de concreto, verifica-se que o valor para o pavimento como um todo não se modifica, mantendo-se em 6 34

MPa. Entretanto, a parede P6 poderá ser simplesmente grauteada, não se necessitando da utilização de armaduras para resistir à nova tensão obtida. Percebe-se que, obviamente, os cálculos necessários à obtenção dos resultados organizados na tabela 3.5 são muito mais trabalhosos que para os dois procedimentos anteriores. Entretanto, utilizando-se o recurso de uma planilha eletrônica eles podem ser executados de forma confortável e acima de tudo confiável. Portanto, essa maior complexidade não é tão importante na opção por um ou outro procedimento. A aspecto da segurança é, sem dúvida, muito mais significativo. 3.7.2. Exemplo 2 O segundo exemplo a ser discutido é um edifício de alvenaria portante de nove pavimentos, com pé-direito de 2.72 m de piso a teto, cuja planta apresenta-se na figura 3.9. Fig. 3.9 - Planta completa do edifício. As paredes portantes externas e as que dividem os apartamentos tem espessura de 19 cm, sendo as restantes de 14 cm de espessura. Para se limitar esta discussão aos elementos mais importantes, tomar-se-á a região inferior esquerda da edificação, que aparece em detalhe na figura 3.10. Essa região foi dividida em paredes e analisada com quatro suposições de níveis de interação entre os elementos componentes: 35

a) Paredes isoladas. b) Grupos de paredes sem interação. c) Grupos de paredes com taxa de uniformização de cargas igual a 50%. d) Grupos de paredes com taxa de uniformização de cargas igual a 100%. Fig. 3.10 - Definição de paredes para região inferior esquerda. Convém ressaltar que a interação adotada no item d corresponde a uma uniformização completa das cargas verticais entre todos os grupos, obtendo-se um único valor de carga média para todas as paredes. Os grupos foram definidos procurando-se reunir paredes de mesma espessura, conforme se apresenta na tabela 3.6. Isso foi feito porque a interface entre paredes de espessuras diferentes precisaria ser realizada através de utilização de armaduras, pela inexistência de blocos especiais adequados à chamada amarração direta. Conforme já se mencionou, esse é um procedimento sobre o qual se têm algumas dúvidas sobre a sua eficiência para a distribuição das ações verticais. Assim sendo, seria perigoso considerar que as forças de interação nessas interfaces pudessem se desenvolver de forma completa, a menos que se tratasse de paredes muito pequenas, que dificilmente trabalhariam de forma independente. Quanto aos resultados obtidos para as quatro simulações mencionadas, eles serão apresentados por parede, independentemente delas estarem ou não agrupadas e desses grupos estarem interagindo ou não. Dessa forma poder-se-á comparar com maior facilidade os diversos resultados obtidos. A tabela 3.7 apresenta um resumo desses resultados, com as diversas simulações, sempre para o primeiro pavimento da edificação. Com os resultados da tabela 3.7 pode-se observar algumas diferenças muito significativas na carga vertical atuante em algumas paredes quando se considera o procedimento de paredes isoladas e grupos de paredes. Normalmente são paredes de pequeno comprimento que se encontram adjacentes a uma abertura. Pode-se citar, por exemplo, as paredes P4, P5, P6 e P15. Nesse caso, pode-se afirmar que é fundamental a consideração de um grupo entre essas paredes e as adjacentes, supondo que as forças de interação serão suficientes para a uniformização das cargas. Se isso não for feito será praticamente impossível especificar blocos com resistência razoável. 36

Tab. 3.6 - Grupos e paredes componentes. Grupo Paredes componentes G1 P2 e P17 G2 P6 e P11 G3 P1 e P4 G4 P19 G5 P10 G6 P9 e P18 G7 P8 G8 P5, P7, P12 e P14 G9 P13 e P16 G10 P3 G11 P15 e P20 Tab. 3.7 - Resultados obtidos para as cargas nas paredes Carga (kn/m) Parede Paredes Isoladas Grupos sem interação Grupos com interação 50% Grupos com interação 100% P1 103.9 121.3 149.9 153.5 P2 108.9 117.6 149.5 153.5 P3 260.9 260.9 165.4 153.5 P4 300.8 121.3 149.9 153.5 P5 328.5 166.3 154.9 153.5 P6 309.1 149.3 153.1 153.5 P7 158.8 166.3 154.9 153.5 P8 195.2 195.2 158.1 153.5 P9 155.1 146.0 152.7 153.5 P10 129.1 129.1 150.8 153.5 P11 114.8 149.3 153.1 153.5 P12 97.6 166.3 154.9 153.5 P13 193.4 190.4 157.6 153.5 P14 182.5 166.3 154.9 153.5 P15 577.2 201.3 158.8 153.5 P16 184.0 190.4 157.6 153.5 P17 164.3 117.6 149.5 153.5 P18 140.4 146.0 152.7 153.5 P19 148.8 148.8 153.0 153.5 P20 166.6 201.3 158.8 153.5 Já para as simulações que envolvem grupos de paredes, as diferenças são menos expressivas, e as maiores cargas ocorrem nas paredes que estão isoladas das demais pela existência de aberturas. O caso mais significativo é a parede P3. A redução do carregamento entre o procedimento de grupos sem interação e com interação de 50% é da ordem de 37 %. Caso semelhante ocorre com uma parede de grande importância, a P20, que apresenta uma redução de 21 % na carga vertical atuante. 37

Somente como comparação pode-se estimar a resistência à compressão necessária para o bloco em cada caso simulado, sempre para o primeiro pavimento e considerando-se blocos vazados de concreto. Para tanto, serão utilizadas as tensões obtidas para cada parede, realizando-se o dimensionamento e tomando-se o maior valor obtido. Os resultados podem ser encontrados na tabela 3.8. Tab. 3.8 - Resistências à compressão do bloco (em MPa) Paredes isoladas Grupos sem interação Grupos com interação de 50% Grupos com interação de 100% 16 8 6 6 Através dos resultados da tabela 3.8 pode-se perceber que o processo utilizado para a distribuição das cargas verticais influencia, de forma muito significativa, a resistência necessária para os blocos a serem utilizados e, por conseqüência, o custo da obra. Entretanto, não se deve deixar de se considerar o aspecto mais importante a ser analisado: a segurança a ser obtida com o procedimento de análise. 3.8. Verificação de Dano Acidental Ações acidentais são aquelas que estão fora do conjunto normalmente considerado para o projeto de um edifício, como ações devidas a explosões e impactos. Essas verificações ganharam importância após um acidente ocorrido em 1968, na Inglaterra. Um edifício de 23 pavimentos, o Ronan Point que é apresentado na figura 3.11, sofreu um colapso progressivo após a explosão de um botijão de gás no 18 o pavimento. Pela retirada de uma de suas paredes portantes, as lajes que estavam acima do nível acidentado entraram em colapso, levando à ruína todo um canto da edificação. Existem, basicamente, duas maneiras de se prevenir o colapso progressivo: a) Evitar a possibilidade de ocorrência do dano acidental. b) Admitir a possibilidade de ocorrência do acidente e evitar o colapso progressivo. Evidentemente a primeira opção nem sempre é viável de ser implementada. Claro que em alguns casos podem ser tomadas providências que minimizem a probabilidade de ocorrência do acidente. Por exemplo a construção de obstáculos que evitem o eventual impacto de veículos em paredes do pavimento térreo. Entretanto, a eliminação completa dessas possibilidades seria no mínimo antieconômica. Quanto à segunda opção, trata-se de evitar que o acidente, e a falha local dele advinda, possa se transformar em uma ruína de parte significativa da estrutura pela progressão de colapsos. Nesses casos os projetistas devem estar atentos à identificação dos pontos onde seria mais provável a ocorrência de um acidente e prover a estrutura de alternativas para o caminhamento das cargas. Na prática, isso significa retirar uma parede ou um trecho de uma parede e verificar se o acréscimo dos esforços sobre a laje e demais paredes pode ser suportado pela estrutura. É importante ressaltar dois pontos sobre essa questão: os elementos devem ser retirados um de cada vez e os coeficientes de segurança podem ser reduzidos ou mesmo eliminados. 38

Fig. 3.11 - Edifício Ronan Point após acidente 1 Em casos usuais, um pequeno reforço nas armaduras das lajes e a mudança dos detalhes de armadura normalmente empregados são suficientes para evitar o colapso progressivo após um dano acidental. Ocorre que usualmente as armaduras são interrompidas sobre os apoios, no caso as paredes estruturais. Na eventualidade de uma dessas paredes ser destruída, as lajes que concorrem para ela acabam sem condições mínimas de continuarem suportando o seu carregamento, provocando então a progressão de um colapso que poderia ser apenas localizado. Portanto, é recomendável que para um edifício de alvenaria, as armaduras do pavimento sejam calculadas para resistir à eventualidade desses acidentes e detalhadas com transpasses sobre todas as paredes. A norma brasileira é omissa quanto a essa questão. Entretanto a BS 5628 - Code of Practice for Structural Use of Masonry - Unreinforced Masonry, Part 1 2, apresenta uma série de prescrições sobre o assunto em seu item 37. Algumas recomendações são gerais, para edifícios de até quatro pavimentos, e outras são mais específicas, para edificações de cinco ou mais pavimentos. Finalmente é importante salientar que o uso de muito bom senso é imprescindível numa questão que trata de ocorrências tão eventuais. 1 HENDRY et al. (1981) 2 BRITISH STANDARDS INSTITUTION (1992) 39