ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DE EVENTOS EXTREMOS DE PRECIPITAÇÃO DIARIA NA CIDADE DE SÃO PAULO Neide Oliveira INMET-7 Disme/SP neide.oliveira@inmet.gov.br Resumo Este trabalho analisou chuvas intensas ocorridas em 24 horas na cidade de São Paulo/SP no período de 1943 a 20, relacionando frequência e intensidade. Os dados analisados foram coletados da estação meteorológica do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET/7 Disme- SP). A análise foi limitada aos eventos de chuva acima de 20 milímetros, ocorridos em 24 horas, com ênfase nos eventos acima de 70 milímetros. A análise efetuada estimou o tempo de retorno para cada evento extremo. Com o estudo foi possível determinar estatisticamente a evolução da precipitação intensa ao longo do período estudado e o tempo de retorno para cada evento extremo. Verificou-se que nos últimos 20 anos a ocorrência de chuvas intensas tem aumentado, tornando-se mais freqüentes na cidade de São Paulo. Palavra chave: eventos extremos, precipitação, recorrência, análise estatística, Abstract This work analyzed heavy rainfall events, in 24 hours, in Sao Paulo-SP, from 1943 to 20, relating frequency and intensity. Data precipitation was collected from the meteorological station of the National Institute of Meteorology (INMET / 7 Disme-SP). The analysis was limited to daily rainfall above 20 mm, with emphasis on the events exceeding 70 mm. The analysis estimated the Return Periods for each extreme event. It was possible to determine the statistics of the evolution of extreme rainfall and Return Periods for each magnitude in São Paulo. The conclusions show that extreme rain episodes have increased over the past 20 years in São Paulo. 1. Introdução Diversos estudos têm demonstrado que os regimes climáticos estão sofrendo mudanças e trazendo conseqüências dramáticas à sociedade, especialmente aos grandes centros urbanos. O conhecimento da evolução da precipitação é de suma importância para o planejamento sócioeconômico e a gestão de recursos hídricos. Na cidade de São Paulo os temporais são freqüentes
na primavera e, especialmente, no verão, e uma das principais conseqüências são os alagamentos e enchentes relâmpagos que lideram as estatísticas como o segundo maior causador de perda de vida. A gravidade dos temporais na cidade de São Paulo depende, além de outros fatores, do tempo de ocorrência e da intensidade da chuva. A compreensão do comportamento das variáveis do clima ajuda na definição de parâmetros para minimizar perdas e equilibrar custos e benefícios. 2. Dados e metodologia Neste trabalho foram utilizados dados diários de precipitação da estação meteorológica do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET/SP) localizada na zona norte da cidade de São Paulo, de janeiro de 1943 a dezembro de 20. Foram selecionados totais de chuva acima de 20 milímetros (mm), em 24 horas, para estudar a evolução dos eventos, especialmente aqueles acima de 70 mm. Para o estudo estatístico da distribuição da freqüência dos eventos extremos utilizamos a técnica de Distribuição Assintótica dos Extremos do tipo I, também conhecido como distribuição de Gumbel. Este método foi utilizado para o traçado das curvas de recorrências e também para a determinação pontual de uma determinada recorrência, a partir de um valor de precipitação. A Função Probabilidade é dada por: P e e.( y ) chuva. sendo o parâmetro de escala, o parâmetro de locação da distribuição e y o valor da = 1,2828/ s e = x - 0,451 s sendo s o desvio padrão e x a média. Assumindo a função Tempo de Retorno (Tr) como: Tr= 1/(1-P) 3. Resultados e discussão A análise estatística tem por objetivo determinar o tempo de retorno para diferentes intensidades de chuva. Num total de 816 meses de dados analisados, 61 deles tiveram pelo menos um dia com chuva entre 60 e 70 milímetros, sendo mais rara a ocorrência de valores acima de 140 milímetros (figura 02 e 03). Eventos extremos, acima de 70 mm, foram agrupados por intensidade e por década, para avaliar a evolução da precipitação em cada década, na cidade de São Paulo (figura 04). Os resultados indicaram que houve um aumento da ocorrência de eventos entre 70 e 90 mm nos últimos 20 anos. Para valores acima de 0 mm observa-se um ligeiro acréscimo ao longo das décadas, com exceção da década de 80 que teve um aumento
Precipitação 24 horas (mm) marcante no numero de eventos extremos. A evolução mais significativa foi observada para valores acima de 70 mm, principalmente nas duas últimas décadas. As chuvas intensas ocorreram com maior freqüência na primavera e no verão, principalmente no mês de janeiro, para todas as categorias. Recalculamos o tempo de retorno para as seguintes séries de dados: entre 1970 a 20, entre 1990 e 20 e entre 2000 e 20 (figura 05). Destacamos o valor de 120 milímetros na figura 05 (linha preto) para mostrar que o tempo de retorno para este valor fica cada vez menor à medida que se aproxima da década de 2000. Para a série entre 2000 e 20, observa-se que o tempo de retorno está mais curto, evidenciando que chuvas mais intensas estão ficando mais freqüentes. acima de 140 mm entre 130 e 140 mm entre 120 e 130 mm entre 1 e 120 mm entre 0 e 1 mm entre 90 e 0 mm entre 80 e 90 mm entre 70 e 80 mm entre 60 e 70 mm 0 20 30 40 50 60 70 número de meses Figura 02- Relação entre freqüência do número de meses e intervalos de chuva máxima (acima de 60 mm). O resultado da curva de tempo de recorrência, apresentado em forma de gráfico, cuja escala de anos (eixo das abscissas) está em escala logarítmica para facilitar a leitura dos dados (figura 03). 150 140 130 120 1 0 90 80 70 60 50 40 30 20 0 0,01 0,1 1 0 Número de anos Figura 03: Tempo de Retorno de chuva intensa, em 24 horas, na cidade de São Paulo (zona norte/inmet).
Precipitação 24 horas (mm) 18 16 14 12 8 6 4 2 0 17 17 11 9 8 7 5 5 5 4 3 3 2 2 1 >70 mm >80 mm >90 mm >0 mm década de 1970 década de 1980 década de 1990 década de 2000 Figura 04: Número de ocorrência de volumes de chuva, por década. 140 130 120 1 0 90 Número de anos 0 1970 a 20 1990 a 20 Figura 05: Tempo de retorno de chuva intensa, em 24 horas, para três séries de dados. Vale comentar o estudo estatístico elaborado pelo Centro de Gerenciamento de Emergências da Defesa Civil de São Paulo (CGE), que relacionou precipitação mensal com o transbordamento dos rios na cidade de São Paulo. Verificou que os períodos de 2005/2006 e 2009/20 foram os mais chuvosos da série. O número de transbordamento é mais freqüente na zona leste da cidade. Em 2009/20 foi registrado, em todas as regiões da cidade, o maior número de ocorrência de transbordamento, inclusive na zona sul, onde normalmente se observa um número muito pequeno. 4. Conclusão Os resultados aqui apresentados indicam que houve um aumento da ocorrência de eventos extremos entre 70 e 90 mm nos últimos 20 anos. Para valores acima de 0 mm observa-se um ligeiro acréscimo ao longo das décadas, com exceção da década de 80 que teve um aumento marcante no número de eventos. A evolução mais significativa foi observada para valores acima de 70 mm, principalmente nas duas ultimas décadas. O tempo de retorno para
eventos de 120 milímetros (figura 05) é cada vez menor à medida que se aproxima da década de 2000. Para a série entre 2000 e 20, observa-se que o tempo de retorno está mais curto, evidenciando que chuvas mais intensas estão ficando mais freqüentes. Estudos anteriores confirmam essa tendência, uma atenuação das chuvas mais fracas e um aumento das chuvas intensas, não só na capital como em grande parte do Estado de São Paulo (Oliveira N. et al,1998, Xavier et el., 1993 e Silva Dias, M.A. F., 1994, Setzer, J, 1973, Sant Anna Neto, 1997). 5. Agradecimentos A autora agradece ao meteorologista Willians Bini Silva, Thobias Heister (Munich Re), Eng. Anibal Knijnik (WSYS meteorologia) e Adilson Nazário (CGE) pela contribuição a este trabalho. 6. Bibliografia - CHOW, V.T. Frequency of hydrologic data with special application to rainfall intensities. University of Illinois Bulletin, p.50-81, 1953. -Oliveira, N., Fogaccia, C.V.C., Almeida R.M.B., Caracterização preliminar das chuvas intensas no Estado de São Paulo, In: X Congresso Brasileiro de Meteorologia, Brasília, 1998. -Setzer J. Chuvas de intensidade máxima no estado de São Paulo. Revista DAE, São Paulo, V:33, n,93, p.52-59, 1973. -Silva Dias, M.A.F, Xavier T. de Maria B.S e Xavier A. F. S.,(1994), Evolução de parâmetros da precipitação diária na grande São Paulo (1933-1992). VII Congresso Brasileiro de Meteorologia, II Congresso Latino-Americano e Ibérico de Meteorologia, Belo Horizonte, outubro de 1994. -Soares, J.R. e Silva Dias, M.A.F., 1986, Probabilidade de ocorrência de alguns eventos meteorológicos extremos na cidade de São Paulo. Rev. Bras. Meteorologia, 1.67-75. -Tucci, Carlos E. M, 2002: Hidrologia Ciência e Aplicação. Terceira Edição, 944 páginas.