I LOVE MY WHITE Mulheres no Registro do Tráfico Ilegal de Drogas Lúcia Lamounier Sena CRISP Abril de 2016
OBJETO A constituição dos sentidos da diferença de gênero em uma dinâmica criminal - tematizada através dos registros de participação de mulheres nas redes de comercialização de drogas ilegais Nesses registros alguns desdobramentos: Como são constituídos os determinantes de valor das posições nesse mercado ilegal? O que as posições observadas revelam sobre as relações de poder e gênero? Em que medida as posições são definidas por uma diversidade de sentidos contextuais de gênero?
APORTE EPISTEMOLÓGICO Os referenciais teóricos que nortearam o estudo contemplam as seguintes dimensões: O debate sobre diferença e gênero de algumas vertentes do campo teórico feminista e do debate sobre gênero e crime. A diferença tomada como uma essência X a diferença construída pelas intersecções de natureza diversa. Contextos específicos de experiência estruturadores dos sentidos. A lógica dos mercados ilegais de drogas referenciada como um sistema aberto, formado por uma padrão ampliado e autônomo de conexões, que estruturam uma dinâmica de rede.
METODOLOGIA Pesquisa de caráter etnográfico Encontros (frequência irregular) com pessoas ou grupos atuantes nos mercados de drogas ilegais em espaços de sociabilidade ou nos próprios locais em que ocorre uma dinâmica de comercialização (bares, residências, dentre outros). Participação em reuniões e eventos do Grupo de Amigos e Familiares de Pessoas em Privação de Liberdade/Escritório de Advocacia Popular. Entrevistas Pessoas que em algum momento atuaram nos mercados de drogas ilegais ou permanecem atuando. Agentes de segurança pública que atuam na repressão ao tráfico de drogas ilegais (Divisão de Tóxicos e Entorpecentes, GEPAR, Policiais que atuam nas ruas, Divisão de Homicídios); Mulheres encarceradas, pelo crime do tráfico, que cumprem pena nas penitenciárias femininas Estevão Pinto (BH) e José Gonçalves Abranches (Ribeirão da Neves)
Pesquisa de Base Secundária METODOLOGIA Banco de dados estatísticos Infopen do Ministério da Justiça, comparando-se o ano de 2006 (ano que entra em vigor a nova lei de Tóxicos, (11343/2006) e o ano de 2011, tomado como fechamento da década (tratamento descritivo). Base de dados do universo da população prisional masculina (José Maria Alckmin) e das populações femininas (José Gonçalves Abranches e Estevão Pinto), referentes ao ano de 2013: dados da Diretoria de Gestão da Informação de Minas Gerais (Testes estatísticos Qui-quadrado e Regressão Binomial).
ESTRUTURAÇÃO DO ESTUDO No primeiro momento, uma breve retomada das discussões sobre diferença e gênero do campo teórico feminista e no debate sobre gênero e criminalidade. Contexto institucional como uma das bases de estruturação do sujeito da diferença Efeito diferencial do poder. Apresentação do perfil do encarceramento no Brasil. De forma específica, o encarceramento por tráfico de drogas. Apontamentos sobre a especificidade das taxas femininas.
Gênero e as Posições no Tráfico Os dados revelaram especificidades em que a dimensão de gênero sugere ter maior implicação.: Destacam-se a relação sexo e crimes violentos: cerca de duas vezes mais enquadramentos entre os homens do que entre as mulheres; O crime de Associação ao Tráfico (Art. 35) em que o percentual de mulheres enquadradas é três vezes maior do que o dos homens; O artigo 40, Inciso III, relativo à infração cometida nas dependências ou imediações de áreas aqui nomeadas como de interesse público (tais como estabelecimentos prisionais,escolas, centros recreativos) em que o percentual de mulheres é quatro vezes maior do que o enquadramento de homens e o tráfico Interestadual e Transnacional, com proporção de mulheres cinco vezes maior. O teste foi estatisticamente significativo para todos os cruzamentos, exceto diversos. Mas como as mulheres têm proporções maiores em todos os demais (a não ser no ART 33), este fato pode estar relacionado à proporção de mulheres enquadradas em tráfico, de maneira geral.
Regressão Binomial Verfiricação da possível diferença na distribuição dos enquadramentos entre homens e mulheres. Influência entre variáveis estabelece relações de causalidade. Os termos em que se estabelecem essas relações são dados em função das probabilidades, a chance de um indivíduo selecionado aleatoriamente possuir um enquadramento no crime em função das características pessoais selecionadas. No caso da variável sexo, qual a probabilidade (a chance) de uma mulher, selecionada aleatoriamente, possuir o enquadramento em um tipo de enquadramento qualquer.
Regressão Logística Binomial Verfiricação se há diferença na distribuição dos enquadramentos entre homens e mulheres. A Influência entre variáveis estabelece relações de causalidade. Os termos em que se estabelecem essas relações são dados em função das probabilidades, a chance de um indivíduo selecionado aleatoriamente possuir um enquadramento no crime em função das características pessoais selecionadas. As possíveis associações entre tipo de crime e sexo, buscou-se investigar (i) em que medida o enquadramento em tráfico, em crimes violentos e em crimes não violentos se relaciona com sexo, idade, escolaridade e tipos de crime; Em que medida o enquadramento em cada artigo da Lei de Tóxicos se relaciona com sexo, idade, escolaridade e tipo de crime Teste revelou relação de chance/probabilidade da variável sexo feminino para os seguintes enquadramentos na Lei de Tóxicos 11343/2006: Art. 35 :Associação ao tráfico (160%) Art 40 Inc IV: Delito cometido em localidades de Interesse público (254%)
DIÁLOGO ENTRE OS DADOS Busca de elementos relacionados aos resultados dos testes estatísticos nos dados da pesquisa de campo (entrevistas, observação etnográfica) A Estruturação das posições e práticas nos mercados ilegais é dado pela Funcionalidade moral : constituição do valor de um agente pela sua portabilidade de um valor de troca que aciona as conexões. A confiança é o bem de maior valor de troca nos mercados ilegais. É um valor individual e impermanente. A Funcionalidade moral é determinante das práticas e da especificidade da diferença de gênero assumida nos mercados ilegais de drogas.
Gênero e Funcionalidade Moral A funcionalidade moral legitima a diferença como uma essência estratégica que caracteriza o mundo (uma rede de comercialização) como espaço da diferença. Esse espaço é instituído por uma moralidade que define internamente os agentes, na especificidade da sua distinção de atuação nesse mercado, como portadores de uma posição diferencial de gênero. A Funcionalidade Moral, expressa-se através do gênero pela sua adequação, prática e simbólica, para o desempenho de uma atividade ( e uma posição) que outro agente, também pelo gênero representado como lhe sendo próprio, é destituído de valor ou pode abster-se de realizar.
Pressupostos Adotados Gênero e Funcionalidade Moral A posição diferencial da mulher é dada pela sua Funcionalidade Moral : Ativação estratégica dos princípios culturais e históricos das essencialidades de gênero Operacionalização da crença de uma posse, essencial das mulheres, do bem de maior valor de troca nos mercados do varejo das drogas ilegais: a confiança. A Funcionalidade Moral de gênero atua de forma favorável para uma mulher em termos de abertura para participação e formas de conexão e, também, para a operacionalidade dos fluxos da rede de comercialização na qual ela atua.
Gênero e Funcionalidade Moral Tanto os homens quanto as mulheres ativam uma performance de gênero quando se isentam ou se encarregam de alguma atividade no tráfico em nome de uma essência ; A instrumentalização das crenças e moralidades referentes às essências de gênero explica as associações entre a variável sexo e determinados enquadramentos; As práticas não são simples balizadoras das essências socialmente dominantes em que se baseiam as relações desiguais de gênero. Tanto ressignificam quanto referendam as diferenças. São transposições estratégicas dessas essências e que possuem forças explicativas no sistema como um todo.
Desdobramentos nos Capítulos da Tese I love my White - a essência como recurso Registros da funcionalidade moral através da figura da fiel. Constituição prática e simbólica dos lugares femininos nos domínios públicos e privados permeados pelos mercados ilegais de drogas. Durar é mudar - movimentos em Tatá - diversidade contextual das posições de gênero através dos trânsitos e negociação de sentidos nas intermitentes formas de atuação em uma rede. Eu não sou Índio, eu estou Índio : o ser e o estar das trajetórias - redes como constituidoras políticas da diferença. Externamente pela criminalização diferencial dos agentes e Internamente por uma dinâmica específica de constituição contextual de valores contrapostos aos socialmente hegemônicos.