Procedimento Investigatório Criminal nº 1.30.002.000194/2015-23 RECOMENDAÇÃO Nº 01/2016 Ao: Ministério da Saúde O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, pelo Procurador da República signatário, no exercício de suas atribuições constitucionais e legais, com fundamento no art. 127 caput, e 129, II e III, da Constituição Federal e art. 6º, XX, da Lei Complementar nº 75/93, e CONSIDERANDO que o Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127, caput, da CF); CONSIDERANDO que compete ao Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, dos bens e direitos de valor artístico, histórico, turístico e paisagístico e expedir recomendações, visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, bem como ao respeito, aos interesses, direitos e bens cuja defesa lhe cabe promover, fixando prazo razoável para a adoção das providências cabíveis (LC nº 75/93, art. 6º, VII, b e XX); CONSIDERANDO que o artigo 196 da Constituição Federal garante o acesso universal e igualitário a ações e serviços para promoção, proteção e recuperação da saúde, a qual relevada como direito fundamental; CONSIDERANDO que, nos termos da legislação vigente, especialmente da Lei nº 8.080/90, o conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema Único de Saúde (SUS) ; 1
CONSIDERANDO que, ainda nos termos do art. 7º, incisos V, VI e VIII, da Lei nº 8.080/90, são deveres do Sistema Único de Saúde (SUS), respectivamente: direito à informação, às pessoas assistidas, sobre sua saúde, divulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e a sua utilização pelo usuário, participação da comunidade ; CONSIDERANDO que o art. 15, da Lei nº 8.080/90, prevê o exercício, pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, das instâncias e dos mecanismos de controle, avaliação e de fiscalização das ações e serviços de saúde; CONSIDERANDO que o art. 4º, inciso IV, da Lei nº 8.142/90, prevê a adoção de relatórios de gestão, por Estados, Distrito Federal e Municípios, para o fim específico de acompanhamento, pela União, do uso e conformidade dos recursos do SUS recebidos, observando-se o controle de que trata o 4º, do art. 33, da Lei nº 8.080/90; CONSIDERANDO que impende ressaltar e colocar em primeiro plano, na ponderação das normas constitucionais, aquela que encerrar a proteção do bem maior que é a vida; CONSIDERANDO os elementos de instrução do Procedimento Investigatório Criminal nº 1.30.002.000194/2015-23, com a ementa CRIMINAL RADIOTERAPIA INVESTIGAR SUSPEITA ATENDIMENTO TRATAMENTO PACIENTES ONCOLOGIA COM FONTE DE COBALTO-60 IRRADIANDO ABAIXO DOS NÍVEIS MÍNIMOS NECESSÁRIOS LESÃO CORPORAL ART. 129 DO CÓDIGO PENAL CRIME CONTRA SAÚDE PÚBLICA ART. 273, 1º, 1º-B, DO CÓDIGO PENAL - INSTITUTO DE MEDICINA NUCLEAR E ENDOCRINOLOGIA - MUNICÍPIO CAMPOS DOS GOYTACAZES/RJ ; CONSIDERANDO que consta, no referido Procedimento Investigatório Criminal, informação da Comissão Nacional de Energia Nuclear CNEN, por meio do Ofício nº 242/2015 CGMI/CNEN, de que interditou, em 31/05/2010, o serviço de radioterapia do 2
Instituto de Medicina Nuclear e Endocrinologia IMNE, em razão de a fonte de cobalto-60 do referido hospital ter sido encontrada irradiando abaixo dos níveis mínimos necessários (50 cgy/min); CONSIDERANDO que se constatou, no referido procedimento investigatório criminal, a continuidade do tratamento por radioterapia por fonte de cobalto, no Instituto de Medicina Nuclear e Endocrinologia IMNE (Hospital Dr. Beda), mesmo após a interdição comunicada pelo CNEN; CONSIDERANDO que os pacientes oncológicos são destinatários de proteção específica, dado que necessitam de tratamento e acompanhamento especializados (procedimentos de média e alta complexidade); CONSIDERANDO que os protocolos de atendimento e os equipamentos empregados no tratamento de oncologia devem seguir padrões rígidos de funcionamento; CONSIDERANDO que os procedimentos de radioterapia por cobalto, em não atingindo a radiação necessária, além de não contribuírem para a resolução ou estabilização do quadro clínico apresentado pelo paciente oncológico, podem significar progressão da doença, com diversas complicações no estado geral de saúde; CONSIDERANDO que a sequencialidade de procedimentos de radioterapia por cobalto, sem a radiação em níveis adequados e mínimos, conforme protocolos de atendimento, podem resultar no evento morte, dado não contribuir para a resolução ou estabilização do quadro clínico do paciente oncológico; CONSIDERANDO que o referido tratamento por radioterapia por fonte de cobalto é feito em parceria com o Sistema Único de Saúde SUS (responsável pelo pagamento dos procedimentos de Alta Complexidade); CONSIDERANDO que, para fins de tratamento de pacientes oncológicos, os aceleradores lineares podem gerar fótons de energia superior àquela gerada por pastilhas de 3
cobalto-60, e que os fótons de alta energia liberado pelos aceleradores lineares liberam menos radiação na pele e nos tecidos sadios do paciente; CONSIDERANDO que com o decaimento radioativo natural das pastilhas de cobalto-60 (duração média de 5,27 anos), a exposição do paciente ao feixe radioativo demora o dobro do tempo em relação ao inicial, para o alcance da dose necessária; CONSIDERANDO que a exposição ao feixe radioativo da pastilha de cobalto, por um tempo maior, implica eventual movimentação física do paciente, durante a aplicação, acarretando que o tumor seja deslocado do campo de irradiação, com a consequente mudança da área atingida pela radiação, passando esta a atingir partes sadias; CONSIDERANDO que, segundo estatística, 60% dos pacientes oncológicos irão precisar, em algum momento do tratamento, de radioterapia; CONSIDERANDO que os aceleradores lineares representam enorme avanço e melhoria do tratamento por radioterapia, utilizando-se de radiação eletromagnética ionizante (fóton) para tratar de tumores, com diminuição acentuada dos efeitos colaterais das sessões e dos riscos de acidentes presentes na radiação por fonte de cobalto-60; CONSIDERANDO que o avanço tecnológico deve estar voltado para a melhor qualidade de vida e para sua proteção; RESOLVE, na forma do artigo 6º, XX, da Lei Complementar nº 75/93, RECOMENDAR ao Ministério da Saúde, na pessoa do Ministro Marcelo Costa e Castro, a inclusão, na pauta de Políticas Públicas e/ou de Ações do Ministério da Saúde, de planejamento, relativamente à oncologia, de substituição da radioterapia, por fonte de cobalto, por radioterapia com aceleradores lineares, estabelecendo-se um prazo para a referida substituição. 4
REQUISITA-SE, por fim, seja encaminhada resposta por escrito e fundamentada, no prazo de 15 (quinze) dias, a teor do disposto no artigo 8.º, inciso II, da Lei Complementar n.º 75/93, acerca da adoção do contido na presente Recomendação (art. 27, parágrafo único, inciso IV, da Lei n.º 8.625/93 e, ainda, com fundamento no art. 6º, XX, da Lei Complementar nº 75/93). Campos dos Goytacazes(RJ), 15 de fevereiro de 2016. EDUARDO SANTOS DE OLIVEIRA Procurador da República 5