ARGAMASSAS TÉRMICAS Uma solução no cumprimento do RCCTE Gonçalves, Paulo Jerónimo Secil Martingança, S.A. Portugal paulo.goncalves@secil.pt Frade, Dina Filipe Secil Martingança, S.A. Portugal dina.frade@secil.pt Brites, Joana Secil Martingança, S.A. Portugal joana.brites@secil.pt Secil Martingança, S.A. Apartado 2, 2406-909 Maceira, Leiria Portugal e-mail: comercial@secilmartinganca.pt Resumo: Neste trabalho, apresenta-se uma melhoria no desenvolvimento de uma argamassa térmica, que pretende contribuir para o cumprimento do regulamento das características de comportamento térmico dos edifícios (RCCTE), no que se refere à envolvente opaca dos edifícios, constituindo assim uma inovação aos actuais processos. Esta argamassa pretende dotar a envolvente de uma maior estabilidade, resistência mecânica superficial e durabilidade, contribuindo também para o cumprimento do regulamento de segurança contra incêndios, através de uma solução altamente versátil sob o ponto de vista dos processos de aplicação. Para além do cumprimento dos pressupostos normativos e legais aplicáveis, apresentam-se alguns resultados do desenvolvimento do produto desde a sua concepção, aplicação e performance da solução em obra. Palavras-chave: Argamassa Térmica, Inovação, Durabilidade. 1. INTRODUÇÃO O presente trabalho assenta em três pilares fundamentais: Poupança Energética, Inovação Tecnológica e Simplificação de Processos. É na sequência do desenvolvimento de uma Argamassa Térmica, apresentada como um passo em frente na inovação dos materiais de construção, e na observação da sua utilização massiva nas práticas construtivas actuais, que surgem identificadas algumas oportunidades de melhoria a implementar numa solução que, ela própria, emerge de uma matriz conceptual moderna e inovadora.
A poupança energética surge associada às necessidades de controlo ambiental, gestão de recursos e controlo dos custos com a energia. Paralelamente, as exigências de conforto dos utilizadores do edificado continuam em crescendo legítimo e previsível. Na figura 1 encontra-se o diagrama que serviu de motor de arranque ao desenvolvimento tecnológico da Argamassa Térmica que, após passagem pelo processo de industrialização, entrou no mercado dos materiais de construção, como solução inovadora para revestimento exterior de fachadas (envolvente opaca dos edifícios). Figura 1 Diagrama cronológico de pressuposto Inexistente regulamentação térmica 1.º RCCTE Preocupações ambientais INOVAR 1990 2000 2010 Exigências de conforto Problema global da energia Directiva Europeia do Desempenho Energético dos Edifícios: SCE, RSECE, novo RCCTE. Claro que a conjuntura para o desenvolvimento de uma solução como esta tem sempre um cenário normativo que define padrões de qualidade e desempenho, e que serve como guia de referência para o enquadramento da solução no respectivo sector de mercado. Todavia, os autores fizeram crescer a lista de requisitos, numa primeira fase, com o sentido de a tornar numa solução de revestimento exterior que é simultaneamente uma forma de isolar termicamente os edifícios e numa metodologia desejada pelos potenciais utilizadores. Esta meta foi claramente atingida. E esta conclusão torna-se inequívoca quando, monitorizada a aplicação de milhares de metros quadrados de fachadas no mercado nacional com recurso a esta solução, são diagnosticados excelentes desempenhos do ponto de vista da aplicação e elevados níveis de satisfação junto das exigências da prescrição. Propõem-se agora os autores ao aperfeiçoamento da solução a partir da experiência obtida das utilizações da solução original [1], mantendo os mesmos pressupostos de base e fazendo crescer a expectativa quanto à melhoria do desempenho térmico e à optimização dos procedimentos de aplicação. Assim, após uma breve revisão do desenvolvimento do produto e da sua caracterização, apresentar-se-ão as inovações introduzidas e as conclusões sobre o desempenho demonstrado em obra da solução melhorada.
2. ARGAMASSA TÉRMICA O desenvolvimento de uma argamassa térmica para revestimento de paredes pretende contribuir para o cumprimento do Regulamento das Características de Comportamento Térmico dos Edifícios (RCCTE) [2], no que se refere à envolvente opaca dos edifícios, corrigindo as pontes térmicas, enquadrando-a na actual norma de argamassas de revestimento, EN 998-1 [3]. Reconhecido pelo mercado, este produto constitui também mais um passo na melhoria das soluções construtivas. Esta solução vem dotar a envolvente de estabilidade e resistência mecânica superficial, contribuindo para a melhoria da segurança contra incêndios, através de uma solução altamente versátil sob o ponto de vista dos processos de aplicação. Estas virtudes confluem no sentido da melhoria da durabilidade, quer do sistema de isolamento térmico em si, quer dos restantes elementos construtivos [1]. Desta forma, estes ficam homogénea e continuamente protegidos das variações higrométricas, minimizando as necessidades de manutenção e contribuindo para a melhoria na sustentabilidade da construção. 2.1 Desenvolvimento Com o objectivo de conferir ao produto final características específicas de um material isolante - argamassa térmica -, tornou-se decisiva a construção de uma curva granulométrica que incorporasse agregados de muito baixa massa volúmica (aproximadamente 20 kg/m 3 ). Seleccionou-se o Poliestireno Expandido (EPS) por apresentar, como consequência desta característica, uma condutibilidade térmica muito baixa decorrente de uma estrutura celular fechada, com ar ocluído, que dificulta a transferência de calor. Por outro lado, este agregado apresenta baixa absorção de água e a importante compatibilidade com os diferentes tipos de ligantes utilizados na construção [4]. Figura 2 O agregado EPS Para além destas características, ao seleccionar o EPS, privilegiou-se a incorporação parcial de materiais que proviessem de outros processamentos industriais, classificados como resíduo e recolhidos selectivamente. Por outro lado, pretendeu-se promover a redução do número de materiais necessários à obtenção das propriedades pretendidas para o produto final. Com estas premissas, era expectável obter um produto que contribuísse para redução da pegada ecológica durante a sua vida útil, diminuindo o consumo de recursos naturais, como a energia. O ligante assume uma importância vital na estrutura da argamassa, pois é responsável por aglomerar as partículas após reacção com água, endurecendo e conferindo as propriedades
físico-mecânicas expectáveis. Durabilidade, aderência ao suporte, coesão e resistência ao fogo decorrem da presença de um ligante mineral hidráulico de qualidade diferenciada, o Cimento Portand Branco. Figura 3 Cimento Branco, o ligante de eleição para a formulação da Argamassa Térmica Convenientemente compatibilizadas com as percentagens de ligante incorporado, são incluídos aditivos de diversas tipologias, de forma a incrementar algumas propriedades fundamentais. Figura 4 Aspecto dos diversos aditivos Trabalhabilidade, permeabilidade ao vapor de água, introdução de partículas de ar e absorção capilar são características que facilitam a aplicação, promovem a durabilidade do sistema e contribuem para atingir os desempenhos técnicos pretendidos. 2.2 Propriedades Da caracterização realizada destacam-se alguns aspectos que têm uma influência determinante no desempenho do sistema durante a sua vida útil. Por se tratar de uma argamassa projectável, com excelentes aderências, garante-se um isolamento continuado, sem lugar a juntas e consequentes pontes térmicas. Esta aderência é garantida por si só, sem recurso a fixações mecânicas, colagens ou outros sistemas equivalentes mais frágeis e que podem em muitos casos colocar em causa, a própria estabilidade do isolamento. Também contribuem de forma decisiva para a durabilidade, o distinto comportamento ao fogo, a notável relação flexão/compressão, associada directamente ao muito baixo módulo de elasticidade da argamassa endurecida, que garante as extraordinárias performances de resistência ao choque/perfuração por corpo rígido, aumentando assim a fiabilidade da solução.
3. UM NOVO PRODUTO 3.1 Melhorias Implementadas É certo que uma solução com as características globais desta argamassa térmica, apresentada como sistema de revestimento exterior, é facilmente capaz de reunir adeptos em todos os sectores da intervenção na construção. Esta realidade é pacífica quando se nota que os sistemas alternativos são tecnologias de isolamento térmico pelo exterior que apresentam excelentes desempenhos térmicos, é um facto, mas denunciam várias debilidades. Com maior ou menor dificuldade essas menos-valias vão sendo contornadas com a introdução de melhorias nos procedimentos e nos novos acessórios, todavia, essas alterações acrescentam complexidade a uma solução que, por si só, já é complexa. Concluído um largo período de observação da utilização da argamassa térmica como revestimento exterior de paredes, pôde resumir-se o plano de acções de melhoria a implementar num novo sistema, em dois pontos: Melhoria do desempenho térmico Maior simplicidade de processos É imediata a percepção de que quanto melhor o desempenho térmico da solução mais eficiente pode ser a sua utilização, desde logo porque, para a mesma espessura de aplicação poder-se-á obter uma resistência térmica superior. Portanto, o desafio era reduzir a condutibilidade térmica do produto final. Figura 5 Objectivo de redução da condutibilidade térmica λ = 0,09 λ = 0,07 O objectivo ambicioso de baixar o λ (condutibilidade térmica) para 0.07 W/m ºC, não foi simples. A necessidade de baixar a massa volúmica da argamassa, conferindo-lhe características de produto em pó reprodutíveis numa unidade industrial de produção de argamassas e ainda assim, manter as suas excepcionais características de aplicação mecânica e trabalhabilidade, constituiu a grande equação a resolver pelos diferentes intervenientes desta equipa de investigação.
Um sistema de fácil utilização em obra torna-se apetecível. Em construção, é sabido que, não basta que a tecnologia e a inovação sejam subjacentes aos materiais utilizados, mas também os processos e tecnologias de aplicação devem acompanhar a evolução dos produtos. Ora, é aqui que reside muitas vezes o factor chave do sucesso ou do insucesso das soluções. A qualidade da mão-de-obra é o aspecto mais difícil de dominar, mas é ela o fiel da balança que transforma um produto numa grande solução, ou a condena ao fracasso. Constata-se que a qualidade média da mão-de-obra na construção não é propriamente elevada, pelo que, a durabilidade de um produto, solução ou sistema novo no mercado é sempre condicionada pela sua maior ou menor aproximação aos processos de aplicação conhecidos. Eis aqui, um dos focos distintivos das soluções de revestimento e isolamento térmico com argamassa térmica de reboco. Depois de um trabalho exaustivo com avanços e recuos, chegou-se a uma nova formulação equilibrada e que após caracterização em diversos laboratórios nacionais de credibilidade reconhecida, originou os seguintes resultados: Figura 6 Tabela de características físicas e mecânicas da nova formulação Ref.ª de Valores de ensaio / Características Unidades ensaio classes Massa volúmica (produto endurecido) kg/m 3 EN1015-10 250 - Absorção de água por capilaridade Permeabilidade ao vapor de água Coef. de capilaridade Coeficiente de difusão ao vapor (µ) kg/m 2 min 0,5 EN1015-18 0,05 W2 - EN1015-19 < 10 70% Hr Resistência à compressão MPa EN1015-11 CSI - Resistência à tracção por flexão MPa EN1015-11 0,6 - Módulo de elasticidade dinâmico Características MPa BS 1881-5 BS 1881-203 Figura 7 Tabela de características físicas da nova formulação Condutibilidade térmica (λ10,dry) Unidades W/m.K Ref.ª de ensaio EN 1745 (EN12664) 500 - Valores de ensaio / classes 0,069 T1 Reacção ao fogo Classes EN13501 1 Bs1d0 Bs1d0 Aderência N/mm2 EN1015-12 0,15 Rotura coesiva Expansão livre Idades (dias): 1-7-15-90 mm/m LNEC E 398 0,1-0,2-0,2-0,4 sem fissuração aparente Indíce de Redução sonora a sons aéreos (Rw) - (parede de tijolo cerâmico de 22 cm com 1 cm de RHP PLUS Int. no interior e 4 cm de ISODUR revestido com 3 mm de FLEXDUR no exterior) db NP EN ISO 717-1 NPEN 20140-3 44
3.2 Caracterização da Solução Além de um desempenho térmico superior, a solução apresenta consideráveis avanços do ponto de vista prático que têm forte impacto na simplificação dos processos de aplicação, mas também ao nível de outros desempenhos técnicos. Um módulo de elasticidade ainda mais baixo e uma expansão livre perfeitamente aceitável conferem a este produto muito baixa tendência para a fissuração. A par e dadas as melhorias alcançadas com a nova formulação da argamassa térmica, foi desenvolvida uma argamassa mineral que revoluciona conceptualmente a definição inicial da solução de revestimento. O esquema de aplicação da solução original contemplava a realização de camadas de regularização e reforço intermédias e, finalmente, as soluções de acabamento. Numa breve referência à criação deste novo produto de regularização e acabamento para a argamassa térmica (a sua caracterização não está no âmbito deste trabalho), refira-se que é graças à conjugação das suas propriedades particulares do ponto de vista físico-mecânico, com as características inovadoras da re-formulação da argamassa térmica, que se define uma solução de revestimento singular. Trata-se do sistema de revestimento mais minimalista e, consequentemente, mais simples de aplicar, que é possível apresentar como solução mista que protege, desempena, isola termicamente e confere textura de acabamento. Figura 8 Esquema genérico da solução [5] Além disso, o conjunto é formado por duas argamassas minerais que maximizam a respirabilidade dos elementos construtivos, através de valores dos coeficiente de permeabilidade ao vapor de água muito favoráveis.
4. PRÁTICA DE APLICAÇÃO Neste capítulo ilustra-se a transposição para obra da solução desenvolvida e testada em fábrica, sobre a qual legitimamente se criara uma elevadíssima expectativa de sucesso. Na verdade a excelente trabalhabilidade da nova formulação da argamassa térmica é apontada como ex-líbris do produto. A execução de panos contínuos de parede com grande desenvolvimento dimensional torna-se num processo com rentabilidade extrema, com recurso à projecção mecânica da argamassa e um consequente procedimento simples de nivelamento manual. A simplicidade do esquema genérico da solução com recurso a uma argamassa de barramento que regulariza a superfície e confere a textura final areada fina para pintura, satisfaz os requisitos arquitectónicos das soluções de revestimento, ao mesmo tempo que oferece total versatilidade aos utilizadores no sentido de reproduzirem com pormenor os detalhes da prescrição, mesmo na mais complexa das estereotomias de fachada. A seguir apresentam-se imagens que ilustram as fases da aplicação do sistema composto pela argamassa térmica e pela argamassa de regularização e acabamento. Figura 9 Projecção mecânica da argamassa térmica Figura 10 Nivelamento da argamassa térmica com régua
Figura 11 Barramento da argamassa de regularização e acabamento Figura 12 Finalização da textura de acabamento 5. CONCLUSÕES As qualidades reconhecidas à argamassa térmica tornam-na numa solução de eleição com um potencial enorme na realização de revestimentos exterior de paredes, quer em obra nova, quer em reabilitação. O vasto leque incontestável de vantagens que a solução, completada com a argamassa de regularização e acabamento, apresenta secundariza a real necessidade de incrementar a espessura de aplicação da argamassa térmica, no sentido de se obterem resistências térmicas superiores na envolvente opaca, como é requisito em determinadas situações. A melhoria conseguida com a redução da condutibilidade térmica em cerca de 25% face à versão original, muito contribui para que, na generalidade das aplicações (considerando as condições ambientais médias do nosso país), se relativizasse o desempenho térmico da argamassa em projecto, em prol das virtudes diferenciadoras que a solução acarreta. Destas, os destaques vão para a versatilidade em projecto, a facilidade de aplicação minimizando o erro de execução e a durabilidade.
Por fim, merece referência a assertividade e o poder de concretização que ligam o presente trabalho com a prática corrente da obra. É desta ligação que surgem as melhores ideias, os mais correctos diagnósticos de necessidades e, consequentemente, as soluções mais harmoniosas. 6. REFERÊNCIAS [1] Sequeira, Cristina; Frade, Dina; Gonçalves, Paulo. Argamassas de reboco com características térmicas. APFAC2010. Lisboa. [2] - RCCTE, Regulamento das Características de Comportamento Térmico dos Edifícios, aprovado pelo Decreto-Lei nº 80/2006 de 4 de Abril. [3] - EN 998-1 Specification for mortar for masonry Part 1. [4] - http://www.acepe.pt/eps/eps_qeps.asp, 7 de Setembro de 2009. [5] http://www.isodur.pt. 20 Dezembro 2011. [6] - Ramos Pires, António, Inovação e desenvolvimento de novos produtos, técnicas e métodos de apoio à concepção, Edições Sílabo, 1999. [7] - http://futureng.wikidot.com/eps, 7 de Setembro de 2009. [8] - http://www.dryvit.pt/mesfvit.htm, 18 de Maio de 2009. [9] - Campos de Sousa, H., Construção e Sustentabilidade, Magazine de informação da Ordem dos Engenheiros, nº 113, Setembro/Outubro 2009, Ordem dos Engenheiros: Região Norte. [10] - Duarte, B.,Preocupações de Sustentabilidade e Especificações Técnicas de Obras, Dissertação de Mestrado Integrado, FEUP, 2009. [11] Baxter, Mike R, Projecto de produto: guia prático para o design de novos produtos, Editora Blucher, 2000. [13] Jugulum, Rajesh, Design for lean six sigma, Philip Samuel, 2009. [14] Frade, Dina. Argamassa leve, como solução térmica em edifícios novos e na renovação. ITECONS 2010. Coimbra.