AVALIAÇÃO DA RESISTÊNCIA DE BORRACHA NATURAL E EPDM EM BIODIESEL PURO E EM MISTURA COM ÓLEO DE SOJA Marcos R. Monteiro 1 *, Alessandra R. P. Ambrozin 1, Fábio Finocchio 1, Gabriela R. dos Santos 1, Gabriel Campos 2 1 Laboratório de Combustíveis, CCDM, DEMa, Universidade Federal de São Carlos - UFSCar, Campus de São Carlos, São Carlos-SP monteiro@ccdm.ufscar.br 2 Indústria Paulista de Artefatos de Borracha S/A (IPAB), Ribeirão Preto-SP O biodiesel foi recentemente incorporado à matriz energética brasileira, sendo adicionado ao diesel comercializado no país desde 2008. No presente trabalho, foi avaliada a resistência à degradação de borracha natural (NR) e borracha etileno propileno dieno (EPDM) em presença de biodiesel de sebo bovino e do mesmo biodiesel contaminado com 5 % (v/v) de óleo de soja. Para tal, foram realizados ensaios de imersão dos materiais, a 50 C e durante 7 dias, com base na norma ABNT NBR 9772. Massa, volume, dureza, tensão à ruptura e deformação dos materiais foram avaliados antes e após os ensaios. Além disso, também foram analisados índice de acidez e iodo das soluções antes e após os testes. Os resultados indicaram que o biodiesel (com ou sem a presença de óleo de soja) alterou a maior parte das propriedades avaliadas neste estudo, especialmente inchamento, diminuição de dureza e deformação. Portanto, a utilização de NR e EPDM em sistemas que interagem com o biodiesel apresenta restrições em relação a sua aplicação, já que tais materiais têm suas propriedades alteradas quando em contato com esse biocombustível. Palavras-chave: biodiesel, biocombustível, EPDM, NR, degradação. Evaluation of the resistance of natural rubber and EPDM in pure biodiesel and biodiesel contained soybean oil Biodiesel was recently introduced in the Brazilian energetic matrix. Since 2008, it is added to diesel that is markted in the country. In the present work, the resistance to degradation of natural rubber (NR) and ethylene propylene diene rubber (EPDM) in pure biodiesel and biodiesel contained 5 % (v/v) of soybean oil was investigated. For such, immersion assays of materials were carried out along 7 days at 50 ºC, according to ABNT NBR 9772. Before and after the assays, mass, volumem, hardness, tension and elongation of the materials were evaluated. Also, acid and iodine number of the solutions were analyzed. The results pointed out that biodiesel (with ou without soybean oil) modified several properties evaluated in this study, especially increase of volumem and decrease of hardness and elongation. Therefore, the use of NR and EPDM in systems, which have contact with biodiesel, is limited according to their use, since such materials have their properties modified when in contact with this biofuel. Keywords: biodiesel, biofuel, EPDM, NR, degradation. Introdução O biodiesel é um biocombustível oriundo de óleos vegetais ou gorduras animais que foi recentemente introduzido na matriz energética brasileira. No ano de 2008, a obrigatoriedade do uso de biodiesel em mistura com diesel mineral 1 evidenciou a necessidade da avaliação do efeito desse biocombustível sobre os diversos materiais utilizados nos veículos e nos sistemas de transporte e armazenamento de combustíveis bem como nos materiais utilizados no processo produtivo do biodiesel. Alguns trabalhos da literatura indicam que o biodiesel causa determinadas alterações das propriedades físicas e químicas de diversos materiais metálicos 2 e, principalmente, nos poliméricos. 3,4
Além da variação de composição, as impurezas oriundas do processo produtivo (metanol, glicerol, catalisador, etc) ou mesmo advindas de processos de degradação oxidativa, hidrolítica ou térmica do biodiesel, podem apresentar efeitos sobre as propriedades dos polímeros. Desta forma, o conhecimento da compatibilidade entre materiais poliméricos e biodiesel de variadas origens e com diferentes padrões de qualidade é extremamente importante no auxílio do desenvolvimento de materiais poliméricos com aplicação nos diversos processos de produção, transporte, armazenamento e consumo do biodiesel. Portanto, o presente trabalho teve como objetivo avaliar o efeito do biodiesel puro e em mistura com óleo de soja sobre borracha natural (NR) e etileno propileno dieno (EPDM), bem como estudar o efeito do processo degradativo dos polímeros sobre a qualidade do biodiesel. Experimental Materiais e Métodos O biodiesel oriundo de sebo bovino (B100) foi gentilmente cedido por uma empresa produtora do estado de São Paulo. O biodiesel utilizado neste estudo atende todos os parâmetros de qualidade da resolução ANP nº 7, de 19/03/08. As misturas biodiesel/óleo vegetal foram preparadas com óleo de soja adquirido no mercado local. As soluções de B100 puro e em mistura com 5 % (v/v) de óleo de soja foram analisadas antes e após os ensaios; foram determinados índice de acidez e iodo segundo metodologias descritas nas normas ABNT NBR 14448 5 e EN 14111 6, respectivamente. Os materiais poliméricos e seus respectivos corpos de prova foram preparados na Indústria Paulista de Artefatos de Borracha S/A (IPAB). Cada material foi confeccionado em dois formatos diferentes conforme Figuras 1 e 2. Antes e após os ensaios, foram determinados: massa, volume, dureza Shore A, tensão à ruptura e alongamento segundo as normas ASTM D 2240 7 e ASTM D 412 8. Ensaios de imersão Os ensaios de imersão das borrachas EPDM e NR em B100 e biodiesel contendo 5 % (v/v) de óleo de soja foram realizados a 50 ºC durante 7 dias, com base na norma ABNT NBR 9772. 9 O volume de solução utilizado em cada teste seguiu a relação de 5 ml/cm 2 do corpo de prova. Desta forma, para os batoques foi utilizado um volume de 120 ml por corpo de prova e para as gravatas um volume de 195 ml. Os ensaios com as gravatas foram realizados em quintuplicata e com os batoques em triplicata. Todas replicatas foram acondicionadas no mesmo recipiente.
Resultados e Discussão Os resultados dos ensaios de resistência de borracha NR e EPDM em biodiesel puro e misturado com 5 % (v/v) de óleo de soja indicaram que ambos materiais têm suas propriedades originais alteradas pelo contato com biodiesel. A simples inspeção visual dos materiais (Figuras 1 e 2) mostra o aumento significativo volume dos corpos de prova após os 7 dias de ensaio. a b c d e f Figura 1 Gravatas de EPDM e NR antes e após o contato com B100 e biodiesel mais 5 % (v/v) de óleo de soja. (a) EDPM antes do contato; (b) NR antes do contato; (c) EDPM após contato com B100; (d) NR após contato com B100; (e) EDPM após contato com B100 e 5 % de óleo de soja; (f) NR após contato com B100 e 5 % de óleo de soja. a b c d e f Figura 2 Batoques de EPDM e NR antes e após o contato com B100 e biodiesel mais 5 % (v/v) de óleo de soja. (a) EDPM antes do contato; (b) NR antes do contato; (c) EDPM após contato com B100; (d) NR após contato com B100; (e) EDPM após contato com B100 e 5 % de óleo de soja; (f) NR após contato com B100 e 5 % de óleo de soja. Na tabela 1, verifica-se mudança em todas as propriedades analisadas dos materiais, especialmente aumento de volume, diminuição de dureza e alongamento. Apesar de ambas borrachas serem afetadas, as mudanças ocasionadas na NR foram mais significativas do que em
EPDM, com exceção da tensão máxima de ruptura. O volume dos corpos de prova de NR, por exemplo, teve aumento da ordem de 9 vezes de seu valor inicial; a dureza diminuiu 3 vezes e a deformação 3 vezes. Tabela 1 Propriedades das borrachas NR e EPDM antes e após 7 dias de contato a 50 C com B100 e B100 mais 5 % de óleo de soja. Propriedade EPDM NR Antes Depois B100 Depois B100-OS Antes Depois B100 Depois B100-OS Massa (g) 9,6376 12,4857 12,1810 9,3543 16,0623 15,5557 Volume (ml) 2,0999 11,0023 10,6560 1,7503 15,5440 14,9597 Dureza Shore A 81 50 50 61 22 22 Tensão na ruptura (N/mm 2 ) 8,92 65,24 63,27 14,00 14,80 19,30 Deformação máxima na ruptura (%) 256 166 169 520 171 170 Os resultados obtidos indicam que NR e EPDM tiveram suas propriedades físicas alteradas significativamente tanto pelo contato com biodiesel quanto pela sua mistura 5 % com óleo de soja. Desta forma, pode-se evidenciar que as amostras avaliadas neste estudo sofreram alterações em suas propriedades independentemente da qualidade do biodiesel utilizado nos ensaios de contato. Os combustíveis automotivos têm que atender a determinados requisitos de qualidade que visam garantir o bom funcionamento dos motores e a integridade dos materiais bem como limitar a emissão de gases de exaustão a níveis aceitáveis. Os índices de acidez e iodo são parâmetros que identificam a presença de espécies ácidas e de insaturações no biodiesel, indicando, por exemplo, a ocorrência de processos de degradação hidrolítica, térmica e oxidativa e, portanto, da perda de qualidade do combustível. As análises das soluções nas quais ficaram imersos os materiais poliméricos indicaram que tais parâmetros sofreram alteração (Tabela 2), especialmente observouse o aumento do índice de acidez do biodiesel após contato com NR, o que mostra que a degradação de tal material possa ter levado à formação de espécies ácidas no biocombustível.
Tabela 2 Propriedades das soluções de biodiesel antes e após 7 dias de contato a 50 C com NR e EPDM. Ensaio Índice de acidez (mg KOH/g) Índice de iodo (g/100g) B100 antes 0,220 42,26 B100 depois (sem contato com borracha) 0,236 46,80 B100 após contato com EPDM 0,210 45,19 B100 após contato com NR 0,263 44,46 B100 + 5 % O.S. antes 0,211 49,83 B100 + 5 % O.S. depois (sem contato com borracha) 0,209 49,07 B100 + 5 % O.S. após contato com EPDM 0,208 43,76 B100 + 5 % O.S. após contato com NR 0,246 45,17 Conclusões Os resultados obtidos neste estudo indicaram que NR e EPDM não são compatíveis com o biodiesel e que, portanto, o seu uso em sistemas aonde ocorra a interação direta biodiesel/polímero deve ser evitado, tanto para manutenção da integridade dos materiais que tem contato com o combustível quanto para qualidade do biodiesel. O presente trabalho faz parte de uma linha de pesquisa na qual está sendo avaliado o efeito do biodiesel sobre materiais poliméricos e destes sobre a qualidade do biodiesel. A pesquisa visa estabelecer a relação entre qualidade do biodiesel e seu efeito sobre materiais, bem como auxiliar as etapas de desenvolvimento de materiais que possam ser utilizados em todo o processo de produção, transporte, armazenamento e consumo do biodiesel. Agradecimentos Os autores agradecem ao CCDM/UFSCar, FAPESP, CNPq e FINEP pelo apoio financeiro e à BrasilBiodiesel e IPAB por ceder amostras utilizadas neste trabalho. Referências Bibliográficas 1. lei 11.097/2005 de 13/01/2005 2. A.R.P. Ambrozin; S.E. Kuri; M.R. Monteiro Quim. Nova 2009, in press. 3. M.C. Graboski; R.L. McCormick Prog. Energ. Combust. Sci. 1998, 24, 125. 4. A.Z. Abdullah; N. Razali; H. Mootabadi; B. Salamatinia Environ. Res. Lett. 2007, 2, article number 034001. 5. ABNT NBR 14448 Óleos lubrificantes e fluidos hidráulicos Determinação do número de acidez pelo método de titulação potenciométrica. 6. EN 14111 Fat and oil derivatives Fatty acid methyl esters (FAME) Determination of iodine value. 7. ASTM D 2240 Standard test method for rubber property Durometer hardness. 8. ASTM D 412 Standard test methods for vulcanized rubber and thermoplastic elastomers Tension. 9. ABNT NBR 9772 Materiais não metálicos Avaliação das modificações nas características dos materiais em contato com combustível.