Parte I COMO CONDUZIR A TIP



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Transcrição:

Parte I COMO CONDUZIR A TIP

1 O Que é a TIP? Visão geral A Psicoterapia Interpessoal (TIP) é uma psicoterapia específica e com tempo limitado, que foi desenvolvida durante um período de 30 anos, inicialmente para pacientes com transtorno depressivo maior, mas posteriormente adaptada também para outros transtornos. Planejada para administração por profissionais experientes e treinados da área de saúde mental, ela também pode ser ensinada clinicamente a pessoas menos treinadas. A TIP tem sido utilizada com e sem medicação (ver Klerman, Weissman, Rounsaville e Chevron, 1984; Weissman, Markowitz e Klerman, 2000, para o manual completo; uma história breve sobre ela pode ser encontrada em Weissman, 2006). O exemplo principal de TIP aqui apresentado ilustra o tratamento de pacientes com transtorno depressivo maior porque este é o uso mais bem estabelecido e mais amplamente empregado. A abordagem da TIP reconhece que os pacientes podem ter transtornos comórbidos. A abordagem se aplica a uma variedade de faixas etárias com depressão maior e a muitos outros transtornos. As adaptações para outras faixas etárias e subtipos depressivos e para outros transtornos são descritas nas Partes II e III respectivamente. A depressão geralmente ocorre no contexto de um evento social e interpessoal. Alguns eventos comuns são: dissolução do casamento; disputa que ameaça um relacionamento importante; perda do interesse do cônjuge e caso extraconjugal; perda ou risco de perda do emprego; mudança para outro bairro; morte de pessoa querida; promoção ou rebaixamento de posto; aposentadoria; diagnóstico de doença clínica.

20 Myrna M. Weissman John C. Markowitz Gerald L. Klerman A compreensão do contexto social e interpessoal do desenvolvimento da depressão pode ajudar a desvendar as razões dos sintomas. Este pode ser o primeiro passo na ajuda ao paciente para levá-lo a entender a depressão como uma doença e desenvolver novas formas de lidar com as pessoas e as situações. O desenvolvimento dessas novas habilidades sociais pode tratar o episódio atual e reduzir a vulnerabilidade futura. A TIP foi desenvolvida para especificar o que pensamos ser um conjunto de procedimentos úteis comumente usados na psicoterapia para pacientes deprimidos não-internados. Acreditamos que definir tais práticas pode ajudar mais terapeutas a usarem esses procedimentos de forma mais efetiva. Os pacientes também devem ser melhor informados quanto ao que esperar. A TIP foi testada em numerosos ensaios de tratamento clínico para depressão, em que foi comparada à medicação psicotrópica, ao placebo, a outras psicoterapias breves e à não-psicoterapia. Ela também foi testada em combinação com medicação. A TIP é uma das psicoterapias recomendadas para o tratamento da depressão nas Recomendações da Associação Americana de Psiquiatria e nas Recomendações aos Médicos de Cuidados Primários (ver http://www.psych.org/ psych_pract/treatg/pg/prac_guide.cfm para mais detalhes). Existem vários tratamentos apropriados para a depressão. Existe uma ampla gama de medicações eficazes e várias psicoterapias úteis. Frequentemente elas são usadas em combinação. É interesse ao paciente deprimido que haja uma variedade de tratamentos benéficos à disposição, mas todos eles devem ser submetidas a testes científicos antes que se possa fazer qualquer argumentação em seu favor. A TIP pode ser uma alternativa importante à medicação para os pacientes durante alguns períodos da vida (p.ex., mulheres durante a gravidez ou amamentação, pessoas idosas e outras que já tomaram muitas medicações e têm dificuldades com os efeitos colaterais, pacientes deprimidos que estão prestes a se submeterem a cirurgia e pacientes que simplesmente não querem tomar medicação). A psicoterapia também pode beneficiar particularmente os pacientes que se encontram em crises vitais e precisam tomar decisões importantes, como o que fazer com um relacionamento que está fracassando ou uma carreira que está em risco. Isto não diminui de forma alguma a importância da medicação como um tratamento antidepressivo. A medicação pode ser especialmente útil para pacientes que precisam de alívio sintomático rápido, têm depressão melancólica ou delirante, não respondem à psicoterapia ou simplesmente não querem falar sobre seus problemas pessoais com um terapeuta. A visão eclética do tratamento faz parte da filosofia da TIP. Conceito de Depressão na TIP A TIP está baseada na ideia de que os sintomas da depressão têm causas múltiplas, genéticas e ambientais. Contudo, seja qual for a causa, a depressão

Psicoterapia Interpessoal 21 não surge isoladamente. Os sintomas depressivos estão geralmente associados a alguma coisa que está acontecendo na vida pessoal do paciente no momento, geralmente associada a pessoas de quem ele se sente próximo. É útil que se identifique e se aprenda a lidar com esses problemas interpessoais e a entender a sua relação com o desencadeamento dos sintomas. O terapeuta de TIP vê a depressão constituída por três partes: 1. Sintomas. Os sintomas emocionais, cognitivos e físicos da depressão incluem humor deprimido e ansioso, dificuldade de concentração, indecisão, uma visão pessimista, culpa, distúrbios do sono e da alimentação, perda de interesse e prazer na vida, fadiga e risco de suicídio. 2. Vida social e interpessoal. Habilidade de se relacionar bem com outras pessoas importantes na vida do paciente (p.ex., família, amigos, colegas de trabalho). O suporte social protege contra a depressão, enquanto que os estressores sociais aumentam a vulnerabilidade à depressão. 3. Personalidade. Existem padrões duradouros por meio dos quais as pessoas lidam com a vida: como elas se impõem, expressam suas raivas e dores, mantêm sua autoestima, e se são tímidas, agressivas, inibidas ou desconfiadas. Estes padrões interpessoais podem contribuir para o desenvolvimento e a manutenção da depressão. Os indivíduos deprimidos frequentemente descrevem uma passividade constante, evitação de confrontos e evitação de risco social em geral; essas táticas depressivas podem levar a resultados depressivos. Alguns terapeutas começam tentando tratar as dificuldades de personalidade de uma pessoa e encaram a personalidade como a causa subjacente da depressão. O terapeuta de TIP não tenta tratar a personalidade e, na verdade, reconhece que muitos comportamentos que parecem duradouros e de toda uma vida podem ser um reflexo da própria depressão. Os pacientes podem parecer dependentes, extremamente preocupados consigo mesmos e irritáveis quando deprimidos; entretanto, quando a depressão se dissipa, estes traços supostamente permanentes também desaparecem ou retrocedem. Esta é a notória confusão clínica entre estado depressivo e traço de personalidade. O ponto forte da TIP é tentar entender o contexto interpessoal em que os sintomas depressivos surgiram e como eles se relacionam com o contexto social e pessoal no presente. O terapeuta da TIP procura o que está acontecendo atualmente na vida do paciente (problemas do aqui e agora ) em vez de problemas na infância ou no passado. A ideia é encorajar o enfrentamento desses problemas atuais e o desenvolvimento da independência fora da situação terapêutica. O curto limite de tempo do tratamento exclui qualquer reconstrução importante da personalidade. Muitos pacientes se sentem muito melhor quando sua depressão se dissipa. Uma

22 Myrna M. Weissman John C. Markowitz Gerald L. Klerman psicoterapia de tempo limitado e com o tempo especificado pode ajudar a que se focalizem nos objetivos e proporciona aos pacientes a esperança de que eles se sentirão melhor dentro de um curto período de tempo. Embora a TIP já tenha sido usada durante períodos de até três anos como tratamento de manutenção (Capítulo 1), na prática a maioria das psicoterapias é breve. Não há nada que impeça uma renegociação do tempo acrescentando continuação ou manutenção ao tratamento da fase aguda quando terminar o tempo de tratamento especificado para a fase aguda. Por outro lado, se a TIP não tiver se mostrado útil no final desta intervenção de tempo limitado, pode ser adequado que se reconsidere o plano de tratamento. Genes e TIP Os progressos na genética e nas neurociências transformaram a psicoterapia em um instrumento ainda mais importante na psiquiatria. Os transtornos psiquiátricos são síndromes geneticamente complexas, comparáveis ao diabete e à hipertensão, em que tanto os genes quanto o ambiente são importantes e estão em interação (Caspi et al., 2003). O genótipo, influenciado pelo ambiente, é expresso no fenótipo (a aparência clínica). Para os transtornos psiquiátricos, o ambiente mais importante consiste nos vínculos pessoais íntimos. Essas conexões, a sua disponibilidade e o seu rompimento (ou ameaça de rompimento) podem influenciar de forma poderosa a emergência de sintomas (expressão fenotípica), especialmente em indivíduos geneticamente vulneráveis. As situações em que esses rompimentos podem ser encontrados e quando os sintomas podem surgir foram definidas como as áreas focais na TIP. São elas: Luto (luto complicado); Disputas interpessoais de papéis; Transições de papéis interpessoais; Déficits interpessoais (escassez de vínculos). A TIP é usada com pacientes que desenvolvem sintomas em associação com estas situações. Praticamente todos os pacientes deprimidos irão se encaixar em uma dessas quatro categorias. A vulnerabilidade genética não pode ser facilmente alterada, mas o ambiente pode. Os sintomas podem melhorar com a clarificação, compreensão e especialmente com o manejo dessas situações interpessoais associadas ao início dos sintomas. A psicoterapia pode ser de importância crucial para essa mudança. As evidências mostraram que este paradigma funciona para a depressão maior em pacientes de todas as idades e também pode ser aplicado a alguns outros transtornos psiquiátricos. É disto que trata a TIP para depressão e suas adaptações.

Psicoterapia Interpessoal 23 Objetivos da TIP Os objetivos da TIP são: 1. reduzir os sintomas da depressão (isto é, melhorar o sono, o apetite, a energia e a visão geral sobre a vida) 2. ajudar o paciente a lidar melhor com as pessoas e as situações de vida associadas ao início dos sintomas. Muito provavelmente, o paciente irá atingir os dois objetivos. Se conseguir resolver uma crise interpessoal importante (p.ex., uma transição de papéis), isto não somente irá melhorar a vida do paciente como também deverá aliviar os seus sintomas depressivos. O terapeuta da TIP irá focar em: problemas atuais; pessoas que atualmente são importantes na vida do paciente; ajuda para o paciente avaliar a sua vida no momento atual; afeto do paciente (sentimentos positivos e negativos); ajuda para o paciente ter domínio sobre os problemas presentes através do reconhecimento das suas respostas emocionais a essas situações, usando as respostas para lidar com elas, e o desenvolvimento de novas amizades e relacionamentos. O terapeuta da TIP não irá: interpretar sonhos; permitir que o tratamento continue indefinidamente; investigar a infância inicial; incentivar a livre associação; incentivar a dependência do tratamento ou do terapeuta; colocar o foco nas cognições. O paciente é visto como uma pessoa em sofrimento, que padece de uma doença e tem sintomas que podem ser tratados no presente. O terapeuta da TIP terá que saber: quando começaram os sintomas; o que estava acontecendo na vida do paciente quando eles começaram; os estressores atuais;

24 Myrna M. Weissman John C. Markowitz Gerald L. Klerman as pessoas envolvidas nesses estressores atuais; as disputas e decepções; os meios que o paciente dispõe para lidar com esses problemas; os pontos fortes do paciente; as dificuldades interpessoais do paciente; se o paciente consegue falar sobre situações que produzem culpa, vergonha ou ressentimento. O terapeuta da TIP irá: ajudar o paciente a explorar as opções. (O terapeuta pode dar conselhos e sugestões para lidar com os problemas, mas os resultados alcançados normalmente são melhores quando as perguntas possibilitam ao paciente descrever as suas próprias opções.); fornecer psicoeducação e corrigir informações erradas a respeito da depressão; ajudar a desenvolver recursos externos. O terapeuta da TIP não irá enfocar a razão de o paciente ter se tornado o que é o objetivo é encontrar um caminho para sair dos problemas, e não uma especulação sobre: a infância; o caráter; as defesas psicodinâmicas; as origens da culpa, vergonha ou ressentimento. (Entende-se que estes são sintomas da doença depressiva.); a vida de fantasia ou insight sobre as origens do comportamento. Entendendo como a depressão começou Para desenvolver uma compreensão de como começou o episódio depressivo e o contexto atual em que ele emergiu, o paciente deve responder às seguintes perguntas: 1. Quais são os seus problemas no momento? 2. Quais as pessoas que são importantes para você atualmente? Quem são os apoios potenciais e de quem você pode ter se afastado? 3. Quando você começou a se sentir deprimido, triste, de baixo astral? 4. O que estava acontecendo na sua vida quando você começou a se sentir deprimido? Deu-se algum fato perturbador? Morreu alguma pessoa próxima a você?

Psicoterapia Interpessoal 25 5. Neste momento da sua vida você está envolvido em disputas ou desentendimentos com outras pessoas? Como você está lidando com essas disputas? 6. Quais são os seus desapontamentos atuais? Como você está lidando com eles? 7. Quais as situações que fazem você se sentir culpado, envergonhado ou irritado? 8. O que estressa você? 9. Quais as coisas em que você acha que se sai bem? (Ou conseguia se sair bem antes de ficar deprimido?) Fatos sobre a depressão Estes fatos são bem conhecidos por muitos, mas não por todos os profissionais de saúde mental. Existem tipos diferentes de depressão: transtorno depressivo maior, transtorno distímico (Capítulo 16) e transtorno bipolar (Capítulo 17). A depressão maior é um dos transtornos psiquiátricos mais comuns, afetando 3 a 4% dos indivíduos em algum momento da vida. A depressão é mais comum em mulheres do que em homens. (Isto é tranquilizador para as pacientes mulheres, mas não é uma coisa que você necessariamente queira enfatizar para os homens, que podem se sentir diminuídos ao ouvirem isto.) A depressão é sob outros aspectos um transtorno de oportunidades iguais. Ela afeta ricos e pobres e pessoas de todas as raças e culturas. A depressão é um caso de família. Ela circula nas famílias e tem consequências sérias para a vida familiar. A depressão está ocorrendo com cada vez mais frequência nas pessoas mais jovens. Existem muitos tratamentos efetivos para a depressão, incluindo medicações e determinadas psicoterapias. Às vezes esses tratamentos são combinados. A depressão tende a ser um transtorno recorrente. Alguns pacientes irão precisar de tratamento por longos períodos. Outros terão uma crise e nunca mais terão outro período com sintomas. Nenhum tratamento é adequado para todos os pacientes ou para todos os tipos de depressão. Se um tratamento não funcionar após um tempo considerável, você e o paciente deverão estimar um novo prazo. (Na verdade, se a TIP não ajudou depois do período inicial, você e o paciente devem considerar uma troca ou aumentá-la.)

26 Myrna M. Weissman John C. Markowitz Gerald L. Klerman Algo a ser considerado para dizer ao paciente: Os momentos fugazes em que você se sente triste e de baixo astral ou deprimido fazem parte da condição humana normal. Essas mudanças passageiras de humor dizem ao indivíduo que alguma coisa não está tão bem na sua vida. A depressão clínica é diferente: ela é persistente, causa prejuízos e inclui uma gama de sintomas. Existem tipos diferentes de depressão. É de grande proveito aos pacientes fornecer-lhe um diagnóstico preciso: transtorno depressivo maior, depressão menor, transtorno distímico ou transtorno bipolar. Transtorno depressivo maior O transtorno depressivo maior, o tipo mais comum de depressão, inclui um humor triste ou disfórico e perda de interesse ou prazer em todas ou quase todas as atividades ou passatempos usuais da pessoa. Este humor persiste por pelo menos várias semanas e está associado a outros sintomas que ocorrem quase todos os dias, incluindo perturbações do apetite (perda ou aumento do apetite), alterações no peso, perturbações do sono (dificuldade para pegar no sono, acordar no meio da noite e não conseguir voltar a dormir, acordar cedo de manhã e sentir-se muito mal) e perda do interesse e do prazer por comida, sexo, trabalho, família, amigos, etc. Agitação, sensação de preguiça, diminuição da energia, sentimentos de desvalorização ou culpa, dificuldade para se concentrar ou pensar, pensamentos de morte, sentimento de que a vida não vale a pena ser vivida, tentativas de suicídio ou mesmo o suicídio são outros sintomas de depressão. Segundo o Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais, quarta edição (DSM-IV), os pacientes que expressam pelo menos cinco dos nove sintomas, que persistem por várias semanas e resultam em uma redução da capacidade do paciente para cuidar de si ou da família ou para ir ao trabalho e prosseguir com a vida diária e excluindo outras causas físicas como hipotireoidismo atendem aos critérios de transtorno depressivo maior. Veja a Tabela 2.1 no próximo capítulo e a Escala Hamilton de Avaliação da Depressão, no Apêndice. Subtipos de transtorno depressivo maior Sabe-se há muito tempo que existem formas diferentes de transtorno depressivo maior, geralmente definidas por grupos particulares de sintomas, e foram sugeridos muitos subtipos. Os estudos de pesquisas demonstram que a depressão que tem as implicações de tratamento mais importantes é a do tipo delirante.

Psicoterapia Interpessoal 27 A depressão delirante, ou psicótica, inclui os sintomas usuais de depressão, como também distorções de pensamento relacionadas a temas depressivos como culpa, autoacusação, sentimento de inadequação ou uma crença de que se é merecedor de punição. As pessoas com depressão delirante podem sentir que a depressão se desenvolveu porque elas são más ou merecem estar deprimidas. A depressão delirante não é frequente. Quando ocorre, ela requer medicação ou eletroconvulsoterapia e geralmente não pode ser tratada por nenhuma psicoterapia isoladamente, incluindo a TIP. Depressão leve Muitas pessoas têm depressão leve ou depressão subsindrômica (p.ex., sintomas como problemas de sono ou perda do interesse, que não atingem o limiar dos critérios para transtorno depressivo maior). Estes estados são chamados por diferentes nomes: depressão menor, depressão sem outra especificação, depressão/ansiedade mista, ou transtorno de ajustamento com humor depressivo. As pessoas com estes sintomas mais leves geralmente não buscam tratamento ou são vistas pelo seu médico de família, um médico de cuidados primários ou um clínico em alguma organização de cuidados à saúde (Capítulo 15). Se estes sintomas persistirem, não devem ser ignorados, já que são prejudiciais e podem interferir na qualidade de vida e produtividade da pessoa. Além do mais, os sintomas da depressão menor aumentam o risco de desenvolvimento de transtorno depressivo maior. Transtorno distímico A característica principal do transtorno distímico é uma perturbação crônica do humor (isto é, sentimento de tristeza ou melancolia, perda do interesse em atividades, baixa energia), mas os sintomas não são de gravidade suficiente para satisfazer os critérios para transtorno depressivo maior. Eles são de leves a moderados e constantes. Devem durar pelo menos dois anos para que sejam considerados transtornos distímicos, mas frequentemente duram décadas. Indivíduos assim acometidos, frequentemente confundem esta depressão crônica com a sua personalidade melancólica e podem não procurar tratamento, encarando o problema como um traço de personalidade que não pode ser mudado. Além disso, a cronicidade do transtorno distímico por vezes o torna mais debilitante do que a depressão maior episódica, e é tratável. A TIP foi adaptada a estes sintomas e está sendo testada em pacientes com transtorno distímico (Markowitz, 1998; Markowitz, Kocsis, Bleiberg, Christos e Sacks, 2005).

28 Myrna M. Weissman John C. Markowitz Gerald L. Klerman Transtorno bipolar O transtorno bipolar inclui a presença de estados maníacos além da depressão. A mania é um estado em que o humor permanece predominantemente elevado (sentir-se animado, eufórico), expansivo ou irritável. Este humor é acompanhado de atividade excessiva, pensamento acelerado, um sentimento de poder, autoestima excessivamente alta, necessidade de sono diminuída, distratibilidade e envolvimento impulsivo em atividades que têm um potencial alto para consequências desagradáveis, como gastos excessivos ou atividades sexuais em excesso. O transtorno bipolar também pode incluir sintomas psicóticos. A TIP foi adaptada e mostrou-se benéfica como coadjuvante da medicação para pacientes que têm transtorno bipolar (ver Capítulo 17). Os pacientes com transtorno bipolar precisam de medicação.