São Paulo, 03 de abril de 2013. Ao Sindicato das Indústrias do Calçado e Vestuário de Birigui Prezados Senhores, Em resposta à consulta de V.Sas., no tocante à constitucionalidade do art. 2º, da Lei nº 14.945 de 14/01/2013, que deu nova redação ao art. 2º, da Lei nº 12.640 de 11/07/2007, cumpre-nos esclarecer o seguinte: Com a promulgação da Lei Complementar nº 103, de 14 de julho de 2000, os Estados e o Distrito Federal foram autorizados a instituir o piso salarial a que se refere o inciso V, do art. 7º, da Constituição Federal de 1988, mediante lei de iniciativa do Poder Executivo. Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: (...) V piso salarial proporcional à extensão e à complexidade do trabalho. A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo aprovou o Projeto de Lei nº 363/07, que deu origem a Lei estadual nº 12.604/07, estabelecendo três faixas de pisos salariais para determinados tipos de trabalhadores, respeitando os pisos fixados em convenção ou acordo coletivo, consoante o disposto no art. 2º, da referida lei, que transcrevemos: Art. 2º - Os pisos salariais fixados nesta lei não se aplicam aos trabalhadores que tenham outros pisos definidos em lei federal, convenção ou acordo coletivo, aos servidores públicos estaduais e municipais, bem como aos contratos de aprendizagem regidos pela Lei federal nº 10.097, de 19 de dezembro de 2000. (grifamos). Posteriomente foram aprovadas outras leis que regulam a matéria que passaram a atualizar os referidos pisos salariais, sem reproduzir a limitação imposta pelo art. 1º da Lei Complementar nº 103/2000, que dispõe: Art. 1º - Os Estados e o Distrito Federal ficam autorizados a instituir, mediante lei de iniciativa do Poder Executivo, o piso salarial de que trata o inciso V do art. 7º da constiutição Federal para os empregados que não tenham piso salarial definido em lei federal,
2 convenção ou acordo coletivo de trabalho. (grifamos). A Lei nº 14.945 de 14 de janeiro de 2013, que modificou a redação do artigo 2º da Lei 12.640/2007, reproduziu com alteração a limitação prevista na Lei nº 103/00, uma vez que estabeleceu sistemática não prevista em lei federal de delegação, ao fixar a seguinte ressalva: Art. 2º - os pisos salariais fixados nesta lei não se aplicam aos trabalhadores que tenham outros pisos definidos em lei federal, em convenção ou acordo coletivo de trabalho, salvo se inferiores ao valor fixado no inciso I do artigo 1º desta lei, bem como aos servidores públicos estaduais e municipais, e, ainda, aos contratos de aprendizagem regidos pela Lei federal nº 10.097, de 19 de dezembro de 2001. (NR) (grifamos). Entendemos que essa interferência do Poder Executivo estadual é incompatível com o direito de negociação coletiva, tendo em vista que os sindicatos de empregados e empregadores devem ter autonomia para negociar, sem intervenção do governo estadual. Isto significa que as entidades sindicais ao fixarem o valor do piso salarial que é resultado do processo de negociação coletiva, com respaldo das suas assembleias, encontram amparo no inciso XXVI, do art. 7º da Constituição Federal de 1988, que dispõe: XXVI - Reconhecimento das convenções e acordos coletivos. Portanto, o art. 2º da Lei nº 14.945/2013 acaba por usurpar a competência legislativa da União para dispor sobre direito do trabalho, extrapolando os estreitos limites da competência delegada aos Estados federados pela Lei Complementar nº 103/2000. Cumpre reiterar que a competência legislativa do Estado de São Paulo para fixar piso salarial decorre da Lei Complementar Federal nº 103, de 2000, mediante a qual a União, valendo-se do disposto no art. 22, inciso I e parágrafo único, da Constituição Federal, delegou aos Estados e ao Distrito Federal a competência para instituir piso salarial para os empregados que não tenham esse mínimo definindo em lei federal, convenção ou acordo coletivo de trabalho.. Na esteira do entendimento do Supremo Tribunal Federal o Colendo Tribunal Superior do Trabalho, pacificou entendimento de que deve prevalecer o piso salarial fixado na convenção coletiva de trabalho em detrimento
3 daquele previsto em lei complementar estadual, ainda que o piso da norma estadual seja mais favorável. Nesse sentido, merecem destaques as seguintes ementas de acórdãos da Seção de Dissídios Coletivos do Colendo Tribunal Superior do Trabalho: "RECURSO ORDINÁRIO. PISO SALARIAL. VALOR INSTITUÍDO EM LEI ESTADUAL. LEI COMPLEMENTAR Nº 103/2000. 1. A Lei Complementar nº 103/2000, na forma prevista no art. 22, parágrafo único, da Constituição da República, e tendo em vista o art. 7º, V, do mesmo Texto Magno, delegou aos Estados e ao Distrito Federal competência para definir, mediante lei, piso salarial, proporcional à extensão e à complexidade do trabalho, para os empregados que não o tenham definido em lei federal, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho. 2. Consoante entendimento já externado pelo STF nos julgamentos das ADI's 4391/RJ e 4.364/SC, com caráter vinculativo, portanto (CF, art. 102, 2º), a delegação legislativa não terá eficácia para os empregados abrangidos por norma coletiva ou lei federal que estabeleça patamar salarial mínimo diverso, não tendo incidência o princípio da norma mais favorável, quando o debate gira em torno da prevalência de lei estadual de norma coletiva autônoma. Precedentes. Recurso ordinário conhecido e provido, no particular." (RO - 1110-30.2010.5.12.0000 Relator Ministro: Walmir Oliveira da Costa, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, DEJT 15/06/2012). "(...) RECURSO ORDINÁRIO INTERPOSTO PELA FEDERAÇÃO DO COMÉRCIO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. PISO SALARIAL. VALOR ESTABELECIDO EM LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL. A decisão do Tribunal Regional merece reforma no aspecto em que estabelece que, a partir de 1º/1/2010, deve ser observado, para a fixação do piso salarial da categoria, o valor do salário mínimo regional previsto na Lei Complementar Estadual 459/2009. Isso porque o entendimento da Seção de Dissídios Coletivos do TST é de que, em vista do entendimento do STF, quando do julgamento da ADI 4391/RJ, o piso salarial fixado por de lei federal, acordo ou convenção coletiva, ainda que de menor valor, prevalece sobre o piso salarial estabelecido na legislação estadual. Recurso ordinário provido, no particular. (...)" (RO - 95400-71.2009.5.12.0000 Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, DEJT 18/05/2012)
4 Nesta linha de raciocínio decidiram a 3ª e a 7ª Turmas do Tribunal Superior do Trabalho, de onde se extrai as seguintes ementas: "AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. DIFERENÇA SALARIAL. PREVALÊNCIA DE PISO SALARIAL INSTITUÍDO EM LEI ESTADUAL EM DETRIMENTO DE CONVENÇÃO COLETIVA. Diante de possível afronta ao artigo 7º, XXVI, da CF, merece seguimento o recurso de revista para melhor exame. RECURSO DE REVISTA. DIFERENÇA SALARIAL. PREVALÊNCIA DE PISO SALARIAL INSTITUÍDO EM LEI ESTADUAL EM DETRIMENTO DE CONVENÇÃO COLETIVA. Embora o piso salarial estabelecido na Lei Estadual seja mais favorável ao empregado, esta e. Corte, por meio da Subseção de Dissídios Coletivos, e na esteira do entendimento do STF, pacificou entendimento de que deve prevalecer o piso salarial fixado na Convenção Coletiva de Trabalho da categoria. Com efeito, no julgamento da ADI 4391/RJ, o STF estabeleceu os limites da lei estadual instituidora de pisos salariais frente aos acordos e convenções coletivas de trabalho. Logo o recurso deve ser provido para excluir da condenação o pagamento das diferenças salariais decorrentes da aplicação da Lei Estadual em detrimento da aplicabilidade do piso salarial previsto no instrumento coletivo. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido. (...) Recurso de revista não conhecido." (RR- 849-90.2010.5.12.0024, Rel. Des. Conv. Maria das Graças Silvany Dourado Laranjeira, 3ª Turma, DEJT 31/08/2012) "PISO SALARIAL LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL 459/09 - EXCEÇÃO CONTIDA NA PRÓPRIA NORMA QUE FUNDAMENTA O PLEITO SINDICAL. 1. O art. 3º da Lei Complementar Estadual 459/09 prevê que os pisos salariais instituídos nessa norma se aplicam, exclusivamente, aos empregados que não tenham piso salarial definido em lei federal, convenção ou acordo coletivo de trabalho. 2. O Sindicato Autor requer a condenação do Supermercado Reclamado ao pagamento de diferenças salariais e reflexos decorrentes da inobservância do piso salarial instituído em favor da categoria pela Lei Complementar Estadual 459/09. 3. Todavia, remetendo a lei mencionada à observância do piso salarial estabelecido em negociação coletiva e restando respeitado o valor fixado a esse título na convenção coletiva de trabalho, não há de se falar na aplicação do piso salarial estadual previsto na Lei
5 Complementar Estadual 459/09, ante os próprios termos da norma legal que fundamenta a pretensão do Sindicato Autor. Agravo de instrumento desprovido." (AIRR - 58-41.2011.5.12.0007 Relator Ministro: Ives Gandra Martins Filho, 7ª Turma, DEJT 23/03/2012) Face ao exposto, concluímos que a lei estadual que ultrapassa os limites da lei delegadora de competência privativa da União é inconstituicional, por ofensa direta às regras constitucionais de repartição da competência legislativa. Atenciosamente, Paulo Eduardo Cardoso de Oliveira Advogado De acordo Marco Aurélio Vizioli Gerente do Departamento Sindical - FIESP peco/consultas sinbi birigui piso