TRANSPORTE PÚBLICO URBANO. crise e oportunidades

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Transcrição:

Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos - NTU TRANSPORTE PÚBLICO URBANO crise e oportunidades Versão Preliminar Brasília - agosto de 1998

SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO... 3 1.1- Objetivo do estudo... 3 1.2 - Referências metodológicas... 4 1.3 - Organização do relatório... 4 2. O PROBLEMA... 5 2.1 - Os números do problema... 6 Passageiros transportados... 6 Produção quilométrica... 8 Índice de passageiros por quilômetro... 9 Tendências de longo prazo... 11 Tarifas... 12 2.2 - Porque está diminuindo a quantidade de passageiros?... 15 Transporte por automóvel... 16 Motocicletas... 17 Transporte escolar... 17 Outros tipos de fretamento... 18 Transporte clandestino e alternativo... 18 Eliminação de deslocamentos. Viagens a pé... 19 2.3 - Porque está aumentando a produção quilométrica?... 19 2.4 - Outros componentes... 21 Custos operacionais... 21 Demanda e dinâmica populacional... 24 2.5 - Conclusões... 25 3. AS POLÍTICAS... 28 3.1 - Infra-estrutura sem investimentos... 28 3.2 - Integração tarifária... 30 3.3 - Novos serviços de microônibus... 34 3.4 - Bilhetagem automática... 39 3.5 - Licitações... 44 3.6 - Modelos de Concessão... 49 Quadro de referência... 50 Situação atual... 52 4. CONCLUSÕES... 56 2

1. INTRODUÇÃO 1.1- Objetivo do estudo Este estudo consiste numa análise dos problemas econômicos e institucionais que o setor de transportes coletivos urbanos vem enfrentando no período que se seguiu à implantação do Plano Real e das estratégias adotadas pelos órgãos gestores e operadores visando a sua superação. Em 1997, o transporte clandestino ou informal foi (e continua sendo) objeto de muita preocupação, tanto na área estatal como privada. A participação das kombis, vans e mototaxis no mercado de transporte urbano cresceu de maneira inesperada em todo o País e foram reiteradas as tentativas de sua institucionalização nos chamados sistemas de transporte alternativo. Para compreender a expansão do transporte informal, a NTU e a ANTP realizaram uma pesquisa em várias cidades, seguida por debates e estudos em diversos encontros nacionais e regionais. Ao longo das pesquisas, estudos e debates, percebeu-se que o transporte informal era apenas uma das facetas de um processo de transformação muito mais amplo que vem se manifestando no mercado de transporte coletivo urbano e que está atingindo duramente a economia do setor. Estas transformações (porque não dizer desajustes?) têm muito a ver com a dinâmica da economia nacional e com o processo de estabilização monetária que se sucedeu à implantação do Plano Real em 1994. Ao perceber esta outra dimensão do problema, a NTU partiu para uma série de consultas a lideranças do setor na área estatal e privada em 11 das maiores cidades brasileiras. Com base nestas entrevistas, principal fonte de informações para este trabalho, procurou-se entender melhor a dinâmica recente do transporte coletivo urbano no País. Grande parte das questões aqui abordadas estão também incluídas nas agendas de discussões sobre licitações e concessões dos serviços de transporte que vêm se repetindo em muitas cidades. Isso é natural uma vez que o processo licitatório evoca as relações contratuais entre o estado e as operadoras privadas e é exatamente aí em que parece se encontrar a origem dos desajustes dos serviços formais de transporte coletivo às novas condições do mercado de transporte urbano. Em outras palavras, a capacidade de reação aos estímulos do mercado depende muito da maneira como se está lidando com a regulação pública dos serviços. O objetivo dos estudos não é formular propostas. Com eles, a NTU pretende colocar à disposição de gestores, técnicos e autoridades um conjunto de informações e análises que ajudem na definição de estratégias para superar os problemas atuais e promover um processo sustentado de desenvolvimento no setor. 3

1.2 - Referências metodológicas As conclusões do estudo estão baseadas principalmente nas informações levantadas em entrevistas com gestores de organizações públicas e privadas de 11 cidades brasileiras: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Porto Alegre, Salvador, Curitiba, Belém, Goiânia, Florianópolis e Campinas. Em cada uma destas cidades foram feitas reuniões com os órgãos gestores públicos e com os sindicatos ou associações representativos dos operadores privados, tanto no âmbito dos sistemas municipais principais (geralmente os municípios das capitais), como dos sistemas intermunicipais metropolitanos. A escolha das cidades baseou-se nas dimensões do sistema de transporte público e na presença de experiências importantes sob o ponto de vista dos modelos de gestão e das políticas de mercado. Obviamente, pesaram também fatores ligados à limitação dos recursos disponíveis para os estudos. Em nenhum momento da realização dos trabalhos houve a intenção de levantar informações e conclusões estatisticamente válidas para os serviços de transporte no universo das cidades brasileiras. O que se visou foi apenas reunir fatos e idéias que estão mobilizando as preocupações dos gestores públicos e privados, a fim de organizar a agenda dos debates sobre políticas para o setor que se pretende lançar, em plano nacional, a partir do segundo semestre de 1998. Os estudos não envolveram pesquisas em fontes primárias. A maioria das informações foi coletada junto a lideranças e gestores dos transportes públicos e, portanto, as conclusões de diagnóstico estão fortemente influenciadas por este filtro político e institucional. Subsidiariamente, recorreu-se também a informações de fontes secundárias locais (estudos, relatórios etc.) e as estatísticas disponíveis no banco de dados da NTU. Além deste relatório final, encontram-se disponíveis na NTU relatórios descritivos dos sistemas e políticas de transporte nas cidades pesquisadas. 1.3 - Organização do relatório Além desta Introdução, o relatório foi dividido em três partes: no Capítulo 2 apresenta-se uma análise do problema principal com que se defronta atualmente o setor, com destaque para as causas prováveis da queda na quantidade de passageiros transportados e do aumento da produção quilométrica. No Capítulo 3 é feita uma descrição das políticas que os órgãos gestores e operadores privados vêm praticando nas onze cidades pesquisadas, comentadas sob o ponto de vista de seus objetivos e resultados mas principalmente quanto ao seu impacto sobre a economia do setor. Finalmente, no Capítulo 4, destacam-se as principais conclusões do estudo, ao lado da apresentação de algumas indicações preliminares para continuidade dos trabalhos numa fase propositiva. 4

2. O PROBLEMA A estabilização monetária, levada a efeito em meados de 1994, criou fortes estímulos imediatos à expansão do transporte coletivo urbano. Impulsionada pelo crescimento da renda, a demanda atingiu níveis muito elevados em 1995 quando comparados com os anos anteriores. A defasagem entre custos e tarifas acumulada no período de alta inflação que antecedeu a implantação do Real foi rapidamente compensada através dos reajustes praticados entre maio e setembro de 1995, criando um ambiente de alívio financeiro para o setor. Como conseqüência, aumentaram bastante os investimentos na renovação da frota de ônibus. Tudo indicava o início de um novo ciclo de expansão. No editorial do Anuário da Associação de 1995, o Presidente da NTU indicava que... fatos positivos não faltaram em 1995 e o panorama pode ser ainda mais otimista em 1996. Se a inflação baixar para 15 a 20% e o PIB continuar crescendo em torno dos atuais 4%, os transportes urbanos terão uma excelente base para continuar sua escalada de expansão e modernização. A inflação se manteve em torno de 9% e o PIB se aproximou do índice desejado (3 a 3,5%) mas as expectativas otimistas em torno do transporte coletivo urbano não se realizaram. Ao contrário, passado o curto período de euforia em 1995, a economia do setor entrou em franco declínio. Na maioria das cidades, a quantidade de passageiros transportados está caindo ou, na melhor das hipóteses, vem se mantendo estável, o que significa, face ao crescimento da população urbana dos grandes centros (caracterizado por taxas baixas mas ainda assim positivas), uma participação decrescente do transporte público no mercado de transporte urbano. Em paralelo, a oferta de transporte público - medida pela produção quilométrica - está aumentando substancialmente nos últimos anos. Quase não há exceções a essa tendência entre as cidades brasileiras. A conseqüência tem sido a queda persistente da produtividade do setor, expressa pelo Índice de Passageiros por Quilômetro (IPK). Uma vez que as tarifas do transporte coletivo são fixadas com base no custo médio dividido pela quantidade de passageiros pagantes, quanto menor o IPK maior a parcela de custo transferida, via tarifa, para cada usuário do sistema. No regime de alta inflação e indexação de preços que durante décadas caracterizou a economia brasileira, a queda de produtividade (e os aumentos de custos internos e externos) costumavam ser repassados para as tarifas sem maiores conseqüências sobre a demanda dos serviços de transporte coletivo, geralmente classificada como cativa e de baixa elasticidade em relação aos preços. Com a mudança para um ambiente de estabilidade monetária, os reajustes de tarifas passaram a ter reflexos cada vez mais importantes no comportamento do mercado. Pouco sensível à transformação do ambiente econômico, o setor continuou a praticar, quase mecanicamente, o repasse de custos e ineficiências para as tarifas durante os primeiros anos após o Plano Real. Em 1997 e sobretudo agora, em 1998, começou a ficar claro o esgotamento deste tipo de estratégia, ao menos para um grande número de cidades brasileiras. Mesmo do ponto de vista estatístico é possível demonstrar que os reajustes 5

tarifários médios do setor estão se dando a taxas cada vez menores com o passar do tempo. Isso significa a percepção, pelos agentes econômicos, de que, num mercado a cada dia mais concorrencial, aumentos tarifários implicam freqüentemente redução no número de passageiros, mesmo considerando o efeito amortecedor do subsídio, representado pelo vale-transporte. Os itens seguintes deste capítulo se propõem a discutir com maior detalhe este problema axial dos transportes coletivos urbanos e agregar a ele novos componentes. Antes, no entanto, é preciso situá-lo melhor do ponto de vista quantitativo. 2.1 - Os números do problema Passageiros transportados As estatísticas disponíveis nas cidades pesquisadas mostram que a quantidade anual de passageiros transportados pelos sistemas municipais de ônibus caiu de 3,6% entre 1995 e 1996 e de 5,5% entre 1996 e 1997. A única exceção é Goiânia, onde os volumes de passageiros transportados apresentam um crescimento muito baixo. As maiores quedas vêm acontecendo em São Paulo, Campinas, Recife e Salvador. Tabela 1 Municípios Selecionados Sistemas Municipais de Transporte Público por Ônibus Passageiros Anuais Transportados 1995-1997 Município Passageiros (em 1000) Variação % 1995 1996 1997 96/95 97/96 São Paulo 1.965.752 1.828.381 1.620.276-7,0-11,4 Campinas 151.532 148.451 133.843-2,0-9,8 Recife 1 482.094 463.791 438.103-3,8-5,5 Salvador 522.323 500.340 473.255-4,2-5,4 Belo Horizonte 556.458 548.880 532.277-1,4-3,0 Curitiba 315.652 313.101 303.980-0,8-2,9 Rio de Janeiro 1.201.636 1.190.439 1.183.389-0,9-0,6 Goiânia 2 200.622 202.280 202.465 0,8 0,1 Porto Alegre 350.560 345.287 349.833-1,5 1,3 Total 5.746.629 5.540.950 5.237.421-3,6-5,5 Fonte: Pesquisa NTU junto a órgãos gestores e sindicatos de operadores (1) Região metropolitana (2) Aglomerado urbano 6

Variação % Gráfico 1 Municípios Selecionados Sistema de Transporte Público por Ônibus VARIAÇÃO % NA QUANTIDADE ANUAL DE PASSAGEIROS TRANSPORTADOS 1996/1995 e 1997/1996 7,0 2,0-3,0-8,0-13,0 São Paulo Campinas Recife Salvador B.Horizonte Curitiba R.de Janeiro Goiânia Porto Alegre Total Seqüência1 Seqüência2 Há poucos dados para os sistemas intermunicipais metropolitanos. Mas, a julgar pelos casos das regiões metropolitanas ou aglomerações urbanas de São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre e Florianópolis, a tendência não tem sido muito diferente, embora o declínio na quantidade de passageiros transportados entre 95 e 96 tenha sido um pouco menor do que nos sistemas municipais. As estatísticas mostram uma tendência de baixo crescimento para o sistema administrado pelo DER-MG na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Tabela 2 Regiões Metropolitanas Selecionadas Sistemas Intermunicipais Metropolitanos de Transporte Público por Ônibus Passageiros Anuais Transportados 1995-1997 Região Passageiros (em 1000) Variação % 1995 1996 1997 96/95 97/96 São Paulo 539.927 524.902 468.670-2,8-10,7 Belo Horizonte 285.000 288.000 292.000 1,1 1,4 Porto Alegre 164.100 155.900 150.500-5,0-3,5 Florianópolis 32.911 32.325 29.624-1,8-8,4 Total 1.021.938 1.001.127 940.794-2,0-6,0 Fonte: Pesquisa NTU junto a órgãos gestores e sindicatos de operadores 7

Variação % Produção quilométrica A produção quilométrica, principal indicador da oferta dos sistemas de transporte, está aumentando em quase todas as cidades pesquisadas. Conforme se observa pela Tabela 3, este aumento foi, em média, de 5,6% entre 1995 e 1996 e de 2,7% entre 1996 e 1997. Tabela 3 Municípios Selecionados Sistemas Municipais de Transporte Público por Ônibus Quilometragem Anual Percorrida 1995-1997 Município Quilometragem (em 1000) Variação % 1995 1996 1997 96/95 97/96 R. Janeiro 566.037 617.936 680.374 9,2 10,1 Campinas 58.425 63.154 68.123 8,1 7,9 Curitiba 96.243 98.868 106.401 2,7 7,6 Goiânia 70.162 71.715 74.322 2,2 3,6 Recife 195.744 211.391 218.269 8,0 3,3 B.Horizonte 172.147 180.252 184.713 4,7 2,5 P. Alegre 100.549 105.432 106.252 4,9 0,8 Salvador 214.257 215.698 216.895 0,7 0,6 São Paulo 801.000 837.000 811.000 4,5-3,1 Total 2.274.564 2.401.446 2.466.349 5,6 2,7 Fonte: Pesquisa NTU junto a órgãos gestores e sindicatos de operadores 12,0 Gráfico 2 Municípios Selecionados Sistema de Transporte Público por Ônibus VARIAÇÃO % NA QUILOMETRAGEM ANUAL 1996/1995 e 1997/1996 10,0 8,0 6,0 4,0 2,0 0,0-2,0-4,0-6,0 R. Janeiro Campinas Curitiba Goiânia Recife B.Horizonte P. Alegre Salvador São Paulo Total 1996/1995 1997/1996 8

No caso isolado do Município de São Paulo, houve um corte importante de oferta em 1997 e, mesmo com o grande peso desta cidade no conjunto, a média geral de quilometragem percorrida ainda revela um aumento no último biênio analisado. O aumento de quilometragem é ainda maior para os sistemas intermunicipais metropolitanos (embora haja poucos dados disponíveis para apoiar a afirmação), conforme se pode verificar pela Tabela 4. Em média, as regiões metropolitanas pesquisadas aumentaram sua oferta em torno de 6,8% entre 1995 e 1996 e de 6,7% entre 1996 e 1997. Tabela 4 Regiões Metropolitanas Selecionadas Sistemas Intermunicipais Metropolitanos de Transporte Público por Ônibus Quilometragem Anual Percorrida 1995-1997 Região Quilometragem (em 1000) Variação % 1995 1996 1997 96/95 97/96 São Paulo 267.381 288.730 305.073 8,0 5,7 Belo Horizonte 150.000 164.000 179.000 9,3 9,1 Porto Alegre 84.800 86.800 91.600 2,4 5,5 Florianópolis 17.217 15.440 16.533-10,3 7,1 Total 519.398 554.970 592.206 6,8 6,7 Fonte: Pesquisa NTU junto a órgãos gestores e sindicatos de operadores Índice de passageiros por quilômetro Em conseqüência das tendências apontadas nos itens anteriores, a produtividade do transporte público urbano caiu bastante no período 1995-1997. Na média dos sistemas municipais pesquisados, o índice de passageiros por quilômetro 1 sofreu redução de 8,7%, entre 1995 e 1996 e de 8,0% entre 1996 e 1997. Nos sistemas intermunicipais, a diminuição foi de 8,3% e 11,9%, respectivamente, entre 1995-1996 e 1996-1997. 1 Trata-se aqui de uma forma grosseira do IPK. Este índice é normalmente apurado para fins de cálculo tarifário e toma como referência a quantidade de passageiros equivalentes. 9

Variação % Tabela 5 Municípios Selecionados Sistemas Municipais de Transporte Público por Ônibus Índice de Passageiros por Quilômetro (média anual) 1995-1997 Município Índice de Passag./Km Variação % 1995 1996 1997 96/95 97/96 Campinas 2,59 2,35 1,96-9,4-16,4 Curitiba 3,28 3,17 2,86-3,4-9,8 Rio de Janeiro 2,12 1,93 1,74-9,3-9,7 São Paulo 2,45 2,18 2,00-11,0-8,5 Recife 2,46 2,19 2,01-10,9-8,5 Salvador 2,44 2,32 2,18-4,8-5,9 Belo Horizonte 3,23 3,05 2,88-5,8-5,4 Goiânia 2,86 2,82 2,72-1,4-3,4 Porto Alegre 3,49 3,27 3,29-6,1 0,5 Total 2,53 2,31 2,12-8,7-8,0 Fonte: Pesquisa NTU junto a órgãos gestores e sindicatos de operadores 10 Gráfico 3 Municípios Selecionados Sistema de Transporte Público por Ônibus VARIAÇÃO % NO ÍNDICE DE PASSAGEIROS POR KM (IPK) 1995-1997 5 0-5 -10-15 1996/1995 1997/1996-20 Campinas Curitiba Rio de Janeiro São Paulo Recife Salvador Belo Horizonte Goiânia Porto Alegre Total 10

Índice (1960=100) Tendências de longo prazo Os dados analisados acima correspondem a um período relativamente curto de tempo. Até que ponto é possível afirmar que as tendências de queda na quantidade de passageiros e de aumento na quilometragem não são apenas fenômenos conjunturais? Entre as cidades estudadas, poucas dispõem de séries estatísticas mais longas. Entretanto, duas delas, Curitiba e São Paulo, oferecem elementos importantes para uma análise de médio ou longo prazo. Note-se que Curitiba é considerado um exemplo de eficiência pública na administração de sistemas de transporte e São Paulo se constitui no maior mercado brasileiro de transporte público urbano. 1600 Gráfico 4 Município de Curitiba Sistema de Transporte Público por Ônibus ÍNDICE DE PASSAGEIROS TRANSPORTADOS E QUILOMETRAGEM 1960-1997 1400 y = 36,203x + 65,541 R 2 = 0,9667 1200 1000 800 600 y = 0,0009x 3-0,325x 2 + 27,639x + 105,15 R 2 = 0,9704 400 200 0 Passageiros Quilometragem Polinômio (Passageiros) Linear (Quilometragem) 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 Ano No caso de Curitiba, os índices construídos a partir de uma série de dados de 37 anos sobre as médias diárias de passageiros transportados e quilometragem percorrida no sistema de ônibus mostram algumas tendências de longo prazo bastante significativas: a) a quilometragem está crescendo a taxa muito superior à que se observa para a quantidade de passageiros transportados, o que determina uma forte queda na produtividade do sistema; b) a partir de 1989-1990 constata-se que a curva de passageiros passa a apresentar taxas negativas (decréscimo), alterando a tendência dos 30 anos anteriores quando se observou um crescimento contínuo. A série disponível para São Paulo refere-se apenas a passageiros transportados no sistema municipal de ônibus entre 1975 e 1997 (22 anos) e está representada no Gráfico 5. Por ela se constata a mesma tendência de crescimento contínuo verificada em Curitiba até a 11

Índice (1975=100) primeira metade da década de 80, que se inverte a partir de então para apresentar uma pendente negativa. O resultado é tal que a quantidade de passageiros transportados no final da série (1997) corresponde, aproximadamente, à quantidade observada 21 anos antes (1976). 140 Gráfico 5 Município de São Paulo Sistema de Transporte Público por Ônibus* ÍNDICE DE PASSAGEIROS TRANSPORTADOS 1975-1997 135 130 125 120 115 110 y = -1E-05x 4-0,0037x 3-0,0224x 2 + 3,1364x + 99,807 R 2 = 0,7619 105 100 95 90 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 97 Ano * Sistema CMTC/SPTRANS Os dados de Curitiba e São Paulo sugerem que as conclusões extraídas para o conjunto das cidades pesquisadas no período 1995-1997 podem não ser resultados de movimentos conjunturais e se inserem numa perspectiva de longo prazo. Depois de quase três décadas de crescimento, a demanda de transporte público vem apresentando tendência de queda a partir da segunda metade dos anos 80, apenas interrompida em 1995 quando o crescimento da renda decorrente do Plano Real provocou uma súbita expansão da mobilidade urbana. Tarifas O reajuste de tarifas tem sido tradicionalmente utilizado pelo setor para compensar a queda de produtividade e o aumento de custos operacionais dos serviços e assim restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro da atividade. No ambiente de estabilidade monetária que se instalou a partir de 1994, este mecanismo continua a ser empregado mas já há indicadores das dificuldades cada vez maiores que esta prática vem enfrentando. Nos últimos anos, os aumentos das tarifas de ônibus vêm se fazendo a taxas decrescentes. À medida em que os mercados de transporte urbano de passageiros se tornam mais competitivos - e é isso o que vem acontecendo - a sensibilidade da demanda aos aumentos de tarifas aumenta. É bem verdade que o elevado nível de subsídio ao usuário, via distribuição do vale-transporte pelos empregadores, as gratuidades e os descontos (sobretudo o passe estudantil) tende a amortecer o efeito dos aumentos de tarifas sobre a demanda. Mas, não se deve esquecer que um grande contingente de usuários não goza de 12

Porcentagem qualquer benefício e sente diretamente as majorações de preços em seus orçamentos domésticos. 48,0 Gráfico 6 Capitais Brasileiras Sistema de Transporte Público por Ônibus VALES-TRANSPORTE VENDIDOS SOBRE PASSAGEIROS TRANSPORTADOS Março 1994 a 1997 47,0 47,0 46,9 46,0 45,9 45,0 44,0 43,0 42,9 42,0 41,0 40,0 1994 1995 1996 1997 Além disso, os reajustes tarifários atuam potencializando a rentabilidade dos modos concorrentes, sobretudo do transporte informal, conforme analisado em estudo recente realizado pela NTU com o apoio da ANTP 2. De janeiro de 1995 a abril de 1998, a tarifa média ponderada do transporte público por ônibus aumentou cerca de 37% em termos reais, ou seja, já descontado o efeito da inflação no período. 2 NTU-ANTP, Transporte Informal. NTU, Brasília, junho de 1997. pags. 40-44 13

Variação % Tarifa Média Ponderada (R$ const. abr./98) Gráfico 7 Capitais Brasileiras Sistema de Transporte Público por Ônibus TARIFA MÉDIA PONDERADA* Jan. e Jul. de 1995 a 1998 0,75 0,70 0,70 0,72 0,74 0,65 0,69 y = 0,0977Ln(x) + 0,5439 R 2 = 0,9559 0,63 0,60 0,62 0,55 0,54 0,50 Jan.95 Jul.95 Jan.96 Jul.96 Jan.97 Jul.97 Jan.98 * ponderação pela quantidade de passageiros transportados A variação média das tarifas de ônibus está decrescendo ao longo do tempo, conforme ilustram os dados extremos da série analisada: enquanto entre janeiro de 1995 e de 1996 o reajuste médio foi da ordem de 16,1%, no mesmo intervalo mensal de 1996-1997 o crescimento não passou de 6,7%. Isso demonstra que os gestores e operadores estão mais sensíveis ao conjunto de impactos negativos das altas taxas de crescimento das tarifas sobre a atividade do setor; em várias cidades, os próprios sindicatos de operadores vêm-se opondo a que os problemas de produtividade e custos sejam enfrentados apenas no plano da política tarifária. 18,0 Gráfico 8 Capitais Brasileiras Sistemas de Transporte Público por Ônibus VARIAÇÃO % DA TARIFA MÉDIA PONDERADA Jan.95 a Jan.97 16,0 16,1 14,0 12,0 10,0 8,0 9,2 6,0 6,7 4,0 Jan.95 - Jan.96 Jan.96 - Jan.97 Jan.97 - Jan.98 Período 14

Índice (1980=100) 2.2 - Porque está diminuindo a quantidade de passageiros? Antes de mais nada é preciso esclarecer : - a que tipo de passageiros se refere a pergunta do título? Trata-se dos passageiros que se utilizam do transporte coletivo em geral ou apenas dos passageiros usuários dos sistemas regulares ou formais? Neste estudo, a pergunta se voltou para os sistemas regulares de transporte coletivo sobre pneus. Mas, embora as informações disponíveis não permitam conclusões seguras, parece que a diminuição de passageiros diz respeito a todo o universo dos sistemas de transporte coletivo, sejam eles formais ou informais. Na Região Metropolitana de São Paulo, onde a Pesquisa de Origem - Destino vem sendo feita sistematicamente a cada 10 anos, desde 1967, fica claro que o transporte coletivo como um todo vem acumulando perdas contínuas para o transporte privado e para a caminhada a pé. Parece haver, portanto, por trás do fenômeno em análise, um longo histórico de perda de mercado do transporte coletivo para o transporte individual não só nas cidades brasileiras como nos principais centros urbanos do mundo 3. 140 Gráfico 9 Paises Selecionados Sistemas de Transporte Público Urbanos ÍNDICE DE PASSAGEIROS TRANSPORTADOS 1970-1992 120 100 80 60 40 França Alemanha Alemanha (Leste) Inglaterra Italia Hungria Polônia Canadá 20 1970 1975 1980 1985 1990 1992 Fonte: Pucher J. e Lefèvre, C. - The Urban Transport Crisis MacMillan Press, Londres, 1996 - pag. 20 Em 1997, a NTU realizou uma pesquisa nacional sobre os transportes informais ou clandestinos 4. Os estudo se basearam numa extensa consulta a lideranças da área estatal e privada e sua conclusões foram discutidas em vários encontros nacionais e regionais, o que representou uma ampla audiência qualificada no setor. Embora os resultados do trabalho e seu debate tenham sido muito positivos, tem-se a impressão de que foi dado um peso 3 A esse propósito, ver: PUCHER, John e LEFEVRE, Christian - The Urban Transport Crisis in Europe and North America. MacMillan Press, London, 1996. pags. 12-20. 4 NTU-ANTP, obra citada. 15

No. de veículos (em 1.000) excessivo ao transporte informal na explicação da perda de mercado vivenciada pelo segmento formal dos transportes coletivos. Em alguns momentos do debate parecia que o transporte informal era a única fonte dos males que afligiam os sistemas públicos de transporte coletivo. Um olhar mais detido sobre o problema, tal como se procurou na presente pesquisa, mostrou que, mesmo em localidades onde o transporte informal não ocorre, o sistema público de transporte coletivo apresenta demanda estabilizada ou em declínio. Isso quer dizer que há outros fatores responsáveis pelo fenômeno, embora não haja dúvidas de que o avanço da informalidade responda, em muitas cidades, por importantes perdas de mercado. Transporte por automóvel As perdas de passageiros para o automóvel parecem ser bastante expressivas, sobretudo a partir de 1992 quando a produção da indústria automobilística nacional e as importações para o mercado interno ganharam um novo impulso. Neste novo ciclo de crescimento, a indústria automobilística deu ênfase à produção de veículos econômicos, com financiamento de até 36 meses, o que proporcionou o aumento da propriedade na classe C, onde se concentra um grande volume de usuários do transporte público. O uso do automóvel está sendo estimulado também pela manutenção do preço da gasolina num patamar baixo. Gráfico 10 Brasil VENDAS DE AUTOMÓVEIS E UTILITÁRIOS LEVES Produção nacional e importações. Mercado interno 1990-1997 2000 1800 1.809,4 1600 1.616,1 1400 1.566,3 1200 1.277,3 1000 1.057,9 800 600 661,3 717,1 716,2 400 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 Ano 16

A maioria dos entrevistados acredita estar se verificando uma perda de mercado do transporte público para o automóvel, o que era tido como pouco provável segundo as teorias vigentes nos anos 70 e 80. Quase sempre a demanda do transporte coletivo urbano era vista como cativa, composta de usuários sem possibilidade de acesso (ou de uso freqüente) ao transporte privado, dada a sua baixa renda face ao custo elevado dos veículos. Mas os entrevistados ainda não têm condições de demonstrar as suas conclusões ou de sustentá-las em dados confiáveis. Motocicletas Outro segmento em expansão no transporte urbano e que vem subtraindo passageiros do transporte público é o das motocicletas. Veículo de custo relativamente baixo e ágil suficiente para enfrentar os congestionamentos, a motocicleta vem sendo empregada, com sucesso, no transporte de documentos e pequenas encomendas nas áreas urbanas. Até alguns anos atrás esse tipo de serviço, prestado pelos office boys e empresas especializadas, empregava em grande escala o transporte coletivo. Mas, a área de concorrência mais percebida com o transporte público é no chamado serviço de moto-taxis que, de forma regulamentada ou não, difundiu-se principalmente nos centros urbanos de médio porte, cobrando tarifas intermediárias entre o taxi e o ônibus. Os problemas de segurança e higiene envolvendo o transporte de passageiros por motocicletas são graves mas, por razões ainda pouco estudadas, não têm inibido o crescimento da demanda neste segmento. Enquanto no caso do automóvel e da motocicleta há uma grande convergência de opiniões dos entrevistados quanto à importância da concorrência que vêm fazendo ao transporte público, em dois outros casos as opiniões são bem mais dispersas: o transporte fretado em geral e o transporte escolar. É bem visível o pouco conhecimento que os gestores e operadores públicos demonstram em relação a estes segmentos do mercado de transportes urbanos, mesmo sabendo-se que a maioria dos serviços de transporte escolar são autorizados/concedidos e controlados pelas Prefeituras. Transporte escolar O transporte escolar, como atividade especializada de fretamento por contratos de pagamento mensal, desenvolve-se estreitamente associada (e muitas vezes supervisionada) às escolas privadas de 1 o e 2 o graus nos grandes centros urbanos. Mais do que o controle público, quase sempre restrito ao veículo, é o vinculo com a escola que passa aos pais de escolares o aval de um serviço seguro e confiável, atributos considerados indispensáveis, e que de outra forma dificilmente seriam reconhecidos num serviço operado por autônomos. Talvez seja por causa desta associação com os estabelecimentos de ensino que o transporte escolar nunca tenha se organizado, até agora, como rede pública especializada. Entre gestores e operadores não há uma visão clara de como vem crescendo o transporte 17

escolar e até que ponto seu desenvolvimento está contribuindo para reduzir a participação dos sistemas públicos no mercado de transporte urbano. Outros tipos de fretamento Os serviços de fretamento ganham expressão no transporte de empregados entre estabelecimentos comerciais/industriais de grande porte e as áreas residenciais (ou entre estas e concentrações de estabelecimentos, como nos distritos industriais, universidades, centros administrativos etc.), muitos deles em localização desfavorável face à rede de transporte público. Quase sempre os empregadores estão envolvidos como contratantes do transporte. Nos grandes centros urbanos, como Rio e São Paulo, estão crescendo bastante serviços especializados de fretamento que servem a determinados tipos de equipamentos ou eventos (teatros, cinemas, shopping centers, competições esportivas etc.), acionados por chamada telefônica. A segurança é um dos atributos mais solicitados, geralmente acompanhada de conforto e cortesia no tratamento de motoristas e guias. Nos dois casos acima mencionados não é simples identificar o crescimento por competição com os sistemas públicos. Este último é um bom exemplo de segmento emergente de mercado, não necessariamente derivado do transporte público. Quanto ao fretamento convencional, há posições muito divergentes entre gestores e operadores mesmo sobre o ritmo de expansão deste tipo de demanda. Alguns afirmam que o segmento está em expansão nas suas cidades e outros o identificam como em retração. Mais do que no caso do transporte escolar, a opacidade destes outros tipos de fretamento é ainda maior para os gestores e operadores. Na maioria das cidades não há qualquer tipo de controle público sobre esses serviços. Mesmo em áreas onde a oferta é bem delimitada, como em Porto Alegre e Curitiba, o transporte fretado chega a abrigar, algumas vezes, verdadeiros serviços clandestinos em competição com a rede pública. Transporte clandestino e alternativo Neste último ano, o que mudou fundamentalmente no transporte por kombis, vans e mototaxis foi a velocidade de sua penetração no mercado, que se reduziu nos grandes centros. O principal fator deste arrefecimento parece ter sido a queda da rentabilidade decorrente do grande número de operadores que entraram no negócio, fazendo cair a receita média. O aumento da taxa de juros também influenciou na decisão de novos investimentos. Não houve grande alteração na geografia do fenômeno. Cidades como Porto Alegre, Florianópolis, Curitiba, Belo Horizonte, Goiânia e Belém continuaram sem registro expressivo de transporte informal. As maiores incidências também continuam as mesmas, assim como a moto-taxi continua se manifestando de maneira predominante nas cidades de porte médio, especialmente no interior de São Paulo, Minas Gerais e Paraná. 18

No diagnóstico do fenômeno, o que mudou em relação aos estudos anteriores foi a ênfase atribuída aos fatores político-institucionais. Está ficando cada vez mais nítido de que a existência de um esquema político de apoio, sustentado em interesses comerciais e eleitorais, é um componente essencial na estratégia de penetração do transporte informal. Por si sós, as deficiências do sistema público de transporte, as expectativas de rendimento da atividade informal, o nível de desemprego e outras causas freqüentemente apontadas não são suficientes para desencadear o rápido crescimento do transporte informal. Mas, de qualquer maneira, o transporte informal e suas manifestações legalizadas, quase sempre denominadas transporte alternativo, caminharam rapidamente, em 1997 e início de 1998, para controlarem uma parcela de 2 a 5% da demanda de transporte coletivo urbano numa quantidade significativa de cidades. Em alguns casos isolados, essa participação pode subir até os 10%. Eliminação de deslocamentos. Viagens a pé Aos fatores acima mencionados, a diminuição da quantidade de passageiros transportados parece se ligar também à supressão de viagens motorizadas em camadas de renda muito baixas. São famílias e pessoas que, não se enquadrando na condição de receber o valetransporte e sem ter acesso a gratuidades e descontos, têm dificuldades de arcar com as despesas do transporte coletivo e limitam as viagens não essenciais (principalmente com motivo compras e recreação). Incluem-se ai os desempregados, cujo número vem crescendo nos últimos anos. Neste baixos patamares de renda, a ação combinada de tarifas de transporte coletivo relativamente altas e tempos elevados de viagens, devido ao congestionamento, levam à substituição do transporte coletivo motorizado pelo deslocamento a pé. Em várias cidades, a tarifa única, de valor relativamente alto, contribui para desestimular os deslocamentos mais curtos por ônibus. Isso parece ocorrer em deslocamentos entre 1 e 5 Km, ou seja, uma faixa muito acima dos 800 metros convencionalmente aceitos para deslocamentos terminais (da moradia ao ponto de ônibus, por exemplo). ooo Em síntese, os motivos analisados para a redução na quantidade de passageiros, apontam para uma condição de mercados cada vez mais competitivos, onde os sistemas de transporte públicos estariam perdendo posições para outros ofertantes. 2.3 - Porque está aumentando a produção quilométrica? Embora a produção quilométrica esteja aumento em praticamente todas as aglomerações urbanas estudadas, os motivos deste crescimento variam muito de um caso para outro. 19

Entre as causas mais freqüentes, destacam-se a expansão da área de atendimento, as pressões sociais e políticas para aumentar freqüências e estender itinerários, a concorrência entre serviços municipais e intermunicipais e entre serviços regulares e clandestinos e, para alguns sistemas remunerados pela produção, a disputa das concessionárias por quilometragem nas câmaras de compensação como forma de ampliar a participação nas receitas tarifárias. A primeira causa está ligada à própria expansão da ocupação territorial na periferia das cidades. Assim, as linhas de ônibus são estendidas continuamente para atender as demandas - quase sempre pouco densas - das novas áreas ocupadas. A tarifa única e a integração tarifária, a cada dia mais difundidas, estimulam este processo de extensão periférica das áreas urbanas em regime de baixas densidades residenciais, pois criam uma indiferença do preço pago pelo usuário em relação à distância percorrida ou ao número de linhas de transporte utilizadas. Sabendo que as tarifas do transporte são aproximadamente as mesmas qualquer que seja a distância entre sua residência e os pólos de atração/produção de viagens, ele tende a escolher localizações residenciais em periferias afastadas onde é mínimo o valor dos terrenos (embora permaneça a penalização do tempo de viagem). Outro fator importante do aumento da produção quilométrica são as demandas sociais e políticas de aumento das freqüências e ajustes de itinerários das linhas de transporte coletivo. Os órgãos gestores lidam diariamente com este tipo de demanda, canalizadas por políticos e lideranças comunitárias que, mesmo gerando benefícios sociais, muitas vezes comprometem o equilíbrio econômico-financeiro dos serviços. Algumas vezes, as operadoras aceitam e até estimulam este tipo de demanda, vendo-a como oportunidade de ampliar sua área de atuação mas sem analisar as condições de viabilidade econômicofinanceira decorrentes da extensão ou melhoria do serviço. A competição entre operadoras de transporte visando ampliar a área de atendimento, o volume da receita ou a margem de lucros é apontada com freqüência como um dos fatores de crescimento da produção quilométrica. Como a competição de preços costuma ser estritamente regulada, a oferta de quilometragem se manifesta com maior intensidade. Esta concorrência se estabelece em vários níveis: a) entre operadoras de sistemas municipais e intermunicipais metropolitanos que se utilizam dos mesmos canais viários: b) entre operadoras regulares e informais, pela disputa das demandas ao longo dos itinerários; c) entre operadoras de um mesmo sistema, quando remuneradas pela produção de serviços, visando conquistar maior fatia da receita tarifária. Neste último caso, como a remuneração se baseia quase sempre nos custos operacionais totais, pode ocorrer (e, de fato, tem ocorrido em várias cidades) uma verdadeira competição pela ineficiência, o que motivou a introdução de critérios de eficiência por parte dos órgãos gestores, nem sempre suficientes para reverter as conseqüências negativas do modelo remunerativo. Os modelos de remuneração por prestação de serviços (ou pela produção), ainda que possibilitando maior flexibilidade no atendimento a demandas sociais localizadas (mas sem 20

Custo Ponderado (R$ const. Dez.97) viabilidade econômica) por parte dos órgãos gestores, têm sido apontados como estimuladores do aumento dos custos unitários ou da produção quilométrica. Quaisquer que sejam os fatores de aumento da produção quilométrica, é inegável que grande parte do problema se deve à falta de informações sobre o mercado e à precariedade dos sistemas de planejamento estratégico e operacional que caracterizam a gestão dos serviços de transporte, tanto na área pública como privada. 2.4 - Outros componentes Na introdução a este capítulo, procurou-se focalizar o problema da produtividade decrescente que está marcando a economia dos transportes públicos nas grandes cidades brasileiras e pressionando as tarifas. Mas, há outros fatores contribuindo para agravar as condições econômico-financeiras dos transportes públicos. O principal deles é o aumento dos custos quilométricos em decorrência do congestionamento (baixas velocidades) das vias e das elevações de salários do pessoal operacional. Outra condição que afeta a economia do setor, influindo no crescimento e na distribuição da demanda, é a dinâmica populacional nas regiões metropolitanas. Custos operacionais Além de queda nos índices de produtividade, o transporte público está se defrontando com o aumento dos custos médios de operação. De acordo com levantamentos da NTU realizados em 9 capitais, os custos por quilômetro 5 aumentaram de 32,3% entre abril de 94 e outubro de 97, em termos reais. Gráfico 11 Capitais Brasileiras - Sistema de Ônibus Urbanos * CUSTO PONDERADO POR QUILÔMETRO (R$ const. dez/97) 1,80 1,70 1,69 1,69 1,67 1,72 1,60 1,60 1,50 1,50 1,40 1,40 1,30 1,30 1,20 1,10 1,00 Abr/94 Out/94 Abr/95 Out/95 Abr/96 Out/96 Abr/97 Out/97 * S.Paulo, Rio, B. Horizonte, Recife, P.Alegre, Salvador, Curitiba, Fortaleza e Brasília 5 Trata-se do custo médio ponderado (pela quantidade de passageiros transportados) em São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Salvador, Porto Alegre, Curitiba e Brasília. 21

Impacto no custo operacional % Os principais fatores deste aumento são a redução das velocidades médias decorrentes do congestionamento no sistema viário urbano e a política salarial que vem sendo praticada em relação ao pessoal de operação das empresas de transportes. Para manter constantes as condições operacionais em ambientes de congestionamento crescente, são necessários mais veículos, motoristas, combustível etc., o que tem elevado substancialmente os custos unitários. O IPEA e a ANTP realizaram uma pesquisa sobre a redução das deseconomias em decorrência de melhorias no transporte público em 10 cidades e apuraram que o congestionamento onera o custo operacional dos sistemas de ônibus entre os limites de 0,9% (Brasília) e 15,8% (São Paulo). 18 Gráfico 12 Cidades Selecionadas IMPACTO DO CONGESTIONAMENTO NO CUSTO OPERACIONAL DOS ÔNIBUS URBANOS 1997 16 15,8 14 12 10 9,6 8 6 6,4 6,2 4 2 3,7 3,5 2,6 2,1 1,6 0,9 0 S. Paulo R.Janeiro Campinas B. Horizonte J. Pessoa Recife P. Alegre Juiz de Fora Curitiba Brasília Fonte: IPEA-ANTP (Redução das Deseconomias Urbanas com a Melhoria do Transporte Público - Relatório Síntese, maio/98 Os impactos registrados no Gráfico 12 foram medidos a partir de dois fatores 6 : o excesso de frota de ônibus e o excesso de consumo de óleo diesel, ambos provocados pelos retardamentos (congestionamentos, semáforos e pontos de parada). Para as 10 cidades pesquisadas, estimou-se em 4.789 veículos o excesso da frota de ônibus 7 devido ao 6 E = (0,2*dD) + (0,5*dF), onde: E = excesso de custos operacionais; D = consumo de óleo diesel F = número de veículos na frota d = variação 7 O aumento da frota foi estimado em função do aumento do tempo de percurso acima do desejável, para cada trecho das vias, nos picos, pela fórmula: DF = DTp*L*Freq, onde: 22

congestionamentos no pico da tarde, representando 16,1% da frota em 1997. O excesso de consumo anual de combustível 8 devido aos congestionamentos (incluindo as vias transversais aos corredores pesquisados) foi calculado em 14,1 milhões de litros de óleo diesel. Estas externalidades negativas que o tráfego privado impõe ao transporte público só encontram respostas satisfatórias na criação de espaço viário exclusivo ou prioritário para a circulação dos meios coletivos, uma vez que as medidas restritivas ao automóvel só têm se mostrado viáveis em áreas muito restritas, continuando improváveis como política mais abrangente. Um outro fator de elevação dos custos operacionais relaciona-se com a política salarial. Os salários do pessoal operacional (motoristas, cobradores e fiscais), que entram na composição do custo total com peso entre 45% e 60%, vêm sendo reajustados muito acima da inflação média da economia e sem qualquer relação com a produtividade geral do setor ou a produtividade específica da função. Esta dinâmica tem a ver não só com o poder de reivindicação dos rodoviários urbanos, capazes de impor custos muito elevados com suas greves e paralisações, mas também à maneira como vêm sendo feitas as negociações salariais, quase sempre vinculadas à determinação das tarifas pelo poder público. A forte correlação entre as variações de salários e de tarifas pode ser notada quando se faz o confronto dos dados do Gráfico 13 com os do Gráfico 7. Este quase automatismo dos aumentos de tarifas e salários ignora por completo os elementos ligados à produtividade e gera pressões muito fortes sobre os custos. DF = aumento da frota de ônibus (veículos) DTp = tempo de percurso em excesso (horas) L = extensão do trecho (Km) Freq = freqüência dos ônibus no trecho (veículos/hora). A quantidade em excesso de ônibus causada pelo congestionamento foi calculada por faixa horária, para cada cidade, para os três níveis de congestionamento considerados (leve, moderado e severo) nas horas de pico. 8 O consumo de combustível está relacionado com a variação da velocidade. Pesquisas de instituições nacionais e internacionais estabelecem essa função (para ônibus): C = 0,44428 + 0,00008 V2-0,00708 V + 1,37911/V + 0,00107 carr, onde: V = velocidade (Km/h) carr = carregamento (sentados + em pé) C = consumo por quilômetro 23

Salario Medio Mensal (R$ const. dez/9 600 Gráfico 13 Capitais Brasileiras Sistema de de Transporte Público por Ônibus SALÁRIO MÉDIO MENSAL DOS MOTORISTAS DE ÔNIBUS Jan. 1995 - Dez. 1997 550 500 y = 52,61Ln(x) + 373,19 R = 0,9356 450 400 350 J F M A M J J A S O N D J F M A M J J A S O N D J F M A M J J A S O N D 1995 1996 1997 Demanda e dinâmica populacional Ao final, é preciso chamar a atenção para alguns aspectos da dinâmica populacional dos centros urbanos que estão afetando a configuração da demanda de transporte coletivo e que são ilustrados pelos dados da Tabela 6. Tabela 6 Brasil População Urbana Residente - Regiões Metropolitanas* 1970-1996 Municípios Centrais 1 Municípios Periféricos 2 Total Ano Nº de Part. % Taxa anual Nº de Part. % Taxa anual Nº de Part. % Taxa anual habitantes no total de cresc. % 3 habitantes no total de cresc. % 3 habitantes no total de cresc. % 3 1970 16.808.973 73,3 6.119.806 26,7 22.928.779 100,0 1980 23.296.978 68,2 3,31 10.847.281 31,8 5,89 34.144.259 100,0 4,06 1991 26.974.935 58,0 1,34 19.549.028 42,0 5,50 46.523.963 100,0 2,85 1996 27.819.000 55,8 0,62 22.008.448 44,2 2,39 49.827.448 100,0 1,38 Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. (*) S. Paulo, R. de Janeiro. B. Horizonte, Recife, P. Alegre, Salvador. Fortaleza, Belém, Brasilia e Curitiba (1) municípios das capitais (2) municípios das periferias metropolitanas (não inclui a capital) (3) taxa geométrica anual de crescimento entre o ano da linha e o ano anterior 24

a) A população das cidades está crescendo a taxas cada vez menores. Na década de 70, a população das regiões metropolitanas cresceu a uma taxa geométrica anual de 4,06%; esta taxa caiu para 2,85% ao ano entre 1980 e 1991 e ultimamente (entre 1991 e 1996) se situou em torno de 1,38%. Assim, enquanto no passado eventuais perdas no atendimento relativo do transporte público eram compensadas pelas altas as taxas de crescimento demográfico das cidades, hoje elas tendem a aparecer mais traduzindo-se em diminuição da quantidade absoluta de passageiros transportados. b) A população das áreas periféricas das cidades está crescendo a taxas maiores do que a população das áreas centrais. Conforme se observa na Tabela 6, a população dos municípios das periferias metropolitanas cresce a taxas anuais quase duas vezes maiores do nos municípios centrais. Em conseqüência, a participação percentual das populações periféricas passou de 26,7% em 1970 para 44,2% em 1996. Isso está fazendo com que, em muitas cidades, a demanda pelos serviços intermunicipais metropolitanos de passageiros cresça mais do que a demanda pelos serviços de transporte do município principal. Enquanto tinham pequena expressão do ponto de vista da demanda atendida, estes sistemas recebiam pouca atenção dos governos estaduais (aos quais está afeta a administração do transporte intermunicipal), dispunham de menos recursos e a atitude administrativa em relação a eles tendia para o laissez faire. Com o novo vulto que estão assumindo, as interfaces deles com os sistemas de transporte dos municípios centrais tornam-se críticas para o desenvolvimento do transporte público nas regiões metropolitanas e sua gestão exigirá órgão gestores mais eficazes e uma nova postura administrativa. c) Em média, a população das cidades está se tornando mais idosa (aumento na participação dos grupos etários de maior idade). Assim, o efeito das gratuidades para idosos na redução da quantidade de passageiros pagantes tende a se intensificar com o passar dos anos; em contrapartida, com a diminuição dos contingentes populacionais mais jovens, os descontos para estudantes podem influir menos na queda do número de passageiros equivalentes (embora as políticas públicas de aumento da escolarização possam neutralizar este efeito). 2.5 - Conclusões A variação do IPK pode ser vista sob ângulos diferentes. Na perspectiva do nível de serviço, a diminuição deste indicador pode significar que os passageiros estão viajando com mais conforto. Mas, o problema surge quando essa melhoria não vem acompanhada de receitas para cobrir os custos adicionais necessários à sua produção. Neste caso, a capacidade adicionada é fonte de ociosidade ou está sendo utilizada sem pagamento. Nos 25

sistemas públicos de transporte parece estar ocorrendo as duas coisas, em proporções variáveis de cidade para cidade. A ociosidade (lugares oferecidos e não utilizados) ocorre em função de fatores como itinerários mau ajustados às linhas de desejo, programação horária inadequada, baixa atratividade dos serviços face à oferta dos concorrentes etc. Por deficiências no controle cotidiano da operação, pela falta de informação sobre a demanda e até mesmo por rigidez regulamentar, muitas redes passam anos a fio sem ajustes. Em algumas cidades estes ajustes são feitos em intervalos de tempo muito longos, como decorrência de algum plano estratégico convencional cuja implantação provoca traumas profundos na circulação urbana e reações de toda espécie por parte da população. A utilização não remunerada dos serviços decorre tanto dos descontos e gratuidades legais quanto dos passageiros que deixam de pagar a tarifa ilegalmente. Estes dois fenômenos são mal dimensionados nas cidades brasileiras e é difícil afirmar que estão crescendo ou diminuindo. Mas, sem dúvida, seu nível atual ainda é muito elevado e chega a até 30% do total de passageiros. Os sistemas de integração tarifária mau balanceados também podem acarretar perda de quilometragem remunerada. Os usuários passam a viajar extensões maiores ou permanecer mais tempo no sistema sem pagamento adicional. O balanceamento se faz pela eliminação de quilometragem ociosa ou aumento da velocidade comercial dos ônibus, o que nem sempre tem acontecido. A simples enumeração das causas de diminuição do IPK já sugere a grande variedade de estratégias possíveis para atacar o problema. Em linhas gerais, é possível destacar as seguintes: a) aumentar a participação dos sistemas públicos no atendimento à demanda de transporte urbano ou, na pior das hipóteses, conter a evasão de usuários para os modos concorrentes; nesta linha é fundamental a adoção de métodos de gestão orientados para o mercado, agilidade na tomada de decisões (portanto, maior flexibilidade nos regulamentos) e investimentos na infra-estrutura de uso exclusivo ou prioritário para o transporte coletivo; b) reduzir a quilometragem não paga ou de baixa utilização, seja pela racionalização das redes e programas operacionais, seja pela eliminação de gratuidades e descontos sem compensação financeira ou diminuição da evasão; c) reduzir os custos unitários, principalmente através de políticas salariais do pessoal de operação que levem em conta a produtividade. O reequilíbrio econômico dos sistemas via aumento de tarifa oferece possibilidades limitadas devido ao baixo nível de renda da população usuária potencial e ao caráter cada vez mais concorrencial do mercado de transporte urbano. Cerca de 50% dos usuários não têm acesso ao vale-transporte, principal forma de subsídio, e seu comportamento é cada vez mais sensível aos aumentos no nível de R$0,75 em que se encontra a tarifa média atual. 26