O QUE O CASO GALILEU TEM A ENSINAR SOBRE AS RELAÇÕES ENTRE CIÊNCIA E RELIGIÃO?

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Transcrição:

O QUE O CASO GALILEU TEM A ENSINAR SOBRE AS RELAÇÕES ENTRE CIÊNCIA E RELIGIÃO? What The Galileo Case Has To Teach About The Relationship Between Science And Religion? Wellington Gil Rodrigues 1 Jéssica Renata Ponce de Leon Rodrigues 2 BLACKWELL, Richard J. Science, Religion and Authority: Lessons from the Galileo affair. Marquette University Press, 1998. Em 22 de fevereiro de 1998 durante um evento na Universidade Marquete (Wisconsin EUA) o professor de filosofia Richard J. Blackwell apresentou a palestra Science, Religion and Authority: Lessons from the Galileo affair a qual deu origem ao livro do mesmo nome. O professor Blackwell é autor de várias obras relacionadas à filosofia e à história da ciência e também sobre as relações entre ciência e religião, entre elas A Bibliography of the Philosophy of Science (1983), Galileo, Bellarmine and the Bible (1991) e também traduziu a obra clássica de Tomaso Campanella A Defense of Galileo, the Mathematician from Florence (1994). A obra Science, Religion and Authority: Lessons from the Galileo affair está dividida em cinco partes principais. Na primeira parte, a qual consiste da introdução, Blackwell apresenta as relações entre ciência e religião como uma relação de amor e ódio ao longo da história da civilização ocidental cristã. Ele oferece como exemplo de amor a síntese realizada por Tomás de Aquino entre a teologia cristã e a filosofia aristotélica clássica e como exemplo de ódio os casos Galileu e Darwin. Ele propõe algumas questões bem pertinentes: Por que essa instabilidade no relacionamento entre ciência e religião? Por que as tensões entre ciência e religião são tão persistentes? Por que esses conflitos apresentam a aparência (e talvez a realidade) de serem insolúveis? Diante dessas questões Blackwell propõe os seguintes objetivos: a) olhar para o caso Galileu buscando os fatores-chave para responder a essa questões; b) formular uma série de lições do caso Galileu sobre a natureza das relações entre ciência e religião. Na segunda parte, a qual ele denominou Considerações históricas preliminares: as estratégias de separação e de integração, Blackwell afirma que o relacionamento entre ciência e religião não segue uma estrutura fixa, mas tem variado ao longo 1 Doutorando em Ensino, Filosofia e História da Ciência pela Universidade Federal da Bahia -UFBA. Atua como professor de Ciência e Religião na Faculdade Adventista da Bahia- FADBA. E-mail: wellgil2000@hotmail.com. 2 Acadêmica do curso de Psicologia da Faculdade Adventista da Bahia-FADBA.

114 WELLINGTON GIL RODRIGUES / JÉSSICA RENATA PONCE DE LEON RODRIGUES dos séculos, pois existem desenvolvimentos internos que forçam a mudança a qual ocorre independentemente na ciência e na religião. Nesse sentido, a recepção da ciência pela comunidade cristã tem sido marcada historicamente por dois extremos: a) rejeição da ciência como perigosa aos objetivos da religião; b) aceitação da ciência como um modo quase religioso de encontrar a Deus na natureza. Entre esses extremos polares, Blackwell coloca duas visões intermediárias que tem efeito recorrente na cultura contemporânea: a) estratégia de separação e b) estratégia de integração. A estratégia de separação se caracteriza por uma ênfase nas diferenças, em uma tentativa de traçar uma linha de demarcação entre ciência e religião para que a religião não seja comprometida pelos métodos e achados da ciência. Blackwell atribui essa estratégia a uma atitude mental defensiva da religião, mas estranhamente não cita o outro lado da moeda, ou seja, que a ciência também pode adotar essa estratégia para se proteger das ingerências indevidas de doutrinas e opiniões religiosas. Blackwell percebe em Agostinho um exemplo dessa estratégia indicando a sua preocupação de como o livro do Gênesis deveria ser interpretado. O conselho de Agostinho basicamente seria de que quanto aos assuntos do formato do céu e da terra o Espírito Santo que inspirou os escritores bíblicos não tinham interesse em ensinar a esses homens fatos que não seriam úteis a sua salvação, ou seja, o interesse da Bíblia é a salvação de almas e não ensinar ciências. Blackwell também cita a famosa frase do cardeal Baronious (que foi utilizada também por Galileu) a intenção do espírito é ensinar-nos como ir para o céu e não como o céu vai. Ou seja, ciência e religião não deveriam conflitar, pois elas não ocupam o mesmo território, a característica da religião é ensinar moralidade e se preocupar com a vida eterna, e por seu lado a ciência ensina fatos e se preocupa com o aqui e o agora. Agostinho estabeleceu um corpo de princípios exegéticos que definiram o debate ciência e religião desde então: a) Toda verdade é uma, desde que tudo deriva de um Deus verdadeiro, ou seja, ciência e religião não podem realmente conflitar; b) noção (que pode ser traçada até Aristóteles) que a ciência natural pode alcançar/obter verdades absolutas. Então qual seria a proposta de solução de Agostinho para conciliar ciência e bíblia? Quando uma determinada interpretação da escritura conflitar com uma verdade da ciência, o religioso deve reinterpretar a sua leitura da Bíblia para buscar concordância com a verdade científica estabelecida. Mas bem aqui surge uma importante pergunta que se constitui no ponto central da questão: E o que fazer quando a convicção científica que está em oposição à Bíblia for menos que uma certeza absoluta? O conselho de Agostinho é que se dê preferencia à Bíblia visto que a confiança em Deus SEMINÁRIO ADVENTISTA LATINO-AMERICANO DE TEOLOGIA - SALT

O QUE O CASO GALILEU TEM A ENSINAR SOBRE AS RELAÇÕES ENTRE CIÊNCIA E RELIGIÃO? 115 como seu autor é sempre mais forte que o julgamento baseado na razão e na experiência humana. E para introduzir a estratégia da integração Blackwell utiliza algumas citações de Campanella nas quais ele faz comentários sobre os livros de Deus e afirma que quem teme a contradição entre ciência e religião está cheio de má fé. O objetivo de Campanella parece ser unir a ciência e religião em um todo unificado e não há maior exemplo dessa estratégia do que Tomás de Aquino, o qual tomou para si a tarefa de reconciliar a filosofia e a ciência de Aristóteles com a fé católica, uma tarefa muito arriscada, como atesta o fato de que, apenas dois anos após a sua morte, o Bispo de Paris condenou alguns de seus escritos, mas ainda assim Aquino se tornou a nova ortodoxia católica. Uma estratégia de integração como essa poderia ocorrer hoje? Para Blackwell há uma chance mínima de isso ocorrer, pois integração envolve reconceptualização das duas disciplinas (ciência e religião) e a reconciliação causa furor na instituição religiosa, visto que ela é encarregada de manter a revelação original intacta. Ex. Teilhard de Chardin. Portanto, a estratégia da integração também envolve consequências problemáticas. As visões de Agostinho (separação) e Aquino (integração) são ainda importantes no modo como nós hoje vemos as relações entre ciência e religião e o caso Galileu é o principal fator que formata as mentes modernas sobre essas relações. Na terceira parte, denominada Um breve esboço do caso Galileu Blackwell afirma que os fatos do caso Galileu revelam os parâmetros que tem caracterizado as relações entre ciência e religião desde então. O primeiro fato é que houve dois julgamentos e não apenas um. O primeiro (1616) versava sobre as questões da verdade, fatos e em um nível abstrato, já o segundo (1633) versava a culpabilidade legal, questão de autoridade e em um nível pessoal. Por volta de 1597, Galileu começou a demonstrar crença no heliocentrismo, a qual era já uma crença antiga mantida pelos gregos. Mas, só em 1610 com as novas descobertas, Galileu vai assumindo o heliocentrismo como a mais provável descrição do sistema solar. Os inimigos de Galileu apontavam a inconsistência entre a nova astronomia e as passagens das escrituras, tais como: Josué e Salmo 19:4-6. Assim a nova astronomia parecia implicar que a Bíblia estava errada e tal questão era um assunto muito espinhoso no contexto da reforma protestante e da contra reforma católica. Duas questões difíceis sobressaíam: a) a reinterpretação das escrituras REVISTA HERMENÊUTICA, CACHOEIRA-BA, VOL. 12, N. 2, P. 113-117

116 WELLINGTON GIL RODRIGUES / JÉSSICA RENATA PONCE DE LEON RODRIGUES e b) quem tinha autoridade para fazer essa reinterpretação. Em 1546 (8 anos antes do nascimento de Galileu), o Concílio de Trento já tinha emitido um decreto normatizando sobre as duas questões acima citadas declarando que ninguém tinha o direito de interpretar as escrituras exceto a santa mãe igreja. Galileu não era teólogo e sabia que não podia vencer nesse campo de batalha; no entanto, na carta à Duquesa Cristina (1615), ele examina os princípios gerais da exegese bíblica. Ele se baseia em Agostinho para defender seu ponto de vista, o qual era: quando a ciência prova conclusivamente uma afirmação sobre o mundo, a escritura deve ser interpretada de acordo, e quando a ciência não pode provar a afirmação, a preferencia deve ser dada à posição bíblica. Mas Galileu não diz nada sobre como se estabelecer essa impossibilidade para a ciência. Ele também não toca na questão do meio termo, ou seja, e quando a ciência poderia provar mas ainda não o fez até aquela data? Galileu faz um uso extensivo da distinção entre o uso literal e o metafórico da linguagem na Bíblia. Isso desde há muito tempo tinha sido um padrão entre os exegetas. Um outro princípio era o da acomodação, ou seja, que as escrituras são acomodadas ao entendimento das pessoas comuns. Galileu chama a atenção quanto a questão de não haver entendimento entre os pais da igreja quanto ao heliocentrismo (um dos princípios do Concílio de Trento) e que eles simplesmente usaram a linguagem do senso comum (o sol nasce e se põe). Ele também levanta a questão se a estrutura dos céus era uma questão de fé e moral (outro dos princípios do Concílio de Trento). Por conta desses eventos, em fevereiro de 1616, a Congregação do Santo Ofício decidiu que a astronomia copernicana era falsa, pois era contrária às Escrituras. E em 05.03.1616 a Congregação do Índice anunciou publicamente sua decisão de condenar o copernicanismo. O nome de Galileu e os seus escritos não foram citados pelo decreto, mas ele sabia que estaria preso ao decreto como qualquer outro católico. Pelos próximos 17 anos Galileu permaneceu longe da disputa, mas em 1623 o seu velho amigo o cardeal Barberini foi eleito Papa (Urbano VI ) e então Galileu decidiu (aparentemente com a aprovação tácita papal) escrever uma obra neutra analisando as evidências das cosmovisões geo e heliocêntrica. (p. 35). O livro apareceu em 1632 e criou uma sensação visto que o Dialogo sobre os dois máximos sistemas de mundo favorecia fortemente o personagem que defendia o ponto de vista de Copérnico, o que parecia claramente uma violação direta do decreto de 1616. Para piorar a situação, foi encontrado no arquivo do Santo Oficio o documento sobre a injunção. Urbano VI ficou furioso porque Galileu não lhe falou dessa injunção. No julgamento, Galileu afirmou que não sabia/ lembrava da injunção já que ele se guiava pela carta de Belarmino e esta não SEMINÁRIO ADVENTISTA LATINO-AMERICANO DE TEOLOGIA - SALT

O QUE O CASO GALILEU TEM A ENSINAR SOBRE AS RELAÇÕES ENTRE CIÊNCIA E RELIGIÃO? 117 mencionava qualquer injunção. O julgamento se tornou inevitável e aconteceu na primavera de 1633, no qual Galileu foi condenado a se retratar e a prisão domiciliar pelo resto da vida. Na quinta parte, denominada Considerações Finais Blackwell apresenta as cinco lições que ele retirou do caso Galileu: 1) Há uma diferença fundamental entre a descrição das coisas como elas são, e uma justificação de uma descrição a qual autoriza sua verdade; 2) Ciência e religião concordam e algumas vezes discordam no nível descritivo, mas elas são sempre diferentes no nível de autoridade; 3) No nível de autoridade nem ciência e nem religião são puramente racionais em caráter. Cada uma delas envolve um componente volitivo derivado da vontade humana, mesmo que em diferentes modos; 4) Tensões no nível de autoridade vão se amplificando na medida em que ciência e religião vão gradualmente se institucionalizado por um longo período de tempo; 5) No nível de autoridade, verdade científica é entendida ser completamente falibilista, no entanto, esse não é o caso considerando a verdade no campo da religião. Esta diferença em suas respectivas concepções de verdade torna a reconciliação entre ciência e religião consideravelmente mais difícil. Por fim Blackwell conclui que as mesmas forças básicas das controvérsias sobre as autoridades da ciência e religião, as quais resultaram no caso Galileu, ainda estão operando hoje e para ele esta é a razão porque a fascinação com esse caso permanece até hoje e que se há uma lição a ser aprendida aqui é que a autoridade religiosa tem seus limites, bem como também o tem a autoridade cientifica. DATA DE SUBMISSÃO: 07/11/2012 DATA DE ACEITE: 03/12/2012 REVISTA HERMENÊUTICA, CACHOEIRA-BA, VOL. 12, N. 2, P. 113-117