Só restaram as carboxamidas para o manejo de doenças na cultura da soja? O que fazer? Fernando Cezar Juliatti 1, Daniel Bertolini 2 e Nayara Bauti 3 Laboratório de Micologia e Proteção de Plantas LAMIP UFU. Bloco 2 E, sala 106, Uberlândia MG. 1 Doutor em Fitopatologia e Melhoramento de Plantas. Professor Titular da UFU. Pesquisador 1 D pelo CNPq juliatti@ufu.br. 2 Bolsista de Iniciação Científica (IC) LAMIP ICIAG - UFU e 3 Eng. Agrônomo Estagiário do Laboratório de Micologia e Proteção de Plantas ICIAG- UFU. Fungicidas são agentes de origem sintética ou natural que protegem as plantas contra a invasão de patógenos e/ou são utilizados para erradicar infecções já estabelecidas Substâncias com propriedades fungicidas já eram utilizadas pelas antigas civilizações, embora de forma bastante empírica. Os povos daquela época, através de suas experiências, descobriram a efetividade de certos produtos contra o que denominavam de pestes. Entretanto, o progresso no conhecimento dos fungicidas ocorreu após o século XVIII, graças aos avanços da química, durante os dois últimos séculos. Após a evolução da química e com o avanço das tecnologias disponíveis o quadro de sensibilidade nos fungos fitopatogênicos nos grandes cultivos de soja, milho, trigo, algodoeiro e feijoeiro tem mudado dificultando a racionalidade e a sustentabilidade do controle de doenças em cultivos para redução do progresso de doença e para que perdas na produtividade não ocorram. Na cultura da soja esta perda da sensibilidade ocorreu após o uso de moléculas em grande escala desde 2002. Primeiramente os triazóis como o Flutriafol e tebuconazol que perderam ou não foram eficientes em campo desde 2004 para o primeiro e 2006, para o segundo. Ou seja, apresentavam nível de controle menor que 40 %. Atualmente, as estrobilurinas (azoxistrobina, piraclostrobina e picoxistrobina), bem como a sua associação com os triazóis não atingem sequer 40 % de controle da ferrugem da soja, em algumas situações, conforme dados ou analise sumarizada do Consórcio anti-ferrugem na safra 2013-2014). (Figura 1).
Az+Cpz / Fonte: Figura 1. Perda da eficácia de fungicidas utilizados no controle da ferrugem da soja após dez safras de uso de triazóis, estrobilurinas e triazóis + estrobilurinas. Fonte: Consórcio Anti ferrugem. 2014. Com este quadro preocupante uma pergunta surge em primeira linha: o que está acontecendo no campo? Trabalhos com o monitoramento de isolados de Phakopsora pachyrhizi tem apresentado certa estabilidade da estrobilurinas até 2013 com a concentração efetiva para matar 50 % da população de patógeno por volta de 0,05-0,5 ppm. Mas, nesta safra esta sensibilidade foi reduzida para 50-500 ppm. Principalmente para azoxistrobina e piraclostrobina. Enquanto picoxistrobina (4,5-45 ppm). E para trifloxistrobina (0,5-3,5 ppm). Para uma carboxamida como benzovyndiflupir esta concentração efetiva ficou entre 0,05-0,1 ppm. Embora não se usou amostras de benzovindiflupir isoladas e sim de benzovindiflupir + azoxistrobina (Elatus). De forma geral os CI 50 (concentração inibitória para inibir 50 % da germinação), para os fungicidas protetores como o Oxicloreto de cobre e mancozeb ficou entre 50-100 ppm. Uma pergunta deve ser formalizada? O que está acontecendo no campo? Desta indagação deveremos tirar alguns aprendizados para o manejo correto de patossistemas, como os que ocorrem em soja, para o manejo das doenças como ferrugem (Phakopsora pachyrhizi), alvo (Corynespora cassiicola), oídio (Erysiphe diffusa), antracnose (Colletotrichum dematium var. truncata) e DFCs (doenças de final de ciclo Septoria glycines e Cercospora kikuchii). Analisando ou fazendo um retrospecto temos: redução no residual de fungicidas no campo e perda da sua eficácia, principalmente triazóis e estrobilurinas. Postura americana conservadora e no ponto de vista do autor correta aprovando o USDA, desde 2004, o uso de estrobilurinas e triazóis associados a protetores como o Clorotalonil dificultando o
aparecimento de mutações ou perda da sensibilidade dos fungicidas triazóis ou estrobilurinas. Mesmo em um país com inverno rigoroso e baixa sobrevivência do patógeno na entre safra. Também devermos estar atentos para o crescimento da agressividade do oídio no cerrado Brasileiro devido ao uso de germoplasma argentino com menor resistência horizontal (RH) e do agente da alvo que apresentam nenhuma ou reduzida sensibilidade aos benzimidazóis. Se nos erramos no passado temos que aprender, com estes os erros e projetor um novo futuro, com o uso de fungicidas como as estrobilurinas, triazóis e carboxamidas nas diversas combinações e combiná-los em campo com fungicidas protetores, para reduzir a pressão direcional na população do patógeno, principalmente a ferrugem da soja. Enquanto as medidas de manejo complementares como o vazio sanitário, impedimento da safrinha de soja não sejam totalmente implantadas e se tornem plenamente eficazes. Sem duvida os protetores vieram para ficar. Estudos realizados pela empresa Bayer na Alemanha por meio da equipe do Dr. Andreas Mehl mostram que a mutação na posição 129 (figura 2) reduziu o acoplamento da enzima mutante com o fungicida trifloxistrobina, mas por outro lado reduziu a sua inativação devido a uma associação mais apurada na estrutura tridimensional para azoxistrobina e piraclostrobina. A estrobilurina picoxistrobina ficou numa posição intermediaria, o que coincide com os estudos n vivo do baseline (folhas destacas em caixa gerbox Figura 3) realizados na UFU nesta safra 2014-2015 para duas populações de Minas Gerais e Mato Grosso. A molécula picoxistrobina apresentou um CI 50 entre (5-50 ppm), para duas populações de ferrugem avaliadas em câmara de crescimento a 22 o Celsius (Mato Grosso Rondonopolis Grupo Girassol e Uberlândia MG). Sem duvida a realização do baseline (monitoramento de resistência), com folhas destacadas melhoraram a confiabilidade dos resultados quando se analisa a germinação dos urediniosporos sobre folhas unifoliadas de soja e não em ágarágua (figura 3, 4, 5 e 6).
Posição 1 F129L 992 G137R G143A TTT GGA GGT Mutações Posição 2524 Figura 2. Sequência molecular do citcromo bc1 com a presença das mutações e suas respectivas posições posicionais, bem como as respectivas alterações genéticas na sequencia de aminoácidos. Na visão dos autores a mutação 129L ocorreu em Phakopsora pachyrhizi.pode ter ocorrido outras mutações que também podem ter afetado também a sensibilidade de outros fungos como Erysiphe diffusa e Corynespora cassiicola, pois o controle dos mesmos em campo foi difícil na presente safra. Outro fato importante é quando se fala do controle do complexo de doenças moléculas de grande importância no controle de ferrugem não apresentam ou proporcionam baixo desempenho no controle de outras doenças como a alvo (Corynespora cassiicola), míldio pulverulento (oídio) (Erysiphe diffusa). As interações regionais ou locais de cultivares e fungicidas devem ser destacadas. Notadamente o uso de cultivares indeterminadas e de ciclo precoce em função do seu lançamento no mercado brasileiro anualmente apresentam uma meia vida curta em função da busca crescente de produtividade e do surgimento continuo de novos genótipos. A tabela 1 apresenta uma relação entre espectro de controle e eficácia para o espectro do controle de doenças na cultura da soja.
Tabela 1. Disponibilidade de fungicidas com modo de ação, espectro de controle e eventual risco de resistência dos fitopatógenos na cultura da soja. Grupo químico Ativo Nome Comercial Doença em soja Espectro de controle Risco de resistên cia Estrobilurina Azoxistrobina Priori Ferrugem, 30-40 % Médio alvo, mela e oidio Estrobilurina Piraclostrobina Comet Ferrugem, 30-40 % Médio alvo, mela e oidio Estrobilurina Picoxistrobina Oranis Ferrugem, 30-40 % Médio alvo, mela e oidio Estrobilurina Trifloxistrobina Flint Ferrugem, 50-60 % Médio alvo, mela e oidio Carboxamida Fluxapiroxade Xemium Ferrugem, 70-80 % Médio alvo, DFCs e oidio Carboxamida Benzovindiflupir Solatenol Ferrugem 95 % Médio
Carboxamida Bixafen - Ferrugem, alvo, DFCs e oidio Benzimidazol Carbendazin Derosal, DFCs, Carbomax, etc. mofo branco, antracnose e oidio Benzimidazol Tiofanato Cercobim, etc. DFCs, metilico mofo branco, antracnose e oidio Triazol Tebuconazole Folicur, Orius, Ferrugem, Tebufort, etc. oidio e DFCs Triazol Ciproconazole Alto 100 Ferrugem, oidio e DFCs Triazol Hexaconazole Domark, etc. Ferrugem, oidio e DFCs Triazol Difeconazole Score, Prisma Oídio, etc. antracnose e DFCs Triazolintiona Protioconazol Proline Ferrugem, (Triazol + antracnose, Enxofre) DFCs e alvo 40 % Médio 50 % Alto 50 % Alto 40 % Médio 40 % Médio 40 % Médio 70 % Médio 80 % Baixo para FAS e 60 % para as demais
Cúpricos Oxicloreto de Difere Oidio, cobre DFCs e Ferrugem Ditiocarbamatos Mancozeb, Unizeb Gold, Ferrugem, Propineb e Antracol e Metiram Polyram alvo e DFCs Nitrilas Clorotalonil - Ferrugem, oídio e DFCs Dicarboxamidas Fluazinam Frowncide, etc. DFCs, oídio e alvo Cúprico + Sulfato de cobre + - Ferrugem, amônia cloretos de quartenária benzalcônio alvo e oidio 30-40 % Baixo 40-50 % Baixo 40-50 % Baixo 35-45 % Baixo 30-40 % Baixo A posição pessoal do autor é de que em todas as pulverizações com triazóis + estrobilurinas, ou carboxamidas + estrobilurinas e futuramente triazóis + carboxamidas + estrobilurinas deve-se associar aos mesmos um protetor em todas as pulverizações no dossel de soja. Independente do ciclo da cultivar e do hábito de crescimento (determinado ou indeterminado). Notadamente devem ser utilizadas estratégias complementares de manejo da resistência, como o impedimento do cultivo de soja na safrinha para que o sucesso das medidas preconizadas e o manejo de fungicidas tenha sustentabilidade, uma vez que nesta última safra tenha eficácia e longevidade. Novas moléculas para os próximos 10 anos no controle da ferrugem da soja não tem se revelado, o que preocupa muito os especialistas que trabalham com a cultura da soja. Avanços no controle químico das doenças da soja ocorreram, como a combinação de um triazol + radical enxofre (Triazolintiona), o que reduz as chances de mutação para um único ativo, bem como as carboxamidas (SDHIs)- atuação na rota da succino desidrogenase, diferente das estrobilurinas (Quinona-oxidase), Mas, a utilização de fungicidas protetores (cúpricos,
ditiocarbamatos, nitrilas, etc.) associados em todas as pulverizações a estes grupos químicos como modo de ação específico preservarão estas moléculas até que novos ativos surjam, o ajudará em muito no manejo dos patógenos nos grandes cultivos. Figura 3. Desempenho das estrobilurinas (azoxistrobina, piraclostrobina e picoxistrobina nas concentrações crescentes de 0 a 100 ppm baixo para cima, para duas populações de Phakopsora pachyrhizi) de Minas Gerais (Uberlândia lado esquerdo) e Mato Grosso (Rondonópolis- lado direito). A- azoxystrobina, B- pyraclostrobina e C- picoxystrobina.
Figura 4. Desempenho de (A- azoxistrobina + benzovindiflupir (cálculo baseado na concentração do ingrediente ativo da carboxamida benzovindiflupir), B- trifloxistrobina + ciproconazol (cálculo baseado na concentração de trifloxistrobina) e C- ciproconazol nas concentrações crescentes de 0 a 100 ppm baixo para cima, para duas populações de Phakopsora pachyrhizi) de Minas Gerais (Uberlândia lado esquerdo) e Mato Grosso (Rondonópolis- lado direito).
Figura 5. (Desempenho de fungicidas protetores (A- Oxicloreto de cobre, B- mancozeb e C- amônia quartenária (cloretos de benzalcônio)), nas concentrações crescentes de 0 a 100 ppm baixo para cima, para duas populações de Phakopsora pachyrhizi) de Minas Gerais (Uberlândia lado esquerdo) e Mato Grosso (Rondonópolis- lado direito).
Figura 6. Germinação de urediniosporos de Phakopsora pachyrhizi em folhas unifoliolares de soja, cultivar Destak, para bioensaio em folha destacada ( in vivo ) visando avaliar o efeito de fungicidas na germinação. Germinação em câmaras de crescimento a 22 graus Celsius e 90 % de UR (nebulosidade).
Figura 7. Perda do efeito residual e eficácia de fungicidas triazóis, estrobilurinas e suas associações no controle de ferrugem, oídio e alvo da soja em 10 experimentos e 150 fungicidas ou tratamentos (600 parcelas em campo), UFU, Fazenda do Glória, safra 2014-2015 (fotos A, B, C e D).