MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL Nº 7494/11 MJG HABEAS CORPUS Nº 106.272/RJ PACTE : ANA CLÁUDIA RODRIGUES DO ESPÍRITO SANTO IMPTE : ANTÔNIO CARDOSO DA SILVA NETO IMPDO : RELATORA DO HC Nº 162. 948 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATOR : EXMO. SR. MINISTRO MARCO AURÉLIO PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. MEDIDA LIMINAR INDEFERIDA NO ÂMBITO DO STJ. APLICAÇÃO DA SÚMULA 691/STF. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE MANIFESTA APTA A EXCETUAR A APLICAÇÃO DO VERBETE. ALEGADA NULIDADE DE AÇÕES PENAIS EM CURSO. INDEFERIMENTO DE DILIGÊNCIAS REQUERIDA PELA DEFESA NA FASE DO ART. 499 DO CPP. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. PLEITO REFUTADO POR DECISÃO DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA. PRECLUSÃO. REQUERIMENTOS QUE DEVERIAM E PODERIAM TER SIDO FORMULADOS NA FASE DA DEFESA PRÉVIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. - Na linha de jurisprudência da Suprema Corte, o Juiz pode indeferir, em decisão adequadamente motivada, as diligências que entenda ser incabíveis ou desnecessárias, na esfera de um juízo de conveniência, inerente ao seu regular poder discricionário. - Parecer pelo não-conhecimento do mandamus ou, no mérito, pela denegação da ordem. EXCELENTÍSSIMO SENHOR MINISTRO RELATOR O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, nos autos em epígrafe, diz a V. Exa. o que segue:
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL 2 Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, ajuizado em favor de ANA CLÁUDIA RODRIGUES DO ESPÍRITO SANTO, contra ato atribuído à Ministro Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça, que indeferiu a medida liminar nos autos do HC nº 162.948/RJ, apontando, na linha de jurisprudência consolidada daquela Corte, o caráter excepcional do trancamento da ação penal, exigindo o desfecho da questão controvertida exame aprofundado do mérito da impetração. Estes, os termos da decisão singular impugnada: Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de ANACLÁUDIA RODRIGUES DO ESPÍRITO SANTO denunciada nas ações penais 2007.51.01.802.985-5 e 2007.51.01.811.522-8, em trâmite no Juízo da 6.ª Vara Federal Criminal da Subseção Judiciária do Rio de Janeiro/RJ, em face de decisão do Tribunal Regional Federal da 2.ª Região. Alegam os Impetrantes, em suma, que a Magistrada Singular, ao indeferir pedidos de diligências formulados após a apresentação da defesa prévia, sob o entendimento de ter havido preclusão, estaria dando ensejo a ilegal cerceamento de defesa da Paciente. Requerem, por isso, liminarmente, seja obstado o andamento dos referidos processos-crimes e, no mérito, seja declarada a nulidade do processo 'a partir da última audiência de sumário de defesa' (fl. 13). É o breve relatório inicial. Decido. Não estão presentes os pressupostos autorizativos para a concessão da medida urgente requerida. Isso porque é entendimento pacífico na Jurisprudência dos Tribunais Pátrios que o trancamento da ação penal é medida de exceção, possível somente quando evidente a ausência de justa causa, o que não é o caso, ao menos primo icto oculi. Exemplificativamente: 'HABEAS CORPUS' - PRETENDIDO TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL - ALEGAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE JUSTA CAUSA SITUAÇÃO DE ILIQUIDEZ QUANTO AOS FATOS SUBJACENTES À ACUSAÇÃO PENAL - CONTROVÉRSIA QUE IMPLICA EXAME APROFUNDADO DE FATOS E CONFRONTO ANALÍTICO DE MATÉRIA ESSENCIALMENTE PROBATÓRIA - INVIABILIDADE NA VIA
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL 3 SUMARÍSSIMA DO 'HABEAS CORPUS' - PEDIDO INDEFERIDO. - A extinção anômala do processo penal condenatório, em sede de 'habeas corpus', embora excepcional, revela-se possível, desde que se evidencie - com base em situações revestidas de liquidez - a ausência de justa causa. O reconhecimento da inocorrência de justa causa para a persecução penal, embora cabível em sede de 'habeas corpus', reveste-se de caráter excepcional. Para que tal se revele possível, impõe-se que inexista qualquer situação de iliquidez ou de dúvida objetiva quanto aos fatos subjacentes à acusação penal. - Havendo suspeita fundada de crime, e existindo elementos idôneos de informação que autorizem a investigação penal do episódio delituoso, torna-se legítima a instauração da 'persecutio criminis', eis que se impõe, ao Poder Público, a adoção de providências necessárias ao integral esclarecimento da verdade real, notadamente nos casos de delitos perseguíveis mediante ação penal pública incondicionada. Precedentes. - A liquidez dos fatos constitui requisito inafastável na apreciação da justa causa, pois o remédio processual do 'habeas corpus' não admite dilação probatória, nem permite o exame aprofundado de matéria fática, nem comporta a análise valorativa de elementos de prova. Precedentes.' (STF - HC 94.592/SP, 2.ª Turma, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJe de 02/04/2009.) O deslinde da controvérsia, outrossim, demanda o aprofundamento do exame do próprio mérito da impetração, tarefa insuscetível de ser realizada em juízo singular e prelibatório. Reserva-se, portanto, ao Colegiado, órgão competente para o julgamento do mandamus, a apreciação definitiva da matéria. Ante o exposto, INDEFIRO o pedido de liminar. No presente writ, alega a defesa da paciente a ausência de adequada prestação jurisdicional no caso, não tendo a autoridade coatora apreciado o pedido de suspensão do andamento das ações penais. Aduz, também, a falta de fundamentação do decisum que indeferiu o pedido de diligências, bem assim o cerceamento de defesa, dada a impossibilidade de dispensá-las uma vez que se buscava apurar a legalidade das interceptações telefônicas realizadas.
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL 4 Requer o impetrante, no mérito, a nulidade das Ações Penais nºs 2007.51.01.802.985-5 e 2007.51.01.811.552-8, em curso perante o Juízo da 6ª Vara Federal Criminal da Seção Judiciaria do Estado do Rio de Janeiro, a partir do sumário, caso sobrevenha sentença condenatória, determinando-se a realização das diligências requeridas pela defesa. Medida liminar indeferida. É o relatório. remédio heróico. Não há como dar acolhida à pretensão veiculada neste Como dito, cuida a hipótese de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado contra decisão singular da lavra da Ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça, que, em sede de outro writ ainda em curso naquela Corte (HC nº 162.948/RJ), indeferiu o pleito cautelar também deduzido em favor da ora paciente. Nesse contexto, cumpre verificar, desde logo, se a situação processual versada nos autos justifica, ou não, o afastamento do enunciado da Súmula nº 691. Esse Supremo Tribunal Federal, ainda que em caráter excepcional, tem admitido a superação do óbice representado pela referido enunciado sumular em casos nos quais a decisão impugnada não guarde sintonia com a jurisprudência predominante nesse Colegiado ou configure situação de abuso de poder ou de manifesta ilegalidade. 1 1 HC nº 86.634-MC/RJ, Min. CELSO DE MELLO; HC nº 89.025-MC-AgR/SP, Min. JOAQUIM BARBOSA; HC nº 90.112-MC/PR, Min. CEZAR PELUSO.
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL 5 O exame acurado dos presentes autos, entretanto, não revela circunstâncias indicadoras de flagrante ilegalidade ou abuso de poder aptas a ensejar o afastamento sempre excepcional do mencionado verbete. Na verdade, a pretensão do impetrante é trazer ao conhecimento dessa Suprema Corte, de modo precário, tema não apreciado, definitivamente, no Superior Tribunal de Justiça, em flagrante intenção de suprimir a instância antecedente. Aliás, não há como ter-se por desprovida de motivação ou teratológica a decisão que ressalta o caráter excepcional do trancamento da ação penal, pressupondo o deslinde da controvérsia exame aprofundado do mérito da impetração, para indeferir a medida liminar. Pode e deve o magistrado, ao apreciar o pedido inicial, pautar-se no poder geral de cautela para buscar outros elementos formadores das razões de decidir além daqueles trazidos pela inicial do mandamus, sem que tanto caracterize constrangimento ilegal, abuso de poder ou teratologia. Revela-se, pois, insuscetível de conhecimento, a ação de habeas corpus quando deduzida contra mera denegação de liminar em sede de outro writ. Em hipóteses como a que se constata nestes autos, a jurisprudência vem rejeitando a possibilidade processual do STJ vir a ser prematuramente substituído por essa Suprema Corte. Ainda que assim não se entenda, é de se observar que a situação processual versada nos autos não caracteriza a ocorrência da alegada coação ilegal.
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL 6 O pedido de diligência complementar, feito na fase do art. 499 do CPP, pode ser indeferido pelo d. Magistrado, conforme sua convicção, caso o julgue, fundamentadamente, impertinente, desnecessário ou protelatório ao desfecho da causa. In casu, a defesa requereu a expedição de ofícios à autoridade policial para que informasse toda a cadeia de custódia das evidências digitais que compõem o HD acostado ao feito e qual a metodologia utilizada nas degravações dos diálogos interceptados, bem como às operadoras de telefonia móvel a fim de que fosse encaminhado o relatório do início e término das interceptações realizadas no bojo da denominada Operação Furacão. Em que pese a argumentação defensiva de que se trata de diligência indispensável à busca da verdade real, o pleito foi indeferido, fundamentadamente, pela Juíza processante por ter havido a preclusão, eis que todos os requerimentos deduzidos pela defesa da paciente poderiam e deveriam ter sido formulados na fase da defesa prévia. Com efeito, bem andou a magistrada processante ao indeferir, motivadamente, o pleito formulado pela defesa por não haver nos autos elementos aptos a demonstrar a necessidade da medida ou mesmo a plausibilidade da tese da defesa, levando-se em conta a possibilidade de requerimento das referidas diligências ao tempo da oferta da defesa prévia. Observa-se, pois, que o indeferimento do pedido de diligência apresenta fundamentação consistente e lógica, mesmo porque, naquele momento processual, mostrava-se incabível e desnecessária, não se afigurando evidenciado o alegado constrangimento ilegal por cerceamento de defesa.
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL 7 Sobre o assunto, a jurisprudência desse col. Supremo Tribunal Federal consolidou entendimento na vertente de que o Juiz pode indeferir, em decisão devidamente motivada, as diligências que considere ser protelatórias ou desnecessárias, no âmbito de um juízo de conveniência, inerente ao seu regular poder discricionário. A propósito, os seguintes julgados: HABEAS CORPUS. ALEGAÇÃO DE NULIDADE PELO CERCEAMENTO DE DEFESA DECORRENTE DO INDEFERIMENTO DE DILIGÊNCIAS. INOCORRÊNCIA. Na fase do art. 499 não se tem a renovação da instrução criminal. Pelo que ao juiz do processo é conferido o poder de decidir sobre a conveniência e a imprescindibilidade da produção de outras provas, a par das que já foram coletadas. Decisão regularmente fundamentada. Habeas corpus indeferido. 2 HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. OITIVA DE TESTEMUNHA. INDEFERIMENTO MOTIVADO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. 1. A jurisprudência desta Corte está alinhada no sentido de que 'não constitui cerceamento de defesa o indeferimento de diligências requeridas pela defesa, se foram elas consideradas desnecessárias pelo órgão julgador a quem compete a avaliação da necessidade ou conveniência do procedimento então proposto'. (HC nº 76.614, Relator o Ministro Ilmar Galvão, DJ de 112.6.98). 2. Indeferimento da oitiva de testemunha que se encontrava presa há vários anos, muito antes da ocorrência dos fatos apurados na ação penal. Ausência de correlação entre estes e os que o réu pretendia provar com a oitiva da testemunha. Inexistência de violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Ordem denegada. 3 Não se pode olvidar, outrossim, o fato de, insurgindose contra o indeferimento ora hostilizado, caberia ao impetrante demonstrar 2 HC nº 87.728/RJ, 1ª Turma, Rel. Ministro CARLOS BRITTO, DJ: 22/09/2006. 3 HC nº 94.542/SP, 2ª Turma, Rel. Ministro EROS GRAU, DJe: 20/03/2009.
MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL 8 e não restou por ele demonstrado que a realização da diligência era oportuna, necessária e conveniente, devido a circunstâncias ou fatos apurados na instrução, os quais, por sua vez, não poderiam preceder à fase probatória. Aí, de fato, a diligência haveria que ser requerida na fase de defesa prévia, conforme entendeu a Juíza processante ao indeferi-la. Não cabe, por fim, perquirir a presença das condições necessárias ao deferimento da diligência, por absolutamente incompatível com o procedimento sumário do habeas corpus. Ante o exposto, opina-se pelo não-conhecimento da ordem ou, no mérito, pelo indeferimento do writ. Brasília, 08 de fevereiro de 2011. MARIO JOSÉ GISI Subprocurador-Geral da República