CHUVAS INTENSAS NO LESTE DA AMAZÔNIA: FEVEREIRO DE 1980

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Transcrição:

CHUVAS INTENSAS NO LESTE DA AMAZÔNIA: FEVEREIRO DE 1980 Luiz Carlos Baldicero Molion Hemlley Maria Acioly Imbuzeiro Departamento de Meteorologia Universidade Federal de Alagoas (UFAL) Iracema Fonseca de Albuquerque Cavalcanti Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), Cachoeira Paulista -SP iracema@cptec.inpe.br ABSTRACT During February 7 to 16 1980, Central Brazil and Eastern Amazon recorded unusually high rainfall rates reaching over 150 mm.day -1 in some gages, with 10 day accumulated totals exceeding 800 mm. The associated atmospheric phenomenon was analyzed using NCEP/NCAR Reanalysis data, river discharge and observed rainfall data. A dry air mass from Northern Hemisphere, likely associated with a frontal passage, entered Northern South America and converged with a Southern Hemisphere frontal system originating an intense convective band at about 9 S, E-W oriented. The mean rainfall, recorded in the region in that month, was 520±120 mm. As a result of the high rainfall totals, Tocantins river March mean discharge, recorded at Tucurui, was 68,000m 3 s -1 against a 24,000 m 3 s -1 historical mean and Xingu river mean discharge was 32,000 m 3 s -1 with long term mean of 18,000m 3 s -1 at Altamira. 1. INTRODUÇÃO A precipitação pluvial é a variável meteorológica mais importante na região tropical. Em anos recentes, sua variabilidade interanual, particularmente seus eventos extremos, tem atraído mais atenção e preocupação em decorrência de uma possível variação do clima global. Dignos de nota são os anos hidrológicos de 1982/83 e 1997/98 quando ocorreram eventos El Niños fortes e, como conseqüência, as Regiões Norte e Nordeste do Brasil sofreram secas severas em oposição às Regiões Sul e Sudeste que registraram cheias excepcionais. Em anos de La Niña, como 1984/85 e 1988/89, as situações opostas foram observadas. Entretanto, outros eventos extremos também podem ocorrer associados a outras condições sinóticas. Excesso (inundações) e escassez (secas) de chuva perturbam as atividades humanas, como a geração de energia elétrica, particularmente no que se refere ao controle e operação de reservatórios e segurança das barragens e da população ribeirinha, além de prejuízos à agricultura e à sociedade. Previsão de chuvas, principalmente de eventos extremos, é uma atividade crucial para a segurança da Sociedade. Qualquer tempo ganho, antes que os processos hidrológicos de superfície se iniciem, é muito valioso para aquelas atividades. O objetivo deste trabalho foi o de analisar o evento extremo de fevereiro de 1980 no Brasil Central e Leste da Amazônia, quando ocorreram totais pluviométricos excedendo 150 mm dia -1 numa larga faixa no Brasil Central ao longo de 9 S aproximadamente. Essas chuvas provocaram enchentes na Região e grandes vazões médias nos rios afluentes da margem direita do Amazonas. 2. DADOS E METODOLOGIA Com o objetivo de identificar os sistemas sinóticos, sua gênese e intensidade, que atuaram no mês de fevereiro de 1980, foi realizada uma análise preliminar usando dados pluviométricos e de vazão dos rios Tocantins e Xingú, obtidos de registros da ANA (2005), e imagens do satélite geoestacionario GOES, obtidas do CPTEC/INPE. Uma vez identificado o sistema e seu período de 20 Ano 03, Número 01

atuação, definido entre os dias 7 e 16 daquele mês, foi utilizado o software Grid Analysis and Display System (GrADS versão 2.8SL), do Center for Ocean-Land-Atmosphere Interactions (COLA) (Doty, 1992), aplicado aos dados de Reanálises do National Centers for Environmental Prediction/National Center for Atmospheric Research (NCEP/NCAR). Esses dados foram obtidos do Climate Diagnostics Center (CDC/CIRES/NOAA, 2006), em um domínio espacial de 25ºW a 110ºW e 50ºS a 20ºN, para a caracterização da termodinâmica e da estrutura vertical do sistema. Em adição, foram utilizados dados de precipitação da Universidade de Delaware (Udel), que são dados observados, colocados em pontos de grade com 0,5 x 0,5º de espaçamento, também obtidos do CDC/CIRES/NOAA. Utilizou-se a velocidade vertical ω (hpa.s -1 ) entre os níveis de 1.000hPa e 150hPa, para a qual foram construídas seções verticais ao longo da longitude de 45ºW e 60 ºW. Para os níveis convencionais de 925hPa a 150hPa, foram construídas cartas de linhas de corrente e magnitude do vento (m.s -1 ) a partir dos arquivos das componentes u e v do vento, que foram utilizadas, também, para construir as cartas de vorticidade relativa (s -1 ) e divergência horizontal (s -1 ) entre 925hPa e 200hPa. Foram também utilizados dados de radiação de onda longa emergente, da NOAA. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO O fenômeno atmosférico, que provocou as chuvas superiores a 150 mm/dia em vários postos pluviométricos do Brasil Central e Leste da Amazônia e acumulados de 10 dias (7 a 16 do mês) superiores a 800mm, é mostrado na imagem do canal infravermelho do satélite GOES para o dia 8 de fevereiro (Figura 1). Esse fenômeno foi gerado pela atuação conjunta da passagem de uma crista e cavado bem amplificados no Hemisfério Norte, possivelmente associados à passagem de um sistema frontal, aparente no canto direito superior da Figura 1, sobre o oeste da África e Atlântico Norte e de um sistema frontal do Hemisfério Sul (SFHS), com uma inclinação NW-SE, cruzando a costa em 25 S. Também houve atuação de um VCAN próximo à costa do Nordeste, além de restos de outro sistema frontal sobre o Atlântico Sul. A ação da crista e do cavado sobre o Atlântico Tropical Norte, próximo ao norte da América do Sul, é mostrada na Figura 2, em que se nota a convergência em altos níveis entre o eixo da crista e do cavado, que ocasionou movimento subsidente nessa região. Divergência em altos níveis sobre grande parte da América do Sul, que favoreceu os movimentos ascendentes, foi consistente com a atividade convectiva visualizada pela nebulosidade na imagem da Figura 1. Figura 1 - Imagem no canal de radiação infravermelha do satélite GOES para o dia 8 de fevereiro de 1980. Ano 03, Número 01 21

A estrutura vertical do movimento vertical indica movimentos subsidentes ao norte do equador e movimentos ascendentes ao sul, ao longo de 60 W (Figura 3), consistente com a região sem nebulosidade no norte da América do Sul e com nebulosidade convectiva sobre grande parte da América do Sul. Figura 2 - Linhas de corrente e divergência em 200 hpa para o dia 8 de fevereiro de 1980. Figura 3 - Seção de ω (hpa s -1 ) ao longo de 60 W para o dia 8 de fevereiro de 1980 A ação dos sistemas do H.N. e do H.S. contribuiu para a concentração da atividade convectiva em uma faixa latitudinal entre 6 S e 12 S, na direção E-W, cobrindo as principais bacias da margem direita dos rios Solimões e Amazonas, além da extensão para sudeste associada à presença do sistema frontal, também indicado pela confluência dos ventos sobre o oceano próximo à costa sudeste do Brasil (Figura 4). O acontecimento espetacular, aparente na imagem de satélite, é toda a região noroeste da América do Sul (Amazônia) ter ficado desprovida de nebulosidade, sugerindo que a massa de ar, associada à crista pós frontal se apresentava muito seca. Na Figura 5, é mostrada a seção da velocidade vertical (ω), ao longo da longitude 45 W. Os movimentos ascendentes (valores negativos de ω) foram intensos entre 6 S-12 S, superiores a 0,18 hpas -1 em módulo, e se estenderam por toda a troposfera. A Figura 6 é uma carta de linhas de corrente 22 Ano 03, Número 01

e vorticidade relativa em 200hPa, para o mesmo dia, onde podem ser observados dois centros, um com vorticidade anticiclônica (Alta da Bolívia), em cerca de 18 S e 53 W, e outro com vorticidade ciclônica (VCAN) em 18 S e 19 W. A divergência em altos níveis, associada à Alta da Bolívia, foi intensificada com a entrada do SFSH em 25 S. A forte convecção permaneceu atuante até o dia 16 de fevereiro. Nota-se que, posteriormente, a intensa convecção ficou restrita ao leste da Amazônia e Nordeste, se estendendo até a Região Sudeste (Figura 7). A seção vertical das velocidades verticais ao longo do meridiano 45 W para esse dia foi mostrada na Figura 8. Os movimentos ascendentes se estenderam por toda troposfera e foram mais intensos entre 500hPa-250hPa, com valores superiores a 0,24 hpa s -1, em módulo. Figura 4 - Linhas de corrente e vorticidade em 850 hpa para o dia 8 de fevereiro de 1980 (vorticidade ciclônica em verde e anticiclônica em amarelo). Figura 5 - Seção de ω (hpa s -1 ) ao longo de 45 W para o dia 8 de fevereiro de 1980. Ano 03, Número 01 23

Figura 6 - Linhas de corrente e vorticidade em 200 hpa para o dia 8 de fevereiro de 1980. Figura 7 - Imagem no canal de radiação infravermelha do satélite GOES para o dia 15 de fevereiro de 1980. Figura 8 - Seção de ω (hpa s -1 ) ao longo de 45 W para o dia 15 de fevereiro de 1980. 24 Ano 03, Número 01

A carta de linhas de corrente e vorticidade relativa para o dia 15 ao nível de 850hPa foi apresentada na Figura 9a. Nota-se, nesse nível, uma linha de confluência se estendendo de 10 S- 50 W a 20 S-55W, coincidente com a posição do ramo leste da Alta da Bolívia em altos níveis (Figura 9b). Além do escoamento de N-NW, a convergência em baixos níveis e divergência em altos níveis contribuíram para a intensa convecção. O centro da Alta da Bolívia, em 18 S e 68 W, estava deslocado mais para sudeste de sua posição normal no verão, e havia um cavado próximo à costa SE, se estendendo até a região tropical. Uma forte difluência ao longo de 15 S, entre 30 W e 55 W, foi aparente, o que está de acordo com os movimentos ascendentes e nebulosidade notados nas Figuras 7 e 8. Isso sugere que as taxas de precipitação mais intensas se confinaram sobre o leste do Brasil Central, particularmente nesse período final de atuação do fenômeno. Na Figura 10 é mostrado o campo de radiação de onda longa emitida para o espaço (ROLE) média para o período 7 a 16 de fevereiro. Com exceção do NW da Amazônia, uma extensa região apresentou valores inferiores a 200 W m -2, ou seja, temperaturas equivalentes a -30 C, confirmando que a atividade convectiva foi intensa durante o período, com aglomerados de topos frios, superiores a 9 km de altura. Os totais de precipitação (cm mes -1 ) para fevereiro de 1980 foram apresentados na Figura 11, elaborada com dados observados (Udel). Uma vasta região, orientada praticamente N-S, e coincidente com os valores baixos de ROLE, apresentou totais médios no mês superiores a 400 mm. Uma inspeção dos totais mensais, observados em 74 postos pluviométricos (Hidroweb) entre 7 S-14 S e 45 W-55 W no mês de fevereiro, resultou em uma média aritmética igual a 540 ± 120 mm, com valor máximo de 921 mm e mínimo de 315 mm. Como conseqüência do alinhamento da faixa convectiva ao longo das bacias do rio Tocantins e do rio Xingú, suas vazões, registradas em março daquele ano, atingiram valores muito acima de suas médias de longo prazo. O rio Tocantins, em Tucurui, apresentou uma vazão estimada de 68.000m 3 s -1 contra uma média histórica de 24.000 m 3 s -1, enquanto o rio Xingu registrou 32.000 m 3 s -1, contra uma média histórica de 18.000 m 3 s -1. (a) (b) Figura 9 - Linhas de corrente e vorticidade em 850 hpa para o dia 15 de fevereiro de 1980 (a) e em 200 hpa para o dia 15 de fevereiro de 1980 (b). Ano 03, Número 01 25

Figura 10 - Radiação de onda longa emergente média (Wm -2 ), período 7 a 16 de fevereiro de 1980. Fonte de dados: CDC/CIRES/NOAA. Figura 11 - Totais de precipitação (cm.mes -1 ) para fevereiro de 1980. Fonte de dados: Udel/CDC/CIRES/NOAA. 26 Ano 03, Número 01

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS Eventos extemos, como o ocorrido entre 7 e 16 de fevereiro de 1980, são catastróficos e, felizmente, raros. Uma inspeção na pluviometria do Brasil Central e Leste da Amazônia, mostrou que algo semelhante ocorreu em 1938, sugerindo que esse evento possa ter um tempo de retorno de cerca de 40 a 50 anos. Um acontecimento atípico foi a presença de uma extensa massa de ar seco, provocando céu claro e estiagem no norte da América do Sul, do lado equatorial de 9ºS. Essa massa de ar seco pode ter sido causada pela penetração de uma crista pós frontal sobre o norte da América do Sul, associada à passagem de um sistema frontal em latitudes tropicais, no Hemisfério Norte. Ao sul dessa latitude, formou-se uma banda, na direção E-W, sob a qual foram registrados altos totais pluviométricos. O posto de Dois Irmãos (9 15 ;49 09 ), por exemplo, registrou um total de 921 mm e dois terços dos 74 postos inspecionados registraram totais superiores a 500 mm naquele mês. Esse evento quase destruiu o Reservatório de Tucurui que, na época, estava em construção. Não se têm relatos de perdas de vida e do montante dos danos materiais provocados pelo fenômeno. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANA (Agência Nacional de Águas) Hidroweb: dados de fluviometria e pluviometria, http://hidroweb. ana.gov.br Acesso em: 21/11/2005. DOTY, B. E. Using the Grid Analysis and Display System. Center for Ocean-Land-Atmosphere Interactions (COLA), Maryland, University of Maryland, 1992. CDC/CIRES/NOOA Climate Diagnostics Center, Boulder, Colorado, USA, http://www.cdc.noaa.gov/, Acesso em : 03/01/2006. Ano 03, Número 01 27