Título: Embalagens biodegradáveis de amido de milho e polipropileno: Influência do agente compatibilizante natural nas propriedades mecânicas Autores: Andréa Bercini Martins (1) & Ruth Marlene Campomanes Santana (2) Filiação: (1,2) Laboratório de Materiais Poliméricos (LAPOL), Departamento de Engenharia de Materiais, Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), RS, Brasil. (1) andrea.bercini@ufrgs.br (2) ruth.santana@ufrgs.br INTRODUÇÃO Hoje em dia, muitos esforços são feitos para reduzir a poluição ambiental resultante do uso exagerado e do descarte incorreto dos plásticos derivados do petróleo. Em vista disso, há um crescente interesse na produção de materiais provenientes de fontes renováveis. Uma dessas fontes são os materiais à base de amido, os quais são bastante atraentes para o desenvolvimento de embalagens biodegradáveis (St-Pierre et al., 1997). O amido, maior componente de cereais e tubérculos, é amplamente estudado para essa aplicação devido ao baixo custo, alta disponibilidade e por ser naturalmente biodegradável (Yu et al., 2013). Contudo, os grupos hidroxila disponíveis na cadeia de amido tornam o, evidentemente, um material muito hidrofílico e com desempenho limitado. Esta característica contribui para dificuldades de processamento, perda de estabilidade dimensional e redução nas propriedades mecânicas. Portanto, o amido não é usado diretamente e a mistura com um termoplástico sintético ainda é necessária (Rodriguez- Gonzalez, Ramsay e Favis, 2003; Ning et al., 2007; Kahar, Ismail e Othman, 2012).
Desta maneira, a compatibilidade entre as fases tem de ser aumentada, uma vez que é extremamente importante para evitar a perda das propriedades. Agentes compatibilizantes são usados a fim de reduzir a energia interfacial e homogeneizar o amido polar na matriz do polímero sintético, melhorando as tensões interfaciais entre as fases (Fig. 1). Uma das alternativas mais exploradas para melhorar a compatibilidade é o uso de polímeros graftizados. O anidrido maleico (MA) é amplamente utilizada para conectar polímeros com diferentes materiais (Taguet, Huneault e Favis, 2009; Rahmat et al., 2009; Kaseem, Hamad e Deri, 2012). Fig. 1 Esquema do comportamento de blendas PP/Amido O objetivo desta pesquisa foi explorar o uso de ácidos carboxílicos orgânicos como agentes de compatibilização proveniente de recursos renováveis como uma alternativa ao empregado comercialmente. Para isso, foram estudados a influência de três ácidos carboxílicos orgânicos nas características mecânicas de misturas de polipropileno (PP) e amido termoplástico (TPS). METODOLOGIA O polipropileno foi fornecido pela Braskem. O amido de milho, grau alimentício, foi adquirido no comércio local da cidade de Porto Alegre, RS, Brazil. Como possíveis agentes compatibilizantes naturais (ACN) foram utilizados os ácidos orgânicos: mirístico (C14), palmítico (C16) e esteárico (C18) fornecidos pela Vetec Química Fina, Rio de Janeiro/Brasil. O polipropileno grafitzado com anidrido maléico (PPgAM) foi fornecido pela PolyBond, e o teor de anidrido maléico era de 1%.
Primeiramente, obteve-se o amido termoplástico (TPS) onde se misturou amido e glicerol, na proporção em massa de 70 e 30%, respectivamente. As blendas PP/TPS, com e sem ACN, foram confeccionadas em extrusora dupla rosca Haake Rheomex PTW16/25. A extrusão foi realizada com perfil de temperatura entre 160 a 190ºC e velocidade da rosca foi de 120rpm. A quantidade de ACN adicionada às blendas foi de 3% ppr. Após mistura na extrusora, as amostras foram transformadas em pellets e então moldadas por injeção em mini injetora Thermo Scientific Haake MiniJet II a uma temperatura de 160ºC, molde aquecido a 60ºC e pressão de 600bar, para confecção dos corpos de prova. As propriedades mecânicas relacionadas a resistência à tração dos materiais foram analisadas de acordo com a norma ASTM D638 com velocidade de ensaio de 5 mm/min, em máquina de ensaios universal INSTRON 3382. Já as relacionadas a resistência ao impacto, foram realizadas de acordo com a norma ASTM D256 no equipamento de impacto IMPACTOR II, com martelo de 2,75J, as amostras não foram entalhadas. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados de resistência à tração do PP e das blendas utilizando ácidos orgânicos diferentes são dadas na Tabela 1. No geral, a adição de amido reduziu as propriedades mecânicas quando comparadas ao PP puro. A blenda sem qualquer agente de compatibilização (PP/TPS) foi a amostra mais rígida e menos resistente à tração, pois apresentou o maior módulo de elasticidade (1326 MPa), a menor resistência à ruptura (15,6 MPa) e a menor deformação na ruptura (102%). Esse comportamento pode ser explicado pelo fato do amido atuar como um concentrador de tensões, reduzindo a resistência à tração, aumentando a fragilidade e induzindo rachaduras durante o ensaio de tração (Iovino et al., 2008). Tabela 1 Resultados do ensaio de resistência à tração das blendas AMOSTRAS Módulo de elasticidade (MPa) Tensão na ruptura (MPa) Tensão no escomanento (MPa) Deformação na ruptura (%) PP 1300,7 ± 59,1 31,3 ± 0,9 31,5 ± 0,9 550,1 ± 41,5 PP/TPS 1326 ± 29,1 15,6 ± 0,7 21,5 ± 0,5 101,6 ± 26,6 PP/TPS/AM 1122,5 ± 48,3 19,6 ± 0,9 25,6 ± 0,6 216,1 ± 34,6 PP/TPS/C14 1146,3 ± 30,2 18,1 ± 0,9 19,5 ± 0,2 253,4 ± 37,4 PP/TPS/C16 1081,5 ± 24,2 16,9 ± 1,3 19,9 ± 0,5 237,9 ± 20,1 PP/TPS/C18 1244,1 ± 42,9 19,5 ± 0,5 23,2 ± 0,3 222,7 ± 18,7
Em todos os casos em que foi utilizado um agente um aumento da flexibilidade das amostras pôde ser observado. Como esperado, a resistência à tração no escoamento e na ruptura foi maior quando o PPgAM comercial foi usado: 25,6 MPa e 19,6 MPa, respectivamente. No entanto, quando o ácido esteárico (PP/TPS/C18) foi utilizado também foi possível ver uma melhoria nas propriedades mecânicas (23,3 MPa e 19,5 MPa). Em ambos os casos, os valores observados se aproximaram ao PP puro (31,5 MPa e 31,3 MPa). O aumento significativo no comportamento mecânico foi atribuído a boa dispersão de amido na matriz polimérica devido ao efeito de compatibilização das substâncias utilizadas. Realmente os ácidos carboxílicos foram incorporados à formulação para interagir com o polímero e com o amido, reduzindo as forças intermoleculares das cadeias de amido, aumentando a mobilidade molecular. No entanto, os resultados dos outros ácidos testados (C14 e C16) não foram tão ruins, uma vez que as suas propriedades não foram severamente danificadas, o que possibilitaria o uso destes para essa aplicação. O resultado da resistência ao impacto pode ser melhor entendido examinando a Fig. 2. Observou-se que todas as blendas apresentaram redução da resistência ao impacto. No caso da amostra sem agente de compatibilidade (PP/TPS), a resistência ao impacto menor foi obtida com uma redução de 60% em relação ao PP puro. Fato já esperado, pois sabe-se que a fraca adesão interfacial induz micro espaços entre o amido e a matriz polimérica, levando a micro fissuras, as quais induzem a propagação de fendas facilmente e diminuem a resistência ao impacto das misturas (Roy et al., 2011).
Figura 2 Resultados de resistência ao impacto Surpreendemente, os valores mais elevados não pertencem às misturas com PPgAM, mas as com o ácido mirístico (PP/TPS/C14). Não se esperava este resultado, mas é muito positivo. Neste caso, a formação de novos grupos, causado pela interação de grupos hidroxila e carboxila do ácido orgânico e os grupos hidroxila do amido, representam novos potenciais pontos reativos, promovendo uma maior interação entre as fases e maior mobilidade, devido a redução das forças intermoleculares (Olivato et al., 2012). CONCLUSÕES Com o objetivo de obter blendas biodegradáveis à base de amido de milho e polipropileno utilizou-se o processamento por extrusão em dupla-rosca. Com base nos resultados obtidos, a adição de amido tem efeito negativo nas propriedades mecânicas. Contudo, a presença de ácidos carboxílicos naturais pode atenuar essa perda, sendo o ácido esteárico (C18) o que apresentou resultados satisfatórios para resistência à tração. E no caso de resistência ao impacto, o ácido mirístico (C14). Esses ácidos melhoraram a interação interfacial, sendo bons substitutos para o agente comercial. Assim, a utilização de ácidos carboxílicos de cadeia longa mostra ser uma alternativa viável e promissora para melhorar a compatibilidade destes materiais. Trabalhos futuros serão realizados para confirmar o aumento da biodegradabilidade destas blendas. BIBLIOGRAFIA
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