NOVOS DEBATES, VELHAS QUESTÕES: ALGUMAS MUDANÇAS NA FORMAÇÃO DOCENTE



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Transcrição:

NOVOS DEBATES, VELHAS QUESTÕES: ALGUMAS MUDANÇAS NA FORMAÇÃO DOCENTE Aline Schmidt (alinemate@gmail.com), Dariane Carlesso (darianecarlesso@gmail.com) e Elisete Medianeira Tomazetti (elisetem2@gmail.com), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM/RS). Resumo: Este trabalho resulta da investigação sobre a nova organização dos cursos de licenciatura de treze Instituições de Ensino Superior (IES) do estado do Rio Grande do Sul frente à implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores (DCNs). De forma geral, destacamos que todas as instituições passaram por reformulações após a promulgação das DCNs e que a maioria compreende necessitar de reestruturações e adequações. A relação entre teoria e prática ainda apresenta-se nas falas dos entrevistados de maneira dicotômica. Destaca-se a necessidade que as IES estão sentindo de promover participação e discussão entre todos os envolvidos no processo de formação docente. Palavras-chaves: Formação de Professores; DCNs; teoria e prática. Seminário do 16 COLE vinculado: 09 O presente trabalho tem como temática prioritária a formação docente. Suas questões de pesquisa foram: de que formas estão estruturados e articulados os cursos de licenciatura existentes no estado do Rio Grande do Sul? Como estas instituições implementaram as Diretrizes Curriculares Nacionais para Formação de Professores da Educação Básica Nível Superior, curso de licenciatura, de graduação plena? Quais as concepções de Prática como Componente Curricular que perpassa a fala de seus Pró-Reitores de Graduação? Como as IES vêm implementando o Estágio Curricular Supervisionado de seus cursos? Como se relacionam com as Escolas de Educação Básica? Que perfis profissionais docentes buscam formar? A pesquisa Cursos de Licenciatura das Instituições de Ensino Superior do Rio Grande do Sul: um estudo sobre os modelos de formação docente 1, realizada entre o período de agosto de 2004 e julho de 2006, buscou dar conta de compreender e responder os questionamentos que introduzem este texto. O início de nossas discussões ocorreu por meio de leituras e investigações sobre a situação institucional da formação de professores em nosso Estado. Seqüencialmente, organizamos e realizamos entrevistas semi-estruturadas com os Pró-Reitores de Graduação de treze (13) Instituições de Ensino Superior (IES) do Rio Grande do Sul (RS), sendo quatro delas públicas 2 e nove privadas. Além das entrevistas pudemos obter outras informações nos sites destas IES e em documentos fornecidos pelos Pró-Reitores das mesmas. 1 Pesquisa viabilizada pelo financiamento da FAPERGS/PROEDU e do CNPq/PIBIC 2 O estudo das instituições públicas foi aprofundado na dissertação de mestrado de Gilsânia Biasus, participante da pesquisa.

Com base em referenciais teóricos da área (CONTRERAS, 2002; PEREIRA, 2000; SHÖN, 2000; GARCIA, 1999; ZEICHNER, 1998; entre outros) e amparadas pela legislação, iniciamos o processo de análise dos dados. A situação dos cursos de licenciatura de cada uma das treze instituições foi analisada a partir da entrevista de seu Pró-Reitor de Graduação, por meio da técnica de análise de conteúdo (BARDIN, 1977 e MORAES, 2003). Posteriormente, seguimos em um trabalho de transversalização dos dados, afim de que fosse possível perceber os elementos comuns e díspares que ali se apresentavam, destacando não mais a singularidade de cada caso e sim a possibilidade de construção coletiva que esses permitiam. Desta forma, o objetivo foi de tentar identificar, analisar e compreender aspectos comuns e específicos das ações e concepções das IES participantes em relação à formação de professores e às Resoluções CNE/CP 01 e 02/2002. A articulação entre os cursos de licenciatura das IES pesquisadas é um primeiro item que nos leva à análise, pois é um importante requisito quando se trata da construção e implementação de mudanças. Constata-se claramente nas falas dos Pró-Reitores a dificuldade de fomentar esta interação entre os diferentes cursos de licenciatura de suas instituições. Contudo, a maioria das IES articula-se internamente sob a forma de fóruns, reuniões, congressos e até mesmo criando órgãos permanentes, os quais se tornam responsáveis pela promoção de interação entre os cursos de licenciatura. A partir da organização, em cada instituição, de um grupo coeso em torno da qualidade dos cursos de formação de professores e com apoio dos diretores dos Institutos, Centros, Faculdades de Educação e dos Pró- Reitores de Graduação, surgem as primeiras iniciativas voltadas para as mudanças conceituais e estruturais. Quanto à recepção do documento das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores, as análises realizadas demonstraram que algumas IES sentiram-se desconfortáveis diante da sinalização de mudanças, apresentando inclusive, certa resistência. Uma instituição, em particular, já vinha participando das primeiras discussões em nível nacional sobre as possíveis alterações em seus fóruns e reuniões. Em outras IES, após a primeira leitura das DCNs, estas discussões ocorriam internamente, com a participação não apenas dos coordenadores de cursos, mas também dos professores da instituição formadora e dos representantes das coordenadorias estaduais e secretarias municipais da educação. Outras instituições iniciaram os debates com reuniões de caráter informativo, com o intuito de inicialmente esclarecer o que estaria mudando. Em suas falas, os Pró-Reitores de Graduação das IES demonstraram, em sua maioria, já estarem se organizando, cartorialmente, para a implementação das mudanças. Logo, percebemos que as discussões estavam encaminhadas e que as alterações ainda se restringiam às estruturas curriculares dos cursos. Contudo, em algumas instituições, percebemos certa ambigüidade na compreensão da legislação quando pensada sob a forma de organização curricular. Em alguns casos, as mudanças restringiam-se a uma preocupação excessiva com a adequação de carga horária, dado o considerável aumento de horas práticas e a limitada compreensão de prática demonstrada em algumas falas.

[...] do ponto de vista cartorial, os cursos estão totalmente consolidados. Do ponto de vista da gestão ainda nós temos dificuldade. (IES 5). [...] nessa divisão de carga horária, acabou que a parte específica, na maioria dos cursos, se sentiu reduzida. Então teve que cortar na carga horária, (...) mas ainda tem uma resistência aí, porque os coordenadores foram desafiados a transformar os currículos anteriores neste novo formato com algum enxugamento de carga horária (específica) [...] (IES 13). Constatou-se, de forma geral, que as referidas Instituições, em se tratando das mudanças nos currículos das licenciaturas, enfrentaram dificuldades e resistências advindas dos próprios cursos que pouco flexibilizaram seus programas curriculares a fim de comportar as horas práticas previstas pela legislação. Isso se deveu, em nossa compreensão, a um entendimento equivocado do que seria esta prática. Como percebemos na transcrição acima, essa foi concebida, em muitos casos, apenas do ponto de vista do aumento da carga horária, que suscitava um enxugamento de disciplinas de caráter conceitual (disciplinas específicas do curso). A concepção de prática como Componente Curricular ou como Estágio Curricular Supervisionado, parece estar carecendo de maiores estudos e reflexões. A própria legislação não aborda somente ações que aconteçam diretamente na escola, mas vai além desta concepção restrita, exemplificando situações que podem ser reveladoras de situações da prática docente. A presença da prática profissional na formação do professor, que não prescinde da observação e ação direta, poderá ser enriquecida com tecnologias da informação, incluídos o computador e o vídeo, narrativas orais e escritas de professores, produções de alunos, situações simuladoras e estudos de casos. (Resolução CNE/CP 1/2002, Art.13, 2 ). Destacam-se, em algumas entrevistas, a carência de esclarecimento acerca da distinção entre a Prática como Componente Curricular e a prática de ensino que ocorre no Estágio Curricular Supervisionado. Em grande parte das entrevistas constata-se que a concepção de prática refere-se ao ir à escola, estar em situação de ensino, dar aula, confundindo-a, assim, com o Estágio. Neste sentido, perdemse pontos importantes desta etapa da formação do professor, previstos na realização da prática como componente curricular: a observação, a reflexão, a contextualização e, conseqüentemente, a resolução de problemas que envolvam o ensino e a aprendizagem, sem distanciar-se dos aportes teóricos da formação. Em algumas IES até mesmo foi citada a existência de laboratórios que, entretanto, apresentavam um objetivo muito mais claro de aprendizagem prática de um conteúdo específico do que uma relação entre ensino e aprendizagem que remeteria ao contexto escolar. [...] na Educação Física, os alunos não vão só pro laboratório de anatomia, eles vão pra um outro laboratório de fisioterapia que tem aparelhos; lá eles fazem exercício. Eles vão para o ginásio, eles vão para a aula de dança, eles vão pro ginásio, eles vão pra natação, então tudo isso conta como prática, só que antes de ele ir pra prática ele tem a fundamentação [...] (IES 12). A relação entre teoria e prática é um dos pontos de maior destaque a ser observado na reestruturação dos Cursos de Licenciatura. Sem dúvida, um dos maiores problemas, não apenas da formação de professores, mas do próprio

processo de construção do conhecimento, encontra-se na busca de maneiras de articulação entre teoria e prática, que já pressupõe uma ampliação na relação entre universidade e escola. Portanto, faz-se necessário que, na concepção de Prática como Componente Curricular e Estágio Curricular Supervisionado para formação do professor, não se subestime o aspecto científico-acadêmico, conduzindo os cursos a um descompromisso com a investigação sobre o fazer pedagógico e com a produção do conhecimento, que desvincula ensino e pesquisa. A dificuldade em romper com a dicotomia e ultrapassar a compreensão aplicacionista da relação entre teoria e prática é consensual nas instituições analisadas. Com a exigência de aumento da carga horária prática, tanto desta como Componente Curricular, quanto como Estágio Curricular Supervisionado, suscitada pela legislação, as instituições formadoras de professores passaram a ter que estabelecer uma relação de maior proximidade com a Escola de Educação Básica. Assim, a criação de convênios possibilitou a interação entre escola e universidade de modo mais sistemático, por meio de projetos. Entretanto, algumas instituições ainda estão se estruturando e tateando tais possibilidades, enquanto que outras não necessitaram de alterações, dada à proximidade entre o que está sendo proposto pela legislação e o que a instituição já vinha implementando nos cursos de formação de professores. O perfil do profissional docente a ser formado pelas IES, indicado nas entrevistas, apresenta uma série de requisitos, entre eles, aspectos de certa forma até opostos: a instrumentalização técnica, o resgate humano e social e o crescente papel da pesquisa no âmbito da formação de professores, considerada como devendo ser gerenciadora de autonomia e de aprendizagem continuada. Esses aspectos revelam o contexto social, político, histórico e educacional de nosso país, diante das reformulações legais e das exigências da escola. É importante destacar que, segundo a fala de alguns Pró-Reitores, seria papel das IES desenvolver o espírito de busca, de inquietação, de pesquisa, permitindo uma formação não restrita aos cursos de graduação. O licenciado poderia tornar-se assim, um profissional capaz de gerenciar sua formação continuamente, seguindo os preceitos de autonomia e pesquisa primados em sua formação inicial. [...] investe-se nas orientações individuais dos alunos, porque que a gente quer isso, é justamente a questão da autonomia que o aluno busque cada vez mais e se liberte do professor e comece a buscar sozinho. (IES 4). Assim, como ressalta um dos entrevistados, as competências e habilidades desejáveis ao perfil do formando nem sempre podem ser alcançadas pelas instituições, (...) algumas (características) não são tão solidificadas pelo curto espaço de tempo que se tem pra se trabalhar (IES 10). PEREIRA (2000), alerta para a natureza transitória e provisória da formação realizada nestes cursos, pois não há garantias acerca da concretização do perfil de professor desejado. Compreendemos o aluno do curso de licenciatura como um sujeito em formação, que carrega representações de sua própria escolarização, vivencia uma formação superior fundamentada e continuará se formando na prática pedagógica. O entendimento mínimo das concepções que sustentam as mudanças propostas pela legislação é premissa necessária para que possa haver uma análise

crítica dos documentos e de sua implementação. Faz-se necessário, um conhecimento que não se limite a informações. A disposição em pesquisar um significativo número de instituições no Estado do Rio Grande do Sul, nos remete a um panorama diverso de significações e operacionalizações. Assim, diante da diversidade encontrada, pode-se afirmar que ainda há um movimento intenso, na maioria dos casos, em busca de adequações às DCNs. Esta tentativa de reorganização acontece, como vimos, principalmente nas grades curriculares dos cursos, ou seja, existe a preocupação de suprir as horas de prática instituídas pela Lei. De um modo geral, isso não significa que haja um entendimento claro sobre o que são estas horas de prática e de que forma elas devem ser operacionalizadas. Há, no entanto, instituições que conseguem visualizar as 400h de prática como componente curricular no transcorrer dos seus cursos, assim como organizar cartorialmente as 400h de estágio curricular supervisionado e, mesmo assim, encontram dificuldades na gestão. Isto se deve principalmente, pelas concepções dicotomizadas entre teoria e prática, conhecimentos específicos e pedagógicos, enraizadas ao longo da história da Formação de Professores. Esta percepção demonstra que há diversidade nos processos de reestruturação, alguns com mais clareza, outros com dificuldades. Muito embora, na maioria dos casos, existe o entendimento de que estas mudanças são significativas para a melhoria na formação de professores e que, portanto, devem acontecer. E acontecendo, remetem às instituições uma relação mais próxima com a escola básica, reivindicando de ambas um melhor relacionamento. Por conseqüência, os Pró-Reitores entrevistados, em sua maioria, admitem estar desenvolvendo políticas de parcerias com as escolas. Para finalizar, pode-se dizer que todo este processo de mudanças tem seu sucesso necessariamente relacionado com a mobilização e organização interna da instituição. Neste sentido, a Pró-Reitoria de Graduação das Instituições desempenha um papel fundamental, ao promover a integração entre os cursos de licenciatura. Por isso, a importância das iniciativas de algumas IES, instituindo fóruns, reuniões e congressos e ainda mais, regulamentando órgãos permanentes que promovem a discussão sobre a formação docente entre coordenadores, professores e alunos das licenciaturas. Dessa forma, questões até mesmo de interpretação das Resoluções, podem ser sanadas no coletivo para que não aconteçam divergências internas. A possibilidade do debate sobre o que deve mudar e de como pode acontecer a operacionalização do que propõem as Diretrizes, influenciará diretamente na efetivação do objetivo final, que é a melhoria na formação de professores. Assim, após constatarmos que, de certa forma, todas as instituições envolvidas na pesquisa mobilizaram-se para uma reestruturação dos cursos de formação docente, nos preocupa o fato de que estas mudanças podem ter ocorrido somente na forma documental, como vimos na fala de um dos Pró-Reitores. Poderíamos nos perguntar, passados alguns anos da promulgação das Resoluções CNE/CP 01 e 02/2002, se tais mudanças ocorreram mesmo em nível de sala de aula ou, se tivemos mudanças apenas no nível burocrático/curricular? Como os professores dos cursos de licenciatura têm produzido suas aulas e práticas formativas visando à

docência na Escola Básica? Têm mudado suas concepções acerca do seu próprio curso como sendo de licenciatura e não de bacharelado? Há uma cultura vivenciada no interior do curso, capaz de acionar as discussões e reflexões acerca do ensino da disciplina na escola? Quem forma esses formadores na perspectiva do ensino e da docência? O que os acadêmicos das licenciaturas têm buscado em sua formação e como a reivindicam? Estas são questões pertinentes que cabem a outra pesquisa responder. REFERÊNCIAS BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Lisboa: edições 70, 1977. BIASUS, Gilsania. Formação de Professores nas Instituições Federais de Ensino Superior do Estado do RS: um estudo de caso. UFSM, PPGE, 2006. BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n 9394/96. Brasília: MEC, 1996.. CONSELHO NACIONAL DA EDUCAÇÃO. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. PARECER CNE/CP 009/2001. Available from Internet: http://www.mec.gov.br, [2001/05/08].. CONSELHO NACIONAL DA EDUCAÇÃO. Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de Licenciatura, de graduação plena. Resolução CNE/CP 1, de 18 de fevereiro de 2002. [http://www.mec.gov.br].. CONSELHO NACIONAL DA EDUCAÇÃO. Institui a duração e a carga horária dos cursos de licenciatura, de graduação plena, de Formação de Professores da Educação Básica em nível superior. Resolução CNE/CP 2, de 19 de fevereiro de 2002. [http://www.mec.gov.br]. CONTRERAS, José. Contradições e contrariedades: do profissional reflexivo ao intelectual crítico. In: CONTRERAS, José. A Autonomia de Professores. São Paulo: Cortez, 2002. GARCÍA M., Carlos. Formação de Professores: para uma mudança educativa. Porto: Porto Editora. 1999. MORAES, Roque. UMA TEMPESTADE DE LUZ: a compreensão possibilitada pela análise textual qualitativa. Mimeo.. Análises qualitativas: Análise de conteúdo? Análise de discurso? Mimeo. PEREIRA, Júlio Emílio Diniz. Formação de Professores: pesquisas, representações e poder. Belo Horizonte: Autêntica, 2000. SHÖN, Donald. Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e para a aprendizagem. Tradução Roberto Cataldo Costa. Porto Alegre: ArtMed, 2000. ZEICHNER, Kenneth M. Tendências da pesquisa sobre formação de professores nos Estados Unidos. In: Revista Brasileira de Educação, ANPED, set/out/nov/dez, 1998, n. 9. 76-87.