VARIABILIDADE ESPAÇO-TEMPORAL DA CONCENTRAÇÃO DE MATERIAL EM SUSPENSÃO EM UM RESERVATÓRIO DE REGULARIZAÇÃO

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Transcrição:

VARIABILIDADE ESPAÇO-TEMPORAL DA CONCENTRAÇÃO DE MATERIAL EM SUSPENSÃO EM UM RESERVATÓRIO DE REGULARIZAÇÃO RESUMO Rosangela Sampaio REIS 1 1 Departamento de Águas e Energia da Universidade Federal de Alagoas, Brasil, rsreis@ctec.ufal.br. William SEVERI 2 2 Departamento de Pesca da Universidade Federal Rural de Pernambuco, Brasil, wseveri@ufrpe.br Clebenilson da Costa ARAÚJO 3 1 Aluno bolsista do Departamento de Águas e Energia da Universidade Federal de Alagoas, Brasil. A construção de reservatórios de regularização promove a estabilização das vazões de jusante, permitindo maior controle na utilização da água, principalmente em projetos hidro-energéticos. Contudo, as intervenções antrópicas alteram as características físicas, químicas e biológicas dos sistemas naturais e, dentre os vários impactos observados na construção de reservatórios, verifica-se uma redução na capacidade de transporte do curso d água promovendo a deposição de sedimentos. Com uma área de 4214 km 2, o reservatório de Sobradinho, localizado na bacia do rio São Francisco, é um dos maiores do Brasil e do mundo, abrangendo os municípios de Casa Nova (BA), Remanso (BA), Sento Sé (BA) e Pilão Arcado (BA), além das áreas rurais dos municípios de Juazeiro e Xique-Xique, também no Estado da Bahia. Construído com a finalidade principal de regularizar a vazão do São Francisco, de modo a permitir a exploração máxima do potencial das usinas hidrelétricas construídas à jusante deste, o reservatório tem apresentado consideráveis oscilações em seu nível médio. Este fato vem causando marcantes reflexos sobre a qualidade da água, sobre as características das comunidades aquáticas, da atividade pesqueira e da disponibilidade de água para fins diversos, sobretudo para a irrigação, prática largamente desenvolvida nos diversos perímetros irrigados implantados na região do vale do São Francisco. Nos últimos anos a bacia do rio São Francisco vem sofrendo grande influência antrópica, visto que a maioria dos povoados não possui saneamento básico, lançando os resíduos diretamente nos rios. Além disso, o uso desordenado do solo na região vem contribuindo para o aumento dos impactos ambientais, a partir da aceleração do processo erosivo do solo e carreamento de material particulado para a coluna d água. O presente trabalho analisa a variabilidade espacial e temporal da concentração de material em suspensão e determina a zona de deposição de sedimentos no reservatório de Sobradinho (BA) entre 2001 e 2002, sendo parte do projeto Monitoramento limnológico e da produção pesqueira do reservatório de Sobradinho, executado pelos Laboratórios de Limnologia, Ictiologia, Tecnologia de Pesca e Ecossistemas Aquáticos do Departamento de Pesca da Universidade Federal Rural de Pernambuco e Departamento de Águas e Energia da Universidade Federal de Alagoas. Palavras-chave: material em suspensão, reservatório, qualidade da água, Sobradinho, rio São Francisco. 1

1 INTRODUÇÃO Com uma área de 4214 km 2, o reservatório de Sobradinho, localizado na bacia do rio São Francisco, é um dos maiores do Brasil. Construído com a finalidade principal de regularizar a vazão do rio São Francisco, de modo a permitir a exploração máxima do potencial das usinas hidrelétricas construídas à jusante deste, o reservatório tem apresentado consideráveis oscilações em seus níveis médios, resultantes das variações climáticas observadas nessa região semi-árida. Este fato vem causando marcantes reflexos sobre a qualidade da água, sobre as características das comunidades aquáticas, da atividade pesqueira e da disponibilidade de água para fins diversos, sobretudo para a irrigação, que é largamente desenvolvida nos diversos perímetros irrigados implantados na região do vale do São Francisco (ESTEVES, 1998). As comparações das características limnológicas de lagos e reservatórios de regiões semi-áridas com aqueles de regiões temperadas têm sido questionadas por alguns autores (STRASKRABA et al.,1993; THORNTON & RAST, 1993; ARMENGOL et al., 1999). Em alguns países, como por exemplo, os Estados Unidos, com uma grande quantidade de lagos e reservatórios distribuídos em diferentes zonas climáticas, não existem padrões diferenciados na legislação ambiental que regularize os usos a partir das singularidades de cada região. No Brasil, a classificação dos cursos d água com base em seu aproveitamento para os mais diversos fins está prevista através da Resolução CONAMA 20/1986 e também não engloba as peculiaridades das suas diferentes regiões. Isto resulta na aplicação generalizada de padrões sem considerar a limnologia local. Por outro lado, reservatórios em regiões semi-áridas têm a mesma função sócio-econômica que os lagos naturais das regiões mais ricas do mundo, tornando-se ainda de maior importância pela sua localização em uma região de escassez de água. Assim, é necessário que o gerenciamento desses sistemas seja racional, baseado não em premissas comparativas, mas no conhecimento e entendimento de suas características e seu contexto. Desse modo, o presente trabalho analisou a variabilidade espacial e temporal da concentração de material em suspensão e a zona de deposição de sedimentos no reservatório de Sobradinho (BA) entre 2001 e 2002, sendo parte do projeto Monitoramento limnológico e da produção pesqueira do reservatório de Sobradinho, executado pelos Laboratórios de Limnologia, Ictiologia, Tecnologia de Pesca e Ecossistemas Aquáticos do Departamento de Pesca da Universidade Federal Rural de Pernambuco com participação do Departamento de Águas e Energia da Universidade Federal de Alagoas. 2 - ÁREA DE ESTUDO Nascendo a cerca de 1000m de altitude na Serra da Canastra, em Minas Gerais, o rio São Francisco atravessa em seu rumo os Estados de Minas Gerais, Goiás, Distrito Federal, Pernambuco, Bahia, Alagoas e Sergipe, formando uma bacia hidrográfica de 640.000 km2, totalmente em território brasileiro. Ela contém 15,6% da população do país e drena 7,6% de seu território. O vale do rio São Francisco está dividido em 4 regiões fisiográficas: Alto, que se estende desde as cabeceiras no município de São Roque de Minas até a cidade de Pirapora (MG); Médio, que compreende o trecho desde Pirapora até a cidade de Remanso (BA); Submédio, que estende-se de Remanso até a cidade de Paulo Afonso (BA) e Baixo São Francisco, de Paulo Afonso à foz, no Oceano Atlântico. A área da pesquisa foi delimitada no trecho entre as cidades de Xique-Xique e Sobradinho, na Bahia (figura 1), no médio e submédio São Francisco. 2

Figura 1 Localização da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco em relação ao território Brasileiro e do reservatório de Sobradinho na bacia. O reservatório de Sobradinho foi criado a partir da construção da barragem da usina Hidrelétrica de Sobradinho, que se encontra a uma distância de 748 km da nascente do rio São Francisco e 1.912 km de sua desembocadura, no Oceano Atlântico. Segundo a CHESF - Companhia Hidrelétrica do São Francisco, a operação da usina teve início no último trimestre de 1979, com a geração de 1.050.000 kw. O reservatório com cerca de 320 km de extensão, profundidade média de 8.6 m e máxima de 30 m e está localizado a uma altitude de 392.5 m acima do nível do mar, sendo projetado para a acumulação de 34.1 bilhões de m 3 de água. Com uma depleção de até 12 metros, esse reservatório garante uma vazão mínima de 2.060 metros cúbicos por segundo, que corresponde a 74% da média anual do rio São Francisco, em Sobradinho. O Clima nessa região é o semi-árido, caracterizado por apresentar uma alta taxa de evaporação (média de 1700 mm na cidade de Remanso), temperaturas médias de 28ºC e pluviosidade de 500 mm. Esses fatores resultam no desenvolvimento de uma vegetação composta por espécies xerófitas, como as cactáceas, palmeiras e bromeliáceas. 3 METODOLOGIA 3.1 - Espacialização dos dados Para um visão espacializada dos dados sobre a área em estudo, foram obtidas 4 imagens do satélite Landsat 7 (figura 2), as quais foram processadas para o tratamento espectral das cenas e delineamento dos objetos de interesse, o recorte da área de estudo e a aplicação de máscara para separação solo-água, utilizando-se o software ENVI 3.2 (The Environment for Visualizing Images, Better Solutions Consulting LLC). Posteriormente, os pontos de coleta foram georeferenciados com o auxílio de um GPS, possibilitando, através de sistemas de informação geográfica (softwares Idrisi 3.2 e CartaLinx Clark University), a locação das estações sobre o mapa. 3

218-66 217-66 217-67 Figura 2 - Cenas do Satélite Landsat 7 compondo o reservatório de Sobradinho. 3.2 - Coleta de Dados 218-67 Foram realizadas campanhas trimestrais em 22 estações de amostragem ao longo da área em estudo (figura 3), entre outubro de 2001 e abril de 2002. As estações de amostragem SBA 01 a SBA 08 foram instaladas na fase rio e as demais (SB09 a SB22) no reservatório de Sobradinho.As amostras de água para determinação das variáveis foram coletadas na superfície, meio e fundo da coluna d água utilizando-se uma garrafa de Van Dorn. As amostras foram filtradas em membranas AP 40 e acondicionadas em gelo. Para determinação da concentração de sólidos totais e frações orgânica e inorgânica, utilizou-se o método gravimétrico (TEIXEIRA et al., 1965 e TUNDISI, 1969). Figura 3 Estações de amostragem no reservatório de Sobradinho (SB01 a SB22). 4

4 - RESULTADOS As variações espaciais e temporais dos valores médios das concentrações de material em suspensão (SST) na coluna d água podem ser observadas na figura 4. Os resultados obtidos mostram alta amplitude nas concentrações de material em suspensão total, com valores entre 1,37 e 383,47 mg/l. 400 350 300 250 200 150 100 50 0 SBA01 SBA02 SBA03 SBA04 SBA05 SBA06 SBA07 SBA08 SBA09 SBA10 SBA11 SBA12 SBA13 SBA14 SBA15 SBA16 SBA17 SBA18 SBA19 SBA20 SBA21 SBA22 SST (mg/l) out/01 jan/02 abr/02 jul/02 out/02 jan/03 abr/03 Estações de amostragem Figura 4 Valores médios da concentração de material em suspensão na coluna d água, nas estações de amostragem. Nas estações de amostragem próximas à barragem foram obtidas as menores concentrações, enquanto o valor máximo foi encontrado na estação SB11, que está localizada na fase de transição rioreservatório. A redução de concentração no sentido rio-barragem mostra que ocorre deposição de material particulado no reservatório de Sobradinho, promovendo seu assoreamento e, consequentemente, reduzindo sua vida útil (figuras 5 e 6). A redução nas concentrações de material em suspensão na coluna d água ao longo do reservatório de Sobradinho pode ser resultante da variação da taxa de deposição, onde as estações próximas à desembocadura do rio São Francisco teriam uma maior taxa de deposição e aquelas próximas à barragem apresentariam menores taxas. Com isso, as partículas seriam retiradas mais rapidamente do sistema no início do reservatório, com conseqüente redução da concentração de material em suspensão ao longo do eixo do reservatório até a barragem. Estas maiores deposições em áreas de desembocadura têm sido relatadas por vários autores, como por exemplo, no estudo de LEITE (1998) e ZANATA (1999), quando os autores analisaram as diferenças longitudinais de deposição de material em suspensão no reservatório de Salto Grande (SP) e verificaram a formação de um gradiente longitudinal, com valores 13 vezes superiores na estação localizada no início do reservatório, na zona de desembocadura do rio Atibaia, em relação à deposição na estação próxima a barragem. 5

Figura 5 Variabilidade espaço-temporal das concentrações de SST em Sobradinho (SB01 a SB12). 6

Figura 6 Variabilidade espaço-temporal das concentrações de SST em Sobradinho (SB12 a SB22). A variabilidade espacial dos dados em Sobradinho ocorre mais acentuadamente entre as estação SB09 a SB12. Nesse trecho, ocorre um incremento na concentração, principalmente nos meses de maior vazão do rio São Francisco, que pode ser resultante da ressuspensão do material, nessa região de mudança entre ambiente lótico e lêntico. Em seguida, verifica-se uma redução significativa das concentrações do material em suspensão, o que permite inferir que nessa área está ocorrendo deposição de sedimentos. Contudo, não é possível determinar com precisão os locais mais susceptíveis ao assoreamento, pois, segundo CARVALHO (1994), a deposição é função de vários aspectos do escoamento, entre eles: o tamanho, peso e forma da partícula; as condições do fluxo (laminar ou turbulento); a velocidade da corrente e os obstáculos no leito. A redução da velocidade do fluxo na porção superior do reservatório tem como conseqüência o decréscimo na capacidade de transporte do corpo d água e, portanto, a deposição de material particulado. Corroboram com essa idéia, os dados obtidos a partir da medição de velocidade, com um acoustic doppler current profiler-adcp Rio Grande, em algumas seções do reservatório (SB05, SB06, SB09, SB10, B11, SB12 E SB22), os quais mostram que as velocidades médias na seção transversal são reduzidas em 86% entre SB05 e SB12, com 38% deste decréscimo ocorrendo entre as estações SB11 e SB12 (figuras 7 e 8).. 7

SB11 SB12 Figura 7 Perfis de velocidade medidos com um ADCP Rio Grande, nas seções de instalação das estações SB11 (a) e SB12 (b), onde as velocidades médias obtidas foram 0,402 m/s e 0,084 m/s, respectivamente. 8

Figura 8 Percentuais das velocidades médias nas seções transversais de algumas estações, em relação a velocidade na estação SB05. As altas concentrações de material em suspensão observadas nesse trecho foram até 20 vezes superiores às obtidos por HENRY & MARICATO (1996), quando analisaram a taxa de sedimentação do material em suspensão no reservatório de Jurumirim, um sistema oligo-mesotrófico localizado no Estado de São Paulo. Nesse sistema, foram verificadas concentrações máximas de material em suspensão na coluna d água de 14,4 mg/l na desembocadura do rio Paranapanema (estação P3); e 19,1 mg/l na desembocadura do rio Taquari (estação T3). Enquanto que, valores semelhantes aos de Sobradinho foram obtidos por LIMA et al. (2003) na bacia do Araguaia-Tocantins. Em relação às concentrações máximas de material em suspensão obtidas nas estações próximas à barragem de Sobradinho (7,5mg/l), verificou-se que estas foram semelhantes às observadas por MARQUISÁ (1998), quando avaliou comparativamente a sedimentação na barragem do reservatório de Barra Bonita (eutrófico) e na barragem do reservatório de Broa (oligotrófico) em SP; onde os máximos foram 6,5 mg/l e 7 mg/l, respectivamente. Mas, foram inferiores às observadas por REIS (2002) nas barragens de Itaparica (4,4 mg/l em SF09), Moxotó (5,0 mg/l em SF15), PA I-II-III (4,8 mg/l em SF23) e PA IV (3,0mg/l em SF18) que estão instaladas a jusante de Sobradinho Verificou-se, também, uma influência sazonal nos dados obtidos para o reservatório de Sobradinho, com variações de até 60 vezes nas concentrações de material em suspensão total. Os maiores valores foram obtidos nas campanhas de janeiro, tendo como causa o aumento de vazão afluente ao reservatório, devido às chuvas que ocorrem entre novembro e março. Os dados de vazões afluentes, defluentes e cotas mostram que o enchimento do reservatório ocorre nesse mesmo período (figura 09). 9

4000 Vazões afluentes (m 3 /s) 3000 2000 1000 1998 1999 2000 2001 1998 a 2001 Polinômio (1998 a 2001) 0 jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez 4000 Vazões defluentes (m 3 /s) 3000 2000 1000 1998 1999 2000 2001 1998 a 2001 Polinômio (1998 a 2001) 0 394 jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez 392 Cotas (m) 390 388 386 384 382 1998 1999 2000 2001 2002 2003 380 jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez Figura 9 Variabilidade temporal das vazões afluentes, vazões defluentes e das cotas no reservatório de Sobradinho. Em relação à composição do material particulado transportado, a fração inorgânica representou mais de 80% (em média) para as estações SB01 a SB12, durante todo o período analisado. Nas estações SB13 e SB14 a fração inorgânica só esteve abaixo de 80% nas campanhas realizadas em abril e julho, o que reduziu a média do período analisado. Nas demais estações a fração inorgânica dos sólidos em suspensão representou de 47 a 60% da concentração do material em suspensão (figura 10), podendo-se inferir que o material depositado nas estações mais a montante do reservatório tem maior composição inorgânica. 10

100 90 80 70 60 50 40 SBA01 SBA02 SBA03 SBA04 SBA05 SBA06 SBA07 SSI (%) SBA08 SBA09 SBA10 SBA11 SBA12 SBA13 SBA14 SBA15 SBA16 SBA17 SBA18 SBA19 SBA20 SBA21 SBA22 Estações de amostragem Figura 10 Percentagem da concentração de sólidos inorgânicos em suspensão na coluna d água em relação ao total. 5 - CONCLUSÕES Após a análise conjunta dos dados obtidos nas campanhas de campo e dos dados operacionais do reservatório (vazões afluentes, vazões defluentes e cotas) conclui-se que:? A variabilidade temporal da concentração de material em suspensão nos reservatórios ocorreu em função do aumento no fluxo afluente, responsável pelo transporte do material alóctone carreado na bacia, através do runoff, sendo a pluviosidade o fator determinante nas características físicas e químicas do sistema.? A formação de um gradiente de deposição no sentido rio-barragem, com as menores concentrações de material em suspensão na coluna d água ocorrendo na zona lacustre do reservatório, mostra que este funciona como uma câmara de retenção para o material em suspensão transportado pelo rio São Francisco, contribuindo para a melhoria da qualidade da água nos reservatórios subseqüentes (efeito cascata). AGRADECIMENTOS Agradecemos o apoio financeiro da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF). REFERÊNCIAS ARMENGOL, J. et al. (1999). Longitudinal Processes in Canyon Type Reservoirs: the case of Sal (N. E. Spain). In: TUNDISI, J.G.; STRASKRABA, M. (ed.) Theoretical Reservoir Ecology and its Application. 1ª ed.. São Carlos, Instituto Internacional de Ecologia; Leiden, Backhuys Publishers. 313-346p. CARVALHO, N. O. (1994) Hidrossedimentologia prática. Rio de Janeiro, CPRM. 372p. ESTEVES, F. A. (1988). Fundamentos de Limnologia. Rio de Janeiro, Interciência FINEP. 575p. HENRY, R; MARICATO, F.E. (1996). Sedimentation rates of tripton in Jurumirim reservoir (São Paulo, Brazil). Limnologica, 26 (1), p. 15-25. 11

LEITE, M. A (1998). Variação espacial e temporal da taxa de sedimentação no Reservatório de Salto Grande (Americana -SP) e sua influência sobre as características limnológicas do sistema. São Carlos, 167p. Dissertação de Mestrado, Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. LIMA et al. (2003). Fluxo de Sedimentos em suspensão na bacia Araguaia-Tocantins. XV Simpósio Brasileiro de Recursos Hídricos. Curitiba. Brasil. MARQUISÁ. G.C. (1998) Sedimentação e fluxo vertical de nutrientes em dois reservatórios de distinto estado trófico (reservatório do Broa e Barra Bonita SP). Tese (doutorado)151p. EESC/USP. São Carlos-SP. REIS, R.S. (2002). Qualidade da água, deposição de sedimentos e sensoriamento remoto: um estudo de caso nos reservatórios do sub-médio São Francisco. 237 p. Tese (Doutorado) - Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. STRASKRABA, M.; TUNDISI, J. G.; DUNCAN, A. (1993). State-of-the-art of reservoir limnology and water quality management. In: STRASKRABA, M.; TUNDISI, J. G.; DUNCAN, A. Comparative Reservoir limnology and water quality management. Dordrecht, Kluwer Academic Publishers. 213-288p. TEIXEIRA, C. et al. (1965). Plankton studies in a mangrove. II. The standing-stock and some ecological factors. Bolm. Inst. Oceanogr., 24: 23-41. THORNTON, J. A.; RAST W. (1993). A test of hypotheses relating to the comparative limnology and assessment of eutrophication in semi-arid man-made lakes. In: STRASKRABA, M.; TUNDISI, J. G.; DUNCAN, A. (1993). Comparative Reservoir limnology and water quality TUNDISI, J. G. (1969) Produção primária, standing-stock e fracionamento de fitoplâncton na região Lagunar de Cananéia. São Paulo. 131p. Tese (Doutorado) - Universidade de São Paulo. ZANATA, L.H. (1999). Heterogeneidade ambiental do reservatório de Salto Grande (Americana/SP), com ênfase na distribuição das populações de clarocera.171 p., (mestrado) 12