ANÁLISE NUMÉRICA DA INFLUÊNCIA DO RIO JOÃO GUALBERTO SOBRE A HIDRODINÂMICA RESIDUAL DA LAGOA DA CONCEIÇÃO FLORIANÓPOLIS. SC.

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Transcrição:

ANÁLISE NUMÉRICA DA INFLUÊNCIA DO RIO JOÃO GUALBERTO SOBRE A HIDRODINÂMICA RESIDUAL DA LAGOA DA CONCEIÇÃO FLORIANÓPOLIS. SC. Júlia Costa Silva* Davide Franco** Fábio Bertini Godoy*** Orientador Prof. Dr. Davide Franco Júlia Costa Silva Florianópolis, 05 de março de 2010. *Laboratório de Hidráulica Marítima (LaHiMar) Universidade Federal de Santa Catarina Graduanda em Engenharia Sanitária e Ambiental Email: jucosta_s@hotmail.com **Laboratório de Hidráulica Marítima (LaHiMar) Universidade Federal de Santa Catarina Prof. Dr. Email: franco@ens.ufsc.br ***Laboratório de Hidráulica Marítima (LaHiMar) Universidade Federal de Santa Catarina Mestre em Engenharia Sanitária e Ambiental Email: fabio@snowboardbrasil.com.br

Resumo A bacia hidrográfica da Lagoa da Conceição, com 80,23 Km 2, possui 35 afluentes, sendo o principal deles o Rio João Gualberto Soares, com uma vazão média de 1m 3 /s. Este trabalho tem por objetivo avaliar a influência da descarga deste rio e das variações do nível oceânico sobre a hidrodinâmica da laguna, através do modelo hidrodinâmico MOHID, comparando-se 3 cenários: Q0) nível oceânico, N.O., e vazão nula do rio João Gualberto; Qc) N.O. e vazão constante do rio; Qv) N.O. e vazão variável do rio. Foram analisados três parâmetros distintos, níveis, correntes residuais e fluxos de volume médios. A avaliação do comportamento hidrodinâmico mostrou que para os três parâmetros analisados houve significativa alteração devido à inclusão do aporte de água doce do Rio João Gualberto, seja ele permanente ou não. De maneira geral os cenários de vazão constante e vazão variável apontaram valores similares, porém este último apresentou valores um pouco inferiores em relação ao Cenário Qc. Palavras chaves: Laguna sufocada, Lagoa da Conceição, modelagem hidrodinâmica, rio João Gualberto. 1. Introdução A bacia hidrográfica da Lagoa da Conceição, com 80,23 Km 2, fica localizada na porção central-leste da Ilha de Santa Catarina e possui 35 afluentes, sendo o principal deles o Rio João Gualberto Soares, com uma vazão média estimada de 1m 3 /s, inserido numa sub-bacia com área de aproximadamente 10Km 2. Este ecossistema é definido como uma laguna costeira sufocada, cuja ligação com o mar é garantida pelo o Canal da Barra. Lagunas costeiras são ambientes estuarinos orientados paralelamente à costa e geralmente separados do oceano por porções de terras e conectados a eles por um ou mais canais. Esses ambientes são de grande importância ambiental por serem altamente produtivos e complexos e isto se deve a sua dinâmica d água, onde ocorrem processos de mistura entre a água oceânica e continental. A Lagoa da Conceição pode ser considerada um recurso natural de usos múltiplos. Inúmeras evidências apontam a decrescente qualidade da água da laguna decorrente da ocupação humana desordenada no local e da exploração turística. A capacidade de renovação das águas e o aporte de material orgânico estão diretamente ligados à qualidade da água e ao equilíbrio hidrodinâmico do corpo lagunar. Um parâmetro que avalia essa capacidade é o tempo de residência da água na laguna e da troca de água entre o sistema laguna-mar. Sendo assim é imprescindível que se conheça e se compreenda a dinâmica das águas no interior da laguna. Este trabalho tem por objetivo avaliar a influência da maior contribuição de vazão pontual na laguna, conforme estudos anteriores, o Rio João Gualberto, sobre a hidrodinâmica local. Para tal foi analisado primeiramente o campo de correntes residuais, níveis e fluxos devido somente às variações do nível oceânico, sem considerar a forçante hidrológica, ou seja, sem incluir a contribuição de vazão pontual, tendo este cenário como referência (Cenário Q0). A partir daí foram feitas comparações com os resultados de outros dois cenários, tendo como forçante a maré e a componente hidrológica. Um deles considera uma vazão constante do Rrio João Gualberto de 1m 3 /s (Cenário Qc) e o outro uma vazão variável ao longo do tempo, porém com vazão média de 1m 3 /s (Cenário Qv).

Os campos de correntes residuais, níveis e fluxos foram obtidos a partir de modelagem hidrodinâmica. Esta ferramenta vem sendo usada de forma crescente na descrição detalhada do escoamento em corpos d água, pois além de facilitar a compreensão da hidrodinâmica dos corpos d água, possibilita avaliar a sensibilidade do ambiente de estudo em cenários hipotéticos. 2. Localização e Descrição da Área A Lagoa da Conceição está localizada na região centro-leste da Ilha de Santa Catarina, na latitude de 27 34 S e longitude 48 27 W. A bacia hidrográfica compreende 80,23km 2, sendo 20km 2 ocupados pelo corpo d água, que possui uma forma alongada no sentido Norte-Sul, medindo 13,4 Km de comprimento e apresenta largura variável entre 0,15km e 2,5km. O restante da área possui a seguinte composição: 55,4% de vegetação arbórea, 17,9% de áreas urbanas, 11,9% de vegetação suprimida, 13,7% de dunas e praias e 1,1% de áreas não classificadas (Godoy, 2007). O corpo lagunar é limitado à oeste por morros, com altitudes entre 400 e 500 metros, e por vegetação primária, e a leste por restingas e por um morro rochoso com altitude de 200 metros. Já ao Sul do espelho d água encontra-se a maior área de dunas do estado de Santa Catarina. A laguna é ligada ao mar por um canal longo e estreito que possui aproximadamente 2,8 Km de extensão e largura variável entre 20 e 40 metros. Este canal, nomeado de Canal da Barra, tem sua foz em mar aberto, na praia da Barra da Lagoa. A região apresenta uma precipitação uniformemente distribuída ao longo de todo o ano, tendo uma oscilação de 172,4 mm e 74,1 mm, dentro de um índice de isoieta anual de 1.611 mm. O relevo submerso da laguna apresenta um perfil assimétrico devido as diferentes inclinações da margem a Oeste e a Leste que delimitam o corpo d água. A profundidade média encontrada é de 1,7m, sendo que 44% do fundo possui profundidade superior a 4,0m e 29%, valores menores que 1,0m.As maiores profundidades são relevadas na margem, atingindo valores de até 8,7 m. 3. Materiais e Métodos 3.1. Dados Ambientais Os dados de entrada do modelo (batimetria, linha de costa, rugosidade de fundo, nível medido e vazão do Rio João Gualberto) utilizados neste estudo foram levantados e tratados por Godoy (2009). 3.1.1. Vazão do Rio João Gualberto Conforme Dutra (1991) a descarga média do Rio João Gualberto é de 1m³/s, a qual foi utilizada como dado de entrada para o Cenário Qc. A sua variação, empregada no Cenário Qv, foi obtida através de monitoramento de precipitação, a partir da qual foram estimadas vazões através do método do hidrograma unitário sintético do modelo CN. A Figura 1 ilustra a variação temporal da descarga. O tempo zero corresponde ao início do dia 10 de janeiro de 2010. Nota-se apenas a presença de dois eventos meteorológicos no

período simulado, um a partir do dia 19 de janeiro (nono dia de simulação) o e outros no início de fevereiro (vigésimo primeiro dia de simulação). Figura 1: Variação temporal de vazão do Rio João Gualberto. 3.1.2. Nível Medido Os dados maregráficos foram extraídos de medições realizadas pelo LaHiMar na estação maregráfica de Jurerê, localizada na coordenada 48 29 0,31 O e 27 26 22,12 S. A Figura 2 expõe a variação de nível durante o período simulado. Observa-se na figura a variação de nível devido à maré astronômica (maior freqüência) e à maré meteorológica (menor freqüência). Figura 2: Variação temporal de nível medido. 3.1.3. Batimetria A grade batimétrica constitui a fronteira de fundo que formam os elementos da malha de cálculo. Sua concepção se deu a partir de dados levantados pela AEROCONSULT em 2001 juntamente com dados batimétricos levantados pelo LaHiMar, em 2006, no canal e no interior da laguna, somando-se a digitalização da carta náutica CN 1902 (DHN, 1972).

A grade utilizada neste trabalho foi desenvolvida por Godoy (2009) e possui tamanho de células retangulares variáveis entre 10 e 50 metros, de maneira a obter um detalhamento no canal (células de 10mx10m) e uma economia de cálculo com células de 50mx50m no corpo da laguna. A Figura 3 ilustra a grande batimétrica usada. Figura 3: Grade batimétrica utilizada nas simulações. Godoy (2009). 3.1.4. Campo de Rugosidade Godoy (2009) e Andrade (2001) adotaram para o canal da Barra da Lagoa o valor de amplitude de rugosidade equivalente de 0,04m e os seguintes valores para a distribuição da amplitude da rugosidade equivalente para a região de estudo: areia: ε= 0,03 m; areia siltosa: ε = 0,025 m; silte arenoso: ε = 0,02 m; silte: ε = 0,015 m; silte argiloso: ε = 0,01 m. 3.2. Modelagem numérica Neste estudo foi utilizado o modelo hidrodinâmico português gratuito MOHID, capaz de simular escoamento em zonas costeiras, estuários, lagoas, lagunas e oceanos. O estudo da influência da entrada de vazão do Rio João Gualberto sobre a hidrodinâmica da Lagoa da Conceição foi realizado por meio da construção de três cenários hipotéticos, os quais possibilitarão uma análise comparativa entre seus resultados, permitindo alcançar o objetivo do presente trabalho. São eles: Cenário Q0: caracteriza-se pela não inclusão da descarga do Rio João Gualberto, onde a única forçante será dada pela variação do nível na entrada oceânica, com a finalidade de definir uma situação padrão, a partir da qual serão feitas comparações. Este cenário se da pela troca de massa e energia somente por meio do canal lagunaoceano e ficou denominado de Vazão Nula. Cenário Qc: nesta simulação, nomeada de Vazão Constante, será admitida uma vazão constante de 1m³/s do Rio João Gualberto, além da variação do nível no Canal da

Barra, com o objetivo de comparar seus resultados ao cenário anterior e analisar como esse valor médio de descarga influencia na hidrodinâmica local. Cenário Qv: será admitida uma vazão variável do Rio João Gualberto com valor médio de 1m³/s, para que seja valida a comparação entre o cenário anterior. A construção deste cenário hipotético tem como objetivo identificar se há uma discrepância dos resultados pra diferentes valores de descarga ao longo do tempo. Esta simulação foi nomeada de Vazão Variável. Para todos os cenários foi aplicado o modelo hidrodinâmico MOHID com a mesma base de dados, no caso, por exemplo, de batimetria e delimitação geográfica da Lagoa da Conceição (linha de costa). Neste estudo foram utilizadas fronteiras laterais abertas, fronteiras laterais fechadas e a fronteira de fundo. Na fronteira de superfície livre o fluxo de água foi considerado nulo. As fronteiras laterais fechadas constituem os limites territoriais da modelagem, as quais respeitaram os limites geográficos da laguna. Na fronteira de fundo o fluxo de água foi considerado nulo, e a rugosidade de fundo variada. Todos os cenários foram rodados para o mesmo período de 28 dias a partir do resultado de um aquecimento do modelo no mês anterior forçado somente com o nível astronômico. O modelo levou aproximadamente 15 dias para se estabilizar. O período de simulação analisado foi de 13 de janeiro de 2008 até 12 de fevereiro de 2008 com armazenamento dos dados a cada 1 hora sendo o passo temporal de cálculo de 1,25 segundos. Após a aplicação do modelo para os três cenários foram obtidos o campo de correntes residuais, fluxos e níveis ao longo da superfície do corpo lagunar a cada 1 (uma) horas. 3.3. Analise dos dados Os resultados do modelo, campo de nível e velocidade, são organizados a partir do modelo hidrodinâmico MOHID no formato HDF5. A utilização do software HDFView possibilitou a importação dos campos horários em forma matricial, os quais foram analisados e trabalhados em MATLAB R2007a e EXCEL 2007. A partir da batimetria (H) e dos campos ao longo do tempo da variação do nível da água ( ) e da velocidade (u, v) foram calculados para os três cenários os campo de fluxo em volume como mostra a equação abaixo., u H u y v H v x Para os três parâmetros analisados (nível, corrente e fluxo) e para cada ponto da grade numérica foram estimadas estatísticas temporais de: valor mínimo, valor máximo, valor médio e desvio padrão ou variância. No caso das grandezas vetoriais (velocidade e fluxo) foram trabalhadas inicialmente com as suas componentes (horizontal U e vertical V) e num segundo momento com as suas respectivas intensidades. Com o intuito de atingir o objetivo do trabalho os resultados não foram analisados isoladamente, mas sempre a partir de comparações entre os três cenários estudados: Vazão

Nula do Rio João Gualberto (Q0), Vazão Constante do Rio João Gualberto (Qc) e Vazão Variável do Rio João Gualberto (Qv). 4. Resultados 4.1. Níveis Médios As Figuras 4 A e B mostram o histograma dos resultados para os três cenários. No caso de vazão nula os valores de níveis médios se concentram na faixa de 0,02m. Nota-se que a inclusão do Rio João Gualberto, tanto constante como variável, deslocou a maior concentração desses resultados para 0,05m, porém não houve alteração significativa do nível médio entre os Cenários Qc e Qv. A Figura 4 C possibilita identificar a diferença dos níveis médios entre o Cenário Qv e Qc. Figura 4 A: Valores de Níveis médios para o cenário de vazão nula do Rio João Gualberto (Q0). Figura 4 B: Valores de Níveis médios para o cenário de vazão constante (Qc) e variável (Qv) do Rio João Gualberto. Figura 4 C: Valores da diferença de níveis médios entre os cenários 3 e 2. Podemos observar, a partir da Figura 4 C, que de maneira geral o cenário com vazão constante eleva os níveis médios da lagoa em 2mm em relação ao cenário com vazão variável. As Figuras 5 A e B apontam a distribuição espacial dos níveis médios do Cenário Q0 e Qc. Observa-se que o aumento de nível devido à contribuição hidrológica se deu em toda a laguna e não de maneira isolada, mantendo-se os mesmos padrões, com níveis negativos próximo ao oceano, níveis positivos crescentes no canal e nível praticamente uniforme no corpo da laguna com apenas uma região sobrelevada, localizada na porção central leste.

Figura 5 A: Distribuição espacial dos níveis médios para o Cenário Q0. Figura 5 B: Distribuição espacial dos níveis médios para o Cenário Qc. 4.2. Velocidades Médias A Figura 6 A expõem as freqüências dos valores médios de velocidade para os três cenários. Nota-se que para o Cenário Q0 os valores de velocidade média se concentram em até 15 m/dia. A inclusão do Rio João Gualberto no estudo hidrodinâmico teve como conseqüência um aumento da freqüência de valores elevados de velocidade média, como 25 e 50 m/dia. A Figura 6 B mostra a relação de velocidade média entre os cenários Qc e Q0. Percebe-se que a velocidade média do Cenário Qc dobra em relação ao Cenário Q0 já numa freqüência significativa. Outras relações ainda maiores aparecem de maneira mais expressiva. Além disso, percebe-se na Figura 6 A que as alterações nas velocidades médias do Cenário Q0 para o Cenário Qc é muito mais significativa que aquela entre os Cenários Qc e Qv, como expressa a Figura 6 C. Percebe-se que boa parte dos valores se mantém o mesmo, mas a grande maioria deles tem a velocidade reduzida, em 80 a 90%, no Cenário Qv se comparado ao Cenário Qc. As Figuras 7 A, B e C apontam as intensidades e direções de velocidade média. A Figura 7 A, Cenário Q0, mostra que as correntes residuais no corpo da laguna não passam de 15m/dia e que há duas regiões de recirculação, no sentido horário, na porção central. Já o Cenário Qc, Figura 7 B, aponta aumentos expressivos de velocidade principalmente na porção norte da lagoa, região onde se localiza o Rio João Gualberto, além de alterar significativamente as direções das correntes residuais. A partir da Figura 7 C percebe-se que a relação das correntes residuais entre os cenários 3 e 2 é modificada ao longo da longitude, diferentemente do que mostra a Figura 7 B. Na porção leste percebe-se que o Cenário Qc aponta valores maiores de correntes residuais, já na porção oeste, e com menor expressão, as velocidades médias são maiores no Cenário Qv. Além disso nota-se que o Cenário Qc apresenta correntes com direções bem definidas no sentido Norte- Sul.

Figura 6 A: Intensidade de Velocidade média para os Cenários Q0, Qc e Qv. Figura 6 B: Relação de velocidades médias entre os Cenários Qc e Q0. Figura 6 C: Relação de velocidades médias entre os Cenários Qv e Qc. Figura 7 A: Distribuição espacial de correntes residuais para o Cenário Q0. Figura 7 B: Distribuição espacial da relação de correntes residuais entre os Cenário Qc e 1. Figura 7 C: Distribuição espacial da relação de correntes residuais entre os Cenário Qv e 2.

4.3. Fluxos Médios A Figura 8 A apresenta as freqüências dos valores médios de fluxo para os três cenários. Observa-se que para no Cenário Q0 a freqüência de valores de fluxo médio é superior ao dos demais cenários para até 100m³/dia. Percebe-se ainda que os Cenários 3 e 2 possuem resultados bastante semelhantes. A Figura 9 B mostra a relação de fluxo médio entre os cenários Qc e Q0. Percebe-se que o fluxo médio do Cenário Qc é de forma geral significativamente superior em relação ao Cenário Q0, havendo pequenas freqüências de valores dessas relações inferior a 1. Além disso, nota-se na Figura 8 A que as alterações nas velocidades médias do Cenário Q0 para o Cenário Qc é muito mais significativa que aquela entre os Cenários Qc e Qv, como expressa a Figura 8 C. Percebe-se que boa parte dos valores se mantém o mesmo, mas a grande maioria deles tem o fluxo reduzido, em 80 a 90%, no Cenário Qv se comparado ao Cenário Qc; semelhante aos padrões ocorridos com as correntes residuais. As Figuras 9 A, B e C apontam as intensidades e direções do fluxo médio. A Figura 9 A, Cenário Q0, mostra que as corrente residuais no corpo da laguna não passa de 1.000m³/dia e que há duas regiões de recirculação, no sentido horário, na região central, como mostrou também o campo de corrente residual. Já o Cenário Qc, Figura 9 B, aponta aumentos expressivos de fluxo principalmente na porção norte da lagoa, região onde se localiza o Rio João Gualberto, além de alterar significativamente as direções dos fluxos. A partir da Figura 9 C percebe-se que a relação das correntes residuais entre os cenários Qv e Qc é modificada ao longo da longitude, diferentemente do que mostra a Figura 9 B. Na porção leste percebe-se que o Cenário Qc aponta valores maiores de fluxos, já na porção oeste, e com menor expressão, os fluxos são maiores no Cenário Qv. Além disso, nota-se que o Cenário Qc apresenta fluxos com direções bem definidas no sentido Norte-Sul.

Figura 8 A: Intensidade de fluxo médio para os Cenários Q0, Qc e Qv. Figura 8 B: Relação de fluxos médios entre os Cenários Qc e Q0. Figura 8 C: Relação dos fluxos médios entre os Cenários Qv e Qc. Figura 9 A: Distribuição espacial de fluxos médios para o Cenário Q0. Figura 9 B: Distribuição espacial da relação de fluxos médios entre os Cenário Qc e 1. Figura 9 C: Distribuição espacial da relação de fluxos médios entre os Cenário Qv e 2.

5. Conclusão Os dados ambientais obtidos e as ferramentas utilizadas permitiram atingir o objetivo do trabalho. Porém estes resultados não devem ser analisados de maneira isolados, somente numa análise comparativa, uma vez que este modelo não foi validado ou calibrado. Para tal sugere-se o refinamento dos dados de entrada, como batimetria, campo de rugosidade, nível e vazão. O modelo hidrodinâmico MOHID se mostrou acessível e com facilidades para análise de diferentes abordagens investigativas. A avaliação do comportamento hidrodinâmico mostrou que nos três parâmetros analisados, nível médio, velocidade média e fluxo médio ao longo do tempo, houve significativa alteração devido inclusão do aporte de água doce do Rio João Gualberto, seja ele constante ou não. As diferenças obtidas foram mais evidenciadas entre os cenários com e sem vazão. De maneira geral os cenários de vazão constante e vazão variável apontaram valores similares. Porém este último apresentou valores um pouco inferiores em relação ao Cenário Qc. Comprovada a influência do Rio João Gualberto sobre os padrões de recirculação recomendase estudo hidrológico mais aprofundado em toda a bacia, com medições de vazões nos diversos córregos contribuinte da laguna. 6. Revisão Bibliográfica ANDRADE, R. C. Estudo da circulação hidrodinâmica da Lagoa da Conceição SC. Dissertação (Mestrado em Ciências em Engenharia Oceânica), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, 2001. DHN Diretoria de hidrografia Nacional. Carta Náutica CN 1902. 1972. DUTRA, S.J. Caracterização geoambiental da Bacia de drenagem do rio João Gualberto, Ilha de Santa Catarina, SC. Monografia do Curso de Geografia, UFSC, Florianópolis, SC. 1991. GODOY, F. B., Caracterização Temática da Bacia Hidrográfica da Lagoa da Conceição Florianópolis - SC. Trabalho de Conclusão de Curso. Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. 2007. GODOY, F. B. Modelagem Hidrológico-Hidrodinâmica da Lagoa da Conceição SC. Dissertação (Mestrado em Engenharia Ambiental), UFSC, Florianópolis, Santa Catarina, 2009. KOEFENDER, F. Análise Numérica da Influência Batimétrica no Padrão de Circulação Hidrodinâmica da Lagoa da Conceição Florianópolis SC. Dissertação (Graduação em Engenharia Sanitária e Ambiental) Departamento de Engenharia Sanitária e Ambiental, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis. 2005. LINO, J.F.L. Análise Numérica da Influência de Forçantes Meteorológicas e Oceanográficas sobre a Circulação Hidrodinâmica da Lagoa da Conceição Florianópolis SC. Trabalho Conclusão do Curso de Graduação em Engenharia Sanitária e Ambiental, Florianópolis, SC. 2005. ROSMAN, P. C. Os Modelos para Recursos Hídricos. In: Magrini, A.. dos Santos, M. A. (eds). Gestão Ambiental em Recursos Hídricos (Vol. 3), Capítulo 2 (Parte III), Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais, COPPE/UFRJ. 2001.