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Rev. ABO Nac. Técnica da inversão sequencial - uma alternativa para o preparo de canais curvos Sequential inversion technique - an alternative for curved root canal preparation Unitermos: T ratamento do canal radicular, métodos Key words:root canal therapy, methods Ronaldo Araújo SOUZA* RESUMO Sempre houve por parte da Endodontia uma preocupação muito grande com a fase mecânica do preparo do canal, mais precisamente, com o preparo de canais curvos. Mais recentemente, há uma grande tendência para se realizar um preparo prévio dos terços cervical e médio destes canais no intuito de facilitar o preparo do terço apical, o "calcanhar de Aquiles" do endodontista, pois é justamente ali onde acontece a maioria das complicações endodônticas. No entanto, as técnicas preconizadas com esta finalidade, parecem ainda não cumprir muito bem o papel para o qual foram criadas, razão pela qual objetivamos mostrar neste trabalho uma alternativa para o preparo destes canais curvos e que denomina-se Técnica da Inversão Sequencial. ABSTRACT There has been in Endodontics a large preocupation with the instrumentation of the root canal, particularly, with curved root canals preparation. More recently, there is a great tendency for making a previous preparation of the cervical and medium portions of these canals, pretending to make easier the instrumentation of the apical portion, because it's just where the majority of the endodontics problems occur. But, the techniques purposed for this finality seem to not fill the role for what they have been created. Therefore, the aim of this article is to present an alternative for curved root canals preparation that we have called the Sequential Inversion Technique. * Especialista em Endodontia. Professor do Curso de Especialização em Endodontia da Associação Brasileira de Endodontia - Seção Bahia, Mestrando em Clínica Odontológica pela Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Rev. ABO Nac.2 INTRODUÇÃO Já de algum tempo a Endodontia vem ensinando que, apesar da necessidade de se reconhecer a importância de todas as etapas da terapia endodôntica, que envolvem aspectos mecânicos e biológicos - "Endodontia é biologia aplicada tecnicamente" (LEONARDO e LEAL 8 ), há de se admitir que a fase da instrumentação assume destacada importância, até porque, é diante de um bom preparo do sistema de canais radiculares que se conseguem as melhores respostas biológicas. Ocorre porém que, num primeiro momento, parece ter havido um certo exagero na importância que se deu à fase da instrumentação e citações como "quanto mais instrumentado um canal radicular, menor a possibilidade de permanência de microrganismos no mesmo" (GROSSMAN 5 ), foram mal interpretados, pois, passou-se a associar-se a qualidade do tratamento endodôntico à necessidade de um alargamento sistemático dos canais radiculares. Isso, entretanto, não encontrou respaldo na prática endodôntica do dia a dia por várias razões, dentre elas, o fato de que, se esse alargamento era possível em canais tidos como retos e amplos - "poucos canais radiculares são retos, mesmo quando a radiografia dá a ilusão de que eles são" (PATTERSON 11 ) - não o era em canais que apresentassem curvaturas no seu trajeto, por discretas que fossem - "o clínico deve presumir que todas as raízes são curvas (a maioria é), muito embora algumas pareçam retas na radiografia" (COHEN 1 ). O que se via, então, era a ocorrência de desvios do canal (formação de degraus, zips, perfurações radiculares), situações, na sua grande maioria, difíceis, quando não impossíveis, de serem contornadas. Passou-se, então a predeterminar-se o quanto instrumentar, em função das condições clínicas da polpa. Se fosse polpa viva seria 1+3, isto é, um instrumento inicial e mais três em aumentos de calibres subsequentes e se fosse um caso de polpa necrosada, em função de uma eventual contaminação do sistema de canais radiculares, alargar-se-ia mais o canal, o que seria 1+4. Isso, além de soar um tanto empírico, também não encontrou respaldo clínico (KASAHARA 7 ), porque levava em consideração, como já foi dito, tão somente as condições clínicas da polpa, quando na verdade, o quanto instrumentar será ditado também por outros aspectos, quais sejam: a) grau de curvatura do canal, b) diâmetro do canal, c) espessura mésio-distal do canal, d) flexibilidade do instrumento. Precisou- se, portanto, de técnicas que respeitassem e contornassem essas dificuldades e, muito embora, DE DEUS 2 e LEONARDO e LEAL 8 citem BERG (1953), GONÇALVES (1956) e MULLANEY e PETRICH (1968), parece ter sido CLEM (1969) o primeiro a chamar atenção para a necessidade de que, diante de determinadas situações (por exemplo, estreitamento e curvatura do terço apical), dever-se-ia realizar uma instrumentação diferenciada do canal. Instrumentos menos calibrosos, portanto, mais flexíveis, trabalhariam no terço apical e, em diminuições progressivas no comprimento de trabalho (CT) e aumentos, também progressivos, no calibre dos instrumentos, seriam instrumentadas as partes mais retas e volumosas do canal. Respeitavam-se dessa forma os "diferentes" níveis de conicidade do canal e a essa técnica ele chamou de "Step Preparation", ou seja, preparação em degraus. Essa técnica ficou conhecida como Técnica Telescópica ou Escalonada e, a partir de algumas modificações feitas nessa proposta inicial, hoje existem várias técnicas apoiadas nos princípios da instrumentação telescópica e poderaim ser citadas: Técnica de Ohio (2,7), Preparo Anticurvatura* (2,7), Técnica de Forças Balanceadas (2,9), Canal Master U (2,4,9), Técnica Bi-escalonada 3, Técnica dos Movimentos Oscilatórios 2 e Técnica de SCHILDER 2,13 (1982). O terço apical é tido como a "zona crítica" (DE DEUS 2 ) de um tratamento de canal e "uma das principais metas da instrumentação do canal deveria ser a preparação precisa da porção apical do canal" (VESSEY 16, 1969). Já que o terço apical dos canais tidos como retos não apresenta maiores dificuldades na sua preparação, torna-se evidente que todas essas técnicas de instrumentação são propostas em função das dificuldades surgidas quando do preparo do terço apical dos canais curvos. Essas técnicas, de um modo geral, preconizam que, em função principalmente do grau de curvatura do canal e da flexibilidade dos instrumentos, o preparo do terço apical seja levado até o instrumento de n o 25. O exemplo clássico para o preparo de canais curvos é o do mésio-vestibular (MV) dos molares, seja ele dos molares superiores ou dos inferiores. Sabe-se que nesses canais existe um componente anatômico, que consiste num depósito de dentina (cotovelo da dentina) na entrada do canal que dificulta sobremaneira não só o acesso ao forame STREIFF e GERSTEIN 14 (1983), como também a limpeza e modelagem do canal. É praticamente um consenso hoje que, para se preparar bem o terço apical dos canais curvos há de se promover os devidos desgastes compensatórios, não só a esse nível de orifício de entrada dos canais, como também nos terços cervical e médio, já que "os dedos do clínico no cabo do instrumento e as paredes do canal na ponta do instrumento, nada * ABOU-RAS, M. Comunicação pessoal, V Congresso Bahiano de Odontologia, Salvador, Bahia, Brasil, 1988.

Rev. ABO Nac.3 deve interferir entre esses dois pontos" (INGLE e BEVERIDGE 6, 1989). No intuito de se fazer esse preparo prévio do corpo do canal, as brocas de gates-glidden têm sido muito indicadas, pelas facilidades que elas proporcionam (SWINDLE et al. 15, 1991). Ocorre, entretanto, que para que essas brocas, ou ainda outras, tipo Peeso, possam ser utilizadas, praticamente todas essas técnicas citadas preconizam que se faça uma ampliação do canal, no mínimo, até o instrumento de n0 25 (DE DEUS 2, LEONARDO e LEAL 8, 1992). Ora, se o terço apical de um canal curvo, no nosso exemplo o MV dos molares, já foi preparado até um instrumento de n0 30 ou mesmo 25, esse terço apical já está pronto, já que esses são os limites referenciais de ampliação para esses canais (COHEN 3 e BURNS 1, 1982). Não parece, portanto, que as técnicas que preconizam o preparo dos terços cervical e médio com a finalidade de faciliatr o preparo do terço apical, estejam realmente cumprindo o seu papel. Acreditou- se que seria interessante uma técnica que nos permitisse preparar os terços cervical e médio sem que ainda tivéssemos sequer tocado no terço apical, ou que, pelo menos, tivéssemos feito tão somente uma ligeira ampliação desse terço apical. Por isso, já há cerca de cinco anos vem sendo desenvolvido e executado aquilo que achou-se que seria uma nova forma de tratar esse tipo de canal e que resultou no que agora chamou-se de Técnica da Inversão Sequencial. MATERIAIS E MÉTODOS Imagine-se, por exemplo, o canal mésiovestibular de um molar inferior. Realizados todos os procedimentos iniciais de um tratamento endodôntico - anestesia, preparo do dente, isolamento do campo operatório, acesso e preparo da câmara pulpar -, faz-se a odontometria. A cinemática de penetração e instrumentação fica a critério de cada profissional. Adotou-se a técnica dos Movimentos Oscilatórios (DE DEUS 4, 1992). Depois de feita a odontometria, faz-se uma ampliação inicial do canal até a lima n o 10, tendo-se sempre o cuidado de manter o canal inundado da substância química auxiliar. Nesse momento, passase a utilizar a broca de Gates-Glidden n o 1, introduzindo-a até o ponto em que ela encontra resistência, que normalmente coincide com o começo da curvatura. O canal é então irrigado, recapitula-se (SCHILDER 13, 1982) com uma lima de número inferior à última usada, que no caso seria a de n o 8, sem a intenção de instrumentar o canal, mas sim, de evitar que as raspas de dentina bloqueiem a sua porção restante. Passa-se então a utilizar a broca de Gates-Glidden n o 2, fazendo com que ela atue aquém do CT da n o 1. Ressalve-se que essas brocas são direcionadas para as zonas de segurança, ou seja, para a parede mesial da raiz, já iniciando, por conseguinte, a remoção do "cotovelo" de dentina e, consequentemente, afastando-se da parede distal (zona de perigo - zona de furca). Novamente o canal é irrigado, recapitulase outra vez da mesma forma e pelas razões expostas e, aí, com a broca de Batt n0 012, terminase por fazer a remoção total do "cotovelo" de dentina, criando dessa forma um "novo" acesso ao forame (STREIFF e GERSTEIN 14, 1983). RESULTADOS Pode-se perceber então que se tem o terço cervical e começo do médio, isto é, tem-se o corpo do canal preparado sem ainda haver praticamente tocado no terço apical, já que este só sofreu uma ampliação inicial com a lima n o 10. Parece, portanto, que agora o preparo do terço apical será realmente facilitado pelo preparo prévio do acesso ao forame (STREIFF e GERSTEIN 14, 1983) - (Figuras 1 e 2). A gora pode-se voltar ao CT original e preparar o terço apical com as limas tipo Flex 10, 15, 20, 25, 30 ou até onde for adequado ao caso. É interessante notar que agora que se está preparando o terço apical, por conseguinte, trabalhando em todo o CT, à medida que vai-se ampliando sequencialmente o calibre das limas, já se está retificando, não só a zona de transição (DE DEUS 2, 1992), como também retificando a passagem da Gates-Glidden n o 1 para a n o 2, portanto, não há necessidade de um momento específico para o refinamento anatômico (DE DEUS 2, 1992); ele é feito enquanto se prepara o terço apical. DISCUSSÃO Ainda hoje existem pequenas divergências quanto ao calibre das brocas de Gates-Glidden. As de n o 1 e n o 2 teriam calibres correspondentes às limas tipo K n o 40 e n o 60, respectivamente (DE DEUS 2, 1992). Outros autores (LEONARDO e LEAL 8, 1992) dizem ser na verdade n o 45 e n o 60 e há ainda medidas como 0,50mm (lima n o 50) e 0,70mm (lima n o 70), respectivamente para as brocas n o 1 e n o 2 (LUEBKE e BRANTLEY 10, MAILLEFER*). A parte ativa de uma lima endodôntica tem 16mm, medida essa feita da ponta do instrumento, ponto chamado D1, até a parte terminal da lâmina, ponto chamado D2 (DE DEUS 2, 1992 e INGLE e BEVERIDGE 6, 1989). O diâmetro de D2 de cada instrumento é 0,32 mm maior do que de D1 (DE DEUS 2, 1992), portanto, uma lima K n o 10 apresenta 0,10 mm na sua ponta (D1) e 0,42 mm na parte terminal da lâmina (D2). * Maillefer, A Endo 3A-8 Gates (mostruário).

Rev. ABO Nac.4 Fig. 1-A (Caso 1) - Lima tipo K n o 10 no canal MV de um primeiro molar inferior esquerdo. Observar a interferência do cotovelo de dentina fazendo com que a lima penetre de trás para a frente Fig. 1-B Novo acesso criado pela técnica da Inversão Seqüencial. O instrumento agora pode trabalhar sem interferências Fig. 2-A - (Caso 2) - Lima n o 10 no canalmv de um 2 o molar inferior esquerdo. Antes de se usar a técnica da Inversão Sequencial Fig. 2-B Mesmo caso da Fig. 2-A, após o uso da técnica da Inversão Sequencial Baseados em dados apresentados por PUCCI18 e REIG 12 (1991) e DE DEUS 2 (1992) a respeito do comprimento das coroas e das raízes dos dentes, pode-se observar que as raízes dos molares apresentam em média, comprimentos que variam de 13 a 16 mm. Portanto, o nosso instrumento n o 10, trabalhando nessas raízes, terá justamente a sua porção mais calibrosa (D2) atuando no 10 terço do canal, o terço cervical. Se sabe-se que esse diâmetro corrresponde a 0,42 mm (DE DEUS 2, 1992 e INGLE e BEVERIDGE 6, 1989) portanto próximo aos calibres apontados para a broca de Gates-Glidden n o 1, podemos deduzir que uma simples ampliação inicial proporcionada por aquele instrumento (lima K n o 10), criará condições para o uso deste (Gates-Glidden n o 1). Em algumas situações a lima n o 10, conforme descrito, não é suficiente para ampliar o canal de forma a permitir o acesso da broca de Gates-Gliden n o 1. Nesses casos, além dessa ampliação inicial com a lima n o 10, faz-se também uso da lima tipo Flex n o 15, já que, seguindo a mesma linha de raciocínio, o ponto D2 dessa lima teria 0,47 mm (DE DEUS 2, 1992 e INGLE e BEVERIDGE 6, 1989) de diâmetro, o que tornaria mais fácil ainda, após uma ampliação inicial com ela, uma penetração com a broca de Gates-Glidden referida. Sabe-se que existem técnicas, como a de Oregon, por exemplo, e outras que se sucederam a ela, que propõem esse preparo delineado, isto é, preparar PRIMEIRO os terços cervical e médio, para só então preparar o terço apical, mas sabe-se

Rev. ABO Nac.5 também que elas tem indicações precisas, como por exemplo, que os canais sejam acessíveis a instrumentos calibrosos desde os passos iniciais da instrumentação. O que está se propondo com a Técnica da Inversão Sequencial é uma alternativa de preparo do corpo do canal, isto é o uso de instrumentos calibrosos, nesses passos inciais da instrumentação, em Canais de difícil acesso. CONCLUSÕES Apoiado nos resultados obtidos da experiência clínica, pode-se concluir que: 1) Já que se tem como um consenso a necessidade de um preparo prévio dos terços cervical e médio ao preparo do terço apical, a Técnica da Inversão Sequencial parece preencher melhor esse requisito, pois permite esse preparo em canais de difícil acesso. 2) As brocas Gates-Glidden e Batt são direcionadas para a as zonas de segurança, evitando assim o desgaste acentuado da parede interna da raiz (zona de furca). (Desgaste direcionado). 3) O terço apical é mais facilmente preparado, pois não existem interferências entre este e o terço cervical, facilitando inclusive a instrumentação rotacional e, possivelmente, diminuindo o risco de fraturas dos instrumentos. Possibilita ainda um menor desvio do canal. 4) Facilita a irrigação, pois, desde cedo, permite uma melhor acomodação da agulha irrigadora, com uma área de refluxo maior, portanto, com menor possibilidade de compressão dos tecidos periapicais e menor extrusão de material. 5) Ganho de tempo, pela facilidade e simplicidade com que ela é executada. Agradecimentos ao Professor Paulo Sérgio Flores Campos pelas fotografias dos casos clínicos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. COHEN, S.; BURNS, R. Caminhos da Polpa. Trad. Sylvio Bevilacqua, 2.ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1982, 695p. 2. DE DEUS, Q.D. Endodontia. 5.ed. Rio de Janeiro, MEDSI, 1992. 3. FAVA, L.R.P. Preparo bi-escalonado. Rev. Paul. Odontol., v.13, n.6, p. 26-32, nov/dez, 1991. 4. GILLES, J.A.; DEL RIO, C.R. A comparision of the canal master endodontic instrument and K-type files for enlargement of curved root canals. J. Endod. v.16, n.12, p.561-565, Dec. 1990. 5. GROSSMAN, L.I. Endodontia Prática. Trad. Sylvio Bevilacqua. 3. ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 1963. 6. INGLE, J.I.; BEVERIDGE, E.E. Endodontia, Trad. José Carlos Borges Teles. 3. ed. Rio de Janeiro: Interamericana, 1989. 7. KASAHARA, E. et al. An evaluation of guidelines for the apical enlargement of Maxilary premolars. J. Endod. v.17, n.1, p.1-7, Jan, 1991. 8. LEONARDO, M.R.; LEAL, J.M. Endodontiatatamento dos canais radiculares. 2. ed. São Paulo: Panamericana, 1992. 9. LESEBERG, D.A.; MONTGOMERY, S. The effects of canal master, Flex-R and K-Flex Instrumentation on root canal configuration. J. Endod. v.17, n.2, p. 59-65, Feb. 1991. 10. LUEBKE, N.H.; BRANTLEY, W.A. Phisical dimensions and torsional properties of rotary endodontic instruments. I. Gates-Glidden Drills, J. Endod. v.16, n.6, p. 438-441, Sept. 1990. 11. PATTERSON, S.S.; NEWTON, C.W. Preparation of root canals and filling by lateral apud GERSTEIN, H. Techiniques in clinical endodontics, Philadelphia: Saunders, 1983, p.42-75. 12. PUCCI, F.M.; REIG, R. Conductos radiculares, anatomia, patologia y terapia. Montevideo, 1945. 2v. apud DE DEUS, Q.D. Endodontia, 5. ed. Rio de Janeiro: MEDSI, 1991. 13. SCHILDER, H. Limpeza e desinfecção dos canais apud COHEN, S.; BURNS, R. Caminhos da Polpa. Trad. Sylvio Bevilacqua. 2.ed.Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1982. 14. STREIFF, J.T.; GERSTEIN, H. Acess cavity preparation apud GERSTEIN, H. Techiniques in clinical endodontics. Philadelphia: Saunders, 1983. p. 1-41. 15. SWINDLE, R. et al. Efect of coronal-radicular flaring on apical transportation. J. Endod. v.17, n.4, p.147-149, Apr. 1991. 16. VESSEY, R.A. The effect of filing versus reaming on the shape of the prepared root canal. Oral Surg. Oral Med. Oral Pathol., v.27, p.543-547 apud LESEBERG, D.A.; MONTGOMERY, S. The effects of canal master, Flex-R and K-Flex instrumentation on root canal configuration. J. Endod. v.17, n.2, p.59-65, Feb. 1991.