Avaliação de métodos de determinação do teor de matéria mineral em carvões brasileiros.



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Transcrição:

Avaliação de métodos de determinação do teor de matéria mineral em carvões brasileiros. Vera L. V. Fallavena, Cristiane S. de Abreu, Taísi D. Inácio, Carla M. N. Azevedo, Marçal J. R. Pires & Lizete S 2. 1 - Faculdade de Química, Pontifícia Universidade Católica do RS Av. Ipiranga, 6681. Partenon, Porto Alegre RS. CEP 90.619-900. Te. 51 33203549, fax 33203549 2 Fundaçâo de Ciência e Tecnologia (CIENTEC) E-mail: vlvargas@pucrs.br RESUMO A matéria mineral (MM) presente no carvão é um importante parâmetro na caracterização desse fóssil por influenciar significativamente seu uso. Nesse trabalho diferentes formas de tratamento térmico foram aplicadas com o objetivo de determinar a mais eficiente do ponto de vista em resultar um teor de matéria mineral real no carvão. Foram avaliadas correlações empíricas e determinação de Cinzas a Média Temperatura (MTA) (300 C, 370 C e 400 C), com determinação do teor de carbonatos no resíduo das amostras. As possíveis modificações químicas e mineralógicas nas amostras foram verificadas através das análises de MEV-EDS, DRX, Análise Elementar (Carbono) e Análise Termogravimétrica (TGA), comparando os resultados da amostra bruta de carvão com as cinzas em diferentes temperaturas. Os resultados mostram que o teor de cinzas determinado a 300 C, reflete com maior exatidão o conteúdo de MM, quando comparado à fórmula de Parr e indica semelhanças entre as amostras brutas e tratadas quanto à presença desses minerais, enquanto nas temperaturas mais elevadas ocorreram transformações profundas, evidenciadas nas análises de caracterização. Entretanto, o percentual de carbono residual no tratamento térmico a 300ºC é sempre maior do que a 370 e 400 C, podendo estar associado a uma oxidação incompleta da matéria orgânica e à presença de carbonatos que não sofreram descarbonatação, já que o teor de carbonato foi sempre maior nesta temperatura. Todos os resultados indicam que o teor de cinzas determinado à 300ºC juntamente com a análise de carbono residual, ser o método mais adequado na determinação da matéria mineral. Uma correlação com os teores de cinzas a alta temperatura é proposta na estimativa do teor da matéria mineral dos carvões 1

estudados. Visando validar a metodologia proposta, está em andamento a análise de Cinzas a Baixa Temperatura (LTA <200 C), em plasma de oxigênio. PALAVRAS-CHAVE: matéria-mineral; tratamento térmico; caracterização de carvão. 1. INTRODUÇÃO No Brasil as maiores jazidas de carvão fóssil (32 bilhões de toneladas) situam-se nos estados do Rio Grande do Sul (89%), Santa Catarina (10%) e Paraná (1%). Os carvões brasileiros possuem em média 50% de matéria mineral, composta principalmente por argilo-minerais (Sánchez et al., 2002). O carvão brasileiro merece, portanto, atenção especial, e estudos que indiquem os processos que melhor se adaptem a essa particularidade. A matéria mineral (MM) desempenha importante papel durante as análises químicas desses carvões, as quais geralmente são realizadas em alta temperatura (815 o C) e em condições oxidantes, com exceção das determinações de matéria volátil. Nestas condições quase todas as famílias minerais são transformadas, exceção do quartzo. O conteúdo de cinzas medido por calcinação a alta temperatura (HTA - hight temperature ashing) não é um bom parâmetro para estimar o conteúdo de minerais do carvão porque muitas transformações dos minerais ocorrem durante a combustão. (Pires e outros 1997). O teor de matéria mineral do carvão em base mássica é maior do que o teor de cinzas determinado a 815 o C. A volatilização de elementos e alteração, decomposição, transformação, cristalização, recristalização e amorfização de minerais e fases originalmente presentes no carvão provoca modificações em um nível maior do que o observado durante a determinação de cinzas à baixa temperatura (Pires e outros, 1997, Vassilev e outros, 2003, Speight,2005) A identificação e caracterização de minerais por vários métodos é mais efetiva, completa e confiável, entretanto os processos de separação alteram mais ou menos irreversivelmente a matéria mineral e inorgânica de amostras de carvão e os resultados obtidos devem ser interpretados com cautela. Nesse contexto, o objetivo desse trabalho é avaliar métodos alternativos de determinação de matéria mineral do carvão fóssil brasileiro por meio de diferentes formas de tratamento térmico. Diversas técnicas analíticas foram empregadas para garantir a qualidade dos resultados quanto a oxidação total da matéria orgânica sem transformações indesejáveis da matéria mineral original. 2

2. MATERIAIS E MÉTODOS 2.1 Identificação e preparação de Amostras e Padrões As amostras de carvão são provenientes da Jazida Sul Catarinense das camadas Barro Branco e Bonito e da Jazida Leão-Butiá da camada M. As amostras foram moídas e peneiradas (< 250 µm), seguindo procedimentos normatizados (NBR 8292 /1983; ASTM D 2013-86 /1996) e armazenadas em frascos fechados ao abrigo da luz. A Tabela I apresenta a identificação das amostras de carvões utilizadas, jazida, camada, mina e estado de origem. Tabela I Identificação das amostras de carvão utilizadas e sua origem. Identificação das Amostras Jazida Camada UF BBF Sul Catarinense Barro Branco SC BC5 Sul Catarinense Barro Branco SC BO1 Sul Catarinense Bonito SC BO2 Sul Catarinense Bonito SC BO3 Sul Catarinense Bonito SC CRE Leão-Butiá M RS C10 Leão-Butiá M RS Além das amostras citadas na Tabela I, trabalhou-se com o Material de Referência Certificado (MRC) de carvão fornecido pela Rede Metrológica do RS. Esse carvão, identificado pela sigla CAR, é o primeiro MRC de carvão brasileiro sendo certificado para análises de carbono fixo, cinzas, enxofre total, matéria volátil e poder calorífico superior. Esse MRC foi tanto usado no controle de qualidade analítico dos parâmetros citados quanto na validação de métodos de análise elementar como em testes de análise térmica para determinação da MM. As amostras BC5 e C10 foram utilizadas na validação do método proposto. 2.2 Caracterização química e mineralógica do carvão e cinzas. Os parâmetros da análise imediata: umidade de análise, teor de cinzas, matéria volátil e carbono fixo, foram determinados seguindo as normas NBR 8293/1983, NBR 8289 DEZ/1983, NBR 8290 DEZ/1983, ASTM D 3172/1989 (1993), respectivamente. A análise elementar do carvão envolve a determinação do percentual em massa do 3

carbono bem como enxofre, nitrogênio, hidrogênio e oxigênio (usualmente estimado por diferença). As análises foram realizadas no analisador elementar LECO TruSpec, segundo a norma ASTM D 5373 (1993), com calibrações para altos teores de carbono em amostras de carvão (35 a 80%) e baixos teores de carbono em amostras de cinzas (1 a 10%). O teor residual de carbonatos, presente nas amostras submetidas ao tratamento térmico, foi determinado seguindo a norma ASTM D6316-09b. Segundo a norma são pesados 0,5 a 0,7g (precisão de 0,1 mg) em cadinhos de porcelana e adicionadas 40 gotas de HNO3 10% (m/v). Após 90 minutos de reação à temperatura ambiente, a amostra foi seca em estufa à temperatura de 120ºC por 3 horas e analisado o carbono residual no analisador elementar (Leco Truspec CHN). O teor de carbonato foi obtido por diferença entre os teores de carbono elementar determinados antes e após o ataque ácido. Os elementos maiores constituintes das cinzas foram determinados por fluorescência de raios X (ASTM D4326-94, 1996) utilizando um equipamento modelo Rigaku RIX 2000 com fonte de radiação de Ródio. Para a determinação da composição mineral de amostras de carvão bruto e tratado foi determinada utilizando um difratômetro de raios-x (Rigaku Dengi D-Max 2000), com radiação Cu Kq, gerada a 30 kv e 15 ma. As fases minerais foram identificadas com o auxílio do aplicativo Jade Plus 5 (MDI, 2000). O estudo da morfologia das partículas foi realizado por meio do microscópio eletrônico de varredura (Philips modelo XL 30) com um sistema EDS (Energy Dispersive X-ray Spectrometer) para análises elementares qualitativas, utilizando o aplicativo EDAX. A amostra seca foi fixada com o auxílio de uma fita adesiva de carbono ou cobre em um suporte metálico, porta-amostra do microscópio (stub), sendo revestida com um filme condutor de ouro para evitar efeitos de carregamento. Análises térmicas foram também realizadas utilizando um analisador térmico simultâneo TG-DTA (TA Instruments, SDT Q600). As amostras com massa entre 10-15 mg foram colocadas em um cadinho de platina e aquecidas a uma taxa de aquecimento de 20 C min -1 de 25 C até 1000 C, sob fluxo de N 2 a uma vazão de 100 ml min -1. Depois de atingida a temperatura de 1000 C a atmosfera é trocada para ar e mantida uma isoterma de 30 minutos. As curvas de DTA e DTG foram obtidas através de utilização do aplicativo TA Universal Analysis. 4

2.3 Determinação do teor de Matéria Mineral à Médias Temperaturas Um método alternativo foi otimizado para estimar o teor de matéria mineral no carvão a partir da análise de cinzas em média temperatura. Foram estudadas três temperaturas (300, 370 e 400 C) utilizando fornos muflas (Modelo EDG-3000-1P para temperatura de 300ºC e Fornitec N480D para as demais temperaturas), os quais tiveram a temperatura calibrada e monitorada por termopar do tipo K (cromo-alumel). Diferentes massas de amostra (0,5, 1,0 e 1,5 g) e tipos de cadinhos foram testados bem como a posição dos mesmos dentro do forno. Os testes eram iniciados com a colocação de cadinhos contendo as amostras de carvão, previamente submetidas ao teste de umidade, no forno à temperatura ambiente e aquecimento até a temperatura do teste com taxa de aquecimento de 30 C por minuto, quando o tempo começava a ser contabilizado. Após diferentes tempos de queima (entre 8 e 400 h) os cadinhos eram retirados do forno e colocados em dessecadores onde permaneciam até atingir a temperatura ambiente e serem então pesados. Se a variação da massa da amostra entre duas pesagens fosse menor que 0,5% o teste era considerado finalizado. Caso contrário os cadinhos retornavam à mufla, em posições diferentes, sempre com o cuidado de revezamento de modo que os diferentes cadinhos permanecessem o mesmo tempo em uma determinada posição. Esse procedimento deve ser feito para evitar diferentes perfis de queima em amostras e replicatas o que aumento a incerteza na determinação da perda de massa. Testes preliminares foram realizados com as amostras BO2 e CAR nos quais foi possível otimizar a massa da amostra e determinar o tipo de cadinho e o tempo ideal de calcinação. Os cadinhos de tamanho médio (30 ml) contendo 1,5g de amostra apresentaram uma queima mais efetiva que os demais, constatada através dos níveis dos teores de cinzas e do teor de carbono residual. Os períodos de queima variam em função das temperaturas e do tipo de carvão estudados num intervalo de 20 a 382 horas. Para comprovar a queima total do material carbonáceo nas amostras de cinzas em média temperatura foram realizadas determinações dos teores de carbono e carbonato nas amostras tratadas termicamente. As possíveis modificações mineralógicas e morfológicas destas amostras foram também avaliadas por meio de análises de MEV-EDS e DRX, por comparação com os resultados das amostras bruta de carvão. 5

2.4 Estimativa de teor de Matéria mineral através de correlações empíricas. Diversas correlações empíricas foram proposta para estimar o teor de matéria mineral no carvão a partir de parâmetros de caracterização dos mesmos (Nahuys, 1984; Speight, 2005). A correlação mais comumente utilizada é a fórmula de Parr (Eq. 1) usada principalmente nos Estados Unidos e que requer apenas valores dos teores percentuais de cinzas a alta temperatura (Cz) e enxofre total (S), determinados na análise de rotina (Speight, 2005). % MM = 1,08.Cz + 0,55.S (1) A correlação de Parr, na sua forma mais simples, trata todo o enxofre total medido como estando sob forma de enxofre pirítico e não faz a subtração da decomposição de carbonatos ou fixação de enxofre nas cinzas. Apesar dessas limitações e das diversas adaptações propostas a essa correlação, cujos ganhos na precisão da determinação da MM não foram claramente demonstrados, a Fórmula de Parr pode ser considerada como referência para comparação entre diferentes métodos de estimativa da MM (Nahuys, 1984; Speight, 2005). 3. RESULTADOS 3.1 Caracterização química e mineralógica do carvão e cinzas. Os resultados obtidos na análise imediata e elementar (Tab. II) confirmam as características esperadas para os carvões brasileiros, com altos teores de cinzas e baixos teores de carbono (Koepsel 2001, Kalkreuth et al, 2006; Depoi et al, 2008). Esses parâmetros correspondem a valores característicos de carvões que apresentam grau de carbonificação intermediários e presença de quantidades significativas de matéria mineral. Tabela II - Resultado da Análise Imediata e Elementar dos carvões brutos Análise Imediata (%, bs) a Análise Elementar (%, bs) a Amostras Umidade Cinzas Matéria Carbono C H N O a,c S 6

(%) Volátil Fixo a,b BBF 1,18 46,02 22,02 31,96 42,82 3,02 0,69 0,98 6,46 BO1 1,25 51,06 20,73 28,21 39,20 2,43 0,64 0,50 6,17 CRE 8,46 35,66 34,32 30,02 49,78 3,12 0,81 3,99 6,64 BO2 2,05 49,89 19,67 30,44 35,29 2,20 0,60 3,46 10,56 BO3 1,42 55,51 17,86 26,63 35,43 2,28 0,65 1,44 4,69 CAR 1,03 41,19 19,17 39,64 49,47 3,12 0,85 5,37 1,69 BC5 1,47 70,91 13,83 15,26 22,17 2,25 0,60 2,57 1,49 C10 3,94 50,52 24,70 24,78 33,70 2,86 0,61 6,32 5,99 a bs - base seca; b Valor calculado por diferença (100-Cz a - MV a ); c calculado por diferença (100- (C+H+N+Cz+S). Os teores de carbono estão dentro da faixa esperada para carvões brasileiros de baixo rank e são coerentes com os teores de cinzas encontrados para essas amostras. Os teores de hidrogênio e nitrogênio são baixos e apresentam pequena variação entre as amostras como esperado. Por outro lado, os teores de enxofre total apresentam variação significativa entre as amostras. Os carvões BC5 e BO2 (Santa Catarina) apresentam o menor (1,49%) e o maior (10,56%) teores de enxofre total, respectivamente. Teores de enxofre entre 4 a 6% são característicos para os carvões de Santa Catarina, porém valores entre 3 a 8% de enxofre são também verificados (Göthe, 1989). A faixa mais ampla de valores verificadas nesse estudo pode ser devida a diferente origem (camadas) dos carvões avaliados como também à falta de homogeneidade na própria camada amostrada (geologia). Cabe salientar que, do ponto de vista de validação dos métodos propostos, teores mais diferenciados de enxofre são interessantes por que sugerem composição mineralógica variada. Na Tabela III são apresentados os valores da composição química (FRX), expressa na forma de óxidos, determinada na cinzas (HTA) das amostras estudadas. Os resultados obtidos demonstram que os elementos predominantes são o SiO 2 (41,50% a 61,88%), o Al 2 O 3 (17,66% a 29,06%) e o Fe 2 O 3 (4,80% a 25,28%). Outros elementos importantes são o CaO (0,87 a 6,78%) e K 2 O (0,70 a 3,23%). A amostra CAR apresenta composição diferenciada das demais devido tratar-se possivelmente de um carvão beneficiado. 7

Tabela III Composição química determinada por Fluorescência de RX nas cinzas de alta temperatura (HTA) das amostras de carvão estudadas. Composição (%) BBF BO1 BO2 BO3 CAR CRE SiO 2 46,72 55,13 54,17 61,88 57,80 41,50 Al 2 O 3 25,66 18,97 19,31 20,96 29,06 17,66 TiO 2 1,28 0,80 0,85 0,89 1,40 0,89 Fe 2 O 3 18,40 16,93 17,11 9,88 4,80 25,28 MgO 0,59 0,94 0,62 0,71 0,47 0,11 CaO 1,76 2,72 1,87 0,87 1,44 6,78 Na 2 O 0,13 nd 1 0,34 0,34 0,16 0,11 K 2 O 2,77 2,66 2,88 3,23 2,72 0,70 P 2 O 5 <0,03 0,03 <0,03 <0,03 <0,03 <0,03 (3) SO 3 1,33 nd 1,69 0,68 1,06 6,45 LOI 1,41 2,80 1,13 0,53 1,06 0,69 1 nd não determinado; (2) Determinado pelo Leco A difração de RX (não mostrado) para as amostras brutas de carvão mostrou a presença, como materiais majoritários, de quartzo (SiO 2 ), caolinita (Al 4 (OH) 8 (Si 4 O 10 ), muscovita (KAl 2 Si 3 AlO 10 (OH) 2, pirita (FeS 2 ), calcita (CaCO 3 ), sulfato de cálcio hemihidratado (CaSO 4.(H 2 O) 0,5 ), mas também ocorrem ortoclásio (KAlSi 3 O 8 ) e albita (NaAlSi 3 O 8 ). As fases minerais presentes confirmam os dados de composição química obtidos pela análise de fluorescência de RX. Esses resultados estão de acordo com dados de literatura, que citam argilas, sulfetos, carbonato e quartzo como os minerais mais comuns nos carvões (Speight, 2005). 3.2 Determinação do teor de Matéria Mineral à Média Temperatura O comportamento e mudanças da matéria mineral na combustão do carvão em temperaturas de 350 C a 500 C tem sido estudada por vários autores (Pinetown e outros, 2007; Nahuys e outros, 1984: Suarez-Garcia, 2002; Mukherjee e outros, 2006) como uma técnica capaz de isolar a fração inorgânica do carvão com pequenas alterações de sua forma original. O tratamento térmico a 370 C é considerada como temperatura ideal em vários estudos de determinação do teor da MM. A Figura 1 apresenta os perfis de variação percentual da massa das amostras de carvões estudadas a 370 C. Observa-se que a maior variação de massa ocorre até cerca de 20 horas de aquecimento, seguida de uma estabilidade nesta perda após 28 h de teste. Foram verificados comportamentos similares entre os carvões estudados, porém com percentuais de perdas diferenciados em função do conteúdo de MM presente, como 8

Variação de Massa (%) Variação de Massa (%) esperado. A amostra de carvão de Recreio (CRE) apresentou uma perda de massa mais acentuada e mais rápida comparada às demais amostras, com 54% de perda de massa original em apenas 5 horas de tratamento térmico. 100 90 80 BO3 370 c CAR 370 C CRE 370 C BBF 370 C BO1 370 C BO2 370 C 70 60 50 40 30 0 10 20 30 40 50 Tempo (horas) Figura 1 Perfil de variação de massa das amostras de carvão submetidas tratamento térmico a 370ºC em função do tempo. Visando verificar a possibilidade de reduzir o tempo da análise bem como melhor observar as possíveis transformações mineralógicas, testes suplementares foram feitos em temperatura de queima mais elevada (400 o C). Os resultados desses testes estão mostrados na Figura 2 e demonstram perdas de massa mais rápidas com a conseqüente estabilização dos teores de cinzas residuais ocorrendo em períodos mais curtos de tempo (8h) quando comparado ao teste feito a 370ºC (Fig. 1). 100 90 80 BO3 400 C CRE 400 C CAR 400 C BBF 400 C BO1 400 C BO2 400 C 70 60 50 40 30 0 10 20 30 40 50 Tempo (horas) Figura 2 Perfil de variação de massa das amostras de carvão submetidas tratamento térmico a 400ºC em função do tempo. 9

Infelizmente observaram-se alterações significativas na composição da matéria mineral do resíduo resultante tanto dos testes a 400ºC quanto a 370ºC. Os difratogramas de raios-x (não mostrado) de todas as amostras avaliadas apresentaram desaparecimento e/ou perda de intensidade significativa nos picos atribuídos a calcita e pirita quando comparados às amostras brutas. Tal comportamento não era esperado para o tratamento a 370 o C usualmente aceito como procedimento de referência (Pinetown e outros, 2007; Nahuys e outros, 1984: Suarez-Garcia, 2002; Mukherjee e outros, 2006) Em função disso foi testado um tratamento térmico mais brando à temperatura de 300 C. Os resultados obtidos são mostrados na Figura 3, onde observa-se uma diminuição significativa na massa das amostras até 200 h de tratamento com desvio padrão (dp) significativos entre as replicatas, seguida de uma estabilidade na perda de massa após 340 h de teste. Esse resultado, além da diminuição dos dp, sugere uma queima significativa da matéria orgânica. São verificados comportamentos similares entre os carvões estudados, com a amostra de carvão de Recreio (CRE) apresentando uma perda de massa mais acentuada e rápida comparada aos carvões da Jazida Sul Catarinense. Esse comportamento pode estar relacionado à composição química diferenciada (Tabela III) dessa amostra que apresenta também o menor teor de cinzas (775 C) e elevado conteúdo de voláteis (34,32%) quando comparado aos demais carvões. Figura 3 - % de variação de massa das amostras BO1, BO2, BO3, BBF, CAR e CRE submetidas tratamento térmico a 300ºC em diferentes tempos. 10

Na Tabela IV são mostrados os teores de carbono antes após tratamento térmico das amostra estudadas. Verifica-se que a amostra BBF apresentou o menor teor de carbono residual (0,26%) a 300 C, com uma diminuição de 99% do teor de carbono original (amostra bruta 42,82% de C), enquanto que a amostra de carvão do material de referência certificado (CAR) apresentou um teor de carbono residual de 6,64%, com uma diminuição de 87% do teor de C original na temperatura de 300 C e uma conversão de 97 e 98% deste teor para as temperaturas de 370 C e 400 C, respectivamente. Observa-se que percentual de carbono residual presente nas cinzas obtidas por tratamento térmico a 370 e 400 C são sempre menores do que os teores obtidos a 300 C. Os resultados indicam uma maior oxidação da matéria orgânica, mas ao mesmo tempo acompanhada de transformação mais intensa nos minerais originais do carvão, como verificado nas análises de DRX. Tabela IV- Teores de carbono das amostras antes e após tratamento térmico (300 C, 370 C e 400 C). Amostra % Carbono (bs) % Carbono residual (bs) Bruta Cinzas 300 C Cinzas 370 C Cinzas 400 C CRE 49,78 1,06 0,71 0,62 CAR 49,47 6,64 1,69 0,87 BBF 42,82 0,26 0,26 0,25 BO2 35,29 2,50 0,73 0,38 BO1 39,20 0,54 0,41 0,37 BO3 35,43 1,25 0,29 0,24 A Figura 4 apresenta o difratograma obtido na análise de difração de raios-x da amostra CRE bruta e cinzas obtidas a 300 C, 370 C e 775 C, ilustrando as transformações que ocorrem diferentes tratamentos térmicos de maneira similar às outras amostras. Pela análise dessas figuras observa-se que as amostras brutas apresentaram quartzo (SiO 2 ), pirita (FeS 2 ), caolinita (Al 4 (OH) 8 (Si 4 O 10 ), sulfato de cálcio hemihidratado (CaSO 4.(H 2 O) 0,5 ), como fases predominantes e ainda a presença de ortoclásio (KAlSi 3 O 8 ), muscovita (KAl 2 Si 3 AlO 10 (OH) 2 e calcita (CaCO 3 ). As amostras BO1 e BO3, da camada bonito apresentaram a presença de albita (NaAlSi 3 O 8 ). Picos devido à presença de calcita e muscovita são proeminentes no carvão bruto e no carvão após aquecimento na temperatura de 300 C. 11

Figura 4 Difratogramas obtidos para a amostra CRE. De cima para baixo: Amostra Bruta, Cinzas a 300 C, Cinzas a 370 C e Cinzas a 775 C.. Q Quartzo (SiO 2 ); K Caolinita (Al 4 (OH) 8 (Si 4 O 10 ); Gh Sulfato de cálcio hemi-hidratado (CaSO4.(H2O) 0,5 ); M Muscovita (KAl 2 Si 3 AlO 10 (OH) 2 ); O- ortoclásio (KAlSi 3 O 8 ); An Anidrita (CaSO 4 ); P Pirita (FeS 2 ); C Calcita (CaCO 3 ); H Hematita (Fe 2 O 3 ). Entretanto, caolinita não aparece nas amostras submetidas à temperatura mais elevada, isto porque durante o tratamento térmico pode ocorrer interação entre minerais e novas espécies minerais vão aparecendo, algumas vezes, meta-estáveis (Nahuys, 12

1984). A anidrita (CaSO 4 ) e hematita (Fe 2 O 3 ) são identificadas nas cinzas a 775 0 C embora não tenham sido observadas nas amostras brutas, representando sua presença um modo alterado do original. A anidrita é um produto neoformado, sendo provavelmente formada pela interação do cálcio organicamente associado nos macerais ou dos poros da água, com o SO 2 proveniente da oxidação da pirita ou do enxofre orgânico na decomposição dos macerais (Gupta, 2007, Pinetown et al (2007). A anidrita pode, igualmente, ser resultante da reação entre o óxido de cálcio (CaO), formado pela decomposição térmica da calcita (CaCO 3 ) e os SO x produto da oxidação da pirita (Santana, 2002). A hematita reflete uma oxidação da pirita. É importante salientar que a pirita não é afetada por tratamento térmico a 300 C, entretanto na temperatura de 370 C e 400 C já aparece na forma de hematita que pode ter sido formada como um produto de transformações térmicas das fases presentes no carvão. Segundo Mukherjee (2006), a pirita sofre oxidação acima de 370 C e a marcasita entre 430-440 C formando oxido de ferro e dióxido de enxofre. A calcita de decompõe na faixa de 750 C-900 C formando CaO e CO 2. A Figura 5 apresenta o resultado, com aumento de 10000x, da microscopia de superfície das amostras carvão bruto BO2 e de suas cinzas obtidas a 300 C durante 382 horas. A B Figura 5 - Microscopia Eletrônica de Varredura de (A) amostra bruta de carvão BO2 e (B) cinzas a 300ºC por 382 horas e respectivos Espectros de Energia Dispersiva 13

Observa-se a morfologia da amostra bruta (Fig. 5A), apresentando uma superfície irregular (MEV) e a presença de material carbonoso e matéria mineral inferida através do espectro EDS. A Figura 5(B), que mostra partículas de cinzas dessa mesma amostra submetida à temperatura de 300 C por 382 h, não apresenta variação significativa de morfologia comparada à amostra bruta. Por outro lado, o teor de carbono (EDS) é bem menor que o da amostra bruta confirmando a oxidação significativa da matéria orgânica. Medidas de carbono residual presente na amostra submetida a tratamento térmico indicaram a presença de 2,5% de carbono (Tabela IV), ou seja, uma redução de 93% do teor de carbono original (35,29%). A Tabela V apresenta um sumário dos dados dos teores de cinzas obtidos a nas diferentes temperaturas estudadas e o tempo necessário para estabilização da perda de massa para cada teste. As diferenças observadas entre os teores de cinzas obtidos a 775 C e a 300 C podem ser explicadas, em parte, pela quantidade relativamente elevada de calcita e pirita presente nas amostras. Esses minerais sofrem uma perda quando o carvão é queimado a temperaturas mais altas (Nahuys, 1984). Na análise do teor de cinzas a altas temperaturas, argilas, carbonatos, sulfatos entre outros minerais, são decompostos sendo a percentagem de cinzas claramente mais baixa que o teor de matéria mineral. Os teores de cinzas obtidos nas demais temperaturas (370 C e 400 C) já apresentam valores mais próximos do valor obtido para tratamento térmico a 775 C. O tratamento térmico a 300 C não provocou transformações profundas na matéria mineral refletindo melhor o conteúdo de MM presente no carvão conforme discutido anteriormente. Tabela V - Teores de cinzas a alta (775ºC) e média temperaturas (300ºC, 370 C e 400 C) para as amostras de carvão em estudo. Amostra Cinzas 300 C (382 h) Cinzas 370 C 48 h Cinzas 400 C 48h Cinzas 775 C (bs) 2h CRE 42,98 37,70 36,89 35,66 CAR 50,09 44,48 43,91 40,88 BBF 53,99 46,90 45,69 46,02 BO2 59,25 53,52 52,36 49,89 BO1 57,12 52,38 51,45 51,06 BO3 62,07 58,52 57,86 55,51 Apesar da não transformação das fases minerais obtidas no tratamento térmico a 300 C persistem teores de carbono residual (Tabela IV) sugerindo queima incompleta. 14

Por outro lado a análise de DRX aponta a presença de calcita (CaCO 3 ) nestas amostras que poderia justificar a presença de carbono sob a forma inorgânica. Na Figura 6 são apresentados os teores residuais de carbono orgânico e inorgânico para as amostras após os tratamentos térmicos. Verifica-se a presença de carbonatos em todas as amostras, sendo a forma de carbono predominante para as amostras de CRE e BO1. O percentual de carbonatos (% CO 2 ) variou de 0,29-7,11%; 0,18-1,94% e 0,18-1,65% nas cinzas a 300 C, 370 e 400 C, respectivamente. Com exceção do CAR os teores de carbono orgânico são inferiores a 1%, indicando que os tratamentos térmicos foram eficientes na eliminação da matéria orgânica. O teor de carbonato foi sempre menor nas amostras tratadas a 400 C e 370 C e maiores a 300 C como esperado em função da decomposição da calcita a temperaturas mais elevadas. Os resultados diferenciados para a amostra CAR indicam características diversas apresentando teores de carbono orgânico (4,70%) e inorgânico (1,94%) muito superior aos das demais amostras de carvão. Para amostras com esse comportamento é necessário a quantificação não só do carbono residual como o do teor de carbonatos para a obtenção do teor de MM mais preciso. Por outro lado a determinação do teor de carbonatos para amostras que apresentem carbono residual, após tratamento térmico, menor do que 1% deve ser feita com precaução visto a pequena contribuição para o cálculo da MM e as incertezas associadas à análise. Figura 6 - Teores % de carbono residual antes e após tratamento ácido (norma ASTM D6316-09b) e de carbonatos nas cinzas das amostras de carvão obtidas por tratamento térmico a 300 C, 370 C e 400 C. 15

Teor de Cinzas a Média Temperatura Com o intuito de estimar de forma mais rápida o teor de MM sem necessidade de testes de longa duração foram verificadas a existência de correlações entre os resultados obtidos nos tratamentos térmicos de média e alta temperatura Na Figura 7 onde foram plotados os valores de cinzas a média temperatura (MTA 300 C, 370 C e 400 C) em função dos teores de cinza a alta temperatura (HTA) apresentados na Tab.IV. 70 Cz 300 C Cz 370 C Cz 400 C 60 50 Cz 300 C = 0,938 CZ_A + 10,851 R² = 0,9395 40 30 Cz 370 C = 1,0158CZ_A + 1,9155 R² = 0,9567 Cz 400 C = 1,0112Cz_A + 1,2368 R² = 0,9528 30 35 40 45 50 55 60 Teor de Cinzas a 775 C Figura 7: Correlação entre os valores de cinzas a alta e médias temperaturas das amostras de carvão estudadas. Cz_A (Cinzas a altas temperaturas) Observa-se boas correlações lineares com R 2 0,9395: 0,9567 e 0,9528, para temperaturas de 300 C, 370 C e 400 C, respectivamente. Esses resultados confirmam a possibilidade da estimativa preliminar do teor da matéria mineral dos carvões estudados de uma simples correlação com os teores de cinzas a alta temperatura. Com o objetivo de validar correlação obtida entre HTA e MTA-300 C testes complementares foram realizados utilizando duas novas amostras de carvão, BC5 (camada Barro Branco) e C10 (camada M-Recreio), que foram submetidas à tratamento térmico de 300 C (382 h). A Tabela VI apresenta um resumo dos valores de cinzas das duas amostras obtidos experimentalmente, bem como o calculado através da utilização da equação da reta (MTA 300 C = 0,938*Cz +10,851). Pela análise da Tabela VI observa-se que o resultado experimental do teor de cinzas a 300 C e o obtido através de cálculo utilizando a equação de reta (correlação 16

entre cinzas obtidas a 775 C e 300 C) são muito próximos com erros menores do que 0,73% para os dois carvões. Esses resultados indicam que é possível fazer uma estimativa inicial do teor de MM através de HTA e utilizando a equação da reta proposta. Cabe destacar, como salientado anteriormente, a necessidade da determinação do carbono residual nas amostras tratadas termicamente a 300 C. Os bons resultados para os carvões usados na validação foram estão relacionados a queima completa eficiente da matéria orgânica constatada pelo C residual < 1%. Entretanto, um número maior de amostras deve ser testado antes de obtenção de uma correlação genérica para os carvões brasileiros. Tabela VI - Teores obtidos, experimentalmente e calculado (correlação), de cinzas das amostras de carvão bruto BC5 e C10 submetidas a tratamento térmico por 382 h a temperatura de 300 C. Amostra Cinzas a 775 C (%) (bs) Cinzas 300 C Experimental (%) (bs) Cinzas 300 C Calculado* (%) (bs) Diferença absoluta % Erro c residual %(bs) BC5 70,91 77,59 77,37 0,22 0,28 0,28 C10 50,52 58,67 58,24 0,43 0,73 0,37 *Cz 300 C = 0,938Cz_A+10,851 2.3 Estimativas de Matéria Mineral através de Correlações Empíricas A Tabela VI apresenta o teor de MM estimado a partir da fórmula de Parr e do teor de cinzas à temperatura de 300 C. Também são mostrados nesta Tabela os teores de cinzas obtido a 370 C, 400 C e 775 C, para fins de comparação, bem como os percentuais de erros entre esses valores. Tabela VI- Teores de Cinzas a 300ºC, 370 C, 400 C e 775ºC e o teor de MM obtido pela correlação de Parr, e erros % entre esses valores. Cinzas MM Cinzas Cinzas Cinzas Amostra 775 C Parr 300 C 370 C 400 C Erro Erro Erro (%) (%) (%) (%) (%) (%) (%) (%) CRE 35,66 41,83 42,98-2,75 37,70 9,88 36,89 11,82 CAR 40,88 45,00 50,09-11,32 44,48 1,15 43,91 2,41 BBF 46,02 52,93 53,99-2,00 46,90 11,39 45,69 13,69 BO2 49,89 57,65 59,25-0,16 53,52 7,16 52,36 9,18 BO1 51,06 58,23 57,12 1,91 52,38 10,05 51,45 11,65 BO3 55,51 62,30 62,07 0,36 58,52 6,06 57,86 7,12 17

BC5 70,91 77,59 77,33-0,34 nd nd nd nd C10 50,52 58,67 57,56-1,93 nd nd nd nd nd = não determinado; Erro % calculado considerando o valor da equação de Parr como referência. Os resultados mostram que a medida do teor de cinzas determinado a 300 C, reflete com maior precisão o conteúdo de matéria mineral, quando comparado à fórmula de Parr (Equação 1). Os erros observados, sem considerar a amostra CAR (-11,52%), variaram entre +1,91 a -2,75%, podem ser considerados baixos levando em consideração os erros envolvidos nas análises. O erro significativos obtido para a amostra CAR está relacionado ao elevado teor residual de carbono orgânico (4,70%) que, se descontado, do teor de cinzas a 300 C (50,09% - 4,70%) resultaria em um erro de somente +0,87% quando comparado ao valor de referência (45,00%). Deste forma é possível propor a estimativa do teor de MM em carvões brasileiros através de tratamento térmico a média temperatura (300 C, mínimo 382 h) com posterior determinação do carbono residual da amostra tratada. 4. CONCLUSÃO Verificou-se que os tratamentos térmicos a média temperatura (300, 370 e 400 C) foram eficientes na eliminação da matéria orgânica. Entretanto transformações mais intensas nos minerais ocorreram nas temperaturas de 370 C e 400 C (como a decomposição da pirita e da calcita, conforme análise de DRX). O teor de cinzas determinado a temperatura de 300 C (tempo mínimo de 382 h) é proposto como método para estimativa da matéria mineral de carvões brasileiros. Esses valores de cinzas à 300ºC se aproximam, para a maioria das amostras, do teor de matéria mineral obtido através da fórmula de Parr com erros percentuais baixos (- 3% a +2%). Na utilização deste método, sugere-se adicionalmente a determinação do carbono residual nas amostras tratadas. Caso obtenha-se um valor > 1% deve-se determinar a contribuição do carbono inorgânico, presente no resíduo sob a forma de carbonatos, e descontar o conteúdo de carbono orgânico (obtido por diferença) no valor de matéria mineral estimado (cinzas a 300 C). 18

5. AGRADECIMENTOS A Rede Carvão CNPq, pelo financiamento do projeto. Ao Centro de Excelência em Armazenamento de Carbono (CEPAC - PUCRS) e a Associação Beneficente da Indústria Carbonífera de Santa Catarina (SATC) pela colaboração na coleta de amostras. 6. REFERÊNCIAS American Society for Testing And Materials. ASTM D6316-09b. Determination of total. Combustible and carbonate carbon in solid residues from coal and coke, www.astm.org, acesso 09/11/2010. ASTM D 3172 89. Standard Practice for Proximate Analysis of Coal and Coke. In: Annual Book of ASTM Standards, West Conshohocken, PA, 1996. v.05.05, p. 288. ASTM D 4326 94. Test Method for Major and Minor Elements in Coal and Coke Ash by X-Ray Fluorescence. In: Annual Book of ASTM Standards, West Conshohocken, PA, 1996. v.05.05, p. 369. ASTM. D 5373 93. Standard Test Methods for Instrumental Determination of Carbon, Hydrogen, and Nitrogen in Laboratory Samples of Coal and Coke. In: Annual Book of ASTM Standards, West Conshohocken, PA, 1996. v.05.05, p. 453-456. Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Preparação de Amostra de Carvão Mineral para Análise e Ensaios, NBR 8292. Rio de Janeiro, 1983. Carvão Mineral Determinação de Umidade, NBR 8293. Rio de Janeiro, 1983. Carvão Mineral Determinação do Teor de Cinzas, NBR 8289. Rio de Janeiro, 1983. Carvão Mineral Determinação do Teor de Matéria Voláteis, NBR 8290. Rio de Janeiro, 1983. Depoi, Fernanda S.; Pozebon, D; Kalkreuth, W.D. Chemical Characterization of feed coals and combustion0by-products from Brazilian power plants. International Journal of Coal Geology, v.76, p.227-236. 2008. Göthe, C.A.V. Diagnóstico Ambiental da Região Carbonífera Catarinense. In: Enc. Nac. Est. Meio Ambient, 2, 1989. Florianópolis Anais. Florianópolis: Depto Geociências. UFSC,.v 3, p.62-103, 1989 Kalkreuth, W; Holz, M.; Kern, M.; Machado, G.; Mexias, A.; Silva, M.B.; Willett, J.; Finkelman, R.; Burger, H. Petrology and Chemistry of Permian Coals from the Paraná 19

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