6 O PAPEL DA METONÍMIA NOS SUBSTANTIVOS X-DO

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6 O PAPEL DA METONÍMIA NOS SUBSTANTIVOS X-DO A Linguística Cognitiva tem como pressuposto central a hipótese de que a categorização linguística reflete modelos de representações mentais humanas. Categorias como homem alto e vermelho formam parte de um continuum e apresentam graus variados de parentesco dentre suas famílias. Assim, há melhores exemplos do que podemos considerar vermelho, assim como há melhores exemplos de substantivos ou adjetivos (Lakoff, 1987). Esse modo de categorização é adotado pela Linguística Cognitiva e é relacionado à Teoria dos Protótipos (Rosch & Lloyd, 1978). Ademais, de acordo com o paradigma cognitivista, a estrutura semântica das línguas naturais não é encapsulada. Com efeito, a informação linguística é totalmente integrada ao conhecimento de mundo dos falantes, não havendo separação entre conhecimento semântico e conhecimento enciclopédico. Portanto, analisar as formações levando em conta somente sua estrutura formal, desvinculadas do conhecimento de mundo dos falantes não é desejável para uma teoria unificada, conforme os modelos da Linguística Cognitiva. Dentre os mecanismos básicos da cognição está o fenômeno da metonímia. Modelos metonímicos são importantes para a economia do léxico, na medida em que em que nos possibilitam acessar uma entidade conceptual por meio de outra, com a qual é associada em termos de contiguidade. Mediante esse mecanismo, podemos denominar um indivíduo através de uma determinada característica. Dentre alguns exemplos de metonímia, podemos citar: (29) Parte pelo todo: Mais de 100 cabeças viram o jogo. Causa pelo efeito: O Barcelona conquistou o título com muito suor. Lugar por instituição: Houston é responsável pelas operações de voos tripulados.

65 Instrumento pelo indivíduo: O martelo não conseguiu quebrar o frasco. Fenômenos como a metonímia, assim como a metáfora, refletem os modelos de categorização mental dos sistemas conceituais humanos. Esses sistemas conceituais são relacionados à percepção humana do mundo e a certas características corporais tais como a possibilidade de locomoção no espaço, a percepção visual, etc. (Lakoff, 1987). Entretanto, mecanismos como a metonímia e a metáfora são tidos pelas vertentes linguísticas objetivistas (tais como o gerativismo) como saberes extra-linguísticos, de maneira que o conhecimento do léxico e de seus padrões de formação, assim como o saber relativo à derivação dos itens lexicais em estruturas sintáticas são considerados como níveis de interface distintos pertencentes ao saber linguístico. Os diversos exemplos de metonímia em (29) são subcategorias de estruturas conceituais. Dentre as características de um modelo metonímico, podemos citar: Existe um conceito alvo A para ser entendido por alguma razão em um dado contexto. Existe uma estrutura conceitual contendo tanto A quanto outra estrutura B. B é parte de A ou é intimamente associada com esta em uma estrutura conceitual. Tipicamente, a escolha de B determinará A, dentro dessa estrutura conceitual. Comparada com A, B pode apresentar maior facilidade de compreensão, de memorização, de reconhecimento, ou pode ter maior utilidade para alguma finalidade em um dado contexto. Um modelo metonímico é um modelo de como A e B são relacionados em uma estrutura conceitual; o relacionamento é especificado por uma função de B para A (Lakoff, 1987: 84). Também o processo de conversão categorial é metonímico, uma vez que denotamos um indivíduo através de uma propriedade expressa pelo adjetivo. Esse tipo de metonímia consiste na atribuição de uma qualidade ou propriedade pelo indivíduo. No tocante aos papéis semânticos, adjetivos deverbais e substantivos formados por conversão a partir de adjetivos como os do tipo X-do podem corresponder a grupos distintos como beneficiários (beneficiado, convidado, convocado, homenageado), vítimas de afetação física ou psíquica (baleado, ferido,

66 viciado) e até mesmo agentivos profissionais (empregada). Temos, assim, um padrão metonímico correlacionado a um processo morfológico (ou mais de um, se levarmos em conta as características morfológicas da base das regras de formação). Em Basilio (2011) podemos ver a referência aos padrões metonímicos nas formações X-do, que designam indivíduos como afetados pelo ato verbal, os quais, segundo a autora, poderiam estar incluídos em um grupo maior, no qual estariam incluídas formações para denotar indivíduos não humanos (pescado, afogado, grelhado, povoado, etc.). Entretanto, além do processo morfológico formador de adjetivos do tipo X-do (além dos substantivos plenos formados por conversão a partir destes adjetivos), temos ainda uma dimensão social que não é prevista pela estrutura linguística. Assim como ocorre com os agentivos, a designação de substantivos X- do também abarca a função social dos indivíduos na sociedade, ao lado da regra de formação de palavras [X do]adj ->[X do]n (Basilio, 2006: 4). Assim, um refugiado não é apenas um indivíduo que se refugiou, assim como um acusado não é simplesmente um indivíduo que foi acusado: a estrutura lingüística nada nos diz acerca da condição de expatriado ou emigrado do primeiro e da condição de réu em processo jurídico do segundo. Um refugiado é uma pessoa que se encontra fora de seu país de origem e que não pode retornar a ele em virtude de perseguições relacionadas à sua raça, religião ou afiliação política. Um acusado tem de responder por seus atos diante de um júri. Há ainda outros exemplos tais como a formação preso, sinônimo de prisioneiro, que denota um indivíduo maior de idade sob custódia da polícia, com a obrigação de cumprir pena em um presídio durante um determinado período de tempo conforme estabelecido pela lei. Entretanto, um indivíduo que não preencha as condições da definição aqui elaborada, de tal maneira que não se encontra de acordo com o modelo cognitivo idealizado que diz respeito à função dos presos na sociedade, pode não ser um exemplo perfeito para o substantivo derivado do verbo prender. Com efeito, não é qualquer indivíduo que esteja privado de sua liberdade que pode ser qualificado como um integrante da categoria dos presos. Um índio da tribo xavante, por exemplo, habitante das reservas indígenas do Mato Grosso, não está submetido às mesmas normas da sociedade civil brasileira, caracterizando-se, assim, por ser inimputável. Do mesmo modo, dizemos que um menor de idade não é preso, mas sim apreendido ou detido, de maneira que a

67 escolha do termo é regida por regras sociais 12. Assim, um preso é essencialmente uma categoria do sistema carcerário: indivíduos mantidos sob cárcere privado, por exemplo, em razão de não se enquadrarem no esquema aqui descrito não podem ser denotados como presos. Formações como empregado e empregada também atestam a importância de modelos cognitivos para a denotação através do uso das formas em do. Empregado denota uma pessoa que presta serviços ao empregador (sua contraparte agentiva) mediante o pagamento de um salário. No entanto, a formação feminina, empregada, pode caracterizar uma função específica que não está prevista pela estrutura linguística: empregada é a mulher que presta serviços domésticos como em: (30) Ontem, um funcionário dele chegou na residência para levar roupas sujas do operador do mensalão, que foram entregues à empregada. Na análise da morfologia lexicalista, no tocante ao tratamento dos nomes de agente deverbais, é comum a representação através de orações adjetivas que X (onde X é o verbo). Analogamente, poderíamos analisar construções lexicais como substantivos X-do seguindo um modelo semelhante, mas ao fazê-lo deixaríamos de analisar certas propriedades denotativas destas formações. A formação empregada, conforme visto em (30), é problemática para a morfologia lexicalista, na medida em que não pode ser descritas mediante representações simbólicas como aquela ou aquela que foi X onde X é um verbo. Assim, empregada não é apenas uma pessoa que foi empregada, de modo que sua condição como trabalhadora que presta serviços domésticos não é adequadamente representada de acordo com a representação semântica proposta. As formas desempregado e desempregada dizem respeito, no entanto, aos indivíduos que perderam seus empregos, de maneira que o substantivo feminino desempregada não tem qualquer relação com empregada, ou seja, não denota uma pessoa que deixou de exercer a função de empregada doméstica. 12 Os casos de derivados em so e to são arrolados pela gramática tradicional sob a classe de verbos abundantes no particípio (Rocha Lima, 2008: 169). Dessa forma, certos verbos possuem duas formas distintas para o particípio passado, uma regular em do e outra irregular. Usa-se a forma irregular junto ao verbo ser nas construções passivas, ou com valor adjetivo isolado.

68 No que tange ao processo de formação, nomes de agente são diferentes de nomes de afetado na medida em que nomes de agente são ativos, enquanto que nomes de paciente ou afetado, sobretudo aqueles cuja base verbal é um verbo transitivo direto (ou bitransitivo), aparecem no contexto da voz passiva, sendo, portanto, pacientes da ação verbal. (31) O criminoso foi acusado pelo júri. (32) O jovem foi denunciado pelos próprios amigos. A possibilidade de ocorrência em ambas as classes de substantivo e adjetivo é comum aos nomes de agente em dor e nte tanto como aos nomes de afetado em do. Processos de formação de nomes de agente X-dor e X-nte têm substantivos como produtos, tais como: (33) Ajudante Representante Organizador Governador Agentivos em dor e nte constituem um grupo heterogêneo quanto à sua categoria lexical. Podem ser substantivos ou adjetivos (organizador, representante), apenas substantivos (governador, ajudante) e, em poucos casos, apenas adjetivos (tolerante). Entretanto, a construção [[X]do] forma adjetivos, dentre os quais apenas um número limitado de formações pode ocorrer como substantivo. Dentre o grupo de nomes de paciente coletados através da análise do corpus, pode-se identificar certas categorias semânticas. Um dos grupos remete a termos jurídicos, tais como acusado, condenado, culpado, denunciado, investigado. Os nomes de paciente desse grupo são substantivos que designam vítimas de julgamentos ou processos judiciais, devendo, dessa forma, preencher

69 os requisitos supracitados no que toca aos modelos cognitivos idealizados 13, ou seja, devem abarcar apenas os indivíduos passíveis de denúncia 14. Por outro lado, um acusado não é qualquer indivíduo que é alvo de acusação, mas aquele que responde por um crime perante o júri. Assim, temos o juiz como agente (o acusador), emitente do julgamento moral e o acusado como o paciente da ação verbal. Em (32), é evidente a dificuldade de denotar como denunciado o jovem se o contexto não remeter à esfera jurídica. Se o jovem em questão não foi denunciado às autoridades do sistema jurídico, ele não é um candidato à denominação plena como um denunciado. Conclui-se não é qualquer indivíduo denunciado que pode ser denotado através do mecanismo metonímico. Substantivos X-do relacionados ao contexto jurídico fazem parte de um campo semântico maior, que compreende diversas formações ligadas a modelos cognitivos específicos. Assim, temos o exemplo de entrevistado, como participante de uma entrevista. Também é importante ressaltar a importância de traço semântico de pejoratividade em formações utilizadas como substantivos, tais como derrotado e condenado. Outra possibilidade a se considerar é o papel da frequência de uso nas formações reconhecidas como substantivos plenos. Ao lado da regra de formação de adjetivos X-do e da possibilidade de conversão de algumas formações para a categoria dos substantivos, temos de considerar fatores ligados à frequência no reconhecimento de formas X-do em contextos variados. Assim, uma formação como aposentado é mais protípica da categoria de substantivos do que internado, que é mais restrita a determinados modelos cognitivos. 13 Um modelo cognitivo idealizado (Idealized Cognitive Model ICM) é um todo complexo e estruturado, uma gestalt que fornece a estrutura para o nosso conhecimento. De acordo com essa visão, organizamos nosso conhecimento e categorizamos nossas experiências de acordo com os princípios de estruturação dos modelos cognitivos idealizados, a saber: a estrutura posicional, a estrutura imagem-esquemática, mapeamentos metafóricos e mapeamentos metonímicos (Lakoff, 1987: 68). 14 Algumas palavras, no entanto, não se restringem ao contexto jurídico, tais como culpado, dentre outras.