ANÁLISE DA OCORRÊNCIA DE EVENTOS EXTREMOS DE PRECIPITAÇÃO REGISTRADOS NO MUNICÍPIO DE ITAJUBÁ, MG Bruno Campos 1, Vanessa Silveira Barreto Carvalho 1, Alan James Peixoto Calheiros 2 1 Universidade Federal de Itajubá brunocampos.bc@gmail.com 2 CPTEC RESUMO: Este trabalho contabilizou os principais fenômenos atmosféricos responsáveis por altos índices pluviométricos associados a eventos de enchentes registrados sobre a cidade de Itajubá - MG nos últimos 13 anos. Dentre os eventos observados, a maior frequência esteve relacionada à atuação de sistemas frontais, da Zona de Convergência do Atlântico Sul e de Vórtices Ciclônicos de Altos Níveis, respectivamente, sendo este último responsável pelo evento extremo registrado no município em janeiro de 2011. A análise do evento em questão revelou que as taxas de precipitação foram superiores a 30 mm/hora o que causou danos humanos e econômicos à região. ABSTRACT: This article has count the main atmospheric phenomena responsible for heavy rainy conditions and associated to flood events registered over Itajubá MG, through the last 13 years. Among the observed events, the highest frequency has been related to frontal systems, South America Convergence Zone and the upper tropospheric cyclonic vortices, respectively, where the last one was responsible for the extreme event registered in the city on January 11 th. The analysis of this event showed that the rain rate were greater than 30 mm/hour, what motivated human and economic damages to the region. INTRODUÇÃO A variabilidade pluviométrica de uma região é um fator crucial que influência diretamente nas atividades humanas e na produção agro-industrial. Situada no sudeste de Minas Gerais, a cidade de Itajubá é caracterizada por sua orografia acentuada, com montanhas em sua adjacência. Nesse município, constantemente, são verificados diversos eventos extremos de precipitação que são responsáveis por enchentes e deslizamentos, que produzem danos a sociedade (PINEHIRO, 2005). Visto que economia da região é basizamente voltada para a indústria e a agropecuária. O regime de precipitação nessa região, em geral, é chuvoso no verão e seco no inverno, sendo influenciado pela atuação de fenômenos meteorológicos como os sistemas frontais (SF), a Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS), o Vórtice Ciclônico de Altos Níveis (VCAN) e sistemas convectivos de mesoescala. A necessidade da caracterização dos principais sistemas causadores de eventos extremos de precipitação é de suma importância no desenvolvimento de técnicas de previsão e monitoramento para situações de emergência sobre a região de estudo. Nesse contexto, o presente estudo objetiva identificar os sistemas responsáveis pelos maiores índices pluviométricos associados a eventos de enchentes sobre a cidade de Itajubá/MG ocorridos de
1998 ao corrente ano e diagnosticar o evento extremo ocorrido em janeiro de 2011 sobre a região Sul/Sudeste de Minas Gerais. METODOLOGIA Para todo o período, de 1998 a 2011, foram analisados dados de precipitação acumulada, registrados a cada três horas por uma Plataforma de Coleta de Dados (PCD) do Centro de Previsão de Tempo e Estudo Climáticos (CPTEC) instalada no campus da Universidade Federal de Itajubá. O total de precipitação acumulada diário foi calculado e as datas com índices de precipitação maior ou igual a 50 mm/dia foram selecionadas. Para essas datas foram levantadas as imagens do satélite GOES (NOAA) para as respectivas datas, em conjunto com os dados de precipitação, foram utilizadas para determinar a duração dos sistemas atuantes. Complementando a análise, para um dos casos registrados no ano de 2011, foram analisados campos de omega, vorticidade relativa, divergência do fluxo de umidade e divergência e linhas de corrente em 850 e 200 hpa gerados no software GRADS a partir de dados, com resolução temporal de 6 horas e espacialidade de 2,5, extraídos do National Centers for Environmental Prediction (NCEP; KALNAY et al., 1996). RESULTADOS A partir da análise dos dados, foram selecionados vinte e um (21) casos de eventos extremos em Itajubá quando foram verificadas taxas de precipitação acumulada superiores a 50 mm/dia. Um destes eventos, entre 01 e 04 de janeiro de 2000, foi responsável por três dias com precipitação superior a esse limite. Segundo Pinheiro (2005), durante este evento o nível do Rio Sapucaí registrou um aumento de 8 metros no dia 02 de janeiro. Nesse dia, o total de precipitação acumulada superou os 180 mm. Outros dois eventos também produziram dois dias com chuva superior aos 50 mm. Todos estes casos estiveram associados à atuação de ZCAS sobre a região. A Figura 1a ilustra o percentual do número de eventos associados a cada tipo de fenômeno atmosférico. Através desta, é possível verificar que praticamente 47,62% dos eventos estiveram associados a passagem de um SF sobre a região. As ZCAS foram responsáveis por 19,05% enquanto os VCAN foram verificados em 14,29% dos eventos. Não foi possível identificar os fenômenos associados a 19,05% destes. Todos estes eventos, assim como a maioria dos eventos causados pela atuação do VCAN, ocorreram em anos de El Niño enquanto a maioria dos associados a ZCAS foram verificados durantes anos de La Niña. No caso dos SF, metade dos eventos foi verificada em anos de El Niño e metade durante anos de La Niña. O número de eventos extremos e as taxas médias de precipitação registradas durante a ocorrência destes podem ser observados na Figura 1b. Através desta verifica-se um pico de ocorrência nos anos de 2008 e 2009 quando três eventos extremos foram registrados. A taxa de precipitação média diária revelou o valor máximo no ano de 2000, com aproximadamente 81 mm/dia. Esse valor está associado com a precipitação média registrada durante 5 dias de um único evento (mencionado anteriormente). O acumulado registrado durante todo este evento foi
de 374 mm. A atuação das ZCAS foi responsável pelas maiores médias de precipitação registradas durante os eventos extremos com 80 mm/dia enquanto os SF e os VCAN revelaram médias de 61 e 59,5 mm/dia, respectivamente. (a) (b) Figura 1 Número de eventos extremos (a) de acordo com o tipo de fenômeno e ocorrência em anos de El Niño e La Niña e (b) de acordo com o ano e taxas médias de precipitação associadas a estes. Em janeiro de 2011 foi observado um evento extremo que provocou danos materias e humanos em boa parte da região Sul e Sudeste de Minas Gerais. Como pode ser verificado nas análises seguintes, tal fenômeno que originou os altos indices pluviometricos foi diagnosticado como um VCAN. Os VCANs do tipo Palmer (Palmer, 1951) são sistemas de escala sinótica que exercem forte influência nas condições do tempo anômalo sobre a região Nordeste e Sudeste do Brasil. Os VCANs são constituídos por um ramo esquerdo (sistema frontal), um centro de subsidência e um ramo direito, resultante da convergência do ar subsidente com os Alísios. As áreas sob subsidência apresentam estiagem enquanto áreas sob os ramos direito e, particularmente, o esquerdo apresentam chuvas intensas. A carta de vorticidade Relativa (10-5 s -1 ) e linhas de corrente em 200 hpa foi apresentada na Figura 2a. Valores positivos indicam movimentos anticiclônicos (amarelo) e valores negativos movimentos ciclônicos (verde), para o Hemisfério Sul. No dia 2 de janeiro às 06 GMT, os mais baixos valores de vorticidade (< 5x10-5 s -1 ) e o escoamento mostrado pelas linhas de correntes em altos níveis caracterizam e determinam a posição do VCAN em aproximadamente 15 S e 25 W, assim como os de vorticidade positiva na região em que a Alta da Bolívia se localizava. Tal padrão está coerente com aquele apresentado por Kousky e Gan (1981). Os campos de divergência do vento horizontal (10-5 s -1 ) e linhas de corrente em baixos níveis podem ser visualizados na Figura 2b. Nos níveis baixos, a divergência (vermelho) está associada a movimentos descendentes, enquanto convergência (azul) está relacionada a movimentos ascendentes. É evidente na figura a região de convergência denominada como o ramo esquerdo do VCAN sobre a região Sudeste, principalmente sobre o Estado de Minas Gerais. Os movimentos ascendentes (azul) em níveis inferiores podem ser enfatizados pelo campo de ômega (Pa/s) mostrado na Figura 2c. O padrão de circulação em altos e baixos níveis
favorece o fluxo de umidade para região, alimentando assim a zona de convergência, como pode ser observado pelo campo de divergência do fluxo de umidade (Figura 2d), onde os valores negativos (azul) indicam convergência de umidade (10-7.s -1.g.kg -1 ) sobre a região de maior nebulosidade do VCAN. (a) (b) (c) (d) Figura 2 Campos de (a) vorticidade (10-5 s -1 ) e linhas de correntes em altos níveis (200hPa), (b) divergência horizontal do vento (10-5 s -1 ) em baixos níveis (850hPa), (c) ômega (Pa.s -1 ) em baixos níveis (850hPa) e (d) divergência do fluxo de umidade (10-7.s -1.g.kg -1 ) em baixos níveis (850hPa) baseado em dados do CDC/NCEP/NCAR para o dia 02/01/2011 às 06 GMT. As imagens do satélite GOES-12 no dia 02 de janeiro de 2011 às 06GMT para os canais do infravermelho e vapor d água podem ser observadas nas Figuras 3 a e b, respectivamente. Notase na Figura 3a que a banda de nebulosidade sobre a região Sudeste do Brasil está associada ao ramo esquerdo do VCAN localizado sobre o oceano Atlântico próximo a costa Leste do Nordeste, como indicado na análise dos campos meteorológicos acima. Os valores de temperatura do topo das nuvens chegam a aproximadamente -50 C, caracterizando sistemas de nuvens de grande desenvolvimento vertical, que são associadas a altos índices pluviométricos. A Figura 3b apresenta a imagem do vapor d água observada na atmosfera para o mesmo instante, evidenciando que um núcleo seco sobre o centro do sistema em altos níveis, enquanto que a refletividade associado à zona de convergência se mostra com altos valores. Observa-se na Figura 3c que as taxas de precipitação, durante a fase de dissipação do sistema, observadas
pelos radares do Pico do Couto (RJ) e de São Roque (SP), do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (DCEA/AER) disponibilizados pela DSA/CPTEC/INPE, chegaram a mais de 30 mm/h concordando com os registros de superfície. Tal sistema teve um tempo de vida de aproximadamente 5 dias. (a) (b) (c) Figura 3 Imagem do satélite GOES-12 para a America do Sul nos canal do (a) infravermelho e CONCLUSÃO (b) do vapor d água e (c) Composição entre as imagens dos radares meteorológicos do DCEA/AER e do satélite GOES-12 para o dia 4 de janeiro de 2011 às 18:30GMT. Fonte: DSA/CPTEC/INPE. A análise da série histórica dos dados de precipitação registrados entre abril de 1998 e julho de 2011 revelou a ocorrência de 21 eventos quando os totais de precipitação ultrapassaram o valor de 50 mm/dia. A maioria destes eventos esteve associada com a atuação de sistemas frontais, ZCAS e VCAN. As maiores médias de precipitação produzidas durante estes eventos estiveram associadas com a ZCAS. Para complementar, o último evento, ocorrido em janeiro de 2011, foi analisado. Os totais pluviométricos excessivos, registrados durante este, foram conseqüência da atuação de um Vórtice Ciclônico de Altos Níveis (VCAN) centrado sobre o oceano Atlântico em 15 S e 25 W cujo tempo de vida foi superior a 5 dias. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem a Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) pelo apoio financeiro no desenvolvimento deste trabalho. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS KALNAY, E., and Coauthors, 1996: The NCEP/NCAR 40-Year Reanalysis Project. Bull. Amer. Meteor. Soc., 77, 437 471. KOUSKY, V. E.; GAN, M. A. Upper tropospheric cyclonic vortices the tropical South Atlantic. Tellus, v. 33, n. 6, p. 538-551, Nov. 1981. INPE-1946-RPE/263. PALMER, C.E. On high-level cyclones originating in the tropics. Transactions of American Geophysics Union, 32 (5): 683-695, Oct. 1951. PINHEIRO, M.V.. Avaliação Técnica e Histórica das Enchentes em Itajubá MG. Dissertação de Mestrado. Programa de Engenharia de Energia, UNIFEI. Itajubá, 2005.