Art. 290 Crimes assimilados ao de moeda falsa Art. 290 - Formar cédula, nota ou bilhete representativo de moeda com fragmentos de cédulas, notas ou bilhetes verdadeiros; suprimir, em nota, cédula ou bilhete recolhidos, para o fim de restituí-los à circulação, sinal indicativo de sua inutilização; restituir à circulação cédula, nota ou bilhete em tais condições, ou já recolhidos para o fim de inutilização: Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa. Parágrafo único - O máximo da reclusão é elevado a doze anos e multa, se o crime é cometido por funcionário que trabalha na repartição onde o dinheiro se achava recolhido, ou nela tem fácil ingresso, em razão do cargo.(vide Lei nº 7.209, de 11.7.1984) Informações rápidas: Objeto material: cédula, nota ou bilhete representativo da moeda. Elemento subjetivo: dolo (elemento subjetivo específico no núcleo suprimir para o fim de restituí-los à circulação ). Não admite modalidade culposa. Crime não transeunte (deixam vestígios de ordem material). Tentativa: admite (crime plurissubsistente). Ação penal: pública incondicionada. Competência: Justiça Federal. Objetividade jurídica O bem jurídico penalmente tutelado é a fé pública, no tocante à confiabilidade do sistema de emissão e circulação de moeda. Objeto material É a cédula, nota ou bilhete representativo da moeda. São termos análogos, relacionados ao papel-moeda e compreendidos como aqueles emitidos por órgão autorizado do governo e dotados de curso forçado, ou seja, não podem ser recusados. Núcleos do tipo O art. 290 do Código Penal, com a rubrica crimes assimilados aos de moeda falsa, incrimina três condutas distintas. Vejamos cada uma delas. a) Formar cédula, nota ou bilhete representativo de moeda com fragmentos de cédulas, notas ou bilhetes verdadeiros O núcleo é formar, no sentido de compor ou montar cédula, nota ou bilhete representativo da moeda, com base em partes de papel-moeda verdadeiro. Cria-se um novo e falso papel-moeda, partindo-se de fragmentos imprestáveis de outros. b) Suprimir, em nota, cédula ou bilhete recolhidos, para o fim de restituí-los à circulação, sinal indicativo de sua inutilização O núcleo é suprimir, ou seja, retirar ou eliminar de cédula, nota ou bilhete recolhido o sinal indicativo de sua inutilização. O sujeito elimina do papel-moeda a informação de que foi retirada de circulação. c) Restituir à circulação cédula, nota ou bilhete em tais condições, ou já recolhidos para o fim de inutilização 1
Restituir à circulação é devolver, retornar ao manejo público a cédula, nota ou bilhete objeto das condutas anteriores ( formar e suprimir ), ou já recolhidos. De acordo com o art. 14 da Lei 4.511/1964, o recolhimento do papel-moeda é efetivado sempre que este apresentar marcas, símbolos, desenhos ou outros caracteres a ele estranhos, perdendo seu poder de circulação. Nessa hipótese, o comportamento criminoso limita-se à colocação do papel-moeda em circulação. Não há emprego de fraude, ao contrário das condutas anteriores. O delito somente pode ser praticado pelo sujeito que não participou da falsificação do papel-moeda ou da retirada de sinal indicativo da sua inutilização. De fato, aquele que praticar qualquer das condutas anteriores, e posteriormente restituir à circulação a cédula, bilhete ou papel-moeda, será responsabilizado unicamente pelo comportamento inicial, pois a conduta posterior será absorvida, em homenagem ao princípio da consunção (post factum impunível). Tipo misto alternativo e tipo misto cumulativo O art. 290 do Código Penal constitui-se em tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado. Estará caracterizado um único delito quando o agente realizar mais de uma conduta no tocante ao mesmo objeto material (cédula, nota ou bilhete). Exemplo: A forma uma cédula com fragmentos de cédulas verdadeiras e, em seguida, a coloca em circulação. Contudo, será forçoso o reconhecimento do concurso de crimes (tipo misto cumulativo) quando o agente praticar duas ou mais condutas em relação a objetos diversos. Exemplo: A forma uma cédula com fragmentos de cédulas verdadeiras, e também suprime sinal indicativo de inutilização de cédula já recolhida, para o fim de restituí-la à circulação. Sujeito ativo Os crimes são comuns ou gerais, podendo ser cometidos por qualquer pessoa. Aquele que recebe o papel-moeda fraudado, nas condições apontadas pelo art. 290 do Código Penal, deve ser responsabilizado por receptação (CP, art. 180) ou favorecimento real (CP, art. 349), dependendo do caso concreto, pois o legislador não previu figura equiparada, como fez em relação ao crime de moeda falsa no art. 289, 1.º, do Código Penal. Sujeito passivo É o Estado e, mediatamente, a pessoa física ou jurídica prejudicada pela conduta criminosa. Elemento subjetivo É o dolo. No núcleo suprimir também se reclama uma especial finalidade (elemento subjetivo específico), representado pela expressão para o fim de restituí-los à circulação. Não são admitidas as modalidades culposas. Consumação O art. 290 do Código Penal contempla crimes formais, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consumam-se com a formação de cédula, nota ou bilhete representativo de moeda com fragmentos de cédulas, notas ou bilhetes verdadeiros (1.ª conduta); com a supressão, em nota, cédula ou bilhete recolhidos, para o fim de restituí-los à circulação, de sinal indicativo de sua inutilização (2.ª conduta); ou com a restituição à circulação de cédula, nota ou bilhete em tais condições, ou já recolhidos para o fim de inutilização (3.ª conduta), independentemente de prejuízo econômico a alguém. São também crimes de perigo concreto, pois é preciso demonstrar a idoneidade das condutas para colocar em risco a fé pública. A falsificação grosseira, incapaz de enganar a normalidade das pessoas, afasta o delito, abrindo espaço para a figura do crime impossível (CP, art. 17). A prova da materialidade do fato 2
Os crimes assimilados aos de moeda falsa pertencem ao rol dos delitos não transeuntes, pois deixam vestígios de ordem material. Destarte, a prova da materialidade do fato exige a elaboração de exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado (CPP, art. 158). Tentativa É cabível, em face do caráter plurissubsistente dos delitos, permitindo o fracionamento do iter criminis. Ação penal - A ação penal é pública incondicionada. Classificação doutrinária Os crimes assimilados aos de moeda falsa são simples (ofendem um único bem jurídico); comuns (podem ser praticados por qualquer pessoa); formais, de consumação antecipada ou de resultado cortado (consumam-se com a prática da conduta legalmente descrita, independentemente da superveniência do resultado naturalístico); de perigo concreto (basta a potencialidade de dano à fé pública, reclamando prova da idoneidade da falsificação); de forma livre (admitem qualquer meio de execução); em regra comissivos; não transeuntes (deixam vestígios materiais); instantâneos (consumam-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo); unissubjetivos, unilaterais ou de concurso eventual (podem ser cometidos por uma única pessoa, mas admitem o concurso); e normalmente plurissubsistentes (a conduta pode ser fracionada em diversos atos). Competência Os crimes tipificados no art. 290 do Código Penal ofendem interesses da União. Encaixam-se, portanto, na competência da Justiça Federal, nos moldes do art. 109, inc. IV, da Constituição Federal. Figura qualificada: art. 290, paragrafo unico Como preceitua o art. 290, parágrafo único, do Código Penal: O máximo de reclusão é elevado para 12 (doze) anos e o da multa a Cr$ 40.000,00 (quarenta mil cruzeiros), se o crime é cometido por funcionário que trabalha na repartição onde o dinheiro se achava recolhido, ou nela tem fácil ingresso, em razão do cargo. Cuida-se de crime próprio ou especial, pois somente pode ser praticado pelo funcionário que trabalha na repartição onde o dinheiro se acha recolhido, ou nela tem fácil ingresso, em razão do cargo. Aliás, o fundamento da majoração da pena reside justamente na violação dos deveres inerentes ao cargo do sujeito ativo, que dele se aproveita para a execução do delito. A limitação da multa não tem mais eficácia diante da Reforma da Parte Geral do Código Penal, que instituiu o sistema de dias-multa. Persiste a sua cumulação com a pena privativa de liberdade, mas a multa passa a ser fixada em sintonia com as regras traçadas no art. 49 do Código Penal. É o que se extrai do art. 2.º da Lei 7.209/1984: São canceladas, na Parte Especial do Código Penal e nas leis especiais alcançadas pelo art. 12 do Código Penal, quaisquer referências a valores de multas, substituindo-se a expressão multa de por multa. Art. 291 Petrechos para falsificação de moeda Art. 291 - Fabricar, adquirir, fornecer, a título oneroso ou gratuito, possuir ou guardar maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer objeto especialmente destinado à falsificação de moeda: Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa. Informações rápidas: Objeto material: maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer outro objeto especialmente destinado à falsificação de moeda. Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa. 3
Crime não transeunte (deixam vestígios de ordem material). Tentativa: não admite (crime obstáculo). Ação penal: pública incondicionada. Competência: Justiça Federal. Objetividade jurídica O bem jurídico penalmente tutelado é a fé pública, no tocante à confiabilidade do sistema de emissão da moeda. A preocupação do legislador com a moeda falsa é nítida, circunstância que o levou a incriminar atos que representariam mera fase de preparação do crime tipificado no art. 289, caput, do Código Penal. Cuidase, portanto, de autêntico crime obstáculo. Objeto material É o maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer outro objeto especialmente destinado à falsificação de moeda. O Código Penal utilizou mais uma vez a interpretação analógica (ou intra legem), pois apresenta uma fórmula casuística ( maquinismo, aparelho e instrumento ) seguida de uma fórmula genérica ( ou qualquer outro objeto especialmente destinado à falsificação de moeda ), com o propósito de alcançar as mais diversas situações surgidas na vida prática. O termo especialmente diz respeito à finalidade precípua do maquinismo, aparelho, instrumento ou objeto, consistente na falsificação de moeda. Em outras palavras, o bem pode até ser utilizado com outros fins, embora seja prioritariamente empregado na contrafação de moedas. Embora os petrechos normalmente sejam falsos, a circunstância de serem verdadeiros, é dizer, efetivamente destinados à cunhagem e impressão de moedas, não exclui o delito, pois o bem jurídico protegido é a fé pública e a emissão de moeda é constitucionalmente reservada à União. Nesse contexto, há crime quando alguém é surpreendido na posse de máquinas subtraídas da Casa da Moeda, instituição dotada de exclusividade para fabricação de moeda (Lei 5.895/1973, art. 2.º, caput). Núcleos do tipo O tipo penal contém cinco núcleos: fabricar (criar, montar, construir ou produzir), adquirir (comprar ou obter), fornecer, a título oneroso ou gratuito (proporcionar, dar, vender ou entregar), possuir (exercer a posse) e guardar (conservar, manter ou proteger) maquinismo, aparelho, instrumento ou qualquer outro objeto especialmente destinado à falsificação de moeda. Trata-se de tipo misto alternativo, crime de ação múltipla ou de conteúdo variado. A lei descreve vários núcleos, e a realização de mais de um deles, em relação ao mesmo objeto material e no mesmo contexto fático, caracteriza um único delito. Sujeito ativo - O crime é comum ou geral, podendo ser cometido por qualquer pessoa. Sujeito passivo - É o Estado. Elemento subjetivo É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa. Consumação Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com a fabricação, aquisição, fornecimento, posse ou guarda dos objetos destinados à falsificação de moeda, independentemente da sua efetiva utilização pelo agente. 4
Nos núcleos possuir e guardar o crime é permanente, ensejando a prisão em flagrante a qualquer tempo, enquanto subsistir a conduta contrária ao Direito. Nos demais núcleos o crime é instantâneo..a prova da materialidade do fato O crime de petrechos para falsificação de moeda deixa vestígios de ordem material, ingressando na seara dos delitos não transeuntes. Assim sendo, a prova da materialidade do fato exige a elaboração de exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado (CPP, art. 158). Tentativa Não é cabível, pois a lei incriminou de forma autônoma atos representativos da preparação do delito tipificado no art. 289 do Código Penal (moeda falsa). E, como se sabe, os crimes de obstáculo são incompatíveis com o conatus. Ação penal - A ação penal é pública incondicionada. Classificação doutrinária O crime de petrechos para falsificação de moeda é simples (ofende um único bem jurídico); comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado (consumase com a prática da conduta legalmente descrita, independentemente da superveniência do resultado naturalístico); de forma livre (admite qualquer meio de execução); em regra comissivo; não transeunte (deixa vestígios materiais); instantâneo (nos núcleos fabricar, adquirir e fornecer ) ou permanente (nas modalidades possuir e guardar ); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma única pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em diversos atos). Competência O crime de petrecho para falsificação de moeda ofende interesses da União, ligados à emissão de moeda, exercida exclusivamente pelo Banco Central (CF, art. 164). Destarte, ingressa na competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, inc. IV, da Constituição Federal. Petrechos para falsificação de moeda e moeda falsa: unidade ou pluralidade de crimes Qual o tratamento penal reservado ao sujeito que possui aparelhos especialmente destinados à fabricação de moeda e efetivamente os utiliza, criando moedas falsas? Há duas posições sobre o assunto: a)o agente deve ser responsabilizado pelos crimes de petrechos de falsificação de moeda e de moeda falsa, em concurso material. Tais crimes consumam-se em momentos distintos, não havendo falar em absorção do crime previsto no art. 291 do Código Penal pelo crime definido em seu art. 289. É a posição que adotamos.18 b)incide o princípio da consunção, resultando na absorção do crime-meio (petrechos para falsificação de moeda), que funciona como antefactum impunível, pelo crime-fim (moeda falsa). É o entendimento de Nélson Hungria: Se à fabricação, aquisição ou detenção dos objetos em questão se segue o seu efetivo emprego na falsificação de moeda, e se há identidade de agente ou agentes, o crime será um só (crime progressivo), isto é, o de falsificação de moeda (absorvido por este o primeiro crime), pois, de outro modo, haveria bis in idem: punição do agente do crime na fase preparatória e nova punição dele na fase executiva. No caso de tentativa de falsificação, se há desistência voluntária do agente, ainda pressuposta a unidade deste, o crime do art. 291 persistirá residualmente (crime subsidiário). 5
Art. 292 Emissão de título ao portador sem permissão legal Art. 292 - Emitir, sem permissão legal, nota, bilhete, ficha, vale ou título que contenha promessa de pagamento em dinheiro ao portador ou a que falte indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa. Parágrafo único - Quem recebe ou utiliza como dinheiro qualquer dos documentos referidos neste artigo incorre na pena de detenção, de quinze dias a três meses, ou multa. Informações rápidas: Objeto material: nota, bilhete, ficha, vale ou título que contenha promessa de pagamento em dinheiro ao portador ou a que falte indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago. Lei penal em branco homogênea (legislação específica). Elemento subjetivo: dolo. Não admite modalidade culposa. Tentativa: admite (crime plurissubsistente). Ação penal: pública incondicionada. Competência: Justiça Federal. Objetividade jurídica O bem jurídico penalmente tutelado é a fé pública, relativamente à confiança da população na moeda e em seu respectivo valor. Como esclarece José Henrique Pierangeli: Nos primórdios da independência, as instituições bancárias passaram a emitir letras ao portador, fazendo-o com autorização governamental central ou com a permissão dos poderes municipais, fazendo-o, inclusive, até mesmo sem autorização, uma prática abusiva que passou a representar perigo para o Tesouro e para a jovem nação. Esses títulos ao portador, portanto, significavam uma moeda paralela que se mantinha indefinidamente na circulação, fazendo concorrência com o papel-moeda emitido pelo Tesouro. A partir de 1860 vários diplomas legislativos foram editados, todos no intuito de restringir a emissão de notas, bilhetes, vales, papéis ou títulos ao portador com o nome do destinatário em branco. ( ) a conduta incriminada perturba efetivamente, ou pode perturbar a normalidade da vida econômica do país, concorrendo esses papéis com o dinheiro que o Estado põe em circulação, colocando em cheque a fé pública, no caso a garantia que o Estado apõe na moeda que faz circular. Objeto material É a nota, bilhete, ficha, vale ou título que contenha promessa de pagamento em dinheiro ao portador ou a que falte indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago. Na verdade, tais objetos se amoldam ao conceito de título de crédito, indicado pelo art. 887 do Código Civil: O título de crédito, documento necessário ao exercício do direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei. O tipo penal fala inicialmente em título ao portador, compreendido como aquele que circula pela mera tradição, pois não há identificação expressa do seu credor. Consequentemente, qualquer pessoa que esteja em sua posse é considerada titular do crédito e a transferência do documento acarreta igualmente a transferência do crédito nele consignado. O título ao portador se opõe ao título nominal, o qual identifica explicitamente seu credor. E como alerta Magalhães Noronha: Nem todos os títulos ao portador oferecem tipicidade ao fato. A lei diz bem claramente que ele deve conter promessa de pagamento em dinheiro, porque há outros que, entretanto, representam mercadorias, serviços, utilidades etc. (warrants, conhecimentos a ordem, passagens de veículos e outros). Lembra Nélson 6
Hungria, citando Pontes de Miranda, que também não se incluem os chamados vales íntimos, ou papel que se dá, como lembrete, a quem, num estabelecimento (agrícola, comercial ou industrial) ou escritório ou consultório, entrega quantia ou coisa, já que não podem prejudicar o dinheiro, por não possuírem função de papel de crédito. Igualmente os chamados vales de caixa, explicados para comprovarem suprimento urgente, retirada de dinheiro, adiantamento ou mesmo um empréstimo rápido ou momentâneo. Tais papéis não se destinam à circulação, fazendo concorrência à moeda; sua posse não se transfere pela tradição, como nas coisas móveis em geral. Mas não para por aí. O tipo penal equipara ao título ao portador aqueles a que falte a indicação do nome da pessoa a quem deve ser pago, pois podem circular livremente para serem preenchidos, oportunamente, por quem ao final pretendesse receber o crédito. Portanto, assim como ocorre nos títulos ao portador, qualquer pessoa de posse do título pode ser considerada titular dos valores nele descritos. Núcleo do tipo O núcleo do tipo é emitir, ou seja, colocar em circulação a nota, bilhete, ficha, vale ou título que contenha promessa de pagamento em dinheiro ao portador ou a que falte indicação do nome da pessoa a quem deva ser pago. O objeto deve ser destinado a circular como dinheiro. E como destaca Heleno Cláudio Fragoso: A forma do título ou a inscrição nele contida é perfeitamente irrelevante, desde que contenha inequívoca promessa de pagamento em dinheiro. Trata-se de lei penal em branco homogênea, pois o tipo penal reclama a emissão de promessa de pagamento em dinheiro sem permissão legal. Destarte, é preciso analisar a legislação específica para saber quais títulos podem circular ao portador ou sem indicação da pessoa a quem deva ser pago, a exemplo do cheque. Sujeito ativo O crime é comum ou geral, podendo ser praticado por qualquer pessoa. Nada impede o concurso de pessoas com o responsável pela criação do título, desde que ciente de que seria colocado em circulação. Vale destacar, contudo, que normalmente as condições de criador e emissor do título recaem no mesmo indivíduo. Sujeito passivo É o Estado e, mediatamente, a pessoa física ou jurídica prejudicada pela conduta criminosa, em razão do não pagamento, pelo emitente, do crédito indicado no título. Elemento subjetivo É o dolo, independentemente de qualquer finalidade específica. Não se admite a modalidade culposa. Consumação Cuida-se de crime formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado: consuma-se com a emissão do título ao portador, isto é, com sua colocação em circulação, independentemente da causação de prejuízo efetivo a alguém. Anote-se que não basta a criação (ou subscrição do título). É imprescindível sua emissão, utilizando-o como substitutivo da moeda corrente ou de outros títulos legalmente permitidos. Em que pese a semelhança desse delito com o crime de moeda falsa (CP, art. 289), a simples criação do título é ato preparatório, irrelevante para o Direito Penal. Tentativa É cabível, em face do caráter plurissubsistente do delito, comportando o fracionamento do iter criminis. Exemplo: O emitente do título ao portador sem permissão legal é preso em flagrante no momento em que iria entregá-lo a terceiro. 7
Ação penal - A ação penal é pública incondicionada. Lei 9.099/1995 A emissão de título ao portador sem permissão legal constitui-se em infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal. A pena máxima cominada detenção de seis meses torna o delito compatível com a transação penal e com o rito sumaríssimo, nos moldes da Lei 9.099/1995. Classificação doutrinária A emissão de título ao portador sem permissão legal é crime simples (ofende um único bem jurídico); comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); formal, de consumação antecipada ou de resultado cortado (consuma-se com a prática da conduta legalmente descrita, independentemente da superveniência do resultado naturalístico); de forma livre (admite qualquer meio de execução); em regra comissivo; instantâneo (consuma-se em um momento determinado, sem continuidade no tempo); unissubjetivo, unilateral ou de concurso eventual (pode ser cometido por uma única pessoa, mas admite o concurso); e normalmente plurissubsistente (a conduta pode ser fracionada em diversos atos), embora exista divergência doutrinária acerca do assunto. Competência O crime tipificado no art. 292 do Código Penal, capitulado entre os crimes de moeda falsa, é de competência da Justiça Federal. Com efeito, o delito coloca em risco a confiança da população na moeda, ao pretender substituí-la ilicitamente, ofendendo interesses da União, na forma delineada no art. 109, inc. IV, da Constituição Federal. Figura privilegiada: art. 292, parágrafo único Em consonância com o art. 292, parágrafo único, do Código Penal: Quem recebe ou utiliza como dinheiro qualquer dos documentos referidos neste artigo incorre na pena de detenção, de quinze dias a três meses, ou multa. Trata-se igualmente de infração penal de menor potencial ofensivo, de competência do Juizado Especial Criminal. Pune-se agora não o emissor do título, mas o seu tomador, isto é, aquele que o recebe ou o utiliza como dinheiro, contribuindo para sua indevida circulação e reiterando a ofensa à fé pública. 8