A POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO NOME DE TRANSEXUAL NÃO SUBMETIDO À CIRURGIA DE TRANSGENITALISMO Ricardo Rafael Garcia de Carvalho 1 Tasmane de Carvalho Gonzaga Pereira da Silva 2 Palavras-chave: Alteração de Nome. Nome Civil. Cirurgia de Transgenitalismo. Mudança de Nome. 1 INTRODUÇÃO O presente artigo tem como objetivo discutir a possibilidade de alteração do prenome de transexual não submetido à cirurgia de transgenitalismo. O artigo 16 do Código Civil Brasileiro garantiu o direito ao nome a todos os indivíduos. Contudo, no sistema jurídico brasileiro, adota-se o princípio da imutabilidade relativa do nome, sendo que conforme disposto no artigo 57 da Lei 6.015/73, é possível pleitear a possibilidade de alteração do nome, desde que motivadamente. No que se refere aos transexuais, não há nenhuma norma específica que se disponha acerca da possibilidade de alteração do nome no caso dos transexuais, mas, o Superior Tribunal de Justiça, julgou em Recurso Especial (REsp 1008398/SP) garantiu a possibilidade de alteração do nome, de paciente submetido à cirurgia de transgenitalismo. Em decorrência disso, cabe analisar a possibilidade de alteração do nome nos casos em que o paciente não foi submetido à realização da cirurgia. A partir do exposto, tem-se que o nome de registro não faz relação à identidade social e psicológica do indivíduo, de modo que a manutenção do nome de registro viola o princípio da dignidade da pessoa humana. Assim, pretende-se discutir acerca da possibilidade de alteração do nome de transexual, ainda que não submetido à cirurgia, no sentido de se garantir o direito à identidade pessoal, para tanto, será realizado um levantamento jurisprudencial junto aos Tribunais, no sentido de verificar como é a discussão do tema no âmbito jurídico. 1 Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Unidade São Gabriel. Graduando em Ciências do Estado pela Universidade Federal de Minas Gerais. 2 Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Unidade São Gabriel. Pós- Graduanda em Direito do Trabalho pela mesma Instituição.
2 O NOME CIVIL Toda pessoa tem direito ao nome, sendo um dos mais importantes atributos da personalidade, por ser o identificador principal do ser humano, sendo certa e incontroversa a importância de cada pessoa ser identificada socialmente, individualizando-se em relação às demais. O Código Civil Brasileiro de 2002 prevê o nome incluído no capítulo que se refere aos direitos da personalidade, e a proteção ao nome decorre da importância de e garantir a individualização da pessoa em âmbito social, no sentido de que o nome tem o caráter de identificar e diferenciar cada indivíduo perante a sociedade. Nesse aspecto, explica FARIAS: O nome civil é o sinal exterior pelo qual são reconhecidas e designadas as pessoas, no seio familiar e social. (...) O nome é direito da personalidade (e não direito de propriedade, como já quis afirmar doutrinariamente), pois toda e qualquer pessoa natural ou jurídica tem direito à identificação. (2014, p.269). O nome civil é o sinal exterior pelo qual são reconhecidas e designadas as pessoas, no seio familiar e social. É o elemento designativo da pessoa, sendo elemento individualizador, seja a pessoa física ou jurídica, designando e distinguindo todo o sujeito na sociedade civil. Reconhecido o nome como direito da personalidade, impõe-se, outrossim, detectar algumas de suas características mais relevantes. Assim, o direito o nome civil é: absoluto, obrigatório, indisponível, exclusivo, imprescritível, inalienável, incessível, inexpropriável, irrenunciável e intransmissível. Em razão da proteção jurídica ao nome, o mesmo é dotado das mesmas garantias que os direitos da personalidade, conforme previsto no Código Civil: Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária Art. 16. Toda pessoa tem direito ao nome, nele compreendidos o prenome e o sobrenome. O nome é próprio de cada pessoa, servindo para distingui-la de membros da própria família, sendo livremente escolhido pelos pais e averbado ao registro público. Além disso, o nome compreende o prenome e o sobrenome.
Conforme exposto no Art. 16, encontra-se o direito ao nome em seu aspecto individual, conforme explica VENOSA (2002): O nome atribuído à pessoa é um dos principais direitos incluídos na categoria de direitos personalíssimos ou da personalidade. A importância do nome para a pessoa natural situa-se no mesmo plano de seu estado, de sua capacidade civil e dos demais direitos inerentes à personalidade. (...) Assim, pelo lado do Direito Público, o Estado encontra no nome fator de estabilidade e segurança para identificar as pessoas; pelo lado do direito privado, o nome é essencial para o exercício regular dos direitos e do cumprimento das obrigações. Tendo em vista essa importância, o Estado vela pela relativa permanência do nome, permitindo que apenas sob determinadas condições seja alterado. O nome, destarte é um dos meios pelos quais o indivíduo pode firmar-se na sociedade e distinguir-se dos demais. Assim, a respeito do aspecto privado do nome compreende-se na manifestação de uso e proteção daquele que violar o nome de outrem. E no que diz respeito ao aspecto público, compreende-se que o direito ao nome decorre do registro da pessoa natural. Com a finalidade de respeitar e buscar a garantia do nome no seu aspecto privado, os registros públicos servem como modo de fazer prova a terceiro e individualizar o cidadão junto à sociedade, de modo que em respeito à segurança jurídica, o nome deve ser a princípio, imutável. 2.1 O Princípio da Inalterabilidade do Nome Em que pese a segurança jurídica dos registros públicos, não se pode afirmar que o nome será sempre imutável, de modo a defender a imutabilidade relativa, compreendendo-se que, por estar intimamente ligado à identidade da pessoa, permitindo sua identificação no meio social, o nome civil somente pode ser alterado em circunstâncias excepcionais, com justa motivação e desde que não imponha prejuízos para terceiros, conforme art. 58 da Lei de Registros Públicos. Embora o princípio da inalterabilidade do nome seja de ordem pública, sofre algumas exceções, por exemplo, quando: expuser ao ridículo, erro gráfico evidente, adoção, embaraços no setor eleitoral, comercial; Sendo que a o princípio da inalterabilidade do nome deve ser afastado apenas nos casos de necessidade comprovada, e não por mero capricho do requerente.
A jurisprudência já vinha admitindo a substituição do prenome oficial pelo prenome de uso. Se a pessoa é conhecida de todos por prenome diverso do que consta de seu registro, a alteração pode ser requerida em juízo, pois prenome imutável, segundo os tribunais, é aquele que foi posto em uso e não o que consta do registro [...] Atualmente, portanto, o prenome oficial tanto pode ser substituído, conforme o caso, por apelido popular, na forma dos exemplos citados e de acordo coma lei, como por outro prenome, pelo qual a pessoa é conhecida no meio social em que vive, com base no permissivo criado pela jurisprudência. (GONÇALVES, 2012. p.156). Assim, embora o nome não possa ser alterado ao simples arbítrio de seu portador, outros acontecimentos o justificam, havendo previsão neste sentido na legislação vigente, conforme será analisado no tópico seguinte. 2.2 A Lei n. 6.015 de 31 de Dezembro de 1973 A Lei n. 6.015/73 busca dispor a respeito do registro público, sendo que em seu conteúdo regula hipóteses em que se permite a alteração do nome. Conforme disposto na Lei de Registros Públicos: Art. 56. O interessado, no primeiro ano após ter atingido a maioridade civil, poderá, pessoalmente ou por procurador bastante, alterar o nome, desde que não prejudique os apelidos de família, averbando-se a alteração que será publicada pela imprensa Art. 57. A alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz a que estiver sujeito o registro, arquivando-se o mandado e publicando-se a alteração pela imprensa, ressalvada a hipótese do art. 110 desta Lei. Art. 58. O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos públicos notórios Com justificativa nos artigos supracitados, é possível pleitear pela alteração do nome, devendo ser averbada a alteração nos assentos de nascimento, a fim de se garantir direitos de terceiro. Contudo, conforme se verifica, os artigos não podem ser identificados de modo taxativo, uma vez que nos termos do Art. 57, estabelece que a alteração posterior deverá ser por exceção e motivadamente. 3 A POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO PRENOME DE TRANSEXUAL O transexual é considerado como uma pessoa que recusa o gênero biológico, pois se identifica psicologicamente com o sexo oposto. Em outros termos, a pessoa nasceu biologicamente de um gênero, mas psicologicamente sua identidade de gênero se adequa àquele distinto do gênero biológico.
Nesse sentido, o transexual quando do seu nascimento, é registrado com o nome de acordo com seu gênero biológico, mas efetivamente, não se identifica com esse gênero. Compreendendo o nome como extensão da personalidade, consequentemente, o transexual não se identifica também com o nome uma vez que difere de sua identidade de gênero. Na análise da Lei de Registros Públicos, não se encontram dispositivos específicos para a alteração de nome no caso de transexuais, contudo, conforme exposto em momento oportuno, o Art. 57 deve ser compreendido de modo exemplificativo, ou seja, entende-se que é possível a alteração desde que de modo motivado. Data venia às críticas decorrentes da patologização do transexualismo, o reconhecimento de conceitos consubstanciados nesse sentido podem auxiliar a compreensão do tema e a garantia de determinados direitos perante o Poder Judiciário. Nesse aspecto, o transexualismo consiste em uma desconformidade entre o sexo físico e o sexo psíquico, reconhecendo a Resolução nº 1.955/2010 do Conselho Federal de Medicina "ser o paciente transexual portador de desvio psicológico permanente de identidade sexual, com rejeição do fenótipo e tendência à automutilação e/ou autoextermínio". Outrossim, segundo a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, o transexualismo: [...] trata-se de um desejo de viver e ser aceito enquanto pessoa do sexo oposto. Este desejo se acompanha em geral de um sentimento de mal estar ou de inadaptação por referência a seu próprio sexo anatômico e do desejo de submeter-se a uma intervenção cirúrgica ou a um tratamento hormonal a fim de tornar seu corpo tão conforme quanto possível ao sexo desejado (CID-10, F 64.0). O Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a possibilidade de alteração dos registros públicos no que se refere à alteração de gênero e sexo de indivíduo comprovadamente transexual, no julgamento do REsp 1008398/SP, entendendo pela possibilidade de alteração do prenome, assim como do designativo de sexo, em favor de transexual que havia se submetido à cirurgia de transgenitalismo, conforme verifica-se da ementa destacada: Direito civil. Recurso especial. Transexual submetido à cirurgia de redesignação sexual. Alteração do prenome e designativo de sexo. Princípio da dignidade da pessoa humana. Contudo, existem situações em que ainda que o procedimento cirúrgico de transgenitalização seja fornecido pelo Sistema Único de Saúde, o indivíduo por razões pessoais não tem interesses de se submeter a esse procedimento. Tal fato, não pode
descaracterizá-lo como transexual, uma vez que a transexualidade não pode ser restringida àqueles que se submetem ao procedimento cirúrgico. Importante destacar que o transexual tem seu direito de personalidade violado conquanto, seu prenome não se adequa à identidade de gênero e não se pode atrelar a alteração do prenome ao procedimento cirúrgico de redesignação sexual, ou mesmo, exigir que um indivíduo se submeta a um procedimento tão incisivo, para ter sua dignidade alcançada. Senão vejamos, a Constituição da República Federativa do Brasil, dispõe: Art.5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) III. ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante. Além disso, o Art.1º, III da CR/88 dispõe como fundamento da República Federativa do Brasil o princípio da dignidade da pessoa humana, e por esse mesmo motivo, deve ser compreendido como norma de aplicação imediata. Por esse aspecto, o Estado não pode obrigar que uma pessoa se submeta a um procedimento a fim de que seja garantido um direito. Ademais, é preciso que as decisões judiciais sejam pautadas com base nas interpretações dos princípios constitucionais. A respeito disso, fala-se atualmente em constitucionalização do direito civil, no sentido de que os direitos fundamentais e constitucionais devem ser aplicados e verificados também na esfera do direito privado, senão vejamos: Como consequência lógica e natural da constitucionalização do Direito Civil - e, de resto do Direito Privado como um todo decorre o reconhecimento da induvidosa aplicação dos direitos fundamentais mesmo nas relações estritamente privadas. É que os direitos fundamentais constituem garantias constitucionais universais (e cláusula pétrea), motivo pelo qual não se pode pretender represa-los somente nas relações de direito público. Até mesmo porque tal equívoco interpretativo implicaria em caracterizar o Direito Civil como um ramo da ciência jurídica, estranhamente liberto da incidência da norma constitucional. (FARIAS, 2014. p.68). Nesse aspecto, entende-se que proibir a alteração de nome do transexual significa violação à dignidade da pessoa humana, um dos valores mais relevantes da ordem jurídica brasileira. Não obstante, ainda há que se defender a possibilidade com base na garantia do direito à identidade. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) ainda não chegou a analisar nenhum caso de alteração de nome pleiteado por pessoa não submetida ao procedimento cirúrgico de
transgenitalização, mas os Tribunais de Justiça têm analisado e divergido quanto ao tema, conforme será analisado no capítulo seguinte. 4 JURISPRUDÊNCIAS Em análise junto aos Tribunais de Justiça dos Estados, delimitando a busca para situações de alteração de nome de transexual não submetido à cirurgia de transgenitalização, com base em pesquisa realizada em Setembro de 2014, encontra-se que apenas os estados da Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Paraíba, Paraná, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo e Sergipe chegaram a apreciar o tema em questão. Na pesquisa realizada, não se contabilizaram os casos em que a decisão de 2º grau se limitava a decidir a respeito de conflito de competência ou a julgar apelação interposta em face de extinção da causa sem resolução do mérito em 1º grau, decidindo ou não pela análise dos autos novamente em 1º grau. Ou seja, foram levados em conta, apenas os acórdãos em que efetivamente se decidiu pela alteração do nome de transexual não submetido à cirurgia de transgenitalização. O levantamento dos dados demonstra que a questão ainda é controversa nos tribunais, de modo que dos 60 (sessenta) julgados analisados, 35 (trinta e cinco) deles reconheceram a possibilidade de alteração do nome. Mais controversa fica a questão, quando se passa a analisar em específico o estado de São Paulo, em que de todas as decisões proferidas nos parâmetros definidos, em 15 (quinze) delas foi reconhecido o direito de alteração do nome, enquanto em outras 18 (dezoito) os desembargadores entenderam pela impossibilidade de alteração do nome. Para tanto, destacam-se algumas jurisprudências analisadas. 0040698-94.2012.8.26.0562 Apelação / Retificação de Nome Relator(a): Carlos Alberto de Salles Comarca: Santos Órgão julgador: 3ª Câmara de Direito Privado Data do julgamento: 24/06/2014 Data de registro: 25/06/2014 Ementa: AÇÃO DE RETIFICAÇÃO DE ASSENTO CIVIL. ALTERAÇÃO DO NOME POR CONTRA DOS CONSTRANGIMENTOS SOFRIDOS EM RAZÃO DO TRANSEXUALISMO. Insurgência contra sentença de improcedência do pedido porque o autor não se submeteu à cirurgia de ablação dos órgãos sexuais masculinos. Desnecessidade. Desconformidade entre sexo biológico e sexo psicológico que pode ser demonstrada por perícia multidisciplinar. Constrangimentos e humilhações que justificam o pedido de alteração do prenome masculino para feminino. Exigência de prévia cirurgia para interromper situações vexatórias constitui violência. Dilação probatória determinada. Sentença anulada
para esse fim. Recurso provido. 0025917-51.2013.8.26.0071 Apelação / Retificação de Nome Relator(a): Luiz Antonio de Godoy Comarca: Bauru Órgão julgador: 1ª Câmara de Direito Privado Data do julgamento: 18/03/2014 Data de registro: 20/03/2014 Ementa: REGISTRO CIVIL Pleito de alteração do prenome e designativo de sexo Modificação condicionada à realização de cirurgia de redesignação sexual, o que, na hipótese, não ocorreu Registros públicos que têm caráter de definitividade, espelhando a realidade Falta de interesse de agir caracterizada Processo extinto sem resolução de mérito Sentença mantida Ausência de violação a dispositivos de lei, bem como a qualquer cânone constitucional Recurso desprovido. 9103308-21.2008.8.26.0000 Apelação / Registro Civil das Pessoas Naturais Relator(a): Ribeiro da Silva Comarca: Araras Órgão julgador: 8ª Câmara de Direito Privado Data do julgamento: 08/02/2012 Data de registro: 10/02/2012 Outros números: 005.67.216460-0 Ementa: Retificação de registro civil Mudança do prenome requerida por transexual - O prenome é sempre imutável, e só em casos excepcionais se admite na jurisprudência e na lei a alteração de prenome e sobrenome. Assim em casos de erro gráfico evidente, quando expõe a pessoa ao ridículo ou no fato de não representar a individualidade de seu portador (artigos 55, único, 57 e 58, caput, da Lei nº 6.015/73, e nos casos de coação ou ameaça a que se referem a Lei de Proteção a testemunhas - O mero capricho de alterar o nome não tem o enquadramento excepcional pretendido na jurisprudência Apelo desprovido (grifo nosso). Processo: Apelação Cível 1.0521.13.010479-2/001 Relator(a): Des.(a) Edilson Fernandes Data de Julgamento: 22/04/2014 Data da publicação da súmula: 07/05/2014 Ementa: EMENTA: RETIFICAÇÃO DE ASSENTO DE NASCIMENTO. ALTERAÇÃO DO NOME E DO SEXO. TRANSEXUAL. INTERESSADO NÃO SUBMETIDO À CIRURGIA DE TRANSGENITALIZAÇÃO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. CONDIÇÕES DA AÇÃO. PRESENÇA. INSTRUÇÃO PROBATÓRIA. AUSÊNCIA. SENTENÇA CASSADA. O reconhecimento judicial do direito dos transexuais à alteração de seu prenome conforme o sentimento que eles têm de si mesmos, ainda que não tenham se submetido à cirurgia de transgenitalização, é medida que se revela em consonância com o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Presentes as condições da ação e afigurando-se indispensável o regular processamento do feito, com instrução probatória exauriente, para a correta solução da presente controvérsia, impõe-se a cassação da sentença.
Sem a intenção de esgotar o tema proposto ou as jurisprudências analisadas, destaca-se que o argumento favorável à alteração do nome justifica-se principalmente com base no reconhecimento de que a procedência do pedido implicará em reconhecimento da dignidade da pessoa humana. Contudo, infelizmente ainda existem julgados como um dos destacados, em que o desembargador entende que a alteração do nome seria por mero capricho do requerente, o que não leva em consideração a dignidade da pessoa humana e a necessidade de adequação do nome à identidade de gênero. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Sabe-se que a sociedade contemporânea é pautada pela diversidade, devendo o direito se adaptar às realidades sociais, sem poder permanecer inerte. Ademais, a compreensão das normas, deve realizar-se não apenas nos limites-objetivo da mesma, mas também com relação aos valores axiológicos dos princípios. O presente artigo buscou demonstrar a importância do nome como fator de individualização e reconhecimento da pessoa na sociedade, bem como de modo não aprofundado identificar o transexual como aquele indivíduo que o gênero biológico não se adequa à identidade de gênero. Pelo exposto, resta demonstrado a importância encontrada na proteção do nome, bem como da adaptação do nome à realidade social, sendo que o próprio ordenamento jurídico brasileiro prevê situações em que a imutabilidade do nome, desde que motivada, pode ser afastada. Conforme fora exposto, deve ser mantido o princípio da inalterabilidade do nome, uma vez que, devemos atentar a não ferir a incolumidade pública, mas os julgadores, ao terem casos de pedidos de alteração do nome, devem tentar não ser tão taxativos e retrógrados, observando fundamentalmente a dignidade da pessoa humana. Assim, reclama-se uma interpretação não exaustiva das hipóteses modificativas de nome, permitindo a sua alteração justificadamente para salvaguardar a dignidade da pessoa humana, de acordo com o caso concreto, a fim de garantir o direito à identidade. O Direito não pode fechar os olhos para a realidade social estabelecida no que concerne à identidade sexual, cuja realização afeta o mais íntimo aspecto da vida privada da
pessoa. Nesse aspecto, destaca-se que em estados como o Rio Grande do Sul e Minas Gerais, de todos os acórdãos analisados, foi conferido ao requerente a possibilidade de alteração do nome, independente de prévia cirurgia de transgenitalização. REFERÊNCIAS BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 29 ed. Malheiros. 2014. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 14 de Novembro de 2014. BRASIL. Lei 6.015, de 31 de Dezembro de 1973. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6015.htm>. Acesso em: 14 de Novembro de 2014. BRASIL. Lei 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 14 de Novembro de 2014. CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. Teoria do Estado e da Constituição. 20 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2013. CID (CID-10, F64.0). Disponível em: <http://www.medicinanet.com.br/cid10/1554/f64_transtornos_da_identidade_sexual.htm> Acesso em 04 de Novembro de 2014. CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Disponível em: <http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2010/1955_2010.htm> Acesso em 04 de Novembro de 2014. DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. V.1. 24 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. FARIAS, Cristiano Chaves de. Curso de Direito Civil. V.1. 12 ed. Salvador: JusPodivm, 2014. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. V.1. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2012. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 30 ed. São Paulo: Atlas, 2014. MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Disponível em: < http://tj-mg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/121148426/apelacao-civel-ac- 10521130104792001-mg/inteiro-teor-121148475> Acesso em 30 de Agosto de 2014.
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