Rev. Cient. Rev. Prod. Cient. Anim., Prod. v.10, Anim., n.2, p.127-137, v.10, n.2, 2008 Características Termorreguladoras de Caprinos, Ovinos e Bovinos em Diferentes Épocas do Ano em Região Semi-Árida Severino Cavalcante de Sousa Júnior 1, Débora Andréia Evangelista Façanha Morais 2, Ângela Maria de Vasconcelos 3, Kelly Mary Nery 4, Jacinara Hody Gurgel Morais 5, Magda Maria Guilhermino 6 RESUMO - Esta pesquisa foi realizada com o objetivo de se avaliar o comportamento de características termorreguladoras de caprinos, ovinos e bovinos durante os períodos seco e chuvoso e correlacionar com variáveis meteorológicas registradas ao longo do ano em ambiente semi-árido. Foram utilizadas dez cabras e dez ovelhas sem padrão racial definido (SPRD), além de dez vacas mestiças de Holandês. A temperatura retal (TR), frequência respiratória (FR) e a taxa de sudação (TS) dos animais foram medidas a cada 15 dias, às 9 h e às 15 h, durante os meses de abril a junho e outubro a dezembro. Nos mesmos horários o ambiente foi monitorado quanto à temperatura e umidade do ar, carga térmica radiante (CTR) e Índice de Temperatura de Globo e Umidade (ITGU). Os resultados mostraram médias de variáveis ambientais superiores ao considerado adequado para as três espécies. Os valores críticos foram concentrados na época chuvosa, que ocorreu do mês de janeiro a junho e no horário das 15:00, quando foram verificadas maiores TR e FR e menores TS. A espécie caprina foi a que apresentou menor elevação da temperatura retal e necessitou acionar em menor escala os mecanismos de termólise respiratória e cutânea. A TR, FR e TS foram correlacionadas de maneira positiva e significativa com taxa de sudação e com todas as variáveis meteorológicas. No período chuvoso à tarde houve maior aquecimento corporal e redução da termólise evaporativa cutânea, nas três espécies, além das variáveis climáticas atingiram valores mais elevados. Palavras-chave: temperatura retal, estresse térmico, ruminantes, termorregulação. 1 1 Doutorando do Departamento de Zootecnia FCAV/UNESP- Jaboticabal. (sevzoo@yahoo.com.br) 2 Professora do Departamento de Ciências Animais/UFERSA. (debora@ufersa.edu.br) 3 Professora do Centro de Ciências Agrárias e Biológicas/UEVA. (angv06@hotmail.com.) 4 Graduada em Agronomia/UFERSA. (kelly_mary_nery@hotmail.com) 5 Graduada em Zootecnia/UFERSA. (narinhazootecnista@hotmail.com) 6 Professora do Departamento de Agropecuária/UFRN. (magdaguilhermino@hotmail.com) 127
Thermoregulatory Traits of Goat, Sheep and Cattle in Different Seasons of the Year in Tropical Region ABSTRACT -This work was conducted with the objective of evaluate the behavior of thermoregulatory traits of goats, sheeps and cows during wet and dry season, as well as correlate these data with meteorological variables registered during the year in a semi-arid environment. Thirteen animals were used: ten undefined breed goats, ten undefined breed sheeps, and ten crossbreed Holstein cows. Rectal temperature (RT), respiratory rate (RR) and sweating rate (SR) were registered biweekly in each animal, at 9:00 h and 15:00 h, during periods april-june and october-december. At the same time meteorological variables was monitored as the temperature and humidity of air, registered Radiant Heat Load (RHL) and Black Globe Humidity Index (BGHI). The results showed means of environmental variables higher than the considered adequate to each species, with critical values in wet season and at 15:00 h, when RT, RR and SR were also higher. The goats showed smaller elevation of RT and consequently had less necessity of using respiratory and cutaneous thermolysis. The RT, RR and RR were significantly correlated with TR and with all meteorological traits. In the rainy season in the afternoon there was more body heat and reduce water evaporative thermolysis of skin in all three species, in addition to climatic variables reached higher values. Key Words: ruminants, rectal temperature, stress thermal, thermoregulation Introdução O semi-árido do Nordeste brasileiro tem como mais importante fração da produção animal a criação de ruminantes. O efetivo regional de bovinos é de 25.421.907 animais, com predominância de animais mestiços, utilizados para produção de leite e carne. Com relação aos pequenos ruminantes, a região é detentora dos maiores rebanhos brasileiros de caprinos e ovinos, que representam respectivamente 93 e 58% do efetivo nacional (Anualpec, 2005). Deste rebanho, aproximadamente 63% estão inseridos na zona semi-árida, criados predominantemente em sistema extensivo e expostos diretamente às condições ambientais (Vasconcelos & Vieira, 2004). A produção de carne de ovinos e caprinos é de fundamental importância para o desenvolvimento sócio-econômico da região Nordeste, devido ao grande potencial dessas espécies em se adaptar às condições climáticas da região. A eficiência produtiva será maior se estes animais estiverem em condições de conforto térmico, na qual não precisem acionar os mecanismos termorreguladores para efetuar a dissipação de calor (Souza et al., 2002). No entanto, sabe-se que esta zona de clima semi-árido, caracterizado por alta incidência de radiação solar e altas temperaturas, impõe durante praticamente todos os meses do ano, situações de desconforto térmico aos animais, sobretudo às de raças mais produtivas, que geralmente são oriundas de clima temperado. 128
Esse fato torna necessário o acionamento de mecanismos fisiológicos de termorregulação, que, embora permitam aos animais manterem a homeotermia, podem trazer reflexos negativos à saúde, às funções produtivas e ao seu bemestar. Animais submetidos às variações climáticas fora da faixa de conforto térmico podem apresentar perda de peso, crescimento retardado, problemas respiratórios e hormonais, falta de apetite, entre outros problemas. Neste contexto, o efeito do clima sobre o desempenho dos animais de produção tem despertado, nos últimos anos, a atenção de vários pesquisadores, salientando a importância da interação animal-ambiente como fator relevante aos processos produtivos (Sousa Júnior et al., 2004). Nos ruminantes criados em regiões tropicais, o mecanismo de termólise considerado mais eficaz é o evaporativo, uma vez que nesses ambientes a temperatura do ar tende a ser próxima à da superfície cutânea, neutralizando as trocas térmicas por condução e convecção. Cerca de 1/3 da termólise evaporativa ocorre pelas vias respiratórias e 2/3 pela cutânea, portanto, a ocorrência de estresse térmico em caprinos, ovinos e bovinos pode seguramente ser diagnosticada pelos aumentos da temperatura retal, frequência respiratória e taxa de sudação. Porém, é importante ressaltar que a termólise evaporativa em regiões de clima quente como nos sertões semi-áridos poderá ser prejudicada tanto pelo excesso quanto pela falta de umidade (Silva, 2000). Durante os meses mais secos do ano, os animais podem sofrer irritações cutâneas e desidratação, ao passo que na época chuvosa, a alta umidade combinada à alta temperatura pode tornar a evaporação mais lenta, prejudicando a dissipação de calor e aumentando o estresse térmico, como foi verificado por Morais (2002), para vacas leiteiras no Sertão Central do Ceará. Essas avaliações são importantes como formas auxiliar ao estabelecimento de padrões termorregulatórios de animais supostamente adaptados ao clima quente, além de contribuírem para a avaliação do equilíbrio térmico entre o animal e o ambiente. Assim, esta pesquisa foi realizada com o objetivo de se avaliar o comportamento da termólise evaporativa cutânea e da temperatura corporal de caprinos e ovinos Sem Padrão Racial Definido (SPRD) e de bovinos mestiços de Holandês, durante os períodos, seco e chuvoso, bem como correlacionar com algumas variáveis meteorológicas registradas no ambiente Semi- Árido. Material e Métodos Esta pesquisa foi realizada na Fazenda Experimental da Universidade Estadual Vale do Acaraú (UEVA), no município de Sobral, região Norte do Estado do Ceará. O município apresenta coordenadas geográficas 3º25 latitude Sul, 40º13 longitude Oeste e altitude 15 m. De acordo com a classificação de Köppen, o clima da região é do tipo BSWh, que significa clima muito seco e quente com estação chuvosa no verão, atrasando-se para o outono. Não são verificadas grandes alterações de fotoperíodo, temperatura do ar e insolação ao longo do ano. Porém, verifica-se a ocorrência de um período chuvoso, geralmente de janeiro a maio, além de 129
um período de estiagem de junho a dezembro. Foram escolhidos aleatoriamente 30 animais, sendo dez da espécie caprina Sem Padrão Racial Definido (SPRD), de seis a oito meses de idade, com peso médio 25 kg, aptidão para produção de carne, de ambos os sexos e pelagens claras e pele pigmentada; dez da espécie ovina SPRD, também de seis a oito meses de idade, com peso médio 30 kg, para produção de carne, de ambos os sexos e pelagens predominantemente de pêlos escuros. Foram também utilizadas dez vacas mestiças de Holandês, com pelagem variando do preto ao marrom, com mais de dois anos de idade e pesando 400 a 500 kg. Os caprinos e ovinos eram criados em sistema extensivo, soltos em pastagem nativa raleada durante o dia e recolhidos a uma instalação rústica, na qual passavam a noite. No grupo dos bovinos havia quatro vacas no final da gestação, que não eram ordenhadas. Esses animais permaneciam em pastagem cultivada com Panicum maximum cv. Tanzânia durante o dia e no final da tarde eram recolhidas a um estábulo onde recebiam suplementação a base de milho triturado e ainda suplementação mineral. As demais vacas secas eram também mantidas em pastagem de Panicum maximum cv. Tanzânia durante o dia, sendo recolhidas ao curral no final da tarde, onde permaneciam a noite inteira até a ordenha, realizada pela manhã. Os dados foram coletados a cada 15 dias, durante os meses de abril a junho, correspondentes ao período chuvoso, e de outubro a dezembro, correspondentes ao período seco. Foram realizadas duas coletas diárias: pela manhã, das 9:00 h às 10:00 h e pela tarde, das 15:00 h às 16:00 h. Nos animais foi registrada em inicialmente a freqüência respiratória (FR), em movimentos respiratórios por minuto, através da observação direta dos movimentos do flanco esquerdo; em seguida registrou-se a temperatura retal (TR), por meio de um termômetro clínico introduzido diretamente no reto dos animais durante dois minutos. Posteriormente foi estimada a taxa da sudação (TS), pelo método calorimétrico de Schleger e Turner (1965), adaptado por Silva (2000). No ambiente foram registradas as temperaturas do termômetro de bulbo seco (temperatura do ar) e do termômetro de bulbo úmido, no início e fim de cada coleta, com as quais foi estimada a umidade do ar; Nesses mesmos horários foram registradas as temperaturas do termômetro de globo negro, com as quais se calcularam o Índice de Temperatura de Globo e Umidade (ITGU) e a Carga Térmica Radiante (CTR), segundo metodologia usada por Morais (2008), através das equações a seguir: Pressão Parcial de Vapor (Pp{Ta}) Pp {Ta} = Ps{Tu} - γ (Ta-Tu) Sendo: Ps{Tu} = pressão de saturação à temperatura Tu (kpa) γ = constante psicrométrica, (kpa/ºc) Ta = temperatura do ar ou de bulbo seco ( C) Tu = temperatura do bulbo úmido ( C) Índice de Temperatura de Globo e Umidade (ITGU) ITGU = Tg + 0,36 Tpo + 41,5 Sendo: 130
Tg = temperatura do termômetro de globo (ºC) Tpo = temperatura do ponto de orvalho (ºC) 41,5 = constante Carga Térmica Radiante (CTR) CTR (W/ m 2 4 )= 1,053 h c (T g -T a ) + δt g Sendo: h c = coeficiente de convecção do globo negro (W/ºC) T g = temperatura do termômetro de globo (ºK) T A = temperatura do ar (ºK) δ = constante de Stefan-Boltzmann (5,6697 x 10 8 W.m -2. ºK) Os dados foram submetidos à análise de correlação entre as variáveis analisadas, análise de variância e teste de homogeneidades de variância do resíduo. Para comparar os resultados foi realizado o teste de Tukey (P<0,05), utilizando-se o pacote estatístico SAS, versão 9. (SAS Institute, 2003). A análise estatística foi realizada pelo método dos quadrados mínimos, conforme Harvey (1960), tendo como base o seguinte modelo: Y ijklm = µ+gg i +A ji +H k +E l +ITGU ijkl +CTR ijkl +F R ijkl +TR ijkl +e ijklm Sendo: Y ijklm = m-ésima média µ = é a média geral; GG i = efeito fixo da i-ésima espécie ( i = 1,2,3); A ji = efeito aleatório do j-ésimo animal pertencente a i-ésima espécie; H k = é o efeito fixo do k-ésimo horário de coleta (k = 1,4); E l = é o efeito fixo do l-ésima época de coleta (k = 1,4); ITGU ijkl = Índice de Temperatura de Globo e Umidade da l-ésima coleta, j-ésimo animal pertencente ao i-ésima espécie CTR ijkl = Carga Térmica Radiante da l-ésima coleta, j-ésimo animal pertencente ao i-ésima espécie FR ijkl = freqüência respiratória da l-ésima coleta, j-ésimo animal pertencente ao i-ésima espécie TR ijkl = Taxa de sudação da l-ésima coleta, j-ésimo animal pertencente ao i-ésima espécie e ijklm é o resíduo, incluindo o erro aleatório. Resultados e Discussão A Tabela 1 apresenta o registro das variáveis meteorológicas durante o período experimental, onde se pode perceber uma amplitude térmica de 7,6 C, com superioridade para o período seco, provavelmente devido à maior incidência de radiação solar verificada nesta época do ano na região onde foi realizada a pesquisa. A Carga Térmica Radiante (CTR) também atingiu valores mais altos no período seco à tarde (15:00), confirmando a maior irradiância, comum nas regiões de baixa latitude na estação estival. Medeiros (1996), comenta que a CTR mais elevada pode ser atribuída ao fato da nebulosidade ser menor nesta época do ano, permitindo que uma maior fração de radiação solar atinja a superfície da terra e que isso é um alerta para uma maior necessidade de proteção dos animais, através de sombreamento, nesta época do ano. 131
Tabela 1 - Médias das variáveis meteorológicas e índices de conforto térmico registrado no ambiente ocupado pelos animais durante o período experimental ITGU: Índice de temperatura do globo e umidade. CTR: Carga térmica radiante. Com relação à umidade do ar e ao ITGU, os maiores valores foram obtidos no período chuvoso pela manhã, porém, em todas as ocasiões os valores foram superiores aos limites da zona de conforto térmico dos bovinos, ovinos e caprinos, referidos por Swenson e Reece (1996) e por Pereira (2005). A umidade do ar foi expressa em pressão parcial de vapor, que representa a concentração de vapor d água em uma atmosfera não saturada, ou seja, justamente a medida de partículas d água que fazem pressão sobre a superfície corporal, portanto está mais relacionada às trocas térmicas evaporativas entre o animal e o ambiente. Por ser independente da temperatura do ar, a pressão parcial de vapor torna-se uma medida de umidade mais recomendada para expressar a termorregulação em animais. As médias foram maiores durante o período chuvoso, em função da maior concentração de vapor d água na atmosfera. As médias de Índice de Temperatura e Umidade (ITGU) Considerando-se as diferentes espécies pode-se verificar que a temperatura retal (TR) foi maior nos bovinos, no período chuvoso na parte da tarde, justamente quando a espécie apresentou valores de temperaturas retais diferentes, o que pode ser justificado devido atingiram maiores valores durante o período chuvoso devido aos altos valores de umidade do ar combinados às temperaturas ambientes altas. Os valores de ITGU encontrados nesta pesquisa são semelhantes aos registrados por Morais et al. (2008), também em região semiárida, o que pode aumentar o estresse dos animais, devido à dificuldade de realizar trocas térmicas por evaporação, sobretudo a cutânea. É possível que esses valores altos de ITGU tornem o período chuvoso bastante crítico para a termorregulação, pois podem vir a suprimir as perdas de calor latente. As médias das variáveis termorreguladoras das três espécies encontram-se na Tabela 2. Não foi verificado efeito significativo (P>0,05) de espécie dentro de cada horário de coleta. Houve efeito significativo (P<0,05) das interações entre diferentes espécies e época do ano, assim como a interação espécie x horário de coleta, para as variáveis termorreguladoras. ao aumento da umidade relativa do ar neste período do ano ocasionando a diminuição das perdas de calor por evaporação, possivelmente por ser esta espécie de maior porte e cor predominantemente preta, o que dificulta a dissipação de calor, aquecendo mais o corpo 132
Tabela 2 - Médias de temperatura retal, frequência respiratória e taxa de sudação de caprinos, ovinos e bovinos durante os períodos chuvoso e seco em Sobral, CE *Médias seguidas das mesmas letras minúsculas nas linhas e maiúsculas nas colunas não diferem entre si pelo Teste de Tukey a 5% de significância. destes animais e também devido a maior área corporal de exposição aos raios solares que aumenta a área de exposição aos raios solares. Resultados semelhantes foram apresentados por Souza et al. (2008) para diferentes grupos raciais de animais da espécie caprina. Os caprinos apresentaram menor aumento da TR que os ovinos, o que pode favorecer a sua adaptação ao ambiente quente. É importante salientar que os ovinos apresentavam predominantemente pêlos escuros, o que certamente favoreceu a maior estocagem térmica, devido à maior absorção de calor ambiente, aumentando a temperatura corporal dos animais. Por outro lado, vale ressaltar que o conjunto pelame-epiderme exerce influência associada sobre o balanço térmico dos animais. Pelames escuros, apesar de absorverem mais a radiação, geralmente apresentam menor transmitância, de forma que o calor fica retido na camada composta por pêlos e ar. Se estiverem associados a epidermes pigmentadas, o animal conta com uma proteção a mais, devido ao pigmento melanínico funcionar como filtro, evitando que eventuais frações de radiação incidente não atinjam as camadas mais profundas da pele, onde normalmente causam lesões (Ligeiro et al., 2006). Os caprinos apresentaram predominância de pelagem clara e pele pigmentada, melhor combinação para as regiões de clima quente, pois reflete parte da radiação solar incidente sobre a superfície do animal e a outra fração que não é refletida pode ser filtrada pela melanina, protegendo os animais de lesões cutâneas. Em pesquisa com caprinos, Ligeiro et al. (2006), demonstraram que a perda de calor latente por evaporação cutânea está associada também com as características morfológicas do pelame, sendo pelames menos espessos e de coloração clara favoráveis a termólise. A frequência respiratória (FR) das três espécies mostrou-se mais elevada que os valores de referência indicados na literatura (Medeiros et al., 1996; Brasil et al., 2000; Azevedo et al., 133
2005; Santos et al., 2005; Ligeiro et al., 2006 e Souza et al., 2008), evidenciando o uso da termólise respiratória em ambos os períodos do ano e horários do dia. No entanto, as médias de bovinos e ovinos foram semelhantes entre si no período da tarde, sendo a espécie ovina a única que apresentou FR diferente entre os turnos da manhã e tarde nos dois períodos do ano e maiores que a dos caprinos, o que pode ser atribuído ao fato dos caprinos terem absorvido menos calor do ambiente, necessitaram assim, dissipar menos calor por evaporação. Esta observação é reforçada pelas menores TR apresentadas pelos caprinos. Quanto aos bovinos, este dado é importante, haja visto que Azevedo et al. (2005), ressaltam que a FR é um indicador de estresse térmico melhor que a TR. De fato, segundo os autores a elevação da FR indica necessidade de utilização do sistema termorregulador, ao passo que a elevação de TR não necessariamente caracteriza um quadro de hipertermia. Animais de regiões quentes podem realizar estocagem de calor, na tentativa de manterem o equilíbrio térmico, buscando a utilização mínima do sistema termorregulador. Esse mecanismo diminui o grau de desgaste imposto aos animais por esses processos, tornando-os mais adaptados ao ambiente (Azevedo et al, 2005). A mesma tendência foi verificada para a termólise evaporativa cutânea, com as TS de bovinos e ovinos superior a dos caprinos, confirmando a menor necessidade de termorregulação dos caprinos. A menor necessidade de dissipação de calor pode também ser um indicativo de maior adaptação ao clima quente, favorecendo a homeostase dos caprinos, que desviarão uma menor quantidade de energia das funções produtivas para a termorregulação, a exemplo do que foi relatado por Brasil et al. (2000), a respeito da influência do estresse térmico sobre a produção e a qualidade do produto. Pode-se ainda observar que dentre as três espécies analisadas, as espécies caprina e ovina, apresentaram diferenças (P<0,05) entre os horários de coleta nos dois períodos estudados. A TR nas três espécies foi maior à tarde e, na maioria dos casos, no período chuvoso, devido à maior concentração de vapor d água na atmosfera nesta época dificultar a termólise evaporativa, principal mecanismo de dissipação de calor usado pelas espécies avaliadas, obrigando os animais a utilizarem mais a termólise respiratória. Maia et al. (2005a) verificaram que em bovinos manejados sob condições de alta temperatura e radiação, a dissipação de calor se dá principalmente por mecanismos evaporativos, sendo a evaporação cutânea responsável por aproximadamente 80% dessas perdas. O efeito da TR pode ser reforçado pela menor TS no período chuvoso, indicando que a termólise evaporativa pela via cutânea, através da sudorese, foi diminuída. Os valores de FR foram maiores no período chuvoso para ovinos e bovinos, e menores para caprinos, em relação ao período seco. Os maiores valores de FR e TS da espécie caprina foram registrados na época seca e turno da tarde, em que, apesar dos altos níveis de radiação evidenciados pelas maiores CTR, a combinação dos demais elementos climáticos permitiu aos animais eliminarem o excesso de 134
calor, favorecendo a homeotermia. Esses dados estão em concordância com Brasil et al. (2000) e Souza et al. (2005), que verificaram maiores TR, FR e consequentemente maiores taxas de termólise evaporativa de cabras leiteiras no turno da tarde e período seco. Na Tabela 3, estão apresentados os coeficientes de correlação entre as variáveis ambientais e as variáveis termorreguladores das espécies estudadas, percebe-se que a temperatura do ar correlacionou-se positivamente (P<0,05) com as características termorreguladoras, indicando que nas ocasiões de maior aporte térmico ambiental os animais das três espécies apresentaram elevação do estoque de calor corporal, levando à maior necessidade de dissipação de calor, aumentando a utilização da FR e da sudorese, para manter a homeotermia (Pereira, 2005). Tabela 3 - Coeficientes de correlação entre as variáveis ambientais e características termorreguladores de caprinos, ovinos e bovinos em ambiente semi-árido *P<0,05; **P<0,01. A umidade do ar também correlacionouse (P<0,05) com as variáveis termorreguladoras, sendo essa correlação positiva com TR e FR e negativa com a TS. Isto indica que em situações de maior umidade do ar os animais tiveram maior necessidade de aumentar a dissipação de calor pelas vias respiratórias, porém a sudorese foi reduzida. Com isso, a via de termólise, que segundo Maia et al. (2005b) é a mais eficiente em situações de calor intenso, fica prejudicada. Uma possível estratégia para minimizar este impacto pode ser a maior proteção dos animais da exposição à radiação solar, através de manejo ambiental adequado, como sombreamento natural em pastagens e acesso a estruturas artificiais de sombra, como estábulos, free-stalls ou até mesmo coberturas de sombrite. Os maiores valores de ITGU foram acompanhados por aumentos de TR e FR, porém tiveram efeitos negativos para a evaporação cutânea, refletindo o que ocorreu com a umidade do ar. Os maiores níveis de radiação, traduzidos pelas maiores CTR, ocasionaram aumentos da TR e FR, porém não influenciaram (P>0,05) a TS. É importante salientar a elevada correlação negativa (P<0,05) entre TS e ITGU, em comparação à correlação entre TS e CTR, muito baixa e não significativa. Em situações de maiores temperaturas retais os animais aumentaram a TS. No entanto, não se verificou correlação significativa entre temperatura 135
corporal e FR, possivelmente por se tratarem de mecanismos não simultâneos. Conclusões Os caprinos apresentam menor aquecimento corporal e utilizaram em menor escala os mecanismos de termólise evaporativa cutânea e respiratória, em relação aos ovinos e bovinos. No período chuvoso à tarde há maior aquecimento corporal e redução da termólise evaporativa cutânea, nas três espécies, além das variáveis climáticas atingirem valores mais elevados. Há necessidade de manejo ambiental e instalações que possibilite maior proteção dos animais contra a absorção de radiação nos períodos de maior umidade do ar. Referências Bibliográficas ANUÁRIO ESTATÍSTICO DA PECUÁRIA BRASILEIRA (ANUALPEC). A rg o s Comunicação, 2005. 200p. AZEVEDO, M.; PIRES, M.F. A; SATURNINO, H.M.S. et al. Estimativa de níveis críticos superiores do índice de temperatura e umidade para vacas leiteiras 1/2, 3/4 e 7/8 holandês-zebu em lactação. Revista Brasileira de Zootecnia, v.34, n.6, p.2000-2008, 2005. BRASIL, L.H.A.; WECHESLER, F.S.W.; BACCARI JÚNIOR, F. et al. Efeitos do estresse térmico sobre a produção, composição química do leite e respostas termorreguladoras de cabras da raça Alpina. Revista Brasileira de Zootecnia, v.29, n.6, p.1632-1641, 2000. HARVEY, W.R. Least squares analysis of data with unequal suclass numbers. Beltsville, Md: ARS/USDA, Publ. 1960. LIGEIRO, E.C.; MAIA, A.S.C; SILVA, R.G et al. Perda de calor por evaporação cutânea associada às características morfológicas do pelame de cabras leiteiras criadas em ambiente tropical. Revista Brasileira de Zootecnia, v.35, n.2, p.544-549, 2006. MAIA, A.S.C.; SILVA, R.G.; LOUREIRO, C.M.B. Respiratory heat loss of Holstein cows in tropical environment. Int. I. Biometeorology., v.49, n.5, p.332-336, 2005a. MAIA, A.S.C.; SILVA, R.G.; LOUREIRO, C.M.B. Sensible and latent heat loss from the body surface of Holstein cows in tropical environment. Int. I. Biometeorology., v.50, n.1, p.17-22, 2005b. MEDEIROS, G.R. Peso a cobrição, ganho de peso durante a gestação e prolificidade de cabras nativas, exóticas e mestiças no semiárido. Areia: UFPB, 1996. 50f. Dissertação (Mestrado). MORAIS, D.A.E.F.; MAIA, A.S.C.; SILVA, R.G. et al. Variação anual de hormônios tireoideanos e características termorreguladoras de vacas leiteiras em ambiente quente. Revista Brasileira de Zootecnia, v.37, n.3, p.538-545, 2008. PEREIRA, J.C.C. Fundamentos da bioclimatologia aplicada à produção animal. São Paulo: FEPMVZ, 2005. 195p. 136
SANTOS, F.C.B.; SOUZA, B.B.; ALFARO, C.E.P. et al. Adaptabilidade de caprinos exóticos e naturalizados ao clima semi-árido do Nordeste brasileiro. Ciência e Agrotecnologia, v.29, n.1, p.142-149, 2005. SAS Institute, SAS (Statistical Analysis System). User s Guide. Cary, NC: SAS Institute Inc., 2003. 129p. SILVA, R.G. Introdução à Bioclimatologia Animal. São Paulo: Nobel, 2000. 286p. SOUSA JÚNIOR, S.C.; MORAIS, D.E.F.; VASCONCELOS, A.M et al. Respostas termorreguladoras de caprinos, ovinos e bovinos na região semi-árida. In: CONGRESSO NORDESTINO DE PRODUÇÃO ANIMAL, 3., 2004, Campina Grande. Anais... Campina Grande: SNPA, 2004. CD-ROM. SOUZA, B.B.; SOUZA, E.D.; CEZAR, M.F. et al. Temperatura superficial e índice de tolerância ao calor de caprinos de diferentes grupos raciais no semi-árido nordestino. Ciência e Agrotecnologia, v.32, n.1, p. 275-280, 2008. SOUZA, E. D.; SOUZA, B B.; SOUZA, W.H. et al. Determinação dos parâmetros fisiológicos e gradiente térmico de diferentes grupos genéticos de caprinos no semi-árido. Ciência Agrotecnica, v.29, n.1, p.177-184, 2005. SOUZA, E.D.; SOUZA, B.B.; SOUZA, W.H. et al. Respostas adaptativas de caprinos da raça Boer e caprimos exóticos ( Boer e Anglo Nubiana) e naturalizados (Moxotó e pardosertaneja) ao clima semi-árido. In: REUNIÃO ANUAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ZOOTECNIA, 39., 2002, Recife. Anais... Recife: SBZ, 2002. CD-ROM. STOTT, G.H. Immunoglobulin absorption in calf neonates with special considerations of stress. Journal of Diary Science, v.63, n.4, p.681-688, 1980. SWENSON, M.J.; REECE, W.O. Dukes Fisiologia dos Animais domésticos. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1996. 856p. VASCONCELOS, V.R.; VIEIRA, L.S. A evolução da caprino-ovinocultura brasileira. Disponível em: http://www.capritec.com.br/ artigos/embrapa. Acesso em: 20 dez. 2006. VAZ, A.K.; FURTADO, A.C.; MARCA, A.; PATERNO, M.R. Qualidade do colostro bovino e transferência de imunidade aos bezerros recém-nascidos na região de Lages, SC. Revista Ciência Agroveterinária, v.3, n.2, p.116-120, 2004. 137