Testamento vital foi ontem apresentado no Porto e permite que os doentes recusem ser tratados para não prolongarem o sofrimento devido à doença Recusa de tratamento para adiar morte avança Associação Portuguesa de Bioética separa testamento vital da eutanásia (VETE CARNEIRO ivete@jn.pt 0 modelo está escrito. Só aguarda a vontade política de avançar com a legalização do testamento vital, perante o qual a sociedade é "consensual". Porque, insiste quem o redigiu, não tem a ver com eutanásia. Essa é discussão para depois. E obrigará a referendo. O "Documento de Directivas Antecipadas de Vontade" é uma declaração de recusa de tratamentos inúteis em caso de doença terminal ou incurável. Foi ontem apresentado no Porto por Rui Nunes, presidente da Associação Portuguesa de Bioética (APB). Perante o silêncio político sobre o tema, o ex-membro do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida resolveu "meter pés ao caminho" e redigir a possível declaração, com base na proposta que a APB apresentou em Outubro. Isto, depois de ter falhado, em Junho, a aprovação do testamento vital proposto pelo partido do Governo. E falhou por motivos que Rui Nunes aceita. A proposta do PS era substancialmente diferente da que fora apresentada em 2007 pela APB. Foi apresentada a um mês do fim da legislatura e misturava o testamento vital com "o consentimento informado para arrancar uma unha" e com "o processo clínico no gabinete do médico dentista", diz, irónico. O Conselho de Ética criticou-a e ela caiu. Em Outubro, a APB redesenhou a proposta inicial juntando
elementos saídos do debate político, como o aconselhamento do médico assistente na assinatura da declaração e a exclusão de testemunhas familiares no acto da assinatura, "para evitar algum tipo de persuasão". "Há um consenso social e político alargado no sentido da legalização do testamento vital", garante o docente de Bioética da Faculdade de Medicina do Porto. "Pergunto-me, mais como cidadão do que como académico, por que não se legalizou ainda", questiona Rui Nunes, lembrando que quer a associação de cuidados paliativos, quer a Ordem dos Médicos - "a mais renitente" - são favoráveis à possibilidade de um doente rejeitar a obstinação terapêutica. A apresentação da declaração, já enviada para o presidente do Parlamento, visou "exigir publicamente ao Parlamento que legalize já o testamento vital", porque "não há motivo para adiar". Rui Nunes admite, contudo, que haja receio político de levar o tema à discussão - embora saúde a iniciativa do CDS-PP (ver texto ao lado). Mas há-o por um erro de interpretação e a confusão com a eutanásia. "São conceitos ética e medicamente complicados", mas são coisas "diferentes ética, médica, política e socialmente". O testamento vital é "um exigência social", que já é realidade "na maior parte dos países modernos". Depois de legalizado, adverte, passe-se então para o debate da eutanásia. Sendo tema que "divide profundamente a sociedade", exige uma discussão muito mais alargada, culminada com um referendo. "Só mete no mesmo saco a legalização do testamento vital e a eutanásia quem quer que tudo fique na mesma". 0 que consta na declaração de princípios do testamento? "Se nalguma fase da minha vida o meu médico assistente determinar que eu tenho uma doença incurável ou terminal e que a utilização de meios de diagnóstico e tratamento apenas servem para prolongar artificialmente o processo de morte, determino que esses procedimentos extraordinários e desproporcionados sejam suspensos ou, de preferência, que não sejam iniciados, e que seja permitida a evolução natural da "Vontade pode ser mudada em qualquer momento" 0 PS já apresentara uma proposta para instituir e regular o testamento vital. 0 actual projecto-lei será igual? É natural que haja algumas alterações. 0 projecto foi apresentado no fim da última legislatura. Agora, o grupo parlamentar é diferente na sua constituição. Isso vai determinar mudanças no texto da proposta? 0 PS está envolvido em vários debates sobre a matéria. Ainda este mês vamos participar num encontro sobre Medicina Interna. Num diploma sobre o testamento vital. vital minha doença sendo apenas providenciados os cuidados paliativos necessários para o meu conforto ou para o alívio das dores e sofrimento. Na ausência de capacidade da minha parte para, de um modo informado esclarecido, consentir na utilização de meios extraordinários e desproporcionados de tratamento é minha vontade que esta declaração seja respeitada pela minha família e pela equipa médica (...)". o que considera contemplado? Haverá que garantir ter mesmo de ser o consentimento informado, o direito a não ser tratado e o direito a nomear o procurador de cuidados de saúde. Depois, tem também de ser definido o processo do próprio testamento vital, não só nos seus aspectos burocráticos. Uma condição muito importante a ter em conta é que fique estabelecido o carácter dinâmico do testamento vital, ou seja, ele pode ser alterado ou eliminado a qualquer momento pelo cidadão a quem diz respeito. A nossa proposta deve também contemplara possibilidade de objecção de consciência dos profissionais em alguns casos. Poderá haver uma confluência da proposta do PS com a do CDS-PP? A iniciativa é do PS. 0 CDS-PP é que poderá fazer essa confluência. A proposta do PS ficará pronta antes das férias parlamentares? Quando for oportuno, e apresentaremos o projecto. Não posso dizer quando. e.f. Documento de directivas antecipadas de vontade prevê aconselhamento do médico assistente
Testamento vital tem de ser legalizado LUSA Açoriano Oriental O presidente da Associação Portuguesa de Bioética(APß), Rui Nunes, exigiu ontem que o Parlamento legalize de "imediato" o testamento vital e apresentou uma proposta formal do documento que enviou ao presidente da Assembleia da República. "Há um consenso social e político alargado no sentido da legalização do testamento vital" afirmou Rui Nunes, frisando que o documento reúne o acordo da população, dos grupos profissionais e das associações científicas e técnicas. Em conferência de imprensa, o presidente da APB e do Serviço de Bioética da Faculdade de Medicina do Porto considerou que é "uma responsabilidade social dos partidos políticos reflectir sobre este tema e aprovar algo que vem da comunidade científica". "Aliás, não se percebe porque é que ainda não está legalizado. Se da Esquerda à Direita há um uníssono em torno da legalização do testamento vital, eu pergunto, mais como cidadão do que académico, porque é que aindanão está legalizado?" questionou. Em seu entender, apesar dos conceitos serem "eticamente e medicamente complicados", não faz sentido fazer passar a ideia de que, ao legalizar o testamento vital, se está a legalizar a eutanásia. "São ética, medica, social, jurídica e politicamente conceitos diferentes. Aqui o que está em causa é, no essencial, boa prática médica", sustentou. O debate da eutanásia é "um debate diferente" e portanto "propomos uma hierarquia de prioridade legislativas nesta matéria, ou seja, legalizar já o testamento vital e deixar o debate da eutanásia para a fase seguinte", acrescentou Rui Nunes. Depois da proposta de diploma legal, a APB apresentou agora publicamente a proposta formal do Documento de Directivas Antecipadas de Vontade, que contém o testamento vital. Para ser eficaz, o declarante deve entregar um exemplar do documento ao seu médico assistente, a familiares ou amigos, bem como proceder à sua inscrição no Registo Nacional de Directivas Antecipadas de Vontade (RENDAV)acriar. O documento deve ser assinado na presença de um notário ou de um funcionário do RENDAV. O cidadão declara que, se numa fase da sua vida o seu médico assistente determinar que tem uma doença incurável ou terminal e que a utilização de meios de diagnóstico e tratamento apenas servem para prolongar artificialmente o processo de morte, esses procedimentos extraordinários e desproporcionados devem ser suspensos, ou de preferência, que não sejam iniciados.*
O debate da eutanásia é "um debate diferente", diz Rui Nunes