ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA

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Transcrição:

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA Data: 06-04-2006 Sumário: 1 A afirmação do interesse em agir como verdadeiro pressuposto processual visa assegurar que o direito de acção seja efectivamente exercido para tutela do direito a que necessariamente deverá corresponder. 2 Se nada do que o Recorrente alega pode justificar a revogação da decisão do mérito da causa, há manifesta falta de interesse do recurso. 3 Torna-se irrelevante, in casu, estar a conhecer se o Autor tinha, ou não, interesse em agir, se, mesmo que procedente fosse a argumentação aduzida pelo Apelante e, assim, houvesse de ser revogado o segmento do saneador em questão, nem por isso seria afectada a final e subsequente decisão do mérito da acção, cujos fundamentos não são questionados pelo Recorrente. Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: 1. J instaurou a presente acção declarativa de simples apreciação negativa, seguindo a forma de processo ordinário, contra o Estado Português, onde, com base nos termos e decisões de um anterior processo crime, pede que seja «declarada a (sua) inocência em relação aos factos da acusação do MP e adquiridos pela pronúncia, que o indiciaram pela prática do crime de burla agravada, com a consequência de o Estado Português reconhecer que o Autor é uma pessoa íntegra e não um criminoso». O Estado Português contestou, suscitando as excepções dilatórias de falta de interesse em agir do Autor e de ilegitimidade passiva, ou, caso assim se não se entendesse, deduziu diversos argumentos no sentido de se concluir pela inviabilidade da acção. O Autor replicou. Findos os articulados e dispensada a audiência preliminar, o Exc. mo Juiz a quo lavrou douto despacho saneador, constante de fls. 1050 a 1071, nos termos do qual julgou as excepções dilatórias deduzidas pelo Réu Estado e decidiu: A improcedência da excepção de ilegitimidade passiva; A procedência da excepção de falta de interesse em agir do Autor. 1

Não obstante o reconhecimento da indicada excepção dilatória, ao abrigo do disposto no artigo 288º, n.º 3 do CPC, foi seguidamente lavrado o douto saneador sentença, constante de fls. 1072 a 1108, nos termos do qual a presente acção foi julgada improcedente, com a decorrente absolvição do Réu do pedido. Inconformado com a sentença, apelou o Autor, formulando as seguintes conclusões: 1ª O tribunal a quo considera que ao Autor falta o interesse em agir, considerando que ninguém tem o direito a ver reconhecida, por via judicial, que não é criminoso. 2ª O Tribunal a quo toma em consideração que pela aplicação do n.º 2 do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa, que constitui o corolário do princípio da presunção de inocência, é expresso quanto ao pedido do Autor na presente acção. 3ª No entanto o Tribunal a quo considera que a presunção de inocência é o estado típico e normal de qualquer cidadão, quando é constituído arguído no âmbito de um processo crime até à sentença com trânsito em julgado. 4ª Acontece que no caso do Autor não aconteceu. 5ª O Autor foi perseguido durante 18 anos, para no final o procedimento criminal terminar em prescrição; 6ª - Ao contrário do que deveria de acontecer num procedimento criminal típico, previsto na C.R.P, que finda com uma sentença transitada em julgado; 7ª - O Autor viu-se acusado, ofendido na honra e apontado como o tal que se abotoou com o dinheiro do Estado, sem sequer ter tido a oportunidade da absolvição, ficando irremediavelmente em causa o direito ao bom nome e à reputação, art.º 26 n.º 1 da C.R.P.; 8ª - As normas ínsitas na C.R.P não podem ser só palavras bonitas que servem para ser proclamadas, quando há interesse nisso, mas vazias de conteúdo. Pelo contrário, as normas da C.R.P têm de ser normas com alcance efectivo, que no caso em apreço foi esquecido; 9ª - Ao Autor não foi dada a oportunidade de demonstrar à sociedade a sua inocência, visto que, o Réu não permitiu que o procedimento criminal chegasse ao fim, pois invocou a prescrição do procedimento criminal, que veio a ser declarada e posteriormente transitou em julgado; 10ª Assim sendo, o Autor mantém, perante a sociedade a imagem de criminoso, situação que foi criada pelo Réu (Estado Português); 11ª - O Réu violou, claramente, o art.º26 n. 1 da C.R.P, nomeadamente o direito ao bom nome e à reputação do autor, bem como o n.º 2 do art.º 32º C.R.P, quando deixou que o procedimento criminal demorasse 18 anos para no final não haver sentença com trânsito em julgado; 12ª - Pelo exposto, assiste ao Autor o direito a interpor a acção declarativa de simples apreciação negativa, para que o tribunal pondere a sua situação de inocência; 13ª - A forma como o tribunal a quo interpreta o n.º 2 do art.º 2º do CPC é inconstitucional; 14ª A todo o acusado criminalmente assiste o direito a um julgamento que definisse a sua culpabilidade ou não e no caso de extinção do procedimento criminal que obstasse à 2

apreciação do mérito, neste caso a prescrição, subsiste, ainda assim, o direito subjectivo de o acusado ver o seu bom nome defendido e eventualmente ilibado; 15ª - Ao Autor não pode ser coarctado o direito à acção a pretexto de que não lhe assiste qualquer direito subjectivo nem interesse substantivo juridicamente atendível; 16ª - Ao interpretar os artigos 2º, n.º 2 e 26º, ambos do CPC, em termos tais que impedem ao Autor de agir em juízo em ordem de ser ilibado o seu bom nome, conspurcado, publicamente, por uma acusação frustrada e não submetida a julgamento, a decisão recorrida não só violou estas normas legais como as aplicou concretamente a violação do princípio constitucional da presunção de inocência. O Réu Estado Português contra alegou, concluindo que deverá ser julgada improcedente a apelação e mantida a douta decisão recorrida. 2. Na 1ª instância, por acordo e confissão das partes e documentalmente, consideraram-se provados os seguintes factos: 1º - O Autor foi acusado pelo Ministério Público, em representação do Estado Português, pela prática de um crime de burla agravada, previsto e punível pelo artigo 313º e al. c) do artigo 314º do Código Penal então em vigor, com a alegação de que, mediante conduta enganatória e artifício fraudulento, lesou o Estado Português, através do Ministério da Saúde, em milhares de contos; 2º - Os factos reportam-se a meados de 1987 e traduzem campanhas publicitárias solicitadas pelo Ministério da Saúde; 3º - A acusação veio a ser recebida por despacho de pronúncia por Juiz de Instrução Criminal de Lisboa, pronunciando o Autor pela prática do referido crime; 4º - No âmbito do referido processo, o Autor foi julgado pela 2ª Vara Criminal de Lisboa e proferido acórdão, datado de 17/01/1994, do qual se encontra certidão de fls. 263 a 331 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, que decidiu, relativamente ao ora Autor, condená-lo como co - autor material de um crime de burla agravada, p. e p. nos artigos 313º e 314º, al. c) do Código Penal, na pena de 4 anos de prisão, com perdão de 1 ano de prisão e, no pagamento ao Estado, em regime de solidariedade com os arguidos Fernando Freire, José Correia e Agostinho Cruz, da quantia de 56.738.144$00, acrescida de juros de mora nos termos aí mencionados; 5º - Interposto recurso pelo Autor da decisão referida em 4), o Supremo Tribunal de Justiça proferiu acórdão, datado de 29/02/96, do qual se encontra certidão de fls. 602 a 833 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, que decidiu, relativamente ao ora Autor, julgar procedente, em parte, o recurso, condenando-o na pena de 3 anos de prisão, com suspensão de execução da pena por 4 anos e no pagamento ao Estado da quantia de 16.074.000$00 e respectivos juros legais; 6º - Do acórdão referido em 5) foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, que determinou a reformulação da decisão pelo Supremo Tribunal de Justiça; 3

7º - Foi então proferido, em 14 de Dezembro de 2000, acórdão pelo Supremo Tribunal de Justiça, do qual se encontra certidão de fls. 835 a 865 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, nos termos do qual resultou anulado o julgamento de 1ª instância, que foi mandado repetir; 8º - Para o efeito do novo julgamento, em 1ª instância, o processo foi distribuído à 1ª Vara Criminal da Comarca do Lisboa, com o n.º 5/93.6TCLSB, onde veio a ser designada data para início da audiência, o dia 13 do Fevereiro do 2003, o que foi motivo de notícias nos jornais; 9º - Na abertura da audiência do julgamento, em 13 do Fevereiro de 2003, o Ministério Publico suscitou uma questão prévia, nos termos que melhor resultam do documento quo se encontra do fls. 867 a 874 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 10º - A questão prévia suscitada pelo Ministério Publico veio a ser acolhida polo Tribunal Colectivo, nos termos do despacho, do qual se encontra certidão do fls. 874 a 885 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 11º - Desse despacho foi interposto recurso obrigatório para o Tribunal Constitucional que, por decisão sumária, datada do 15 do Julho do 2003, decidiu não tomar conhecimento do recurso, da qual se encontra certidão do fls. 887 a 905 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 12º - Nenhum dos arguidos no processo crime faltou às audiências do julgamento ou a qualquer outro acto processual; 13º - Por despacho proferido em 25 do Março do 2004 no processo referido em 8), do qual consta certidão do fls. 1000 a 1002 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido, o procedimento criminal contra o autor veio a ser declarado extinto, por prescrição. 3. O despacho saneador tem por finalidade normal apreciar e decidir sobre matéria de excepções dilatórias e nulidades processuais (não sanadas) suscitadas pelas partes (na maior parte pelo réu) ou que sejam do conhecimento oficioso e possam ser, face aos elementos de prova constantes do processo, conhecidas e decididas. No entanto, sempre que o estado do processo, face aos elementos de prova dele já constantes neste momento, o permitir, sem necessidade portanto de mais provas, o juiz deverá conhecer e decidir sobre o mérito da causa, quanto à totalidade ou parte do pedido ou pedidos (incluindo o pedido reconvencional) ou sobre alguma excepção peremptória (invocada pelo réu ou do conhecimento oficioso), quer a julgue procedente ou improcedente. Caso o juiz no saneador decida sobre o mérito da causa ou julgue procedente ou improcedente alguma excepção peremptória, o saneador terá o valor de sentença (é o chamado saneador sentença) n.º 3, parte final, do artigo 510º CPC. No caso dos autos, o Exc. mo Juiz apreciou e decidiu sobre a matéria de duas excepções dilatórias suscitas pelo réu e que podiam, face aos elementos de prova constantes do 4

processo, ser conhecidas e decididas. A primeira reportava-se à legitimidade passiva do Estado, consistindo, portanto, em saber se o Réu tinha (ou não) legitimidade para ser demandado. A segunda consistia em saber se, por parte do Autor, havia uma necessidade justificada, razoável e fundada de lançar mão de um processo ou de fazer prosseguir uma acção, isto é, se tinha interesse em agir. E, porque o estado do processo, face aos elementos de prova dele já constantes neste momento, o permitiam, sem necessidade portanto de mais provas, o Exc. mo Juiz conheceu e decidiu sobre o mérito da causa, quanto à totalidade do pedido. Debruçando-se sobre as assinaladas questões, o Tribunal a quo considerou: Improcedente a excepção da ilegitimidade passiva do Réu. Procedente a excepção da falta de interesse em agir. No entanto, embora a falta em agir do Autor consubstancie uma excepção dilatória inominada, sendo a sua falta insanável, de conhecimento oficioso, conducente à absolvição do Réu da instância (artigos 288º, n.º 1, alínea e), 289º, 493º, 494º e 495º todos do CPC), considerou o Tribunal a quo que haveria que se ter em conta o vigente artigo 288º, n.º 3, CPC, onde se prescreve que «as excepções dilatórias só subsistem enquanto a respectiva falta ou irregularidade não for sanada, nos termos do n.º 2 do artigo 265º; ainda que subsistam, não terá lugar a absolvição da instância quando, destinando-se a tutelar o interesse de uma das partes, nenhum outro motivo obste, no momento da apreciação da excepção, a que se conheça do mérito da causa e a decisão deva ser integralmente favorável a essa parte», preceito que consagra o denominado princípio da prevalência da decisão de mérito. Isto significa que, no caso concreto, julgar procedente ou improcedente a aludida excepção teria, em qualquer dos casos, idêntica relevância, porquanto a procedência da excepção não impediu que se conhecesse do mérito da causa, tal como aconteceria se tivesse sido julgada improcedente. Poder-se-á considerar que, embora procedente a excepção, o Exc. mo, por força do aludido comando legal, como que ficcionou que a excepção seria improcedente. Conhecendo, então, de mérito, concluiu o Tribunal a quo que não assistia fundamento jurídico à pretensão do Autor (de ver reconhecido perante o Réu que não é criminoso), pelo que foi julgada a acção improcedente e, em consequência, absolvido o Réu Estado do pedido contra si 5

formulado pelo Autor. A improcedência do mérito da acção assentou fundamentalmente na consideração da sua inviabilidade jurídica, pois entendeu o despacho saneador sentença que, uma vez declarada a prescrição do anterior procedimento criminal movido ao Autor/Apelante, resulta excluída a possibilidade de, em nova acção, ser reapreciada a veracidade dos factos que lhe eram imputados naquele anterior processo crime, como necessário seria para que fosse declarado inocente da correspondente acusação. Nestes termos, ressalta à evidência que a falta de interesse em agir do Autor, conquanto integradora da excepção dilatória reconhecida, cedeu lugar e consequência à subsequente decisão do mérito da causa que sobreleva àquela. E, por isso, como muito bem considerou o Apelado, no quadro do recurso em apreço, a questão do interesse em agir só poderia ganhar autonomia e relevância, caso houvesse de ser alterada a decisão do mérito da causa. Tendo no saneador sido apreciadas as excepções dilatórias e sido proferida decisão de mérito, o recurso próprio e adequada era a apelação, embora a decisão recorrida englobasse três segmentos decisórios, dois dos quais desfavoráveis ao Autor. Ora o artigo 684º, n. os 2 e 3 concede ao recorrente a faculdade de restringir o recurso a alguma ou algumas das partes decisórias em que é possível subdividir a decisão recorrida (delimitação objectiva), quer no requerimento de interposição, quer nas conclusões das alegações, contanto que lhe sejam desfavoráveis por só se poder recorrer daquilo em que se ficou vencido (artigo 680º, n.º 1). E tal pode ocorrer tanto de forma expressa como tácita. No requerimento de interposição, se o recorrente não identificar as decisões desfavoráveis de que pretende recorrer ou não declarar que concorda com alguma delas, o recurso abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença lhe seja desfavorável (artigo 684º, n.º 2, 2º &). Mas, nas conclusões da alegação, se o recorrente referir que não se pronuncia sobre o assunto respeitante a alguma das decisões desfavoráveis, por já não estar interessado em submetê-las à apreciação do tribunal superior, ou se, pura e simplesmente, ao assunto dessas decisões não alude, o recurso fica restringido às restantes decisões desfavoráveis (artigo 684º, n.º 3). No momento de elaborar as conclusões da alegação, pode o recorrente confrontar-se com a impossibilidade de atacar algumas das decisões desfavoráveis. Tal verificar-se-á em dois casos: ou por preclusão ocorrida aquando da apresentação do requerimento de interposição do 6

recurso, ou por preclusão derivada da omissão de referência no corpo da alegação. Se o recorrente, ao explanar os fundamentos da sua alegação, defender que determinada decisão deve ser revogada ou alterada, mas nas conclusões omitir a referência a essa decisão, o objecto do recurso deve considerar-se restringido ao que estiver incluído nas conclusões (1). Ora, reportando-nos ao caso concreto, verifica-se que, não obstante o pedido formulado na parte final da sua alegação, inequivocamente reportado à decisão do mérito, desenvolve toda a sua argumentação sobre a matéria da referida excepção dilatória. Do mesmo modo, em sede conclusiva, o Apelante restringe o recurso ao mesmo segmento da decisão recorrida, ou seja, à decisão sobre a falta de interesse em agir. Com efeito nas conclusões a), b) e c) começa por referir a decisão do Tribunal a quo sobre a falta de interesse em agir. Argumenta, seguidamente, no sentido de tentar demonstrar e justificar o seu interesse na propositura e seguimento da presente acção (conclusões d) a o). Termina imputando àquela decisão uma pretensa inconstitucionalidade e dupla violação normativa (conclusões m) e p). Como realça o Recorrido, a alegada inconstitucionalidade de interpretação e aplicação do artigo 2º, n.º 2 do CPC, conquanto isoladamente considerada pudesse eventualmente ser entendida como reportada à matéria do douto despacho saneador sentença (onde aquele preceito vem marginalmente citado entre parêntesis cfr. fls. 1103), surge integrada na economia dos argumentos do Apelante sobre o interesse em agir e resulta apontada como erro jurídico daquela decisão, como se vê e decorre da simples leitura da conclusão p) da respectiva alegação O mesmo se diga, aliás, quanto à prescrição do procedimento criminal, que o Apelante invoca como mero impedimento à demonstração da sua inocência no processo crime, sem alusão ou referência circunstanciada à decisão de mérito da acção. E acrescenta: O teor da alegação torna ainda mais evidente a sua exclusiva relação ao douto despacho saneador, na parte em que conheceu da aludida excepção, sendo essa a única decisão que o Apelante reporta e inequivocamente cita (aludindo a fls. 21 da decisão recorrida, ou seja a fls. 1066 dos autos). Ademais, só em sede (desse segmento) do douto despacho saneador foram consideradas as implicações do princípio constitucional da «presunção de inocência» do arguido sobre a matéria sobre a matéria e pedido da presente acção, que o Apelante refere e procura contraditar na sua alegação, cometendo à «decisão recorrida» uma pretensa violação desse princípio. 7

Por outro lado, lida a alegação, verifica-se que o Apelante não menciona o saneador sentença (stricto sensu) nem faz qualquer referência aos respectivos e concretos fundamentos. Como tal, a matéria alegada pelo Apelante respeita, única e exclusivamente, ao segmento da decisão em que se conheceu e julgou procedente a excepção dilatória da falta de interesse em agir. Ora, se nada do que o Apelante efectivamente alega poderá justificar a revogação da decisão do mérito da causa, há manifesta falta de interesse do recurso, isto é, torna-se irrelevante estar a conhecer se o Autor tinha, ou não, interesse em agir, uma vez que, mesmo que procedente fosse a argumentação aduzida pelo Apelante e, assim, houvesse de ser revogado o segmento do saneador em questão, nem por isso seria afectada a final e subsequente decisão do mérito da acção, cujos fundamentos não são questionados pelo Apelante. Quanto aos argumentos expandidos a propósito da inconstitucionalidade dos artigos 2º, n.º 2 e 26º do CPC, que o Recorrente diz ter sido praticada na decisão recorrida, não se vê em que possa consistir. Como salienta o Recorrido, o artigo 2º, n.º 2 do CPC, ao expressar o princípio de que a todo o direito corresponde uma acção, importa a inversa afirmação, pois nenhuma acção haverá de corresponder a um direito que não exista. Ora, em medida alguma, essa interpretação contende com os princípios consagrados, designadamente com o princípio do livre acesso ao direito e com o decorrente «direito de acção». Muito pelo contrário, como se vê do artigo 20º, n.º 1 da CRP, o livre acesso ao direito e aos Tribunais é assegurado para defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, o que óbvia e logicamente pressupõe a existência do direito ou interesse que se pretenda fazer valer. Aliás, só por absurdo se poderia pensar que um não direito houvesse de ser processualmente exercido em nome dos princípios que visam assegurar o livre acesso aos Tribunais, precisamente, para o exercício dos direitos legais. Nestes termos, a afirmação do «interesse em agir» como verdadeiro pressuposto processual, corresponde na íntegra aos referidos princípios e, ao contrário do que o Apelante pressupõe, serve-lhes de efectiva garantia prática, pois que visa assegurar que o direito de acção seja efectivamente exercido para tutela do direito a que necessariamente deverá corresponder. Ora, no caso presente, certo é que norma alguma confere ao Apelante o pretenso «direito à inocência», ou, mais, simplesmente, norma alguma consagra a «inocência» como «direito», havendo outrossim, e tão só, normas o artigo 32º, n.º 2 da CRP e o artigo 6º, n.º 2 da CEDH que ditam a «presunção de inocência» de toda e qualquer pessoa acusada da prática de um 8

delito (em sentido amplo) até à cabal demonstração do seu cometimento por condenação definitiva. Tal presunção reporta-se a um «conceito» e não a um direito, pelo que não comporta a possibilidade de ser declarada como se o fosse. Ainda que, por força dessa presunção, houvesse de ser de ser considerada a existência de um direito subjectivo do Autor (não já reportado à «inocência», mas sim de ser havido e tratado como inocente), forçoso seria considerar que a correspondente violação teria necessariamente de integrar uma acção condenatória (quer destinada à tutela efectiva do interesse, quer destinada à reparação indemnizatória das consequências de uma tal violação), diversa da presente. Nestes termos, o douto despacho recorrido mais não fez do que assinalar a inexistência do direito invocado pelo Autor/Apelante, concluindo, por isso, pela decorrente impossibilidade de intentar e fazer prosseguir a presente acção. Ou seja, aplicou o n.º 2 do artigo 2º CPC nos seus precisos termos e, portanto, em perfeita harmonia com os princípios constitucionais supra indicados. Por sua vez, o artigo 26º do CPC reporta-se à legitimidade das partes, com o qual se não confunde o pressuposto processual do «interesse em agir», pelo que não se vislumbra que violação possa ter sido cometida, no despacho recorrido, tanto mais que as partes foram consideradas legítimas. Mesmo a entender-se que alguma das conclusões se reporta à decisão de mérito, entendemos não assistir razão ao Recorrente. O saneador sentença encontra-se muito bem estruturado e fundamentado, apreciando, em nosso entender, correctamente a questão que se lhe impunha conhecer e decidindo em conformidade, pelo que merece o nosso acolhimento. Assim, remetendo para os fundamentos da decisão alegadamente impugnada, nega-se, nesta parte, provimento ao recurso, ao abrigo do disposto no artigo 713º, n.º 5 CPC. Daí a necessária improcedência do recurso. 4. Pelo exposto, na improcedência da apelação, confirma-se a douta decisão recorrida. Custas pelo Apelante. 9

Lisboa, 6 de Abril de 2006. Granja da Fonseca Pereira Rodrigues Fernanda Isabel Pereira (1).-Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 108. 10

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO Data: 10.05.2004 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO: 1- RELATÓRIO B... e mulher C... e D..., com os sinais dos autos, instauraram a presente acção declarativa, com processo comum, na forma sumária, contra E... e mulher F..., identificados nos autos, pedindo a condenação dos réus: a) a reconhecerem o direito de propriedade dos Autores sobre o prédio descrito no artigo 1º da petição; b) a reconhecerem que a parcela de terreno com a área de cerca de 30 m2 e com a forma aproximadamente triangular é parte integrante do prédio dos Autores; c) a absterem-se de violar o direito de propriedade bem como o direito de usufruto dos Autores sobre o seu prédio, e nomeadamente sobre a sua descrita parcela de terreno; d) a retirarem do prédio dos Autores tudo o que ali colocaram, nomeadamente lenhas e lixos, bem como abster-se de ali depositar quaisquer outras lenhas ou quaisquer outros pertences; e) a absterem-se de entupir ou por qualquer forma impedir a normal circulação da água no aqueduto que atravessa o prédio dos Autores na parcela de terreno em causa; f) a pagar aos autores uma indemnização pelos prejuízos causados quer pela ocupação da parcela de terreno quer pela tapagem do rego de água, a liquidar em execução de sentença. Alegaram, em síntese, factos integradores do seu domínio (aquisição originária e derivada e, ainda, presunção decorrente do registo) e usufruto (escritura de doação de fls. 16-24) sobre o prédio descrito em 1º da petição ( Campo..., sito no..., freguesia de...,..., descrito na Conservatória sob o nº 00638/001222, com inscrição da aquisição a favor dos primeiros autores e de usufruto a favor da autora D... e marido G... (certidão de fls. 10-13). Nos últimos meses, os réus têm tentado apropriar-se de uma parcela de terreno que é parte integrante daquele prédio, situada na parte mais a norte/nascente de tal prédio, parcela essa que tem a forma aproximadamente triangular, com cerca de 30 m2 de área, onde os demandados têm vindo a depositar lenhas e lixos, sem autorização dos demandantes, impedindo, desse modo, a entrada e saída do prédio dos autores, desde e para o caminho público, impedindo assim o escoamento dos produtos agrícolas, nomeadamente uvas ali produzidas bem como do milho. Acresce, alegam ainda, que existe um rego para condução de água, o qual acompanha parte do caminho público e que entra no prédio dos autores, atravessando a dita parcela de terreno e 11

servindo de aqueduto de uma água que se destina quer ao prédio dos autores quer ao prédio dos Réus. Em dia não apurado do mês de Abril de 2001, os Réus decidiram entupir o talhadouro existente na parcela de terreno em causa, no local onde o aqueduto se bifurca, cortando, assim, a possibilidade de a água circular, fazendo-a transbordar e provocando a destruição parcial do rego e a destruição parcial da borda do prédio dos autores que ladeia o caminho, que se encontra num nível mais elevado, seis calços do prédio dos autores. Com a sua conduta intencional, os demandados causam prejuízos aos demandantes que não é possível quantificar desde já. Após tentativas de citação dos réus e os autores terem vindo aos autos pedir a rectificação do nome do réu marido (E... e não H...), foram os demandados citados, por via postal, em 20/12/2001 (fls. 51 a 56). Apresentaram contestação/reconvenção, em 05/02/2002. * Por despacho de fls. 68, o julgador da 1ª instância considerou e decidiu que: A presente acção declarativa segue a forma sumária. Assim, de acordo com o art. 783 CPC, é de 20 dias o prazo da contestação. Os RR. nos autos foram citados para a causa em 20.12.01, conforme resulta de fls.53 e 54. Desta forma, descontado o período de férias judiciais, apura-se que o prazo de oferecimento da contestação terminou a 28.01.02, já contando a dilação a que alude o artº. 252 -A, n.1, al. a) CPC. Ora, a contestação oferecida nos autos deu entrada em juízo a 5.2.02, em momento no qual, de acordo com o arto.145, n.3 CPC, já se havia ex tinto o direito de a parte praticar o acto. Nesta conformidade, por extemporâneo determina-se o desentranhamento dos autos do articulado em apreço, bem como a respectiva remessa à parte, após trânsito desta decisão. Inconformados, os réus agravaram daquele despacho, tendo concluído, nas suas alegações de recurso: 1- Verifica-se dos elementos constantes dos autos e dos documentos juntos com estas alegações que foi depositada na caixa de correio dos agravantes, em 07.12.01, uma carta remetida por este Tribunal dirigida a H... 2- Que a petição que a mesma continha identificava como RR. este H... e F.... 3- Os RR. outorgaram procuração à sua mandatária em 18.12.01 que se encontra junta à contestação. 4- E requereram o registo do seu prédio contíguo ao dos AA. em 27.12.01. 5- Face ao teor da petição e da contestação resulta ainda que os RR. identificaram o teor da petição que receberam. 6- Dos factos alegados e constantes dos autos é legítima a atitude dos agravantes de se darem 12

por citados com a carta depositada na sua caixa de correio, por o assunto lhes dizer respeito e por ser mínima a divergência com o nome do R. marido. 7- Devendo ser considerada como tal essa data e forma de citação. Não houve resposta às alegações. ** Nos termos do estatuído no artº. 784º, do CPC, foi proferida sentença, decidindo-se julgar a presente acção procedente e em conformidade, reconhecem-se os Autores como proprietários do prédio identificado no artigo 1º da petição inicial e que a parcela de terreno com a área de cerca de 30 m2 e com a forma aproximadamente triangular faz parte integrante dessa prédio e condenam-se os Réus a reconhecerem tais direitos dos Autores e a: a) absterem-se de violar o direito de propriedade bem como o direito de usufruto dos Autores sobre o seu prédio, e nomeadamente sobre a sua descrita parcela de terreno; b) a retirar do prédio dos Autores tudo o que ali colocaram, nomeadamente lenhas e lixos, bem como Zabster-se de ali depositar quaisquer outras lenhas ou quaisquer outros pertences; c) a absterem-se de entupir ou por qualquer forma impedir a normal circulação da água no aqueduto que atravessa o prédio dos Autores na parcela de terreno em causa; d) e a pagarem aos autores uma indemnização pelos prejuízos causados quer pela ocupação da parcela de terreno quer pela tapagem do rego de água, a liquidar em execução de sentença. Custas pelos Réus. ** Inconformados, os demandados apelaram da sentença, tendo, nas suas alegações, formulado as seguintes conclusões: 1- Com a presente apelação pretendem os recorrentes, nos termos do arts. 735, nº1 e 710, ambos do C.P.C., fazer subir e que seja julgado o recurso de agravo, interposto do despacho que ordenou o desentranhamento da contestação. 2- Estando alegado e provado por documentos autênticos que a autora D... é titular, em conjunto com seu marido, do usufruto do prédio identificado na petição pelos autores, não pode esta, desacompanhada daquele, intervir na acção e formular os pedidos constantes das alíneas b) a f). 3- Na sentença proferida e porque dispunha de todos os elementos necessários a conhecer dessa questão, devia ter sido declarada a autora D... parte ilegítima, e os RR. absolvidos da instância quanto aos pedidos na parte em que fossem por ela formulados. 4- Não o tendo sido foram violadas as normas dos arts. 28-A do C.P.C. e 1440 do C.Civil. 5- Por outro lado aqueles pedidos são formulados indistintamente por todos os AA. sem discriminação dos interesses de uns ou outros, consoante a qualidade de proprietários ou 13

usufrutuários. 6- Formulados desse modo, e desacompanhados do usufrutuário, verifica-se também a ilegitimidade dos demais autores, para a acção, no que diz respeito aos pedidos das referidas alíneas b) a f), tendo sido violada a norma legal do art. 1440 do C.C.. 7- Também o pedido de condenação dos RR. no pagamento de prejuízos alegadamente causados aos autores não comporta os requisitos para ser julgado procedente. 8- Existindo um direito de usufruto sobre o identificado prédio a favor da autora D... e marido, serão eles os prejudicados com a actuação dos réus, a ter existido tal actuação e a ser injustificada. 9- Consistindo o usufruto no direito de gozar temporária e plenamente uma coisa ou direito, sem alterar a sua forma ou substância, são os usufrutuários que retiram do prédio os proveitos e suportam também os respectivos encargos. 10- Por isso, a ter havido prejuízos, eles reflectiram-se na esfera jurídica os usufrutuários e não dos proprietários da raiz, pelo que só aqueles têm legitimidade para pedir o ressarcimento. 11- Não tendo em conta a titularidade do usufruto foram violadas as normas dos arts. 1439 e 483 do C.C. e ainda 26, nº 1 do C.P.C.. 12- E se algum prejuízo específico existisse na esfera jurídica dos proprietários, então deveriam os autores ter discriminado os prejuízos de uns e outros, definindo a titularidade dos respectivos direitos. 13- Não o tendo feito, deve tal pedido ser julgado improcedente e os RR. dele absolvidos. Não houve resposta às alegações. ** O julgador a quo sustentou o agravo. ** Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. 2- FUNDAMENTAÇÃO 2.1- OS FACTOS Consideram-se provados os factos descritos na petição inicial, parcialmente referidos no relatório, para a qual remetemos (arts. 463º, nº 1, 484º, nº 1, 713º, nº 6, e 784º, do CPC). 2.2- O DIREITO O objecto do recurso é balizado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de 14

conhecimento oficioso - arts. 684º, nº 3, e 690º, nº 1 e 3, do C.P.Civil. Nos termos do estatuído no artº 710º, do CPC, cumpre conhecer, antes de mais, do agravo interposto, que "só são providos quando a infracção cometida tenha influído no exame ou decisão da causa ou quando, independentemente da decisão do litígio, o provimento tenha interesse para o agravante" (nº 2, do citado normativo). Agravo De referir, antes de mais que os agravantes não indicam, como é devido (artº. 690º, nº 2, al. a), do CPC), quais as normas jurídicas violadas. Vejamos, de todo o modo. Na petição inicial, os autores começam por identificar o réu marido como H... Tentada, inicialmente, a citação da pessoa com esse nome, como residindo na Suíça, foi junto aos autos (fls. 47) um AR, com data de 11/12/2001, com a assinatura no lugar reservado ao destinatário, do seguinte teor H.... Foi ainda citado por via postal simples em 07/12/01 (fls. 45-46). Após a rectificação do nome do réu marido, requerida pelos autores, os réus foram regularmente citados, por via postal registada, em 20/12/01, tendo apresentado a sua contestação/reconvenção em 05/02/02. Resulta da lei processual civil que, em processo sumário, a contestação deve ser deduzida no prazo de 20 dias. Na citação por via postal registada acresce uma dilação de 5 dias, quando realizada em pessoa diversa do réu, como sucedeu no caso em apreço (artº 252º-A, nº 1, al. a), do CPC). Na citação por via postal simples a dilação é de 30 dias (artº 252º-A, nº 3, do CPC). Referem os agravantes que a carta de citação inicialmente enviada (via postal simples) em nome de H... (fls. 46) foi depositada na caixa de correio daqueles, que a abriram, considerando que eram os mesmos os verdadeiros destinatários da citação porquanto o nome da ré mulher estava correctamente indicado e o litígio lhes dizia respeito e não ao H..., ausente na Suíça. Considerou-se, assim, o réu citado, nessa data (07/12/2001), por via postal simples, para a acção. Não nos parece aceitável o raciocínio dos agravantes. Com efeito, dúvidas não restam que houve erro na identificação do réu marido na petição. Corrigido esse erro, determinou-se a citação por via postal registada, o que se efectuou (fls. 50 a 56). É esta a citação que releva no processo (arts. 228º, nº 1, 467º, nº 1, al a), do CPC) e não a efectuada, por via postal simples, em nome de outra pessoa que não o réu marido, pese embora este possa ter percebido o eventual engano na identificação do sujeito passivo na citação efectuada em nome de H... Com a citação dos réus, já correctamente identificados, em 20/12/2001, por via postal simples, 15

ficaram estes expressamente advertidos do prazo legal da contestação e bem assim da dilação (5 dias). Deste modo, a mais elementar prudência impunha que os réus atendessem ao prazo fixado na citação efectuada em 20/12/01, que terminou em 28/01/2002, e não ao resultante da hipotética citação de 07/12/2001. A contestação/reconvenção, de 05/02/2002, foi apresentada fora de prazo, quando já se extinguira o direito dos réus de praticarem esse acto processual (artº 145º, nº 3, do CPC). O despacho recorrido não merece censura. Improcedem, assim, as conclusões do agravo. Apelação No entender dos apelantes estando alegado e provado por documentos autênticos que a autora D... é titular, em conjunto com seu marido, do usufruto do prédio identificado na petição pelos autores, não pode esta, desacompanhada daquele, intervir na acção e formular os pedidos constantes das alíneas b) a f). Concluem, ainda, os recorrentes que aqueles pedidos são formulados indistintamente por todos os AA. sem discriminação dos interesses de uns ou outros, consoante a qualidade de proprietários ou usufrutuários, pelo que formulados desse modo, e desacompanhados do usufrutuário, verifica-se também a ilegitimidade dos demais autores, para a acção, no que diz respeito aos pedidos das referidas alíneas b) a f), tendo sido violada a norma legal do art. 1440º, do CC. Vejamos. No artº 26º, do CPC, é-nos dado o conceito de legitimidade processual: o autor é parte legítima quando tem interesse em demandar, o qual se exprime pela utilidade derivada da procedência da acção. A legitimidade deve aferir-se pela titularidade da relação material controvertida, tal como a configura o autor. Como é sabido, na última revisão do CPC (DL nº 329-A/95, de 12/12, e nº 180/96, de 25/09), o legislador veio consagrar, na redacção dada ao artº 26º, a tese do Prof. Barbosa de Magalhães, no sentido de que a legitimidade deve ser analisada pela titularidade da relação material controvertida, tal como configurada pelo autor. Assim, a ilegitimidade de qualquer das partes apenas ocorrerá quando em juízo se não encontrar o titular da alegada relação material controvertida ou quando legalmente não for permitida a titularidade daquela relação. A legitimidade deve ser referida à relação jurídica objecto do litígio, determinando-se através da análise dos fundamentos da acção e qual a posição das partes relativamente a esses fundamentos. A legitimidade deve aferir-se pela posição das partes na relação material conforme é apresentada pelo autor, com abstracção da procedência ou não do pedido, que só num momento posterior será apreciado. Por outro lado, preceitua o artº 28º-A, nº 1, do CPC, que devem ser propostas por marido e mulher, ou por um deles com o consentimento do outro, as acções de que possa resultar a perda de direitos que só por ambos ser exercidos. 16

Mostra-se alegado e provado, além do mais, que o prédio denominado Campo..., sito no..., freguesia de...,..., está descrito na Conservatória sob o nº 00638/001222, com inscrição da aquisição a favor dos primeiros autores e do usufruto a favor da autora D... e marido G... (certidão de fls. 10-13). Existe, pois, um direito de usufruto simultâneo do casal D... e G..., constituído contratualmente (arts. 1439º, 1440º e 1441º, do CC). Ora, tal como a acção está configurada e considerando o objecto do processo, a eventual improcedência do pedido teria como consequência um resultado equivalente à perda daqueles direitos (propriedade e usufruto) relativamente à parcela de terreno em causa, pelo que, em princípio, se afiguraria necessária a intervenção do co-usufrutuário marido da autora, nos termos do estatuído no citado normativo (artº 28º-A, do CPC). Com efeito, os autores reivindicam a propriedade e invocam um direito de usufruto sobre um prédio rústico, incluindo uma parcela de 30 m2, direitos esses alegadamente violados pelos réus. Salvo melhor opinião, a propositura da acção pela autora co-usufrutuária, nos termos que se deixaram referidos, constitui um acto de administração extraordinária (artº 1678º, nº 3, do CC), que pode conduzir a um resultado equivalente à perda do usufruto relativamente à aludida parcela de terreno. Haveria, pois, preterição de litisconsórcio necessário, excepção dilatória que, como tal, obsta ao conhecimento do mérito da causa e que, pese embora não tenha existido oportuna contestação, importaria sanar, de acordo com o disposto nos arts. 265º, nº 2, e 288º, nº 3, 1ª parte, do CPC. Porém, com a revisão da lei processual civil operada através da publicação dos DL nºs 329- A/95, de 12/12 e 180/96, de 25/09, acentuou-se a prevalência do fundo sobre a forma, privilegiando-se a decisão de mérito sobre a decisão baseada em questões processuais. O estatuído na 2ª parte do nº 3, do artº 288º, do CPC, reflecte a preocupação do legislador no tocante à referida prevalência da decisão de fundo: exclui-se a absolvição da instância nos casos em que a falta do pressuposto processual (v. g. a ilegitimidade activa), quando este se destina à tutela do interesse de uma das partes, nenhum outro motivo obste a que se conheça do mérito da causa e a decisão deva ser inteiramente favorável a essa parte. Ora, no caso em apreço, uma vez que não há contestação, estão provados os factos articulados na petição, matéria essa conducente à integral procedência da acção, reconhecendo-se, além do mais, a propriedade dos primeiros autores e o usufruto da autora D... sobre o referido prédio rústico, incluindo a parcela com 30 m2. Por outro lado, parece-nos manifesto que o pressuposto processual a que se refere o artº 28º- A, nº 1, do CPC, se destina à tutela do interesse do autor. Não se justifica, assim, a absolvição da instância dos réus com base na ilegitimidade activa, por preterição litisconsórcio necessário (arts. 28º-A, nº 1, 288º, nº 1, al. d), 493º, nº 2, e 494º, al. e), do CPC) ou a remessa dos autos à 1ª instância a fim de sanar-se o aludido pressuposto processual (artº 265º, nº 2, do CPC) ou, ainda, aguardar que a parte utilizasse a faculdade 17

concedida no nº 1, do artº 269º, do CPC. Até por uma questão de economia processual, princípio que impõe que o resultado processual deve ser atingido com a maior economia de meios, a qual exige que cada processo resolva o maior número possível de litígios (M. Andrade, Noções Elementares Processo Civil, p. 386, e J. Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, 1996, p. 163). Por outro lado, no referente aos pedidos formulados nas alíneas b) a f), ao contrário da tese dos apelantes, entendemos que os mesmos têm legitimidade processual. Na verdade, tendo presente a factualidade alegada e que, como se deixou mencionado, a legitimidade deve ser referida à relação jurídica objecto do litígio, determinando-se através da análise dos fundamentos da acção e qual a posição das partes relativamente a esses fundamentos, qualquer das partes, e concretamente aqueles autores, têm legitimidade. Os autores, enquanto proprietários da raiz do prédio e do usufruto, têm óbvio interesse em demandarem os réus e estes evidente interesse em contradizer, interesse directo, positivo, na (im)procedência da acção (artº 26º, do CPC). O conteúdo do direito de propriedade está definido no artº 1305º, do CC. O usufrutuário tem o direito (real) de gozar temporária e plenamente da coisa ou direito alheio, sem alterar a sua forma ou substância (artº 1439º, do CC). Os factos alegados e provados, imputados aos réus, podem implicar danos simultaneamente para o proprietário da raiz e para o titular do usufruto ao diminuírem ou impedirem o uso e fruição do usufrutuário (artº 1446º, do CC) e, bem assim, ao poderem alterar a forma e substância da coisa ou o seu destino económico, afectando, também, o conteúdo do direito de propriedade do titular da raiz. Verifica-se, pois, a legitimidade activa dos autores (artº 26º, do CPC). De todo o modo, em sede de liquidação de sentença, será possível discernir, com maior segurança, quais os danos que afectam simultaneamente os proprietários da raiz e os titulares do usufruto ou apenas alguns deles (artº 661º, nº 2, e 664º, do CPC). Deste modo, não se afigura, a nosso ver, processualmente relevante a falta de discriminação dos prejuízos causados pelos demandados aos autores enquanto titulares de diferentes direitos sobre o mencionado prédio rústico. Deste modo, em face da matéria de facto assente, provando os autores os factos (ver 1º a 27º da petição) integradores da posse conducente à usucapião e, assim, o seu domínio (aquisição originária e também a derivada e, ainda, a inscrição no Registo Predial do prédio a seu favor artº 7º, do C.R.Predial), bem como o usufruto sobre o prédio em causa, incluindo a parcela de terreno com 30 m2, como lhes competia (arts. 342º, nº 1, 1251º, 1258º a 1263º, 1268º, 1287º, 1294º, 1316º, 1439º e 1440º, do C. Civil), nesta acção real (reivindicação e usufruto), a conduta culposa e ilícita dos réus, pois que não demonstraram que a sua ocupação era legítima, impõese a condenação dos demandados a restituírem ou a absterem-se de ocupar a parcela de terreno em causa e bem assim a respeitarem os direitos reais dos autores e, ainda, a indemnizarem (responsabilidade civil extracontratual) os demandantes pelos prejuízos causados (arts. 483º, nº 1, 487º, 1311º, 1315º, 1439º e 1446º, do CC). 18

Improcedem, assim, todas as conclusões do recurso da apelante. 3- DECISÃO Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal em negar provimento ao agravo e julgar improcedente a apelação, confirmando-se as decisões recorridas. Custas pelos agravantes/apelantes. Porto, 10 de Maio de 2004 Manuel José Caimoto Jácome Carlos Alberto Macedo Domingues José António Sousa Lameira 19

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto Nº Convencional: JTRP00038428 Relator: MARQUES DE CASTILHO Descritores: TÍTULO EXECUTIVO LIVRANÇA PACTO DE PREENCHIMENTO Nº do Documento: RP200510180520292 Data do Acordão: 18-10-2005 Votação: UNANIMIDADE Meio Processual: AGRAVO. Decisão: PROVIDO. Sumário: Na acção executiva, a alegação e prova dos factos respeitantes ao preenchimento abusivo da letra ou livrança deve ser feita nos embargos de executado. Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto Relatório B... e mulher C... deduziram embargos de executado contra D..., SA por apenso ao processo de execução que lhes foi movido por esta entidade bancária com base numa livrança que referem foi entregue contendo apenas as assinaturas dos embargantes tendo tudo o resto, nomeadamente o montante, data de emissão e vencimento foram preenchidos pelo embargante a qual lhe foi entregue para garantia do pagamento de obrigações emergentes de um contrato de empréstimo sob a forma de crédito pessoal o que se prova por documento devendo por tal juntar o mesmo aos autos o que se torna essencial para conhecer do direito do embargado sendo abusivo o preenchimento da livrança. O Mmº Juiz do Tribunal a quo proferiu despacho no qual considerando que no caso não foi invocado nenhum dos fundamentos consignados nos artigos 813º a 815º do Código Processo Civil, como serão todas as outras disposições legais infra citadas de que se não faça menção especial designadamente porque não invocaram nem provaram nenhum dos factos concretos susceptíveis de modificar, impedir ou extinguir o direito da embargada nos termos do artigo 817º alíneas b) e c) rejeitou os mesmos. Inconformados vieram os executados interpor tempestivamente recurso que foi admitido e qualificado como de apelação tendo neste Tribunal se ordenado após notificação a rectificação de tal qualificação como de agravo na conformidade do disposto no artigo 234-A nº2. Nas alegações oportunamente apresentadas veio o Recorrente aduzir a seguinte matéria 20

conclusiva que se passa a reproduzir: 1.ª Os Recorrentes em 9/01/2004 deduziram embargos de executado à execução que lhes foi movida pela Recorrida. 2.ª Como fundamento dos embargos deduzidos os Recorrentes alegaram que a execução se baseava numa livrança; essa livrança foi entregue à Recorrida como garantia do pagamento das obrigações de um contrato de empréstimo sob a forma de crédito pessoal; essa livrança foi entregue à Recorrida contendo apenas as assinaturas dos Recorrentes, e que tudo o resto não foi por eles preenchido. Alegaram que o preenchimento da livrança era abusivo. Alegaram, também, que a Recorrida não referiu quando é que se verificou o incumprimento do aludido contrato, nem quando é que se procedeu à resolução do mesmo, bem como quando comunicou aos Recorrentes que se iria proceder ao preenchimento da livrança. Tendo os Recorrentes requerido que a Recorrida juntasse aos autos cópia do contrato de empréstimo, cópia do documento comprovativo da resolução do contrato e sua comunicação aos Recorrentes, bem como cópia do pacto de preenchimento. Sendo que, só em face desses elementos, no seu entender essenciais, poderiam tomar posição mais detalhada. 3.ª Por despacho proferido a fls., e de que ora se recorre, os embargos de executado deduzidos pelos Recorrentes não foram recebidos. 4.ª Isto porque, inter alia, não foram invocados nenhum dos fundamentos consignados nos artigos 813º e 815º do C.P.C.. 5.ª Ora, dispõe o artigo 815º do C.PC. que "Se a execução não se basear em sentença, além dos fundamentos de oposição especificados no artigo 813º, na parte em que sejam aplicáveis, podem alegar-se quaisquer outros que seria lícito deduzir como defesa no processo de declaração." 6.ª Deste modo, no caso presente, o título que serviu de base à execução foi uma livrança. Tendo os Recorrentes alegado que a livrança dada à execução foi entregue à Recorrida como garantia do cumprimento de um contrato de empréstimo. Alegaram que essa livrança foi entregue contendo apenas e tão só as assinaturas dos Recorrentes, sendo que tudo o demais foi preenchido pela Recorrida. Sendo que o seu preenchimento era abusivo. Alegaram que a Recorrida não referiu quando é que se verificou o incumprimento do contrato de que a livrança era garante, nem quando se procedeu à resolução do mesmo, bem como quando foi comunicado aos Recorrentes que se iria proceder ao preenchimento da livrança e requereram que a Recorrida juntasse aos autos cópias do contrato de empréstimo, pacto de preenchimento e comunicação da resolução do contrato, pois são elementos essências e só em face deles poderiam tomar posição mais detalhada. 7.ª Assim sendo, e ressalvado o muito respeito devido por melhor opinião, entendem os Recorrentes que os fundamentos que invocaram são lícitos, e, nos termos do artigo 815º do C.P.C. os embargas que deduziram deveriam ter sido recebidos. 8.ª Pelo que, ao não receber os embargos o Meritíssimo Juiz "a quo" violou o disposto no referido artigo 815º do C.P.C., e, consequentemente, deve o despacho sob recurso ser revogado e substituído por outro que receba os embargos, seguindo-se os ulteriores termos. 21