filosofia & literatura Carlos João Correia
bhagavān - feliz, adorável, divino, título de Kṛṣṇa [Krishna] gītā - (fem.) canção, poema भगव$ त - bhagavadgītā
The Bhagavad Gītā. Ed. e trad. de Winthrop Sargeant. Albany: State University of New York Press, 1994. The Bhagavad Gītā in the Mahābhārata. Ed. e trad. Van Buitenen. Chicago: Chicago University Press, 1981. Mahābhārata. Book VI: Bhīṣma (1) including the Bhagavad Gītā in context. Trad. de Alex Cherniak. New York: New York University Press/JJC Foundation, 2008. Bhagavad-Gītā. A Canção do Senhor. Ed. e trad. de J.C. Calazans. Lisboa: Ésquilo, 2010.
O que é uma epopeia? Uma epopeia é um longo poema narrativo sobra as acções de guerreiros e heróis. É uma narrativa heróica, poligonal, que incorpora no seu seio mito, lenda, contos populares e história. As epopeias têm frequentemente uma significação nacional no sentido do que elas incorporam a história e as aspirações de uma nação numa forma majestosa ou grandiosa. Basicamente,existem dois tipos de epopeias: (a) primárias (b) secundárias. O primeiro tipo pertence à tradição oral e é, assim, composto oralmente e recitado; só mais tarde, nalguns casos, é que transcrito. O segundo tipo é escrito logo desde o começo. Na categoria (a) podemos citar, a título de exemplo, Gilgamesh, Ilíada e Odisseia, Beowulf, a Edda antiga. Na categoria (b) podemos referir a Eneida de Virgílio, a Canção de Rolando de autoria anónima, os Lusíadas de Camões, o Paraíso Perdido de Milton e a Lenda dos séculos de Victor Hugo. J.A. Cuddon. The Penguin Dictionary of Literary Terms and Literary Theory. London et al.: Penguin Books.1998 4 [1977], 264-265.
A Bhagavad-Gītā inscreve-se claramente na categoria (a), tendo como seu autor a figura mítica de Vyāsa. A Bhagavad-Gītā [BhG] é um poema épico, de matriz religiosa, que se insere numa epopeia indiana mais ampla, intitulada o Mahābhārata. [VI livro: Bhīṣma]. Mahābhārata significa literalmente Grande [História] de Bhārata (rei Bharata; Bhārat [Índia] ) BhG: II a.c. - I d.c.; Mahābhārata IV a.c. - IV. d.c. A primeira tradução ocidental é portuguesa (Colégio da Companhia de Jesus de Goa - c.1759 - Tradução Summa do Livro, que os Gentios da Ásia chamam Bagavota Guitá); trad.ingl. integral dos 18 capítulos do poema por Charles Wilkins, 1785 (Companhia Inglesa das Índias Orientais). uma das maiores curiosidades alguma vez apresentadas ao mundo literário ; provavelmente o mais belo livro que alguma vez saiu das mãos do homem (Burnouf); o primeiro dos livros (Emerson); [em comparação] o nosso mundo moderno e a sua literatura nos parecem insignificantes e triviais (Thoreau. Walden ou a vida nos bosques,1854).
Contexto narrativo: Dois exércitos estão prestes a confrontarem se. Um dos príncipes de uma das facções, de nome Arjuna, solicita ao seu cocheiro Kṛṣṇa [Krishna] que conduza o seu carro de guerra para o meio dos dois exércitos para que ele possa ver de perto o rosto dos seus inimigos. O príncipe apercebe se então que, do outro lado, no exército adversário, estão familiares, amigos queridos, antigos professores e a sua alma enche se subitamente de compaixão e angústia. O príncipe Arjuna expressa o seu desespero e pergunta se para que lhe serve um reino e até a própria vida, se aqueles mesmos que, nas suas palavras, merecem, por direito, a felicidade, se encontram naquele campo de batalha e, como tal, renunciaram à vida. Mesmo que muitos prossegue Arjuna não se apercebam do mal iminente, ele próprio já o conhece e, como tal, prefere deixar se matar. Perante a grande estupefacção geral dos dois exércitos, depõe as armas com a mente trespassada pela tristeza. Krishna, o seu cocheiro, interroga o sobre as razões de tal desânimo numa hora de tanto perigo e invectiva o a pôr se de pé e a combater. O príncipe declara que mais lhe vale tornar se um pedinte do que entrar nesta guerra e confessando que a sua mente está confusa sobre que deve fazer (dharma) solicita a Krishna que o esclareça, afirmando lhe, no entanto, peremptoriamente que não lutará, sentando se em silêncio. O cocheiro aceita o repto e inicia um longo discurso didáctico filosófico, realizado mesmo no meio daqueles dois grandes exércitos.
Quem são aqueles dois exércitos e por que razão lutam? Luta pelo poder de dois clãs de primos, os Pāṇḍava (dharma) e os Kaurava a batalha que enfrentas é a batalha que cada um de nós deve lugar sozinho com a sua mente. Por isso, [...] deves estar preparado para lutares contra a tua mente, atingindo a liberdade pelos teus próprios esforços, transcendendo os poderes da mente não manifesta. Nesta guerra não haverá necessidade nem de setas nem de servos nem de amigos MhB 14:12, 11-12. "Cada um é por si próprio (ātman) o seu amigo, cada um é por si próprio o seu inimigo. O si próprio (ātman) é um amigo quando se conquistou a si mesmo; mas quando um homem não se conquistou a si, então é hostil a si próprio, age como o seu próprio inimigo." BhG 6:5-6
Árvore genealógica do Mahābhārata
Argumentação de Krishna na Bhagavadgītā 1. exortação à nobreza de carácter de Arjuna 2. o que não é real não tem ser; o que é real não tem não-ser [i.e. não pode não-ser] BhG 2:16 3. o que é imperecível é o âmago, o cerne da nossa identidade BhG 2:17 e 2:12 as armas não a podem cortar, o fogo não a pode queimar, a água não a pode molhar e o vento não a pode secar 2:23 4. Mas mesmo que penses o contrário, nem mesmo assim o podes lamentar 2:26; a morte é certa para aquele que nasce, como o nascimento é certo para aquele que morre; portanto, não te deverias lamentar sobre o que é inevitável 2:27 5. [sabendo isto] como se pode matar alguém ou ser a causa da morte de alguém? (2:21) 6. as consequências [frutos] da acção não deveriam ser o teu objectivo, assim como nunca te deverias atrair pela inacção. (2:47) ninguém pode ficar inactivo nem que seja por um momento; todos são atraídos para a acção, pelas propriedades da natureza. (3:5) todas as acções sem excepção são realizadas pelas propriedades da natureza; mas devido à ilusão do ego as pessoas julgam-se as criadoras (3:27) 7. yoga ( yoga é a cessação das flutuações da consciência [Patañjali 1:2] ) yoga ou via: karma-yoga; dhyāna-yoga [paramātman]; jñāna-yoga; bhakti-yoga