Características e efeito da fração granulométrica < 2 µm no comportamento de queima de uma argila

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Cerâmica 53 (2007) 249-254 249 Características e efeito da fração granulométrica < 2 µm no comportamento de queima de uma argila (Characteristics and effect of the granulometric fraction < 2 µm on the firing behavior of a clay) C. M. F. Vieira, L. A. Terrones, R. Sánchez, S. N. Monteiro Laboratório de Materiais Avançados - LAMAV, Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro - UENF Av. Alberto Lamego 2000, Campos dos Goytacazes, RJ 28013-602 vieira@uenf.br Resumo Este trabalho tem por objetivo caracterizar a chamada fração argila, isto é, com fração granulométrica < 2 µm, e avaliar por meio de dilatometria, análise termogravimétrica e térmica diferencial, e difração de raios X, seu efeito no comportamento de queima de uma argila sedimentar caulinítica. A amostra foi obtida por técnica de sedimentação baseada na lei de Stokes e submetida à caracterização mineralógica, química e morfológica por meio de difração de raios X, fluorescência de raios X e microscopia eletrônica de transmissão. Os resultados indicaram que a fração granulométrica < 2 µm da argila apresenta uma composição mineralógica constituída de caulinita, haloisita, mineral micáceo, goetita e gibsita. Durante a queima, a fração argila é a principal responsável pela sinterização da argila. Palavras-chave: argila, caracterização, granulometria, mineralogia, queima. Abstract This work has for objective to characterize the so-called clay fraction, i.e., that fraction with particle size < 2 µm, and to evaluate by dilatometry, thermogravimetric and differential thermal analysis, and X-Ray diffraction, its effect on the firing behavior of a sedimentary kaolinitic clay. The clay fraction sample was obtained by the sedimentation technique based on the Stokes law and submitted for mineralogical, chemical and morphological characterization by X-Ray diffraction, X-Ray fluorescence and transmission electron microscopy. The results showed that the clay s granulometric fraction with size < 2 µm displays a mineralogical composition formed by kaolinite, haloisite, micaceous mineral, goethite and gibbsite. During the firing, this clay fraction is the main responsible for the sintering of the clay body. Keywords: clay, characterization, particle size, mineralogy, firing. INTRODUÇÃO A granulometria de uma argila tem uma importante função no processamento de cerâmica vermelha, devido à sua relação direta com a composição mineralógica. A chamada fração argila, associada a partículas com tamanho inferior a 2 µm, é geralmente constituída de argilominerais. Estes minerais, de origem secundária, são os principais responsáveis pelo desenvolvimento da plasticidade do sistema argila-água [1-3]. Outras características, como elevada área superficial, solubilidade e instabilidade térmica são típicas dos minerais secundários constituintes da fração argila. A plasticidade é uma propriedade fundamental para permitir que massas argilosas alcancem a consistência plástica adequada para serem conformadas pelo processo de extrusão [4, 5]. Para um mesmo tipo de argila, isto é, similar mineralogia, será mais plástica a argila que apresente maior quantidade de minerais argilosos. Isto significa que mais água será necessária adicionar para que se alcance o estado de consistência plástica. Vulgarmente argilas muito plásticas são denominadas de gordas ou fortes. A utilização destas argilas em cerâmica vermelha pode trazer problemas de processamento, dificultando a etapa de conformação e secagem. Por outro lado, geralmente peças produzidas com estas apresentam uma resistência mecânica a verde e a seco satisfatórias, pois as partículas de argilominerais apresentam uma boa coesão entre si. Durante a queima, a sinterização pode ocorrer em baixas temperaturas [6]. Entretanto, a baixa permeabilidade destas peças pode dificultar a saída de gases no estágio inicial de queima e podem retrair demasiadamente, acarretando defeitos no produto final. Desta forma, argilas magras ou fracas, com menor teor de argilominerais e maior quantidade de quartzo, principal impureza das argilas, são geralmente utilizadas na formulação da massa cerâmica. Devido à diversidade mineralógica, a sinterização de

250 C. M. F. Vieira et al. / Cerâmica 53 (2007) 249-254 argilas é um fenômeno bastante complexo, sendo influenciado pelas características das matérias-primas e parâmetros de processo [7-10]. Em princípio, as diferentes frações granulométricas que compõem uma argila comportam-se de maneira distinta durante a sinterização. Assim, este trabalho tem por objetivo caracterizar e avaliar o efeito do comportamento de queima da fração granulométrica < 2 µm de uma argila na consolidação das partículas. MATERIAIS E MÉTODOS A argila estudada corresponde a um material sedimentar de origem flúvio-lacustre encontrado no município de Campos dos Goytacazes, Estado do Rio de Janeiro. Esta argila vem sendo utilizada para fabricação de cerâmica vermelha, sobretudo tijolos e, em menor quantidade, telhas e pisos. A fração granulométrica < 2 µm da argila foi avaliada comparativamente com sua granulometria natural, submetida a um peneiramento em malha de 20 mesh (< 840 µm), constituindo assim a fração total. A fração < 2 µm foi obtida por técnica de sedimentação, baseada no princípio da lei de Stokes, de acordo com norma técnica [11]. A composição química das amostras foi realizada por fluorescência de raios X em equipamento Philips, modelo PW 2400. A composição mineralógica qualitativa foi obtida por difração de raios X (DRX), em difratômetro Seifert, modelo URD 65, operando com radiação Cu-K α e 2θ variando de 5º a 40º. A morfologia das partículas foi observada por microscopia eletrônica de transmissão (MET). As imagens de MET foram obtidas num microscópio Jeol, modelo 2000FX da COPPE/ UFRJ. As análises termogravimétrica e térmica diferencial foram realizadas em analisador térmico simultâneo TA Instruments, modelo SDT 2960, utilizando atmosfera de ar e taxa de aquecimento de 10 o C/min. A análise dilatométrica foi realizada em um dilatômetro Orton com taxa de aquecimento de 10 o C/min. Foram preparados corpos-de-prova cilíndricos por prensagem a 20 MPa, com 3,13 cm de diâmetro e 0,8 cm de espessura. Os corpos de prova após secagem em estufa a 110 o C, foram queimados em forno de laboratório em temperaturas variando de 400 a 1100 o C com taxa de aquecimento de 3 o C/min e tempo de patamar de 60 min. O resfriamento foi realizado desligando-se o forno. As fases cristalinas de queima foram determinadas por DRX em amostras na forma de pó, utilizando o mesmo equipamento e procedimento como descrito anteriormente. RESULTADOS E DISCUSSÃO Composição mineralógica e química A Fig. 1 apresenta os difratogramas de raios X das amostras de argila correspondentes às frações < 840 µm e < 2 µm. É observado que a amostra da fração total < 840 µm é composta pela caulinita, mineral micáceo, gibsita, goetita e quartzo. Já a fração argila, < 2 µm, apresenta similar composição mineralógica em comparação com a fração total, à exceção do quartzo. Isto indica que além de argilomineral, os hidróxidos apresentam-se com tamanho de partícula extremamente pequeno. Já o mineral micáceo pode está associado a um argilomineral, a ilita, e/ou a mica não hidratada, possivelmente do tipo muscovita. Se por um lado sedimentos quaternários, típicos da região de Campos são considerados recentes e não propícios a ocorrência de ilita, há na região sedimentos de origem marinha que são favoráveis à formação deste tipo de argilomineral. Intensidade 2 q (grau) Figura 1: DRX das amostras. C = caulinita; Gi = gibsita; Go = goetita; M = mineral micáceo; Q = quartzo. [Figure 1: XRD of the samples. C = kaolinite; Gi = gibbsite; Go = goethite; M = micaceous mineral; Q = quartz.] A Tabela I apresenta a composição química das amostras. Observa-se que a fração argila, < 2 µm, apresenta um menor teor de SiO 2 e maior teor de que a fração total. Tabela I - Composição química das amostras (% em peso). [Table I - Chemical composition of the samples (Wt. %).] fração SiO 2 Al 2 Fe 2 TiO 2 K 2 O Na 2 O CaO MgO PF < 840 µm, total 44,56 29,64 8,72 1,22 1,40 0,51 0,34 0,89 11,40 < 2 µm, argila 38,80 33,58 8,97 1,11 0,88 0,29 0,25 1,06 13,83

C. M. F. Vieira et al. / Cerâmica 53 (2007) 249-254 251 Isto indica um maior percentual de minerais argilosos presente na fração argila. De fato, a razão SiO 2 /Al 2 é um parâmetro indicativo da quantidade de argilomineral e quartzo. De acordo com a composição química teórica da caulinita, a razão SiO 2 /Al 2 é de 1,18. Valores maiores que este indicam sílica livre na forma de quartzo. A fração total apresenta razão SiO 2 /Al 2 de 1,50, enquanto na fração argila esta razão é praticamente a da caulinita pura de 1,16. Pode-se então inferir que existe uma excessiva quantidade de quartzo na fração total e alguma quantidade adicional de alumina na fração argila que está associado à presença de hidróxido de alumínio na forma de gibsita. Observa-se que o percentual de Fe 2 é bem parecido para ambas às frações granulométricas. Isto indica que o ferro está presente na goetita, no mineral micáceo e possivelmente em substituição parcial ao Al na estrutura da caulinita. O incremento da perda ao fogo da fração < 2 µm está relacionado, predominantemente, ao aumento de mineral argiloso. Morfologia A Fig. 2 apresenta uma micrografia obtida por MET da fração argila, < 2 µm. É possível observar a predominância de partículas lamelares de formato pseudo-hexagonal com tamanhos menores que 2 µm, associadas com a caulinita. Partículas de morfologia tubular, associadas a haloisita, são também observadas em pequena quantidade. Este resultado evidencia a presença, do argilomineral haloisita nas argilas cauliníticas de Campos dos Goytacazes. Entretanto, sua identificação por DRX é dificultada devido à sobreposição de picos de difração com a caulinita. Além disso, a ocorrência de haloisita associada com partículas predominantes de caulinita é uma situação relativamente comum. Comportamento térmico As Figs. 3 e 4 apresentam as curvas de ATD/TG/DTG das frações < 840 µm e < 2 µm, respectivamente. Observa-se na Fig. 3 três picos endotérmicos a 59,0 o C, 267,0 o C e 497,6 o C e um pico exotérmico a 947,8 o C. Na curva de DTG, três picos correspondentes à perda de massa são observados. A perda de massa, 1,82%, do primeiro pico de DTG a 55,6 o C corresponde também ao primeiro pico da curva de ATD e está associada à eliminação de água higroscópica. A perda de massa, 2,93%, do segundo pico de DTG a 263,0 o C está associada à decomposição de hidróxidos como a goetita e gibsita. A perda de massa, 8,28%, do último pico de DTG a 495,9 o C é a mais significante. Esta última perda de massa está associada à eliminação de água de constituição da caulinita, formando a metacaulinita. Em proporção em menor também ocorre eliminação de água de constituição da haloisita. Na Fig. 3 existe também, conforme mostra a seta, um discreto pico endotérmico associado à transformação alotrópica do quartzo-α para quartzo-β. Uma prova da existência deste pico será apresentada mais adiante neste trabalho, por dilatometria. Por fim, a 947,8 o C é observado o único pico exotérmico que está associado a decomposição da metacaulinita com formação de novas fases [12-14]. Em comparação com a fração total, < 840 µm, a fração argila, < 2 µm, não apresenta o pico endotérmico correspondente ao quartzo. Por outro lado, a perda de massa associada à água de constituição da caulinita/haloisita, pico de DTG a 484,8 o C, é mais significativa, 11,34%, do que a correspondente na Fig. 3. Este resultado indica ausência de quartzo e maior quantidade de mineral argiloso na fração Peso (%) [ ] Deriv. peso (% / ºC) Figura 2: Micrografia obtida por MET da fração argila, < 2 µm. [Figure 2: TEM micrograph of the clay fraction, < 2 µm.] Figura 3: Curvas de análise térmica (ATD/TG/DTG) da fração total, < 840 µm. [Figure 3: Thermal analysis curves (DTA/TG/DTG) of the total fraction, < 840 µm.]

252 C. M. F. Vieira et al. / Cerâmica 53 (2007) 249-254 Peso (%) Deriv. peso (% / ºC) Figura 4: Curvas de análise térmica (ATD/TG/DTG) da fração argila, < 2 µm. [Figure 4: Thermal analysis curves (DTA/TG/DTG) of the clay fraction, < 2 µm.] argila. Há também uma perda de massa de 1,2% (12,54-11,34) associado ao pico de DTG a 670,5 o C. Este resultado pode estar relacionado com a eliminação de água de constituição de mineral micáceo ou de grupos de hidroxilas remanescentes dos minerais argilosos ou dos hidróxidos. A curva de DTG não mostra o tipo de reação que esteja ocorrendo. Figura 6: Comportamento dilatométrico da fração argila, < 2 µm. [Figure 6: Dilatometric behaviour of the clay fraction, < 2 µm.] Na Fig. 7 é possível concluir sobre a presença ou não do quartzo nas amostras estudadas. De acordo com a Fig. 7a nota-se que a 559,2 o C ocorre uma mudança no ângulo da curva dilatométrica referente à presença de quartzo livre. Já na Fig. 7b não é observada variação na curva o que indica ausência de transformação alotrópica do quartzo. Dilatometria As Figs. 5 e 6 apresentam as curvas de dilatometria de peças cruas correspondentes às frações < 840 µm e < 2 µm, respectivamente. É evidente a diferença de comportamento das diferentes frações granulométricas avaliadas. A fração argila, Fig. 6, apresenta maior retração e máxima taxa de sinterização em temperatura inferior, 890,9 o C e temperatura de vitrificação, máxima retração, a 1050 o C. Por outro lado, a fração total, apresenta máxima taxa de sinterização a 1124,5 o C e alcança o limite de detecção do equipamento a 1300 o C. (A) (B) Figura 5: Comportamento dilatométrico da fração total, < 840 µm. [Figure 5: Dilatometric behaviour of the total fraction, < 840 µm.] Figura 7: Curvas de dilatometria das frações < 840 µm e < 2 µm para avaliar a presença de quartzo. [Figure 7: Dilatometric curves of the fractions < 840 µm and < 2 µm to evaluate the presence of quartz.]

C. M. F. Vieira et al. / Cerâmica 53 (2007) 249-254 253 Fases cristalinas de queima As Figs. 8 e 9 apresentam, respectivamente, as curvas de DRX das frações < 840 µm e < 2 µm queimadas em temperaturas no intrvalo de 400 a 1100 o C. Conforme pode ser observado na Fig. 8, a fração total, < 840 µm, apresenta a 400 o C, caulinita, mineral micáceo, hematita e quartzo. As diferenças em relação ao material natural consistem na ausência dos hidróxidos de ferro e alumínio, decompostos por volta de 267 o C, e a presença de hematita, formada a partir da goetita. A partir de 600 o C, a caulinita não é mais detectada, devido à formação, da fase amorfa, metacaulinita. Nenhuma mudança nas fases cristalinas ocorre até 900 o C. Há 1000 o C, as controvérsias fases de alumina-γ e mulita, formadas a partir da decomposição da metacaulinita, são detectadas [12-14], além da formação de feldspato plagioclásio. Na temperatura de 1100 o C, os picos de mulita aumentam de intensidade e o mineral micáceo não é mais detectado. Nas curvas de DRX, Fig. 9, da fração argila, < 2 µm, observa-se a 400 o C a presença de mineral micáceo, caulinita, e hematita. Em comparação com a amostra somente seca a 110 o C, Fig. 1, a gibsita e goetita estão ausentes. Em comparação com a fração total, Fig. 8, não é observada a presença de quartzo. A partir de 600 o C não são mais observados picos de difração correspondentes à caulinita. A partir daí, nenhuma alteração ocorre nas fases cristalinas até 1000 o C. A 1100 o C, mulita e alumina-α são detectadas. Este tipo de mulita, conforme já mencionado, é proveniente da decomposição da metacaulinita. Já a alumina-α aparece de acordo com a seguinte seqüência: gibsita : alumina-χ : alumina-κ : alumina-α [15]. A menor intensidade de pico de fases cristalinas identificadas na fração argila, Fig. 9, em comparação com a fração total, Fig. 8, é um indicativo de Intensidade Intensidade Figura 9: DRX da fração argila, < 2 µm, queimada de 400 a 1100 o C. Aα = alumina-α; C = caulinita; H = hematita; M = mineral micáceo; Mu = mulita. [Figure 9: XRD of the clay fraction, < 840 µm, fired at 400 to 1100 o C. Aα = alumina-α; C = kaolinite; H = hematite; M = micaceous mineral; Mu = mullite.] maior formação de fase amorfa, devido à ausência de quartzo e elevada reatividade das partículas, da fração argila. CONCLUSÕES O trabalho de caracterização e avaliação do comportamento de queima da fração de partículas < 2 µm de uma argila caulinítica de Campos dos Goytacazes permitiu concluir que: a fração argila, < 2 µm, é composta de caulinita, haloisita, mineral micáceo e hidróxidos de ferro e de alumínio. A única diferença na mineralogia em comparação com a fração total, < 840 µm, é a ausência de quartzo; a fração argila apresenta um início de sinterização em temperaturas mais baixas em comparação com a fração total, acarretando maior retração linear; devido ao tamanho reduzido das partículas e predomínio de minerais argilosos, a fração argila é a principal responsável pela consolidação das partículas de uma argila na etapa de queima. AGRADECIMENTOS 2 q (grau) Ao CNPq, CAPES, FAPERJ e Tecnorte/Fenorte o apoio concedido a esta pesquisa na forma de auxílio e bolsas. 2 q (grau) Figura 8: DRX da fração total, < 840 µm, queimada de 400 a 1100 o C. Aγ = alumina-γ; C = caulinita; H = hematita; M = mineral micáceo; Mu = mulita; Pl = plagioclásio; Q = quartzo. [Figure 8: XRD of the total fraction, < 840 µm, fired at 400 to 1100 o C. Aγ = alumina-γ; C = kaolinite; H = hematite; M = micaceous mineral; Mu = mullite; Pl = plagioclase; Q = quartz.] REFERÊNCIAS [1] R. E. Grim, Am. Ceram. Soc. Bull. 44 (1965) 687. [2] A. G. Verduch, Bol. Soc. Esp. Ceram. Vidr. 24 (1985) 395. [3] P. S. Santos, Ciência e Tecnologia das Argilas, vol 1, 2 a Ed., Edgard Blücher, S. Paulo (1989) 3-4. [4] W. C. Lawrence, J. Am. Ceram Soc. 41 (1958) 147. [5] M. F. Abajo, Moldeo por Extrusión de los Productos

254 C. M. F. Vieira et al. / Cerâmica 53 (2007) 249-254 Cerámicos de Construcción, Manual sobre Fabricación de Baldosas, Tejas y Ladrillos, Beralmar S. A., Barcelona (2000) 125. [6] S. N. Monteiro, C. M. F. Vieira, Ceram. Int. 30, 3 (2004) 381. [7] M. Dondi, G. Guarini, M. Raimondo, Tile & Brick Int. 15 (1999) 176. [8] M. M. Jordán, A. Boix, T. Sanfeliu, C. de la Fuente, Appl. Clay Sci. 14 (1999) 225. [9] G. Cultrone, E. Sebastián, K. Elert, M. J. de la Torre, O. Cazalla, C. Rodríguez-Navarro, J. Eur. Ceram. Soc. 24 (2004) 547. [10] M. Hajjaji, S. Kacim, M. Boulmane, Appl. Clay Sci. 21 (2002) 203 [11] Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), Determinação da Análise Granulométrica dos solos, NBR- 7181-84 (1984). [12] K. Okada, N. Otsuda, J. Osaka, J. Am. Ceram. Soc. 69 (1986) C-251. [13] B. Sonuparlak, M. Sarikaya, I. A. Aksay, J. Am. Ceram. Soc. 70 (1987) 837. [14] W. M. Carty, U. Senapati, J. Am. Ceram. Soc. 81 (1998) 3. [15] Alcoa, Oxides and Hydroxides of Aluminum, Alcoa Technical Paper n. 19 (1987). (Rec. 15/05/2006, Ac. 18/05/2007)