DESPACHO SEJUR Nº 086/2012 (Aprovado em Reunião de Diretoria em 03 de maio de 2012) Expediente nº 2024/2012 Cuida-se de Comunicação Interna em que o Sr. Corregedor do CFM indaga ao SEJUR, pontualmente, o seguinte: Quais são os atos que podem ser considerados como interrupção de prescrição intercorrente, na aplicação do Código de Processo Ético-Profissional CPEP. Manifestação. Inicialmente é preciso esclarecer que as causas interruptivas do lapso prescricional previstas no art. 61 do CPEP se aplicam somente aos processos já instaurados (em curso) e não à fase inquisitória (Sindicância), onde o fluxo prescricional quinquenal flui ininterrupto a partir do conhecimento do fato pelo CRM. A redação do art. 61 do CPEP é a seguinte: Art. 61. São causas de interrupção de prazo prescricional: I - o conhecimento expresso ou a citação do denunciado, inclusive por meio de edital; II - a apresentação de defesa prévia; III - a decisão condenatória recorrível; IV - qualquer ato inequívoco, que importe apuração dos fatos. Da interpretação do inciso IV, do art. 61 do CPEP. Entendemos que a previsão deste inciso IV do art. 61 do CPEP não é muito feliz, isto porque a interpretação e aplicação deste inciso se apresenta com alta carga de subjetividade, o que deve ser evitado em nome do princípio da segurança jurídica. Mas, dura lex, sed lex (a lei é
dura, porém é lei). Assim, devemos procurar harmonizar os seus termos à realidade vivida pelos Conselhos de Medicina. Nessa linha de raciocínio podemos afirmar que além da segurança jurídica, a prescrição intercorrente se direciona à consecução do princípio constitucional da eficiência da Administração Pública, cuja resposta à sociedade deve ser rápida, técnica, transparente e fundamentada, calcada na legalidade e no interesse público, ao mesmo tempo em que se protege os direitos individuais. Registra-se que a previsão da prescrição intercorrente garante à sociedade uma maior efetividade e acerto nas decisões administrativas, uma vez que o processo não poderá ficar paralisado injustificadamente sem uma conclusão; ou seja, ou se prosseguirá as investigações até uma conclusão, resguardando o interesse público, ou será arquivado pelo decurso do tempo sem novos elementos conclusivos, protegendo o direito do particular. Com efeito, temos que a prescrição intercorrente, como qualquer outra forma de prescrição, pune a inércia do titular do direito de punir do Estado/Administração em exercê-lo. Mais propriamente, pune a inércia da Administração Pública no seu poder investigatório, consubstanciada na ausência de atos de apuração dos fatos ou de conclusão do processo administrativo. Nessa linha de raciocínio, o que é ato inequívoco, que importe apuração dos fatos? Respondemos. De conformidade com as regras do devido processo legal, com substrato constitucional e legal, ato inequívoco de apuração do ilícito ético é a própria notificação (citação) do indiciado/denunciado comunicando a instauração do processo éticoprofissinal; dentre outros atos que deixem clara a intenção de investigar. Na medida em que o Conselho Regional de Medicina toma conhecimento do fato deve determinar a instauração de Sindicância para melhor apurar a autoria e a materialidade da infração, se estas já não estiverem suficientemente esclarecidas. Após, se o caso, na forma do art. 8º do CPEP, poderá ocorrer o arquivamento ou a abertura de PEP. Caso a decisão seja pela abertura de PEP, o conhecimento expresso ou a citação/notificação do denunciado implicará na interrupção do prazo prescricional (art. 61, I, CPEP). Com efeito, não podemos considerar toda e qualquer manifestação do agente público, ainda que despida de cunho investigativo
como ato inequívoco de apuração dos fatos, sob pena de permitir que a Administração Pública, de maneira transversa, transforme as condutas antiéticas imprescritíveis ao arrepio da Constituição Federal que.orienta em sentido contrário ( 5º, art. 37). Desta forma, os atos processuais de cumprimento de expedientes internos da Secretaria ou Seção, ou a apresentação de argumentos de defesa por parte do investigado, ou ainda, a juntada de documentação para a regularidade da representação processual das partes, como juntada de procuração, substabelecimentos ou renúncia de mandato, etc. não podem ser considerados como marco interruptivo da prescrição, pois não implicam em efetiva apuração dos fatos. Por outro lado, a mera e simples movimentação interna corporis do processo administrativo e mesmo a concessão de cópia ou vistas dos autos aos interessados também não têm o condão de interromper a prescrição, na forma prevista no art. 61, IV do CPEP. Da interpretação do art. 62 do CPEP. Iniciamos pela transcrição da redação do art. 62 do CPEP, que é a seguinte: Art. 62. Todo processo disciplinar paralisado há mais de 3 (três) anos, pendente de despacho ou julgamento, será arquivado ex-officio ou sob requerimento da parte interessada, sem prejuízo de serem apuradas as responsabilidades pela paralisação. (g. n.) Entendemos que a prescrição intercorrente para os fins do art. 62 do CPEP é aquela que se verifica quando já há processo éticoprofissional instaurado. Assim, a inércia da Administração por período superior a três anos implicará na perda do poder de punir. Contudo, para a correta aplicação deste dispositivo é preciso definir qual o exato sentido e compreensão da expressão pendente de despacho ou julgamento, contida na norma supra referida. A compreensão do termo julgamento. Aqui, nos parece que a norma quis se referir às decisões colegiadas inerentes aos Conselhos de Medicina. Assim, julgar é fazer juízo de valor sobre os fatos imputados ao denunciado, em cotejo com as provas constantes dos autos e emitir opinião a respeito da sua procedência ou improcedência. Ou seja, é condenar ou absolver o médico denunciado
das acusações contidas na denúncia. Nesse sentido o termo julgamento é utilizado no art. 8º, bem como é empregado na Seção II Do Julgamento (arts. 30 40), tudo do CPEP. O Vocabulário Jurídico 1 trás a definição do termo julgamento da seguinte forma: julgamento é a formação de juízo a respeito do assunto, que motiva a contenda. Juízo, aí, deve ser tido com convicção, compreensão, persuasão, capacitação. Por ele, então, formada a convicção ou formado o convencimento, em face dos fatos apresentados e dos elementos examinados, o juiz ou julgador, si paret (se está claro), formula sua sentença, que será condenatória ou absolutória. A sentença, pois, é o resultado, é a conseqüência do julgamento, é parte dele, visto que o julgamento se estrutura antes, pelo convencimento, pela capacitação, a que chegou o julgador, a respeito da verdade sobre os fatos controvertidos ou em debate na demanda. A compreensão do termo despacho. Saber qual é o exato significado do termo despacho irá facilitar a aplicação desta norma aos casos concretos. Este termo, ao contrário do termo julgamento, pode gerar maiores dificuldades para o interprete e aplicador da norma. Todavia, pensamos que a melhor orientação para a definição do termo despacho deve ser a contida no 3º do art. 162 do CPC, que tem a seguinte redação: Art. 162. Os atos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos.... 3 o São despachos todos os demais atos do juiz praticados no processo, de ofício ou a requerimento da parte, a cujo respeito a lei não estabelece outra forma. O Vocabulário Jurídico 2 trás a definição do termo despacho da seguinte forma: Despacho. Na técnica forense e administrativa, exprime a decisão proferida pela autoridade judicial ou administrativa nas petições, memoriais ou demais papéis submetidos pelas partes a seu conhecimento e solução. Como podemos inferir o termo despacho, constante desta norma, tem uma conotação positiva significando que a autoridade 1 DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico. 26ª edição; atualizadores Nagib Slabi Filho e Gláucia Carvalho; RJ: Forense, 795/796. 2 DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico. 26ª edição; atualizadores Nagib Slabi Filho e Gláucia Carvalho; RJ: Forense, 795/796.
processante irá se manifestar expressamente em razão de uma petição, memoriais ou outros papéis que lhe forem submetidos pelas partes. Assim, despacho, para os fins do art. 62 do CPEP, deve ter algum conteúdo decisório em resposta a algum requerimento formulado pelas partes interessadas. Não pode, ao contrário, ser entendido como sendo qualquer ato de mero impulso processual, como por exemplo: simples juntada de petições e documentos de interesse das partes; prorrogação de prazo para o conselheiro instrutor ou relator; juntada de ofícios oriundos de Juízes de Direito, membros do Ministério Público, de Delegados de Polícia e outras autoridades solicitando cópias de documentos ou informação a cerca do atual andamento do processo. Não podemos perder de vista que a razão de ser desta norma é reprimir a inércia da Administração em detrimento da segurança jurídica e da eternização dos processos. Por outro lado, a título de esclarecimento, para os fins do art. 62 do CPEP, despachos que têm o condão de interromper a prescrição são os seguintes, sem excluir outros da mesma natureza: determinação de abertura de sindicância ou PEP; designação de instrutor ou relator; substituição de instrutor ou relator, quando devidamente justificada; decisão que admite a produção de determinadas provas, inclusive a prova pericial ou outra diligência necessária para elucidação dos fatos; determinação de expedição de cartas de intimação das partes interessadas; expedição de carta precatória para alguma diligência de conteúdo relevante. Se não forem observadas estas mínimas cautelas poderemos chegar à conclusão de que os processos administrativos, em sua totalidade, poderão implicar no afastamento definitivo do instituto da prescrição (intercorrente), pois à Administração bastará a prática de qualquer ato processual de impulso oficial do processo ou de comunicação para interromper a prescrição. Com isso, poderemos ter centenas ou dezenas de atos processuais capazes de interromper a prescrição (intercorrente) e tornar letra morta o art. 62 do CPEP. Pensamos que assim como ocorre no Direito Penal, o processo administrativo disciplinar deve respeitar o princípio do favor rei (princípio da inocência ou in dúbio pro reo). No caso em análise, não caberia ao intérprete ampliar demasiadamente um conceito para prejudicar o denunciado.
III - CONCLUSÃO Com essas considerações, esperamos ter atendido a solicitação formulada pelo Sr. Corregedor do CFM e colaborado para melhorar a aplicação das normas contidas no CPEP. À consideração superior. Brasília, 14 de março de 2012. Antonio Carlos Nunes de Oliveira Assessor Jurídico Giselle Crosara Lettieri Gracindo Chefe do SEJUR Desp. SEJUR 086_12_Exp. 2024_12_Ato inequívoco_art. 61, IV_Prescrição intercorrente_art. 62_CPEP_acno