Fenologia da Vegetação Arbórea Nativa visando a Apicultura Sustentável para a Agricultura Familiar da Metade Sul do Rio Grande do Sul

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Transcrição:

Fenologia da Vegetação Arbórea Nativa visando a Apicultura Sustentável para a Agricultura Familiar da Metade Sul do Rio Grande do Sul Phenology of Native Trees Aiming Sustainable Beekeeping at Peasantry in the South Half of Rio Grande do Sul State WOLFF, Luis Fernando. Embrapa Clima Temperado, wolff@cpact.embrapa.br; GOMES, Gustavo Crizel. Universidade Federal de Pelotas, crizelgomes@gmail.com; RODRIGUES, Walter Fagundes. walterfagundes@bol.com.br Resumo A criação de abelhas é atividade importante em sistemas de produção familiar de base ecológica, garantindo a polinização dos cultivos, a produção de alimento para a família, a inclusão e a geração de renda. O conhecimento sobre as espécies botânicas de valor apícola, seus períodos de floração e suas capacidades de fornecerem néctar e pólen, são determinantes para manejos e produtividades adequadas. Como subsídio para a apicultura sustentável e o manejo de sistemas agroflorestais, o objetivo deste trabalho foi realizar o levantamento fenológico da flora apícola arbórea nativa em parte da Metade Sul do RS. Um total de 50 espécies arbóreas nativas com aptidão apícola foi registrado, englobando 23 famílias botânicas, com maior representatividade para Myrtaceae e Anacardiaceae. Foi estabelecido, ainda, um calendário anual dos seus períodos de floração, identificando-se as ofertas de néctar e de pólen e os períodos em que ocorrem para cada espécie. Palavras-chave: Abelha, floração, agroecologia, mel, agrofloresta. Abstract Beekeeping is an important issue in peasantries ecological basis production systems, ensuring crops pollination, food production for the families and incomes generation. Knowledge about the phenology of native species of trees, its periods of flowering and its capacity to provide nectar and pollen for bees, are crucial for correct management and productivity at bee hives. Aiming this, was conducted a study of indigenous trees in the southern half of Rio Grande do Sul State, as a subsidy for beekeeping and sustainable management of agroforestry systems. A total of 50 native tree species with fitness for beekeeping was recorded, comprising 23 families, with greater representation of Myrtaceae and Anacardiaceae. The study also established a calendar of the flowering periods of that trees, identifying the offering of nectar and pollen and showing the periods in which this occurs for each species. Keywords: honeybee, blossom, agroecology, honey, agroforestry. Introdução A falta de informações sobre a flora apícola regional é uma das limitações ao incremento planejado da apicultura e da meliponicultura na Metade Sul do Rio Grande do Sul. O estudo da flora apícola indica as fontes de alimento utilizadas pelas abelhas na coleta de néctar e de pólen e possibilita maximizar a utilização dos recursos naturais, tanto na implantação como na manutenção de pastos apícolas locais, em áreas de vegetação natural ou cultivada (WOLFF et al., 2006). A flora da região Serrana de Pelotas e municípios adjacentes insere-se no contexto da Mata Atlântica, localizada no sudeste do estado do Rio Grande do Sul e com remanescentes da Floresta Estacional Semidecidual Submontana (MARCHIORI, 2002), caracterizando-se por apresentar 20-50% de árvores caducifólias (CARVALHO, 2003). O regime fenológico das espécies melíferas locais é limitante para a apicultura e a meliponicultura na Metade Sul, sobre o qual os produtores têm pouco 554 Rev. Bras. De Agroecologia/nov. 2009 Vol. 4 No. 2

ou nenhum controle. Assim, as informações sobre a flora apícola nativa contribuem também para a tomada de decisão sobre o local adequado de instalação dos apiários (WOLFF, 2007) e para o plantio de árvores nos agroecossistemas, cuja presença modifica positivamente os microclimas locais e gera benefícios econômicos e sociais ( NAIR, 1993; SOARES, 1998). A inserção de colméias e árvores melitófilas em sistemas agroflorestais, de forma integrada ao manejo de pomares ou lavouras, favorece a produção orgânica e a proteção ambiental (WOLFF et al, 2008). Neste trabalho, foi realizado o levantamento qualitativo e o estudo das características botânicas e melitófilas de espécies nativas arbóreas ocorrentes na região Serrana de Pelotas/RS, buscando contribuir com a formação de uma estrutura básica para o desenvolvimento local e a sustentabilidade da apicultura, da meliponicultura e da agricultura familiar de base ecológica. Metodologia Foi realizado um levantamento da flora arbórea em matas ciliares e de encosta da formação florestal Submontana, em três localidades com fragmentos significativos desta cobertura nativa: na Estação Experimental Cascata EEC (Pelotas), da Embrapa Clima Temperado, na Colônia Maciel (Pelotas) e em Santo Amor (Morro Redondo). Para coleta de material botânico e observações de campo, foram feitas duas viagens mensais durante o período de setembro de 2007 a setembro de 2008, em semanas alternadas na Colônia Maciel e na Colônia Santo Amor, além de coletas semanais na EEC. Foram realizadas coletas de material botânico fértil e montagem de exsicatas para organização de herbário, conforme metodologia de ZANIN e HEPP (2001). Material botânico de cada espécie também foi fotografado durante a época de floração para documentação. Na identificação das famílias botânicas, foi adotada a sistemática de SOUZA e LORENZI (2005), baseada na proposta da APG II (Angiosperm Phylogeny Group II) de 2003. Os gêneros e espécies foram identificados com o auxílio de diferentes chaves analíticas, dendrológicas, guias e manuais de identificação. A aptidão apícola das espécies arbóreas foi considerada com base nas observações de campo semanais e através de revisão bibliográfica. Os eventos fenológicos foram estudados de acordo com o método proposto por MARCHIORI (1995) para fenologia em dendrologia, com a análise de no mínimo três indivíduos adultos por espécie em intervalos mensais pelo período de um ano. Com base nos dados obtidos sobre o comportamento fenológico da vegetação, foi elaborado um calendário regional de floradas arbóreas nativas de valor apícola. Para as espécies que apresentaram florescimento em mais de uma época do ano, foi considerado apenas o período em que ocorreu o pico mais notável de intensidade e de extensão de sua florada. Resultados e discussão Foram registradas 50 espécies arbóreas com aptidão apícola, de 23 famílias botânicas. As famílias mais representativas foram Myrtaceae, com 14 espécies, seguida de Anacardiaceae, com 4 espécies, Flacourtiaceae, Lauraceae e Mimosaceae, cada uma com 3 espécies, Euphorbiaceae, Meliaceae, Rutaceae, Sapindaceae e Verbenaceae, com 2 espécies cada, Araliaceae, Arecaceae, Asteraceae, Boraginaceae, Combretaceae, Erythroxylaceae Fabaceae, Phytolaccaceae, Quillajaceae, Rosaceae e Tiliaceae, cada qual com 1 espécie. A maioria das espécies forneceram néctar e pólen às abelhas e os períodos de oscilação nas floradas ao longo do ano evidenciaram maior aporte natural nos meses de outubro e novembro, tipicamente na primavera. Nenhuma espécie nativa arbórea foi observada florescendo nos meses de junho e julho. Pelo calendário anual dos períodos de floração (Figura 1), é possível identificar as épocas de máximo número de espécies melitófilas ofertando alimento às abelhas (setembro a fevereiro plena safra), bem como planejar os momentos mais adequados para a antecipação dos manejos de preparo das colméias para a entressafra (maio a junho remoção de melgueiras, colocação de redutores de alvado, alimentação de manutenção) ou de preparo para a safra (julho a agosto alimentação estimulante, limpeza e rodízio de favos de ninho). Pela análise do calendário de floradas, é possível, ainda, planejar junto aos agricultores os reflorestamentos mais indicados com as espécies nativas locais para a manutenção dos apiários e meliponários nas propriedades, bem como orientar quanto aos Rev. Bras. De Agroecologia/nov. 2009 Vol. 4 No. 2 555

cortes seletivos e manejos de biomassa a serem conduzidos nos sistemas agroflorestais apícolas. 16 14 12 Nº de espécies florida 10 8 6 4 2 0 jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez Meses do ano FIGURA 1. Número de espécies arbóreas nativas que fornecem néctar e pólen durante os diferentes meses do ano na Metade Sul do Rio Grande do Sul, no período de 2007/2008. TABELA 1. Espécies arbóreas nativas, com valor apícola e período de floração, levantadas na região Serrana de Pelotas, na metade Sul do RS, período de 2007/2008 Embrapa Clima Temperado, Pelotas/RS Família Nome científico Nome popular Valor Apícola Floração Anacardiaceae Lithraea brasiliensis March. Aroeira-braba out-nov Anacardiaceae Schinus terebinthifolius Raddi Aroeira-mansa; -vermelha fev Anacardiaceae Schinus molle L. Aroeira-salsa out Anacardiaceae Schinus polygamus (Cav.) Cabr. Molhe; Assobieira mar Araliaceae Didymopanax morototonii (Aubl.) Done & Planch. Caixeta Pólen out Arecaceae Syagrus romanzoffiana (Cham.) Glass. Gerivá; Coqueiro Pólen nov-dez Asteraceae Gochnatia polymorpha (Less.) Cabr. Cambará abr Boraginaceae Cordia ecalyculata Vell. Louro-mole mar Combretaceae Terminalia australis Camb. Sarandi dez Erythroxylaceae Erythroxylum argentinum Schulz Cocão out Euphorbiaceae Sebastiana commersoniana (Baill.) Smith&RJ Branquilho dez Euphorbiaceae Sebastiana brasiliensis Spreng. Branquilholeiteiro Fabaceae Erythrina crista-galli L. Corticeira-dobanhado Flacourtiaceae Xylosma pseudosalzmanii Sleumer Sucará; Nãome-toque nov-dez fev out-nov Flacourtiaceae Casearia decandra Jacq. Guaçatunga out-nov 556 Rev. Bras. De Agroecologia/nov. 2009 Vol. 4 No. 2

Flacourtiaceae Casearia sylvestris Sw.. Chá-de-bugre out-nov Lauraceae Nectandra megapotamica (Spreng.) Mez Canela-amarela; -merda Lauraceae Ocotea puberula Ness. Canela-guaicá; -sebo nov-dez ago Lauraceae Ocotea pulchela (Ness et Mart. Ex Ness) Ness Canela-lageana dez-jan Meliaceae Cabralea cangerana (Vell.) Mart. Cangerana out-nov Meliaceae Cedrela fissilis Vell. Cedro set Mimosaceae Mimosa bimucronata (DC.) O. Kuntze Maricá fev-mar Mimosaceae Calliandra brevipes Benth. Quebra-foicerosa out Mimosaceae Calliandra tweediei Benth. Quebra-foice out Myrtaceae Eugenia uruguayensis Camb. Cambuí Pólen dez Myrtaceae Eugenia involucrata DC. Cerejeira-do-riogrande set Myrtaceae Eugenia rostrifolia Legr. Batinga nov Myrtaceae Psidium cattleyanum Sabine Araçá Pólen ago-set Myrtaceae Myrcianthes gigantea (Legr.) Legr. Araçá-do-mato nov Myrtaceae Acca selowiana (Berg) Burret Goiabinha campo; Feijoa Pólen abr Myrtaceae Myrcianthes pungens (Berg) Legr. Guabijú nov-dez Myrtaceae Campomanesia xanthocarpa Berg Guabirobeira out Myrtaceae Gomidesia palustris (DC.) Kaus. Guamirim fev Myrtaceae Myrceugenia euosma (Berg) Legr. Guamirim fev-mar Myrtaceae Myrcia glabra (Berg) Legr. Ubá mai Myrtaceae Blepharocalyx salicifolius (Kunth) Berg Murta jan-fev Myrtaceae Myrrhinium atropurpureum Schott Murtilho set Myrtaceae Eugenia uniflora L. Pitangueira dez Phytolaccacea Phytolacca dioica L. Umbuzeiro out Quillajaceae Quillaja brasiliensis (St. Hil. & Tul.) Mart. Timbaúva; Sabão soldado Rosaceae Prunus sellowii Koehne Pessegueiro-domato Rutaceae Zanthoxylum rhoifolium Lam. Mamica-decadela jan fev-mar out Rutaceae Zanthoxylum hyemale A. St. Hil. Coentrilho jan-fev Salicaceae Salix humboldtiana Willd. Salgueiro dez Sapindaceae Allophylus edulis (St. Hil.) Radlk. Chal-chal; Baga morcego Sapindaceae Cupania vernalis Camb. Camboatávermelho set ago Symplocaceae Simplocos uniflora (Pohl) Bentham Sete-sangrias out-nov Tiliaceae Luehea divaricata Mart. Açoita-cavalo jan-fev Verbenaceae Cithrarexylum montevidense Cham. Tarumã espinho; -banhado nov Verbenaceae Cithrarexylum myrianthum Cham. Tarumã-branco nov-dez Rev. Bras. De Agroecologia/nov. 2009 Vol. 4 No. 2 557

Conclusões Pelos dados obtidos, é possível concluir que a flora apícola arbórea nativa na região Serrana de Pelotas/RS apresenta uma grande diversidade de famílias botânicas (23 famílias), com maior representatividade de Myrtaceae e Anacardiaceae, seguidas de Flacourtiaceae, Lauraceae e Mimosaceae. Esta vegetação caracteriza-se por uma maior concentração de oferta de alimento às abelhas no período primaveril, com auge nos meses de outubro e novembro, e carência de floradas no período hibernal, com ausência absoluta de espécies em flor de junho a julho. Referências CARVALHO, P. E. R. Espécies arbóreas brasileiras. Brasília: Embrapa Informação Tecnológica; Colombo: Embrapa Florestas, 2003. 1039 p. MARCHIORI, J. N. C. Elementos de dendrologia. Santa Maria: UFSM,1995. 163 p. MARCHIORI, J. N. C. Fitogeografia do Rio Grande do Sul: enfoque histórico e sistemas de classificação. Porto Alegre: EST, 2002. 118 p. NAIR, P.K.R. An introduction to agroforestry. London; Kluwer Acad.Publishers, 1993. 499p. SOARES, A.L.F. Conceitos básicos sobre permacultura. Brasília: MA/SDR/PNFC, 1998. 53p. SOUZA, V.C.; LORENZI, H. Botânica sistemática: guia ilustrado para identificação das famílias de Angiospermas da flora brasileira, baseado em APG II. Nova Odessa: Instituto Plantarum, 2005. 640 p. WOLFF, L. F. et al. Localização do apiário e instalação das colméias. Teresina: Embrapa Meio- Norte, 2006. 30 p. (Embrapa Meio-Norte. Documentos, 151). WOLFF, L. F. Apicultura sustentável na propriedade familiar de base ecológica. Pelotas: Embrapa Clima Temperado, 2007. (Embrapa Clima Temperado. Circular técnica, 64.) 16 p. WOLFF, L.; et al. Sistema agroflorestal apícola em parreiral com aroeiras-vermelhas, abelhas melíferas africanizadas e abelhas nativas sem ferrão na região Sul do Brasil. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO E PESQUISA EM ECOLOGIA, 2008, Pelotas. Resumos... Pelotas: Educat, 2008. p. 240-243. ZANIN, E. M.; HEPP, L. U. Botânica: manual de laboratório. Erechin: Uricer, 2001. 102 p. 558 Rev. Bras. De Agroecologia/nov. 2009 Vol. 4 No. 2