Comunicação dos riscos da radiação em imagiologia pediátrica

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Transcrição:

Comunicação dos riscos da radiação em imagiologia pediátrica Informação para apoiar os debates sobre os benefícios e os riscos nos cuidados de saúde RESUMO Organização Mundial da Saúde

Resumo Os avanços nas tecnologias que usam a radiação ionizante têm conduzido a um número cada vez maior de aplicações clínicas no diagnóstico e tratamento das doenças humanas. Consequentemente, o uso dessas tecnologias tem-se expandido em todo o mundo, exercendo um impacto positivo na população pediátrica. As radiografias computorizadas e digitais (CR e DR) estão a substituir as radiografias tradicionais em chapa, fornecendo imagens que ficam instantaneamente disponíveis para análise e distribuição electrónica, com menores custos e acesso mais facilitado. A tomografia axial computorizada (TAC) é um valioso instrumento para avaliar as doenças e os traumatismos pediátricos, substituindo, muitas vezes, procedimentos de diagnóstico menos rigorosos e mais invasivos. As intervenções orientadas por fluoroscopia podem substituir opções cirúrgicas que constituem um risco relativamente mais elevado de efeitos adversos nas crianças. A medicina nuclear permite avaliações estruturais e funcionais, especialmente evidentes através de técnicas híbridas (e.g. PET-CT). A radiologia dentária tem evoluído e a TAC de feixe cónico é cada vez mais usada em crianças pelos dentistas e ortodontistas, em algumas regiões, para obterem imagens 3D da face e dos dentes. O uso da radiação em imagiologia pediátrica salva vidas o valor clínico da imagiologia envolvendo o uso de radiação para o diagnóstico de doenças ou lesões em crianças é inquestionável. Todavia, o uso inadequado ou não especializado dessas tecnolo- Comunicação dos riscos da radiação em imagiologia pediátrica / 3

gias poderá resultar numa exposição desnecessária, que aumenta o risco e não traz um benefício acrescido para as crianças doentes. Embora a dose de radiação aplicada durante esses procedimentos de diagnóstico seja baixa e não se preveja que possa provocar traumatismos agudos, os procedimentos de intervenções orientadas por imagem podem emitir doses suficientemente altas para causar efeitos determinísticos, tais como lesões na pele. Há riscos ocasionais que podem ser preocupantes na imagiologia pediátrica, porque as crianças são mais vulneráveis do que os adultos ao desenvolvimento de certos tipos de cancro e têm um tempo de vida mais longo, para desenvolver, a longo prazo, efeitos na saúde induzidos pela radiação. Embora os riscos individuais da radiação sejam, na maioria, bastante pequenos, o reforço da segurança contra a radiação na imagiologia pediátrica tornou-se uma questão de saúde pública, devido ao número cada vez maior da população pediátrica exposta, assim como ao maior nível de conhecimento por parte do público e, muitas vezes, alarme por parte das pessoas. Os benefícios do uso da imagiologia em crianças deve ser ponderado em função dos potenciais riscos da exposição às radiações. O objectivo final é que o benefício supere os danos e, por isso, exige políticas e acções que reconheçam e maximizem os múltiplos benefícios para a saúde que se podem obter e que, simultaneamente, minimizem os potenciais riscos. Isso pode conseguir-se implementando os dois princípios da protecção contra as radiações na medicina: justificação dos procedimentos e optimização da protecção, resumidas como efectuar o procedimento correcto e efectuar correctamente o procedimento. As orientações existentes para a recomendação de imagiologia podem ser usadas para apoiar a justificação e reforçar a adequação da recomendação. Estes instrumentos de apoio à decisão podem ajudar os prescritores e os radiologistas, juntamente com os doentes/cuidadores, na escolha do exame apropriado. Na protecção contra as radiações, a optimização significa manter as doses tão baixas quanto razoavelmente possível (ALARA). Na imagiologia médica, ALARA significa aplicar a dose mais baixa possível necessária para obter as imagens adequadas de dados para o diagnóstico. Existem múltiplas oportu- 4 / Comunicação dos riscos da radiação em imagiologia pediátrica

RESUMO nidades para a redução da dose de radiação, sem qualquer perda significativa de informação para o diagnóstico. Os prestadores de cuidados que requisitem e/ou executem procedimentos de imagiologia radiológica em crianças têm a responsabilidade partilhada de comunicar os riscos da radiação com rigor e eficácia aos doentes, aos pais e a outros cuidadores. Devem ser também capazes de participar em debates sobre os riscos-benefícios, para fundamentar o processo de tomada de decisão os radiologistas, assistentes de radiologia, físicos médicos e outros membros da equipa de imagiologia devem estar aptos a participar em debates sobre os riscos-benefícios com os seus colegas, em particular os pediatras, médicos de família, médicos de emergências e outros prescritores. Contudo, os conhecimentos dos profissionais de saúde acerca da doses de radiação e riscos associados na imagiologia médica podem ser escassos. Uma comunicação eficaz e equilibrada sobre os riscos da radiação requer uma formação adequada, estudos e recursos que sirvam de apoio ao diálogo sobre riscos-benefícios, particularmente em crianças doentes. Por exemplo, é importante informar que os riscos podem ser controlados e os benefícios maximizados, seleccionando um procedimento apropriado e usando métodos que reduzam a exposição do doente, sem reduzir a eficácia clínica. Embora os fundamentos da comunicação de riscos e do diálogo sobre riscos-benefícios sejam comuns a todas as unidades de saúde, a implementação de uma estratégia de comunicação eficaz em imagiologia pediátrica requer, muitas vezes, considerações específicas. O presente documento discute diferentes abordagens para se estabelecer esse diálogo em cenário clínico, incluindo a comunicação com o doente pediátrico. Apresenta sugestões práticas para ajudar o debate sobre riscos-benefícios, incluindo exemplos de perguntas frequentes e respostas, que podem também ser usadas para elaborar materiais informativos para os doentes e suas famílias. O documento discute igualmente questões éticas relacionadas com a comunicação sobre os riscos da radiação na imagiologia pediá- Comunicação dos riscos da radiação em imagiologia pediátrica / 5

trica e propõe diferentes cenários e partes interessadas envolvidas, quando se cria um debate na comunidade médica. Também se discutem conceitos e princípios da protecção contra as radiações, a forma como eles se aplicam à imagiologia pediátrica e os principais factores necessários para criar e manter uma cultura de segurança contra a radiação nos cuidados de saúde, com vista a melhorar as práticas um pilar da protecção contra a radiação em medicina. Esse debate é precedido por um capítulo que descreve os tipos de radiação e as fontes de exposição médica das crianças, e apresenta uma panorâmica das actuais tendências na utilização da radiação ionizante na imagiologia pediátrica. Apresenta estimativas relativas às doses de radiação nos procedimentos pediátricos e uma panorâmica dos riscos conhecidos e potenciais, associados com a exposição à radiação durante a infância. Uma boa prática médica abrange a comunicação eficaz acerca dos benefícios e riscos das intervenções médicas. Neste contexto, a comunicação dos riscos da radiação é uma componente essencial das boas práticas na imagiologia médica e tem um papel fundamental como base para um debate apropriado sobre riscos-benefícios entre os profissionais de saúde e as crianças, suas famílias ou cuidadores. 6 / Comunicação dos riscos da radiação em imagiologia pediátrica

Comunicação dos riscos da radiação em imagiologia pediátrica The use of ionizing radiation in paediatric imaging saves lives and in many cases prevents the need for more invasive procedures. While every day applications of X-rays for medical imaging help millions of patients worldwide, inappropriate use may result in unnecessary and preventable radiation risks, particularly in children. A balanced approach is needed that recognizes the multiple health benefits, while addressing and minimizing health risks. Patients and families should have access to risk-benefit discussions about paediatric imaging when, where, and in the way they need to best understand the information and to be able to use it for making informed choices. Accurate and effective radiation risk communication is also necessary between health care providers who request or perform radiological medical procedures in children. By enabling informed decision-making, effective radiation risk communication contributes to ensure the greatest possible benefit of paediatric imaging, at the lowest possible risk. This document is intended to serve as a tool for health care providers to communicate known or potential radiation risks associated with paediatric imaging procedures, to support risk-benefit dialogue during the process of paediatric health care delivery. Department of Public Health, Environmental and Social Determinants of Health (PHE) Family, Women and Children s Health Cluster (FWC) World Health Organization (WHO) Avenue Appia 20 CH-1211 Geneva 27 Switzerland www.who.int/phe