A LUTA DE CLASSES NO CAMPO: O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA

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Transcrição:

1 A LUTA DE CLASSES NO CAMPO: O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA Mônica Gomes Müller Eduardo Henrique Lopes Figueiredo INTRODUÇÃO As lutas pela terra no Brasil iniciaram-se no período colonial, com os povos indígenas defendendo seus territórios tradicionais contra as entradas e bandeiras, patrocinadas pelo governo português e por fazendeiros da época. Estas lutas ganharam impulso no final do século XIX, tendo como marco inicial a chamada Guerra dos Canudos. Essa guerra ocorreu no sertão da Bahia, na região de Canudos, entre os anos de 1870 e 1897, tendo como líder Antônio Conselheiro. Após a intervenção das tropas federais, o movimento foi derrotado. Outros movimentos importantes de luta pela terra foram os seguintes: a) Guerra do Contestado na divisa do Paraná com Santa Catarina (1912-1916); b) O movimento liderado por Padre Cícero, no Ceará (1930-1934); c) O cangaço, liderado por Lampião entre os anos de 1917 e 1938; d) A luta dos posseiros de Teófilo Otoni - MG (1945-1948); e) A revolta de Dona Nhoca, no Maranhão (1951); f) A revolta de Trombas e Formoso, em Goiás (1952-1958); g) A revolta do sudoeste do Paraná (1957); h) A luta dos arrendatários em Santa Fé do Sul, São Paulo (1959); i) As Ligas Camponesas no interior do nordeste, sobretudo na região do semi-árido de Pernambuco e da Paraíba (décadas de 1950 e 1960). Em 1964, após o golpe militar, estabeleceu-se a chamada paz de cemitérios no campo brasileiro, até que, no final da década de 70, sobretudo após a fundação da Comissão Pastoral da Terra em 1975 e as greves do ABCD paulista, os camponeses sentiram-se estimulados a lutar por espaços para plantio, iniciando no Rio Grande do Sul as ocupações de terra que estão na gênese do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST 1. 1 BEZERRA NETO, 1998, p. 19-20.

2 1 A LUTA DE CLASSES NO CAMPO BRASILEIRO O termo questão agrária, segundo o Dicionário da Educação do Campo, é utilizado para designar uma área do conhecimento humano que se dedica a estudar, pesquisar e conhecer a natureza dos problemas das sociedades em geral relacionados ao uso, à posse e à propriedade da terra. Ao se fazer o estudo da forma de organização socioeconômica do meio rural de qualquer país, está-se estudando a questão agrária daquele país. Porém, durante muito tempo, o termo foi utilizado principalmente como sinônimo dos problemas agrários existentes e, mais reduzidamente, quando, em determinada sociedade, a concentração da propriedade da terra impedia o desenvolvimento das forças produtivas na agricultura 2. Para os objetivos deste trabalho, a questão agrária é compreendida como o conjunto de problemas ligados indissociavelmente ao desenvolvimento do capitalismo no campo. Fernandes define a questão agrária como o movimento do conjunto de problemas relativos ao desenvolvimento da agropecuária e das lutas de resistência dos trabalhadores, que são inerentes ao processo desigual e contraditório das relações capitalistas de produção 3. Entretanto, quando se analisa os diversos momentos da história percebe-se que a questão agrária apresenta-se com características diversas, relacionadas aos distintos estágios de desenvolvimento do capitalismo. Assim, a produção teórica constantemente sofre modificações por causa das novas referências, formadas a partir das transformações da realidade 4. Nessa pesquisa, pretende-se estudar o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e sua inserção na luta de classes no campo. Para tanto, estudar-se-á a gênese da expansão do capitalismo no campo e a reprodução de relações não-capitalistas e os movimentos sociais como paradigmas de interpretação das lutas no campo. Como bibliografia preliminar utilizaremos as obras de João Pedro Stédile, Ariovaldo Umbelino de Oliveira, José de Souza Martins, José Graziano da Silva, Bernardo Mançano Fernandes e Eduardo Paulon Girardi. 2 O MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA 5 O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) nasceu de um conjunto de conflitos fundiários que emergiram no Sul do país e tinham por característica fundamental as ações de ocupação como forma de pressão para a conquista da terra, em oposição à estratégia privilegiada por sindicatos rurais, que era a de encaminhar esse tipo de demanda principalmente 2 CALDART, Roseli Salete et alii (orgs.), 2012, p. 641. 3 FERNANDES, Bernardo Mançano, 2013, p.28. 4 Ibidem, p.28. 5 Esse item foi baseado no verbete MST do Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro, publicado pela Fundação Getúlio Vargas e na página da Internet do MST.

3 pelas vias administrativas, ou seja, elaborando relatórios de conflitos e enviando denúncias e solicitação de desapropriação a diversas instâncias do governo federal. Nascido com forte apoio da Igreja, em especial da Comissão Pastoral da Terra (CPT), e ligado a algumas das chamadas oposições sindicais que começavam a se desenvolver em diversos pontos do país, a origem imediata do MST foram as ocupações das fazendas Macali e Brilhante (Ronda Alta RS 1979), a luta dos agricultores que perderam suas terras com a construção da barragem de Itaipu, no Paraná, e que constituíram, em junho de 1981, o Movimento dos Agricultores Sem Terra do Sudoeste (Mastro) e a ocupação da Fazenda Burro Branco, em Santa Catarina (1980). Desse conjunto de eventos, um dos mais significativos foi o acampamento de Encruzilhada Natalino, em Ronda Alta, no Rio Grande do Sul, em 1980/81, que mobilizou a opinião pública nacional e exigiu a intervenção do governo federal. A partir das ocupações, começaram a ocorrer reuniões e articulações, visando a unificar essas lutas atomizadas. Em julho de 1982, realizou-se em Medianeira, no Paraná, o primeiro grande encontro de trabalhadores sem terra, com representantes dos estados do Rio Grande do Sul, do Paraná, de Santa Catarina, de São Paulo e de Minas Gerais. No mesmo ano, em setembro, ocorreu novo encontro em Goiânia, com participantes de 16 estados. No ano seguinte, em Chapecó (SC) foi criada uma comissão regional provisória, composta por dois participantes de cada estado, que se reunia a cada três meses. O MST não tem uma data oficial de fundação, mas considera-se que o movimento surgiu, de forma orgânica, no 1º Encontro Nacional dos Sem Terra, em Cascavel, no Paraná, que ocorreu entre 20 e 22 de janeiro de 1984. A partir desse encontro, os trabalhadores rurais começaram a construir um movimento nacional, com os seguintes objetivos: a luta pela terra, a luta pela Reforma Agrária e por um novo modelo agrícola, a luta por transformações na estrutura da sociedade brasileira e por um projeto de desenvolvimento nacional com justiça social. Em 1985, o MST realizou seu 1º Congresso Nacional, em Curitiba, no Paraná, cuja palavra de ordem era: Ocupação é a única solução. Neste mesmo ano, o governo de José Sarney aprovou o Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA), com o objetivo de implementar o Estatuto da Terra e viabilizar a Reforma Agrária, com uma previsão de assentar 1,4 milhão de famílias até o final de seu mandato. Entretanto, pressionado pelos grandes latifundiários, o governo Sarney cumpriu, ao final de cinco anos de governo, apenas 6% das metas estabelecidas no PNRA. Com a articulação para a Assembléia Constituinte, os ruralistas criam a União Democrática Ruralista (UDR) com atuação em três frentes: o braço armado - incentivando a violência no campo -, a bancada ruralista no parlamento e a mídia como aliada.

4 A Constituição de 1988 trouxe algumas conquistas para os movimentos sociais. Os artigos 184 e 186 fazem referência explícita à função social da terra e determinam que, quando essa função não for cumprida, a terra seja desapropriada para fins de Reforma Agrária. Fernando Collor de Mello assumiu a presidência da República em 1989 e sua posse representou um retrocesso na luta pela terra, pois além de se posicionar claramente contra a Reforma Agrária, vários de seus aliados de governo eram ruralistas. Durante o seu governo houve uma grande repressão contra os Sem Terra compreendendo despejos violentos, assassinatos e prisões arbitrárias. Em 1990, ocorreu o II Congresso do MST, em Brasília, que continuou debatendo a organização interna, as ocupações e, principalmente, a expansão do Movimento em nível nacional. A palavra de ordem era: Ocupar, resistir, produzir. Em 1994, Fernando Henrique Cardoso vence as eleições com um projeto de governo neoliberal, principalmente para o campo. É o momento em que se prioriza novamente a agroexportação. O MST realizou seu 3º Congresso Nacional, em Brasília, em 1995, quando reafirmou que a luta no campo pela Reforma Agrária é fundamental, mas nunca terá uma vitória efetiva se não for disputada na cidade. Por isso, a palavra de ordem foi Reforma Agrária, uma luta de todos. Em agosto de 2000, o MST realiza seu 4º Congresso Nacional, em Brasília, cuja palavra de ordem foi Por um Brasil sem latifúndio. Durante os oito anos de governo FHC, o Brasil sofreu com o aprofundamento do modelo econômico neoliberal, que provocou graves danos para quem vive no meio rural, fazendo crescer a pobreza, a desigualdade, o êxodo, a falta de trabalho e de terra. A eleição de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002, representou um momento de expectativa, com o avanço do povo brasileiro e uma derrota da classe dominante. No entanto, essa vitória eleitoral não foi suficiente para gerar mudanças significativas na estrutura fundiária, no modelo agrícola e no modelo econômico. Do ponto de vista organizativo, o MST estrutura-se em comissões municipais, que se apóiam em núcleos. As comissões municipais articulam-se em comissões estaduais. No plano nacional, existe a Coordenação Nacional, liderada por João Pedro Stedile, composta por representantes de todos os estados em que o movimento atua. É ela que define os rumos do movimento e sua linha política. Além da Coordenação Nacional, há a Comissão Executiva, que decide os encaminhamentos que a Secretaria Nacional, com sede em São Paulo, deve fazer. Cabe a essa secretaria programar os cursos de formação (um dos mais importantes investimentos do

5 MST) e também editar o jornal do MST ( Jornal dos Sem Terra ), que é mensal e vem sendo publicado com regularidade desde o início da década de 1980. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ABREU, Alzira Alves de e BELOCH, Israel (coords.). Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro 1930-1983 (DHBB). Rio de Janeiro: Forense Universitária, FGV/CPDOC-FINEP, 1984. BEZERRA NETO, Luiz. Sem Terra Aprende e Ensina: Um estudo sobre as práticas educativas e formativas do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra - MST - 1979-1998. Dissertação de Mestrado em Educação, Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas. Campinas: [s.n.], 1998. CALDART, Roseli Salete et alii (orgs.). Dicionário da Educação do Campo. Rio de Janeiro, São Paulo: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, Expressão Popular, 2012. FERNANDES, Bernardo Mançano. A questão agrária no limiar do século XXI. In: Espaço e Geografia, v.04, p.07-24, 2001.. Construindo um estilo de pensamento na questão agrária: o debate paradigmático e o conhecimento geográfico. Tese de Livre-Docência, Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia. Presidente Prudente: [s.n.], 2013. GIRARDI, Eduardo Paulon. Proposição teórico-metodológica de uma cartografia geográfica crítica e sua aplicação no desenvolvimento do atlas da questão agrária. Tese de Doutorado em Geografia, Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista. Presidente Prudente: [s.n.], 2008. MARTINS, José de Souza. Os camponeses e a política no Brasil. As lutas sociais no campo e seu lugar no processo político. Petrópolis: Vozes, 1981.. O Cativeiro da Terra. 7ª edição. São Paulo: HUCITEC, 1998. OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. O campo brasileiro no final dos anos 80. In: A Questão Agrária Hoje. 2ª edição. Porto Alegre: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1994.. Barbárie e Modernidade: As Transformações no Campo Brasileiro e o Agronegócio no Brasil. In: Revista Terra Livre, São Paulo: AGB, ano 19, n. 21, jul-dez, 2003, p. 113-156. SILVA, José Graziano da. A Modernização Dolorosa. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981.. A Nova Dinâmica da Agricultura Brasileira. Campinas: UNICAMP, 1996. STÉDILE, João Pedro (Coord.). A Questão Agrária Hoje. 2ª edição. Porto Alegre: Editora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 1994.

6 (org.). A Questão Agrária no Brasil: O debate tradicional - 1500-1960. 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2011. (org.). A Questão Agrária no Brasil: O debate na esquerda - 1960-1980. 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2012. (org.). A Questão Agrária no Brasil: Programas de reforma agrária - 1946-2003. 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2012. (org.). A Questão Agrária no Brasil: História e natureza das Ligas Camponesas - 1954-1964. 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2012. (org.). A Questão Agrária no Brasil: A classe dominante agrária natureza e comportamento - 1964-1990. 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2012. (org.). A Questão Agrária no Brasil: O debate na década de 1990. 2ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2013. (org.). A Questão Agrária no Brasil: O debate na década de 2000. 1ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2013. (org.). A Questão Agrária no Brasil: Debate sobre a situação e perspectivas da reforma agrária na década de 2000. 1ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2013.