Ressonância Magnética à Imagem (RMI) e agentes de contraste contendo Gd 3+
Ressonância Magnética à Imagem (Imagem por Ressonância Magnética Nuclear) método de diagnóstico por imagem estabelecido na prática clínica e em crescente desenvolvimento. Em virtude da sua elevada sensibilidade em diferenciar tecidos, o seu espetro de aplicações estende-se a todas as partes do corpo humano e explora aspetos anatómicos e funcionais. Técnica relativamente recente ~ 1973
técnica não-invasiva baseada nas propriedades magnéticas do núcleo de 1 H, uma vez que o H é o átomo mais abundante no corpo humano, devido à elevada concentração de água no mesmo. Ex. imagens do corpo humano obtidas por RMI
RMI usa as propriedades magnéticas do átomo de hidrogénio ( 1 H) e a sua interação com um forte campo magnético externo e com as ondas rádio para produzir imagens com elevado detalhe do corpo humano.
Inicialmente quando esta técnica surgiu designou-se por RMN mas o termo nuclear tinha conotações negativas. No entanto, os princípios básicos são os mesmos. Ressonância Interação entre o campo magnético e a frequência das ondas Rádio Magnética Necessário um campo magnético externo Nuclear Propriedades do núcleo dos átomos
A RMI, tal como a espectroscopia de RMN baseia-se no efeito de ressonância magnética nuclear. Para os químicos, a técnica RMN é usada para obter informação sobre os desvios químicos, integração e constantes de acoplamento. Em RMI, três tipos de informações podem ser obtidas: densidade protónica tempo de relaxação T 1 tempo de relaxação T 2 A intensidade das imagens vai depender destes parâmetros
1946 - Fenómeno de ressonância magnética nuclear (RMN) Felix Bloch e Edward Purcell Prémio Nobel da Física - 1952 1973 - Paul C. Lauterbur e Peter Mansfield Descobertas efetuadas na área da RMI 2003 Prémio Nobel da Medicina
FUNDAMENTOS DE RMN As propriedades de ressonância magnética têm origem na interação entre um átomo e um campo magnético externo. Os principais átomos constituintes do organismo são: H, O, C, P, Ca, F, Na, K e N. Estes átomos, excepto o H, possuem no núcleo atómico protões e neutrões.
Apesar de outros núcleos possuírem propriedades que permitem a sua utilização em RMI, o H é o escolhido: é o mais abundante no corpo humano; o protão do hidrogénio possui o maior momento magnético e, portanto, a maior sensibilidade à RMN. (nota: em consequência da sua maior conc. nos tecidos e do seu maior momento magnético, o sinal que pode ser obtido é 1000 X superior relativa/ a qq outro elemento presente nos tecidos)
Spin e momento magnético O átomo de H possui no núcleo apenas um protão partícula carregada positivamente, que possui uma propriedade chamada de spin ou momento angular - vai rodar em torno do seu próprio eixo (como um pião) - o spin (I) pode ser +1/2 ou -1/2
Para além do spin, o protão do H possui outra propriedade designada momento magnético, que faz com que o mesmo se comporte como um pequeno íman. O prótão do H pode ser visto como uma pequena esfera (1), que possui um movimento de rotação (spin) em torno do seu próprio eixo (2); por ser uma partícula carregada positivamente (3), irá gerar um campo magnético próprio à sua volta (4), comportando-se como um pequeno dipolo magnético (4) ou como um íman (5), com um momento magnético (μ) associado.
Normalmente, os protões no corpo têm uma orientação completamente aleatória pelo que nenhum momento magnético é produzido : Mas o que vai acontecer aos protões de H do corpo do paciente quando ele é submetido a um exame de RMI?
Quando o paciente é colocado no interior do magneto e fica sujeito a um campo magnético (B 0 ) muito forte (por ex. 1 T = 10 000 G): os protões do H poderão assumir 2 orientações relativamente ao campo: Orientação paralela - nível de menor energia Orientação anti-paralela - nível de maior energia Nota: campo magnético terrestre: ~ 0,3 G
Por ação de um forte campo magnético externo os protões vão-se distribuir por 2 níveis de energia. Importa referir que há um pequeno excesso de protões no nível de menor energia. E = diferença de energia entre os dois estados energéticos Proporcional à intensidade de campo magnético externo aplicado (B 0 )
No equilíbrio, há um ligeiro excesso de núcleos no nível de energia mais baixo relativamente ao nível de energia mais alto. A partir daí temos uma magnetização paralela ao campo magnético externo. No entanto, esta ainda não pode ser medida. Como proceder? Se em seguida se aplicar, durante um determinado período de tempo, uma radiação electromagnética na zona das rádiofrequências que corresponda exactamente a E, (condição designada por ressonância) vai haver passagem dos núcleos do estado energético mais baixo para o estado mais elevado.
Ao se desligar a fonte de radiação, os núcleos começam a relaxar retomando a sua orientação original com emissão de energia a qual é captada por uma antena e transformada em imagem. Relaxação processo por meio do qual o núcleo excitado retorna ao equilíbrio devido à libertação de energia. A relaxação pode ocorrer por 2 processos Relaxação spin - rede Relaxação spin - spin
Relaxação spin - rede: envolve troca de energia entre os spins excitados e as moléculas vizinhas. A constante de tempo para esta forma de relaxação designa-se por T 1. O valor de T 1 depende da natureza física e química do ambiente que envolve o núcleo excitado: Ex: moléculas de pequenas dimensões, incluindo a água, relaxam muito mais lentamente do que as de maiores dimensões, como os lípidos. O valor de T 1 da água ligada a proteínas é consideravelmente menor do que o da água livre. O valor de T 1 é afetado pela presença de espécies com eletrões desemparelhados ex. Gd 3+
Relaxação spin - spin: há transferência da energia de excitação ( E) para um núcleo vizinho que se encontra em um estado não excitado. A constante de tempo para esta forma de relaxação designa-se por T 2. Ambos os processos ocorrem simultaneamente Os valores de T 1 e T 2 variam de acordo com o tipo de tecido em estudo.
Tempos de relaxação T 1 e T 2 aproximados para diversos tecidos do corpo humano a 1,5 T Tecido T 1 (ms) T 2 (ms) Substância branca 790 90 Substância cinzenta 920 100 Líquido cefalo-raquidiano 4000 2000 Sangue (arterial) 1200 50 Parênquima hepático 490 40 Miocárdio 870 60 Músculo 870 50 Lípidos (gordura) 260 80 Estas diferenças nos valores de T 1 e T 2 podem assim ser usadas para gerar contraste entre os tecidos nas imagens.
Pulso de radiofrequência Campo magnético externo forte Radiação de RF Excitação dos núcleos Regresso ao estado fundamental Quantificação Deteção Emissão de energia Conversão em Imagem
AGENTES DE CONTRASTE O termo contraste define a diferença relativa em intensidade entre duas regiões adjacentes numa escala de cor cinzenta. O contraste ou intensidade do sinal numa imagem de RMI é o resultado de um complexo conjunto de fatores: tempos de relaxação (T 1 e T 2 ) densidade protónica dos tecidos analisados parâmetros instrumentais (tipo de sequência de pulsos, intensidade do campo magnético, etc..)
A administração de adequados agentes de contraste (AC) permite melhorar esse contraste, ie, melhorar a visualização dos diferentes tecidos e das possíveis lesões. Atualmente, ~ 40-50% dos exames de RMI incluem o uso de AC AC: compostos que alteram significativamente as propriedades magnéticas da região onde são distribuídos de modo a melhorar a deteção e a caracterização de lesões, e para contribuir para a intensidade do sinal. agentes de contraste vão alterar as características de relaxação dos tecidos (T 1 e T 2 ) em que estão presentes
AC em RMI não são visualizados na imagem apenas os seus efeitos são observados A escolha destes agentes depende de vários parâmetros: elevada relaxividade (relaxividade = aumento da veloc. de relaxação dos protões da água) serem quimicamente inertes terem baixa toxicidade in vivo possuírem boa distribuição corporal rápida e completa excreção após o exame médico
AGENTES DE CONTRASTE CONTENDO Gd 3+ A maioria dos AC actualmente utilizados é constituída por compostos de coordenação contendo Gd 3+ Porquê o Gd 3+? tem 7 eletrões desemparelhados (é o mais paramagnético entre os iões metálicos estáveis) apresenta um tempo de relaxação eletrónica longo
Modo de atuação: Gd 3+ em virtude dos seus 7 eletrões desemparelhados possui um momento eletrónico elevado (o momento magnético do eletrão é cerca de mil vezes mais intenso que o da maioria dos núcleos) Um núcleo que se situe nas vizinhanças deste ião paramagnético sentirá um intenso campo magnético local aumento das velocidades de relaxação dos núcleos AC contendo Gd 3+ : T 1 intensidade do sinal
Na sua forma livre o Gd 3+ é tóxico pelo que tem de ser ligado a agentes quelantes de forma a reduzir a sua toxicidade e, ao mesmo tempo, melhorar a sua especificidade para tecidos ou órgãos. (a ph fisiológico Gd 3+ Gd(OH) 3 Acumulação: ossos, fígado, baço Toxicidade: Gd 3+ tem um raio iónico semelhante ao do Ca 2+. A sua toxicidade resulta da competição com este metal essencial. agente quelante - Gd 3+ elevada estabilidade termodinâmica elevada estabilidade cinética
Características de coordenação do Gd 3+ Preferência por átomos doadores: O> N> S e F> Cl números de coordenação mais comuns: 8 e 9 Todos os quelatos de Gd 3+ utilizados em RMI, são complexos com número de coordenação nove nos quais o ligando ocupa oito posições de ligação ao metal e a nona posição de coordenação é ocupada por uma molécula de água.
AGENTES DE CONTRASTE CONTENDO Gd 3+ Presentemente estão aprovados pela EMEA (European Medicines Agency) e pela FDA nove agentes de contraste. Os AC podem ser classificados com base na estrutura do ligando em: lineares ou macrocíclicos
Ligandos Lineares O DTPA tem sido um dos ligandos lineares mais estudados: Ligandos Macrocíclicos Um macrociclo é, usualmente, definido como um composto cíclico polidentado, contendo pelo menos três átomos doadores, tais como N, O, P, S, sendo o anel macrocíclico constituído por um mínimo de nove átomos. De entre os ligandos macrocíclicos mais investigados destaca-se o DOTA:
Exemplo de alguns agentes de contraste contendo Gd 3+ atualmente usados em clínica.
A complexação de iões Gd 3+ com ligandos do tipo poliaminocarboxílicos, produz em geral, complexos com estabilidade cinética e termodinâmica suficiente para evitar a libertação do metal, tóxico na forma livre, no ambiente fisiológico. Por outro lado, o design dos ligandos permite dirigir os complexos para recetores celulares específicos e melhorar as propriedades farmacocinéticas dos complexos. ligando macrocíclico versus ligando linear Ex: DOTA Ex: DTPA Ligandos macrocíclicos formam complexos termodinâmicamente mais estáveis que os correspondentes ligandos lineares. Efeito Macrocíclico
APLICAÇÕES DA RMI Sistema Nervoso Central Inflamações Inflamações Tumores (especial relevância para tumores intracranianos) Meningite Encefalite aguda viral Esclerose múltipla
Sistema Cardiovascular Avaliação de acidentes vasculares cerebrais (AVC) - exame de segunda linha Miocardites agudas Observação do coração e os grandes vasos, bem como das veias do abdómen e tórax Quantificação do fluxo sanguíneo velocidade, aceleração e turbulência
Patologias Mamárias Método complementar à mamografia e à ecografia Deformações mamárias Próteses mamárias Monitorização à quimioterapia - carcinoma da mama
Sistema músculo-esquelético Método de eleição para avaliação de patologias do sistema músculoesquelético Excelente delineamento no estudo da medula espinal e da coluna vertebral, assim como da articulação do joelho e ombro Clara visualização de estruturas complexas: meniscos, ligamentos, cartilagem articular, sinovial e estruturas ósseas; Fraturas não detetadas por raios X
RMI - VANTAGENS Técnica não invasiva; indolor; o paciente não é exposto a radiações ionizantes. Permite visualizar imagens de tecidos moles do corpo humano: músculos, tendões, ligamentos e veias sanguíneas. Imagens muito mais claras e detalhadas do que as obtidas por outros métodos. Permite o diagnóstico precoce de patologias permitindo também uma terapêutica apropriada, factos que assumem especial relevância em neoplasias. Permite uma visualização de lesões a nível cerebral e ósseo nunca antes conseguidas. Os agentes de contraste utilizados são menos tóxicos, estando associados a menos reações alérgicas que os usados noutras técnicas.
RMI - DESVANTAGENS Elevado custo do equipamento; tempo prolongado de exame. Um material metálico interno não detetado pode ser afetado pelo elevado campo magnético, facto que poderá levar a distorção das imagens ou podendo, até, tomar proporções mais graves (ex: pacemaker). Técnica permitida apenas até às 12 semanas de gravidez. Elevada ocorrência de falsos positivos
Design de novos AC Área de investigação em pleno desenvolvimento Muitos novos compostos estão presentemente em fases pré-clínicas ou em ensaios clínicos